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A escolarização dos jovens e adultos que tiveram negado o acesso ou sua permanência no sistema formal de ensino, em idade própria, constitui um desafio não apenas para o Governo, mas para a sociedade como um todo. Se por um lado encontramos questões de ordem quantitativa, referentes a um percentual expressivo da população ainda não alfabetizada, de outro lado temos as questões de ordem qualitativa.

Quanto à qualidade na educação ofertada a esse público de jovens e adultos, questiona-se a adequação do currículo, do material didático, da metodologia, os modos de avaliação e, sobretudo, da formação inicial e continuada de professores, Considerando que esses alunos têm um perfil diferente dos alunos atendidos na modalidade de ensino regular, pois são indivíduos com história de vida marcada pela exclusão, Oliveira (1999) salienta que

Embora nos falte uma boa psicologia do adulto e a construção de tal psicologia esteja, necessariamente, fortemente atrelada a fatores culturais, podemos arrolar algumas características dessa etapa da vida que distinguiriam, de maneira geral, o adulto da criança e do adolescente. O adulto está inserido no mundo do trabalho e das relações interpessoais de um modo diferente daquele da criança e do adolescente. Traz consigo uma história mais longa (e provavelmente mais complexa) de experiências, conhecimentos acumulados e reflexões sobre o mundo externo, sobre si mesmo e sobre as outras pessoas. Com relação à inserção em situações de aprendizagem, essas peculiaridades da etapa de vida em que se encontra o adulto fazem com que ele traga consigo diferentes habilidades e dificuldades (em comparação com a criança) e, provavelmente, maior capacidade de reflexão sobre o conhecimento e sobre seus próprios processos de aprendizagem. (p. 60-61)

Ao considerar a especificidade desse público, é preciso que o professor esteja atento para não encarar essas especificidades como algo negativo, mas

entendê-las e respeitá-las, estimulando e valorizando seus saberes, possibilitando que esses alunos façam conexão entre os conhecimentos e saberes já aprendidos. No processo de aprendizagem, Tardif (2006) considera que os alunos devem tornar-se “os atores de sua própria aprendizagem, pois ninguém pode aprender em lugar deles. Transformar os alunos em atores, isto é, em parceiros da interação pedagógica, parece-nos ser a tarefa em torno da qual se articulam e ganham sentido todos os saberes do professor.” (p. 221).

Nessa perspectiva, é fundamental o acolhimento desses jovens e adultos em um trabalho de resgate de sua autoestima e da conscientização de sua identidade por meio da valorização de suas origens. Nesse contexto, a Proposta Curricular para Educação de Jovens e Adultos, considera que

Contribuir para o processo de acolhimento dos alunos da EJA não é tarefa simples, pois envolve lidar com emoções, motivações, valores e atitudes, responsabilidades e compromissos. O acolhimento ao aluno envolve tanto a valorização dos conhecimentos e da forma de expressão de cada um como seu processo de socialização, levando em conta, nas situações de ensino e aprendizagem, dúvidas e inquietações, realidades socioculturais, jornada de trabalho e condições emocionais decorrentes da exclusão escolar. Para regressar à escola, jovens e adultos têm de romper barreiras preconceituosas, geralmente transpostas em função de um grande desejo de aprender. Assim, essa disposição para a aprendizagem precisa ser alimentada por uma prática pedagógica que garanta condições para que prevaleça uma atitude positiva diante dos estudos. Nesse contexto, um aspecto importante refere-se à proposição de um ensino comprometido com a aprendizagem, que considere a situação real dos alunos, dando sentido e plenitude humana à sua existência, respondendo a problemas de seu dia a dia e também para sua atuação mais ampla. (BRASIL, 2002a, p. 88)

Portanto, o atendimento a esse público tão heterogêneo e diversificado culturalmente, pressupõe que o educador dessa modalidade tenha consciência de sua importância no desenvolvimento desses educandos.

Tardif (2006) considera que o professor possui uma posição fundamental, pois é ele quem “constrói seu espaço pedagógico de trabalho de acordo com limitações complexas que só ele pode assumir e resolver de maneira cotidiana apoiada necessariamente em uma visão de mundo, de homem e de sociedade.” (p. 149). Nesse sentido, o autor (2006) considera que os professores são atores

competentes, sujeitos do conhecimento, e que a sua subjetividade precisa estar no centro das investigações.

Para compreender a natureza do ensino, é absolutamente necessário levar em conta a subjetividade dos atores em atividade, isto é, a subjetividade dos próprios professores. Ora um professor de profissão não é somente alguém que aplica conhecimentos produzidos por outros, não é somente um agente determinado por mecanismos sociais: é um ator no sentido forte do termo, isto é, um sujeito que assume sua prática a partir do significado que ele mesmo lhe dá, um sujeito que possui conhecimento e um saber-fazer proveniente de sua própria atividade e a partir dos quais ele a estrutura e a orienta. (TARDIF, 2006, p. 230).

Considerando o papel do professor, Fonseca (2007) observa três valores que julga fundamentais para a participação do professor na Educação Matemática de jovens e adultos: honestidade, compromisso e entusiasmo. Tais valores, no entanto, remetem a três dimensões da formação desse educador: sua intimidade com a Matemática, sua sensibilidade para as especificidades da vida adulta e sua consciência política.

Sobre a intimidade com a Matemática, a autora considera a relação do educador com o conhecimento matemático. Enfatiza que, embora o professor considere o conhecimento matemático informal, ainda há uma carência referente a aspectos como o acolhimento, negociação, “quando a situação demanda que criem, estimulem e/ou organizem espaços de (re)significação desse conhecimento” (FONSECA, 2007, p. 56); considera, portanto, que é a “intimidade com o conhecimento matemático que o proverá de recursos para que tais proposição, negociação e desempenho sejam um reflexo da perspectiva ética e política pela qual ele se assume como educador matemático de jovens e adultos”(FONSECA, 2007, p. 57).

Desse modo, é fundamental que o professor conheça os conteúdos e os procedimentos matemáticos, estabelecendo mesmo uma relação de intimidade, o que contribui para que ele acompanhe a trajetória de construção de conhecimento dos seus alunos. Quanto aos programas e propostas de formação docente, Fonseca (2007), considera a importância no desenvolvimento de habilidades da leitura. No entender dessa autora,

A contribuição do conhecimento da Matemática dar-se á não apenas pelo acesso a um vocabulário específico, cada vez mais frequente nas diversas instancias da vida social, mas também pelo provimento de modos de tratamento, organização e registro da informação, que orientam e sugerem critérios para o julgamento e o enfrentamento de questões diversas da vida moderna, em seus apelos funcionais, e da vida humana, em suas indagações arquetípicas. (FONSECA, 2007, p. 59-60)

Em relação à sensibilidade para as especificidades da vida adulta, Fonseca (2007) considera importante que o professor conheça o seu aluno, não apenas como indivíduo, mas também como grupo social. Em relação à seleção e critérios que possibilitem o diagnóstico desses alunos, assinala ser necessário efetuar registros de informação, consultá-los, socializar com os demais professores e refletir sobre os dados encontrados.

Em relação ao papel ético e político da ação educativa, Fonseca (2007) considera que o educador deve entender a EJA como sendo um direito do cidadão, uma necessidade da sociedade e uma possibilidade de realização da pessoa como sujeito de conhecimento. Desse modo, a autora considera que todos que estão inseridos na sociedade devem lutar, não apenas pelo acesso à escolarização, mas por uma educação de qualidade, sendo que

É também do campo da ética e da cidadania a preocupação com a própria formação profissional e a consciência de sua repercussão na prática pedagógica, como atitude de respeito para com os alunos que têm direito a uma Educação de boa qualidade, para com o projeto pedagógico que requer ações conscientes e eficazes, e para consigo mesmo, inserindo-se num processo amplo de formação humana que envolve todos os atores dos processos de ensino-aprendizagem no âmbito escolar. (FONSECA, 2007, p. 64)

2.2 A especificidade da Educação de Jovens e Adultos no tocante ao