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Ao indicar os princípios de exclusão e inclusão, Morin (1999b) observa que eles não podem ser tratados separadamente e retoma a ideia de que, apesar de antagônicos, são complementares.

De acordo com Morin (1999b, p. 122), o princípio da exclusão “refere-se ao fato de que o Eu é único e ninguém pode dizê-lo em meu lugar”. Logo, o outro não é Eu. E essa diferenciação de um Eu em relação a outro se insere “na ocupação do espaço egocêntrico por um Eu que unifica, integra, absorve e centraliza cerebral, mental e afetivamente as experiências de uma vida” (MORIN, 2007a, p. 75).

O princípio da exclusão se dá, concomitante e concorrentemente, ao princípio da inclusão, que é, “ao mesmo tempo, complementar e antagônico” (MORIN, 2007a, p. 122). O autor refere-se ao NÓS, isto é, “eu posso incluir o meu EU em um NÓS, posso introduzir, em minha subjetividade e minhas finalidades, os meus parentes, minha família, minha pátria...” (MORIN, 1999b, p.122).

Ainda,

A condição de sujeito comporta, ao mesmo tempo que o princípio de exclusão, um princípio de inclusão; este nos permite nos incluirmos numa comunidade, um Nós (casal, família, partido, Igreja) e incluir esse Nós no centro do mundo. [...] Portanto, o egocentrismo do sujeito favorece não somente o egoísmo, mas também o altruísmo, pois somos capazes de dedicar o nosso eu a um Nós e a um Tu (MORIN, 2007a, p. 75-76).

Na exclusão, nada pode estar no lugar dele, é indivíduo em si, tem sua identidade, não é o outro. E na inclusão há uma inscrição hereditária, há uma inserção da espécie, família, sociedade etc. no interior do sujeito. Eu me incluo e me transformo em um nós. “[...] Ou seja, temos todos, em nós, este duplo princípio que pode ser diferentemente modulado, distribuído; ou seja, o sujeito oscila entre o

egocentrismo absoluto e a devoção absoluta.” (MORIN, 2007a, p. 122, grifo do

autor)

Tomando esses dois princípios, exclusão e inclusão, deparamos com a afetividade estreitamente ligada à subjetividade e à liberdade quando, em determinados momentos, o sujeito sofre a pressão de duas forças antagônicas: o egoísmo e o altruísmo em suas tomadas de decisão.

A afetividade pode ser entendida como uma dimensão que permite os vínculos e pode ser expressa de diversas formas em nossas atitudes com as pessoas.

A liberdade “supõe, ao mesmo tempo, a capacidade cerebral ou intelectual de conceber e fazer escolhas, e a possibilidade de operar essas escolhas dentro do exterior [... desse modo,] o sujeito pode, eventualmente, dispor de liberdade e exercer liberdades” (MORIN, 1999b, p. 126). Então, dependendo da opção do sujeito, pode exercer ou não a liberdade.

A liberdade supõe, ao mesmo tempo, a capacidade cerebral ou intelectual de conceber e fazer escolhas, e a possibilidade de operar essas escolhas dentro do meio exterior. Sem duvida há casos em que se pode perder toda a liberdade exterior, estar numa prisão, mas conservar a liberdade intelectual. [...]. (MORIN, 1999b, p. 126)

Em relação à liberdade do sujeito, parece que é um processo de formação ao longo da vida, influenciada pela sociedade e meio em que vive, e diz respeito à sua liberdade de escolha, que, a nosso ver, depende da igualdade de oportunidades e do acesso ao conhecimento. Já no que tange à subjetividade:

O mundo interno do indivíduo/sujeito, construído na tessitura da transmissão e apreensão do acervo sociocultural coletivo, das relações interpessoais nucleares e expandidas, e da configuração das instâncias biopsíquicas, permite um sentido próprio e singular à vida e ao viver, indicando a complexidade constitucional do ser. Essa dinâmica possibilita a compreensão da subjetividade como um sistema que organiza/desorganiza o mundo interno e o mundo externo do sujeito, facilita/dificulta o desenvolvimento e o crescimento pessoal, resgata/interdita o passado que interfere no agora do presente, prospecta o futuro, desvela e distingue o singular e o especial (DIAS, 2008, p. 8).

É neste espaço que ele acolhe a reflexão sobre conhecer, agir, situar-se, estabelecer relações com os outros, atribuir significados às experiências vividas e construir sua subjetividade. “É o indivíduo humano, vamos repetir, que dispõe das qualidades do espírito e mesmo de uma superioridade em relação à espécie e à sociedade, pois só ele tem a consciência e a plenitude da subjetividade” (MORIN, 2007a, p. 73).

Nesse contexto, é possível compreender a ideia de tudo-nada, também implícita na noção de sujeito: ora sou tudo, ora, em face da consciência da própria morte, sou nada! Nesse aspecto, Morin (1999b, p. 127) alerta:

Sujeito não é apenas ator, mas autor, capaz de cognição/escolha/decisão. A sociedade não está entregue somente a determinismos materiais, ela é um mecanismo de confronto/cooperação entre indivíduos sujeitos, entre os “Nós” e os “Eu”.

Isso remete à oscilação do sujeito entre o egoísmo e o altruísmo, em que, “no egoísmo, eu sou tudo, e os outros são nada; mas, no altruísmo, eu me dou, me devoto, sou inteiramente secundário para aqueles aos quais me dou” (MORIN, 1999b, p. 127).

Ao pensar na autoformação como a construção da formação do sujeito, prepondera o EU sobre o NÓS e, em muitos momentos, ocorre o confronto sobre as interações com os outros e com as coisas do mundo, em que parece que o NÓS prepondera sobre o EU.

O sujeito, único em meio à dualidade e à multiplicidade, comporta o diferente, agrega os aspectos multidimensionais e revela uma identidade polimorfa. Dessa maneira, cada indivíduo é singular e, contudo, duplo, plural e diverso, e isso não o impede de viver para si e para o outro dialogicamente. “[…] os outros moram em nós; nós moramos nos outros, [... o que significa que] cada um contém a

multiplicidade e inúmeras potencialidades, mesmo permanecendo um indivíduo único.” (MORIN, 2007a, p. 95)

É interessante notar que o ser humano possui outras aptidões organizadoras além do aspecto cognitivo, como a afetividade, fazendo com que o sujeito humano esteja destinado ao amor, ao ódio e a todos os sentimentos e conteúdos que o movem na relação com o outro e consigo mesmo.

Somos originários do cosmos, da natureza, da vida, mas, devido à própria humanidade, à nossa cultura, à nossa mente, à nossa consciência, tornamo-nos estranhos a este mundo, que nos parece secretamente íntimo. Nosso pensamento e nossa consciência fazem-nos conhecer o mundo físico e nos distanciam dele. O próprio fato de considerar racional e cientificamente o universo, separa-nos dele.

Desenvolvemo-nos além do mundo físico e vivo. É nesse “além” que tem lugar a plenitude da humanidade.

Tudo isso faz emergir o processo de hominização, isto é, a humanização é testemunhada pela possibilidade da evolução, tanto cultural quanto biológica, da educação sociocultural e de um meio complexificado pela cultura.

Isto significa reconhecer, como disse Montaigne (apud MORIN, 2007a, p. 73), que “cada homem carrega a forma inteira da condição humana”, com a complementaridade e também com os antagonismos e contradições de indivíduo/sociedade/espécie.