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Capítulo 2: Mercado de Trabalho Juvenil – Um Panorama da RMSP

2.3. A Metodologia de Quadros

2.3.3. A Escolaridade e o Mercado de Trabalho

Neste tópico abordaremos a relação entre o nível de escolaridade da população economicamente ativa juvenil e a inserção no mercado de trabalho, para em seguida destacarmos a fragilidade da qualidade do ensino básico brasileiro. O nível de escolaridade será classificado da seguinte maneira: para aqueles que possuem até 8 anos de estudo, como ensino fundamental - completo ou incompleto -; para aqueles que possuem de 9 a 11 anos de estudo como ensino médio – completo ou incompleto – e para aqueles com 12 anos ou mais de estudo como ensino superior, completo ou incompleto.

Tabela 2.16. População Total Ocupada por Níveis de Escolaridade na RMSP

1981

Total1 % Renda* Total1 % Renda* Total1 % Renda*

Fundamental 4.700 75,3 870 5.210 68 790 5.085 51 670

Médio 860 13,8 1.580 1.365 17,8 1.425 2.985 29,9 960

Superior 675 10,9 3.400 1.085 14,2 3.085 1.095 19,1 2.720

Total 6.235 100 1.240 7.660 100 1.220 9.980 100 1.135

1 Em mil indivíduos

* Valores em janeiro/2004. Deflator: INPC corrigido - IPEA/CESIT Fonte: Bombach (2004)

1990 2002

Escolaridade

Tabela 2.17. População Jovem Ocupada por Níveis de Escolaridade na RMSP

1981

Total1 % Renda* Total1 % Renda* Total1 % Renda*

Fundamental 1.095 67,1 545 1.045 61 500 460 24,4 430

Médio 400 24,4 760 485 28,3 730 1.060 56,2 485

Superior 140 8,5 1.290 185 10,7 1.185 365 19,4 1.020

Total 1.635 100 661,9 1.715 100 639,7 1.885 100 570

1 Em mil indivíduos

* Valores em janeiro/2004. Deflator: INPC corrigido - IPEA/CESIT Fonte: Bombach (2004)

Escolaridade 1990 2002

Entre o total da população ocupada da RMSP, observa-se uma proporção de ocupados com ensino fundamental mais expressiva do que entre a população juvenil, expressando em alguma medida, a perda de espaço dos jovens no mercado de trabalho em ocupações cuja escolaridade é mais baixa quando comparada à participação da população adulta. Ao tomarmos o ensino médio, observa-se que sua participação relativa no total da população ocupada na RMSP aumentou expressivamente, com uma participação de 13,8% em 1981 para quase 30% em 2002.

Quando nos voltamos à população juvenil, observamos uma melhora acentuada da sua situação educacional ao longo destes anos, especialmente na década de 90, quando o crescimento absoluto do número de jovens no sistema educacional de 171 mil alunos representou uma taxa de crescimento de 10%, frente à expansão de 5% nos anos oitenta. Do total dos jovens ocupados que estudam na RMSP em 2002, 24,4% estavam no ensino fundamental, 56,2% cursavam ou haviam concluído o ensino médio – uma participação relativa muito mais expressiva do que a observada na população total - e apenas 19,4% cursavam ou haviam concluído o ensino superior, esboçando as enormes desigualdades nas oportunidades de educação uma vez que a maioria dos jovens ocupados não ultrapassa a barreira do ensino médio.

À medida que nos aproximamos e depuramos os dados que acompanham o crescimento expressivo de alunos no ensino médio - de 118,5% nos anos 90, representando um crescimento absoluto de 574 mil matrículas – observa-se que além de ser o grau de instrução cuja taxa de crescimento foi mais expressiva, apresentou também a queda dos rendimentos relativos mais acentuada, de 36,2%, seguida pela perda de 21,1% dos rendimentos para os jovens do ensino fundamental e de 20,9% para os jovens universitários (Tabela 15).

A despeito da redução dos rendimentos reais dos jovens do ensino superior, estes recebem, em média, duas vezes mais do que outros com ensino médio e 2,4 vezes mais quando comparados a um jovem do ensino fundamental. Ao longo destes 21 anos houve uma ampliação do número de jovens universitários, mas que, de maneira alguma, mitigou o claro afunilamento de acesso ao sistema educacional brasileiro superior, consolidando a concepção da educação brasileira como um verdadeiro “monopólio social” 47: de um total de 1,7 milhões de jovens ocupados na RMSP, apenas 365 mil freqüentavam ou haviam concluído o ensino superior (21,5%).

No contexto de enxugamento dos postos de trabalho, não se observa a contrapartida de melhores ocupações ou salários, nem a ascensão social da

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grande maioria dos jovens a medida que estes galgam níveis educacionais melhores.

O avanço quantitativo da escolarização em todos os segmentos populacionais na década de 1990 é, até certo ponto, um reflexo das crescentes exigências educacionais praticadas no mercado de trabalho pelas empresas contratantes. O grau de escolaridade elevado, assim como a experiência profissional, passou a ser repetidamente apontado pelas próprias empresas como requisito necessário a seus trabalhadores para que estes dominassem as novas técnicas organizacionais e tecnológicas que se desenvolviam na esfera microeconômica. Ao mesmo tempo em que o baixo dinamismo econômico e a reestruturação produtiva “modernizante” geravam um expressivo excedente de mão-de-obra. Neste contexto, o grau de escolaridade elevado foi alçado a critério de seleção profissional para os inúmeros candidatos às novas e escassas vagas criadas, mas sem que houvesse, fundamentalmente, uma relação funcional entre o posto criado e a escolaridade exigida (Lourenço, 2002).

O grau de escolarização elevado assume um papel essencial no processo de inserção ocupacional dos jovens no mercado de trabalho mas não garante, por si só, melhores ocupações e/ou rendimentos mais elevados. A educação consolida-se como um caminho individual para se ter alguma chance de inserção ocupacional, mas um caminho frágil, onde os percalços são muitos, apresentando- se como uma defesa individual precária contra a elevação do desemprego e a redução dos rendimentos (Pochmann, 2004; Quadros, 2001).

Quando partimos para a análise da estrutura sócio-ocupacional com a distribuição dos jovens ocupados, segundo o grau de escolaridade, nos cinco níveis sociais da estrutura proposta, a desigualdade social brasileira ganha cores muito mais fortes.

Tabela 2.18.

Evolução da Estrutura Ocupacional – Jovens Ocupados, RMSP, 2002

Total % Renda* Total % Renda* Total % Renda*

Superior 1.664 0,4 5610,0 3.328 0,3 4005,0 16.629 4,6 3770,0 Médio 9.146 2 1805,0 25.780 2,4 1685,0 58.202 15,9 1800,0 Baixo 108.921 23,6 685,0 310.152 29,3 740,0 188.760 51,7 845,0 Inferior 188.756 41 390,0 457.337 43,2 400,0 55.711 15,3 410,0 Ínfimo 144.691 31,4 150,0 246.129 23,3 155,0 24.949 6,8 65,0 Total 460.661 100 430,0 1.058.528 100 485,0 365.040 100 1.020,0 Ensino Superior Estrutura Ocupacional

Ensino Fundamental Ensino Médio

Fonte: PNAD, IBGE apud Bombach, 2004

Ao tomarmos os níveis sociais da estrutura sócio-ocupacional dos jovens ocupados na RMSP no ano de 2002, observa-se como o claro afunilamento educacional, calcado nos níveis de rendimento associados a distintos “padrões de vida”, se impôs como um elemento divisor de águas do quadro educacional juvenil. Na prática, a dinâmica excludente do mercado de trabalho brasileiro vem “deteriorando as vantagens potencialmente oferecidas pela educação, além de aumentar as desigualdades de renda para os mesmos níveis educacionais”48.

Observa-se uma concentração dos jovens ocupados nos estratos inferiores da estrutura ocupacional, balizando um quadro onde 72,4% do total de jovens do ensino fundamental (333.447 jovens) e 66% dos jovens no ensino médio (700 mil jovens) possuíam rendimentos menores que R$ 500,00. No ensino superior, 22,1% (80 mil jovens) apresentavam um padrão de vida inferior à baixa classe média, cujos rendimentos eram menores que R$ 500,00 ao mês e destes, 25 mil recebiam em média R$ 65, 00 ao mês (Bombach, 2004).

Ao nos focarmos na situação dos estratos superior e médio buscando elementos que possam corroborar com a correlação entre o aumento dos níveis de escolaridade e o aumento dos rendimentos médios e do status social, não os encontramos. Bombach (2004) bem aponta como a “aquisição de, no mínimo, mais três anos de estudos, o que faz elevar o nível de escolaridade do primeiro para o segundo grau, não representa, de acordo com os dados, o acesso às

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camadas superiores”49, uma vez que o percentual de jovens nos dois estratos ocupacionais (superior e médio) é praticamente igual entre aqueles que possuem até 8 anos de estudo (2,4%) ou de 9 a 11 anos de estudo (2,7%). O que se observa nestes dois estratos ocupacionais é uma concentração de sua população juvenil no ensino superior, ao passo que os demais estratos têm sua população juvenil concentrada no ensino médio, reforçando o conceito da educação superior como um “monopólio social”.

Quando observamos a situação dos jovens negros, esta situação é ainda mais dramática, não apenas para a aquisição dos requisitos educacionais que o mercado de trabalho exige, mas também no que se refere às dificuldades de superação dos preconceitos no mercado de trabalho sintetizados nas ocupações precárias que lhes são ofertadas, em termos das atividades desenvolvidas e dos rendimentos auferidos.

Sinteticamente, os dados das três tabelas abaixo apontam para uma concentração dos jovens negros ocupados nos últimos níveis da estrutura ocupacional independente do nível de escolaridade. Dos jovens negros ocupados que cursavam ou haviam cursado o ensino fundamental, 78,4% recebiam até R$ 500,00 mensais em 2002 na RMSP, o mesmo sendo observado no ensino médio (75,1%) apesar deste representar um nível de escolarização mais elevado.

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Tabela 2.19.

Nível Fundamental – Jovens Ocupados, RMSP, 2002

Total % R. média* Total % R. média*

Superior - - - - Médio 8.310 3,6 1.840,0 - - - Baixo 66.510 28,9 700,0 41.405 18 655,0 Inferior 78.160 33,9 395,0 110.600 48 385,0 Ínfimo 72.340 31,4 155,0 72.355 31,4 150,0 Ignorados 5.005 2,2 - 5.980 2,6 - Total 230.325 100 500,0 230.340 100 365,0

* Valores em janeiro/2004. Deflator: INPC corrigido - IPEA/CESIT Fonte: Bombach (2004)

Estrut. Ocup.

Não Negro Negro

Tabela 2.20.

Nível Médio – Jovens Ocupados, RMSP, 2002

Total % R. média* Total % R. média*

Superior - - - - Médio 21.620 3,3 1.675,0 - - - Baixo 220.355 33,3 750,0 89.800 22,6 710,0 Inferior 268.585 40,6 400,0 188.750 47,5 395,0 Ínfimo 136.360 20,6 150,0 109.760 27,6 160,0 Ignorados 14.145 2,1 - 9.150 2,3 - Total 661.065 100 515,0 397.460 100 430,0

* Valores em janeiro/2004. Deflator: INPC corrigido - IPEA/CESIT Fonte: Bombach (2004)

Estrut. Ocup.

Não Negro Negro

A situação crítica não é nem mesmo revertida para os jovens negros que freqüentam ou que já haviam concluído o ensino superior, uma vez que 25% destes jovens (11 mil em números absolutos) estavam alocados em empregos de péssima remuneração (até R$ 500,00) e com mais de metade da população jovem negra com ensino superior inserida no nível baixo da estrutura sócio-ocupacional, lhes proporcionando um padrão de vida típico de baixa classe média (Bombach, 2004).

Tabela 2.21.

Nível Superior – Jovens Ocupados. RMSP, 2002

Total % R. média* Total % R. média* Superior 14.965 4,7 3.820,0 1.660 4 3.325,0 Médio 53.215 16,5 1.815,0 4.985 12 1.660,0 Baixo 165.480 51,4 860,0 23.280 53,8 765,0 Inferior 47.395 14,7 405,0 8.315 19,2 440,0 Ínfimo 22.450 7 60,0 2.490 5,8 100,0 Ignorados 18.295 5,7 - 2.505 5,8 - Total 321.800 100 1.045,0 43.235 100 870,0

* Valores em janeiro/2004. Deflator: INPC corrigido - IPEA/CESIT Fonte: Bombach (2004)

Estrut. Ocup.

Não Negro Negro

No início deste capítulo expusemos o movimento ascendente das taxas de desemprego juvenil entre 1981 e 2002. No entanto, ao tomarmos as taxas de desemprego da população brasileira total de acordo com os níveis de escolaridade, fica claro a excludente dinâmica do mercado de trabalho brasileiro e seu papel como perpetuador das desigualdades brasileiras ao longo dos anos 90. Os dados de Pochmann (2004) – relativos ao período 1992 e 2002 – apontam que a taxa de desemprego entre os grupos de maior renda sofreu uma inflexão para baixo entre a faixa de estudo de 9 anos (fundamental completo) e a de 15 ou mais anos de estudo (superior incompleto), enquanto que na classe de baixa renda, à medida que a escolaridade se eleva, o desemprego cresce.

A ampliação do processo discriminatório no interior do mercado de trabalho, de acordo com as distintas faixas etárias – entre jovens e adultos principalmente -, a cor/raça e o gênero dos indivíduos, conforma um verdadeiro ciclo vicioso de ampliação das desigualdades que impede que a educação revele o seu “potencial transformador das relações humanas e da agregação de valor à produção no Brasil”50.

Ao longo destes anos, observou-se a deterioração das condições de funcionamento do mercado de trabalho brasileiro, que ao invés de ser refreada

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pela expansão do sistema educacional, corroborou com o desperdício e com o desgaste dos avanços quantitativos educacionais conquistados em ocupações precárias e de baixa qualidade. A persistência das péssimas condições do mercado de trabalho conduziu às segmentações ocupacionais ainda mais acentuadas, com a exclusão dos mais pobres dos empregos nos segmentos educacionais mais elevados. O significado desta dinâmica vai além da dimensão ocupacional, uma vez que a melhoria da situação social e a conquista da cidadania no país está intimamente imbricada à dissolução deste ciclo vicioso.

Atualmente, a educação parece ter se consolidado como uma defesa “profundamente precária contra a elevação do desemprego e a queda do nível de renda”51.

“À medida que se eleva a escolaridade da população de baixa renda, acompanha, em indicadores mais expressivos, o desemprego. O mercado de trabalho, diante da enorme escassez de emprego e do elevado excedente de mão-de-obra no país, termina observando a manifestação mais evidente da discriminação, sobretudo quando se trata da população de menor renda e mais escolaridade. Dessa forma, nota-se que, do ponto de vista da oferta educacional mais escolarizada, o desempenho do Brasil na década passada mostrou incrementos importantes, ainda que se possa questionar acerca da

qualidade”52