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3.1 EXEMPLOS INTERNACIONAIS

3.1.1 A Experiência da Costa Rica

A experiência vivenciada na Costa Rica6 é um dos exemplos positivos do uso desses me-

canismos. De acordo com Teixeira [32], o mecanismo implantado no país foi determinante para a disseminação desse tipo de política ambiental. Oliveira [36] destaca que

6A Costa Rica representa o primeiro país a desenvolver um mecanismo de Pagamento por Serviços Ambientais, o qual teve início em 1997 e estendeu-se em nível nacional.

[...] a política de reconhecimento e de valorização dos ser- viços ambientais levada a efeito na Costa Rica assenta-se sobre cinco pilares principais: amplitude como política pú- blica; o Estado como motor e animador de ações de ampli- tude e consolidação da política de PSA; aspectos naturais convergentes; cooperação internacional; e estabilidade po- lítica [36].

De acordo com Peralta [12], durante as décadas de 1960 e 1970, a Costa Rica apresen- tou uma perda na sua cobertura florestal passando de 75% em 1940 para 21% em 1987, chegando a ser considerada como um dos maiores índices de desmatamento mundial.

Peralta [12], citando um estudo realizado pela FAO7 em parceria com o CATIE8, no

ano de 2000, aponta como causas principais do desmatamento a transformação dos bos- ques para o cultivo de agro-exportação, pecuária extensiva, construção de infraestrutura, consumo de lenha e carvão para a produção de energia, políticas de colonização que privi- legiam a ocupação de terras tidas como improdutivas e políticas de crédito incentivando a criação e exportação de gado.

Como a situação mostrava-se bastante grave, em 1996 setores governamentais e não governamentais se reuniram para buscar soluções. Segundo Peralta [12], entre as atitudes tomadas, criou-se a Lei Florestal nº 7.575/1996 que estabeleceu diretrizes e deu origem ao Programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA-CR). Esse programa apresentou o objetivo de diminuir os altos índices de desmatamento existentes na época, aumentar a cobertura florestal e reconhecer o valor que os serviços florestais apresentam, incentivando a cidadania ecológica.

Mesmo enfrentando desafios, especialmente quanto a eficácia social, o Programa da Costa Rica pode ser considerado consolidado e, em conjunto com outras medidas, deteve o desmatamento e ampliou a cobertura florestal no país de 21% em 1987 para 52,38% em 2012 [12].

Esse mecanismo de PSA, segundo Peralta [12], parte do princípio de que a manutenção da floresta em pé traz importantes benefícios para a sustentabilidade local. Representa uma das estratégias nacionais para a conservação do ambiente, complementando o Sistema de Áreas Silvestres Protegidas e permitindo maior conscientização sobre a importância dos recursos naturais para o equilíbrio ecológico.

7A FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura, faz parte do Sistema ONU – Organização das Nações Unidas, e foi criada em 1945 para auxiliar no combate a fome e a pobreza através de ações que buscam aumentar a segurança alimentar e o desenvolvimento da agricultura. 8O CATIE - Centro Agronómico Tropical de Investigacion y Ensenanza, corresponde a uma instituição que tem como objetivo contribuir para a redução da pobreza no meio rural através da educação, pesquisa e cooperação técnica, buscando uma gestão sustentável da agricultura e dos recursos naturais. Com sede na Costa Rica, fazem parte desta instituição membros pertencentes a Belize, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Venezuela e, também, o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) do Estado do Acre, no Brasil.

O autor afirma que outro objetivo do programa é reconhecer financeiramente os propri- etários de bosques e áreas florestais por seus esforços na tentativa de proteger os serviços prestados pela floresta. Estes agem diretamente sobre o desenvolvimento humano e na proteção do ambiente, visando reconhecer os custos intrínsecos na preservação do ecossis- tema em questão, internalizando as “externalidades ambientais positivas” e minimizando ações que promovam o desmatamento ou a degradação das áreas florestais.

Para que fosse possível sua implantação, em um primeiro momento, foi necessário que os serviços ambientais passassem a possuir valor econômico no mercado. Assim poderia haver algum tipo de compensação para os que produzem esses bens e serviços de forma sustentável, sem prejuízos para o equilíbrio ambiental, por aqueles que fazem uso destes serviços para sua subsistência.

Para tanto, Teixeira [32], afirma que a Lei nº 7.575/1996 da Costa Rica reconheceu quatro serviços ambientais passíveis de remuneração, sendo eles:

[...] a) mitigação das emissões de gases de efeito es- tufa (GEE); b) serviços hidrológicos, incluindo provisão de água para consumo humano, para irrigação e para pro- dução de energia; c) conservação da biodiversidade; e d) provisão de beleza cênica para recreação e ecoturismo [32]. Peralta [12] salienta que, para efeitos da Lei, a gestão das florestas e bosques é di- vidida em cinco modalidades. São elas a conservação dos bosques, o reflorestamento, a regeneração de forma natural, os sistemas agroflorestais e o manejo florestal. A Tabela

3.1 representa os tipos de serviços ambientais reconhecidos como de valor, tanto para a preservação, como para a economia e traz uma breve descrição sobre suas características fundamentais.

A Lei nº 7.575/1996 apresentou outras inovações importantes. Teixeira [32] aponta a criação de um imposto sobre o uso de combustíveis fósseis como forma de financiamento do programa, criação do Sistema Nacional de Certificação Florestal para o Manejo dos Bosques e a criação do Fundo Nacional de Financiamento Florestal – FONAFIFO como as mais importantes 9.

Montero [39] faz uma síntese dos pontos principais que norteiam a Lei Nº 7575/96 em relação ao pagamento pelos serviços ambientais. Ele destaca que os incentivos florestais podem ser agrupados em três categorias principais: 1) incentivos de caráter financeiro – utilização de certificados que podem ser utilizados no pagamento de tributos diversos; 2) incentivos fiscais – sujeitos que realizam ações de reflorestamento e proteção dos bosques

9O FONAFIFO, de acordo com Hercowitz[38], representa um órgão governamental que apresenta status legal de forma independente, correspondendo a estratégia de maior relevância criada através da Lei nº 7.575/1996, tendo como objetivo principal buscar os recursos necessários para a implantação do Programa e gerenciá-los.

TIPO DE SERVIÇO

AMBIENTAL DESCRIÇÃO DO SERVIÇOAMBIENTAL

Mitigação da emissão de gases do efeito estufa (redução, absorção, fixação e ar- mazenamento do carbono)

Os bosques primários e secundários e as plantações florestais fixam o carbono de forma permanente na biomassa e contri- buem para a limpeza da atmosfera. Proteção da água para o uso urbano, ru-

ral ou hidrelétricos. A perda da cobertura florestal pode pro-duzir impactos sobre o ciclo hidrológico e sobre o microclima em determinadas regiões. O serviço prestado pela floresta corresponde na manutenção dos níveis e da qualidade da água ao longo do tempo, através da redução nos níveis de erosão, sedimentação e fluxo de nutrientes. Proteção da biodiversidade para sua

conservação e uso sustentável em pes- quisas científicas, farmacêutica, melho- ramento genético e proteção dos ecos- sistemas e das mais variadas formas de vida.

A Lei da Biodiversidade da Costa Rica nº 7788/1998 compreende a biodiversi- dade dentro de cada espécie e estas den- tro de cada ecossistema, os quais devem ser protegidos de forma individual ou co- letiva, levando-se em conta o valor real associado ao potencial bioquímico e ge- nético que os recursos possuem.

Beleza cênica. Conceito que leva em conta aspectos

subjetivos que se encontram ligados a preservação e a utilização do patrimônio natural como uma paisagem atrativa. Tabela 3.1: Serviços Ambientais reconhecidos pela Costa Rica como tendo valor econômico

poderão ter isenção dos impostos sobre imóveis; 3) incentivos não econômicos – proteção de imóveis que servem ao serviço florestal ou que se dedique a alguma atividade florestal. A Lei estabelece, ainda, as fontes de recurso para o financiamento e pagamento do PSA. Dentre as principais, encontra-se o imposto único sobre os combustíveis, do qual, 3,5% do montante arrecadado deve ser obrigatoriamente destinados a esses pagamentos. Em 2006, foi aprovado o Decerto Ejecutivo nº 32.868, o qual estabeleceu o Canón pelo uso da água. Esse instrumento econômico fundamentado na Lei das Águas, estipula que 25% da receita arrecadada com ele deve ser destinada ao FONAFIFO para ser aplicado na preservação e proteção dos recursos hídricos [37]. Além disso, o FONAFIFO deve procurar financiamento em fontes diversas, como mecanismos de certificação de sustentabilidade ambiental, convênios e cooperação entre instituições públicas ou privadas, empréstimos e doações de bancos e agências internacionais [12].

Apesar de apresentar muitos pontos positivos, o programa PSA – CR também apre- senta limitações. Uma delas refere-se às exigências feitas para que os proprietários possam aderir ao programa. Para Peralta [12], outra limitação corresponde à necessidade de o proprietário possuir título de propriedade como requisito para o acesso aos benefícios pre- vistos. Podem ser selecionados para o programa agricultores que possuem propriedades de forma individual, empresas privadas de setores diversos e associações que visam o de- senvolvimento e a conservação de comunidades indígenas do país. Os contratos tem seus registros junto à escritura das propriedades, o que faz com que haja garantia de continui- dade do processo de sustentabilidade da propriedade inclusive nos casos onde estas são vendidas.

Já os critérios e categorias para a seleção dos projetos aptos a receber o benefício estipulado através do PSA encontram-se descritos no Manual do PSA10. Este estabelece

as diretrizes para seu funcionamento, as áreas mínimas e máximas consideradas de acordo com as modalidades definidas, divididas de acordo com as prioridades identificadas no PSA a cada ano [12]. Todos os anos são estipulados, através de decreto, o número de hectares que podem ser contratados em cada modalidade, as áreas prioritárias, os valores a serem pagos e, no caso dos sistemas agroflorestais, a quantidade de árvores disponíveis. Ao longo do tempo, o Programa foi sendo aprimorado. Foram feitas diversas tentativas de aumentar a participação de proprietários rurais com menos condições financeira através da inclusão do Índice de Desenvolvimento Social como critério de acesso e a criação de projetos de leis com o objetivo de fomentar financiamentos [12].

Porras [40] salienta que a informação mostrou-se fundamental para a construção desta proposta. O Registro Nacional da Costa Rica criou um sistema informatizado que permite

10O Manual de Procedimientos para el pago de Servicios Ambientales, aprovado através do Acordo nº 11 de 28 de janeiro de 2009 e publicado no Diario Oficial La Gaceta, Nº 46 , em 06 de março de 2009, estabelece os procedimentos que devem ser aplicados no pagamento pelos serviços ambientais prestados pelas florestas através da tomada de medidas que visem o reflorestamento, a proteção da cobertura florestal e a recuperação de áreas degradadas através da regeneração natural e do plantio em sistemas agroflorestais.

o acesso às informações referentes à situação legal de todos os participantes do programa. Mesmo assim, o autor considera que as mudanças sociais provocadas ainda são peque- nas. De forma geral, os pagamentos são feitos para propriedades com custo de oportuni- dade baixo ou para grandes proprietários e empresas privadas e os custos das transações são elevados, dificultando a participação dos pequenos agricultores.

Em 2012, segundo Peralta [12], foi aprovado o Decreto Ejecutivo Nº 37.660 – MINAET estabelecendo as áreas prioritárias para o ano de 2013, o prazo de contrato para cada modalidade, variando entre 5 e 10 anos e a forma do pagamento. Para que um PSA seja aprovado, as solicitações são avaliadas e pontuadas com base em critérios11 de acordo

com indicadores específicos para cada prioridade, previstos no Decreto e, com base na Lei Florestal. Os proprietários que demonstrem interesse devem apresentar um plano de gestão florestal de acordo com a modalidade de PSA em que se encaixam [12].

Para facilitar, criou-se o Plano Operativo Institucional (POI)12 que apresenta o ob-

jetivo principal de fortalecer a conservação e o uso sustentável do patrimônio genético, natural e cultural, partindo de uma organização territorial baseada na participação da sociedade e assegurando o respeito, o exercício e o gozo dos direitos humano.

A Matriz Anual da Programação Institucional (MAPI)13, criada a partir do FONA-

FIFO, relaciona os programas pertencentes ao sistema de PSA, apresentando os objetivos a serem alcançados ao longo do período partindo de uma base relativa às metas alcançadas no ano de 2014.

Conforme Peralta [12], o pagamento pelos serviços ambientais prestados pelos propri- etários rurais é feito através de certificados ou de dinheiro. Estes valores são atualizados todos os anos de acordo com a inflação e o primeiro pagamento ocorre no momento em que o contrato é assinado, estando condicionado a um sistema de monitoramento e avaliação dos resultados.

Desde sua criação o programa apresentou resultados considerados importantes, tais como: maior conscientização da sociedade em relação à importância que os serviços flores- tais apresentam; fortalecimento das discussões sobre o setor florestal e a institucionalidade do país; diminuição significativa na taxa de desmatamento, chegando próximo a 0%, além da expansão e da qualidade das florestas e da regeneração das áreas antes degradadas [12].

Além disso, de acordo com Porras et al. [41], o PSA permitiu, até 2010, a proteção efetiva de aproximadamente 710 mil hectares de bosques localizados em propriedades

11Os critérios estipulados para cada modalidade de PSA, bem como a pontuação referente a cada um deles foram estabelecidos com base no Decreto Nº 25.721 – MINAE, o qual corresponde ao Regulamento à Lei Florestal.

12O POI representa um instrumento de planejamento, em curto prazo, implementado pelo FONAFIFO apresentando, de forma resumida, os objetivos e metas que devem ser atendidas durante o ano referentes ao Programa de PSA implantado. Além disso, é uma importante ferramenta projetada para auxiliar no acompanhamento e avaliação da execução das ações planejadas.

13A MAPI para o ano de 2015 encontra-se disponível no Plan Operativo Institucional 2015, elaborado pela Unidad de Planificación y Control de Gestión. Disponível em: <http://www.fonafifo.go.cr/quienesomos/planificacion/PL_POI_2015.pdf>.

privadas, o reflorestamento de mais de 50 mil hectares, acompanhado do manejo de forma sustentável de mais 30 mil hectares e ao plantio de 3,5 milhões de árvores, conseguindo restaurar de forma natural mais de 5500 hectares. Foram beneficiados cerca de 10 mil camponeses, indígenas, empresas ou cooperativas ligadas ao programa.

No POI/2015 estão representados os indicadores14do desempenho histórico e projetado

para os anos de 2011 a 2013. A partir da utilização dos dados coletados em 2014 como uma linha de base, faz-se uma projeção para o que se quer alcançar entre os anos de 2015 a 2018. Através da análise destes indicadores, percebe-se que o foco principal para a realização deste PSA é a redução na quantidade de emissão de carbono na atmosfera. Porém, a preservação dos bosques e a manutenção da floresta em pé trazem benefícios que vão além do controle e da captura do carbono, auxiliando, inclusive, na manutenção da qualidade dos recursos hídricos.

Apesar do programa de PSA da Costa Rica estar consolidado e apresentar resultados satisfatórios, servindo como modelo para a criação de programas semelhantes em outros países, ainda enfrenta dificuldades e desafios. Os principais correspondem às fontes de fi- nanciamento, avaliação dos resultados alcançados e limitações quanto à forma de ingresso de proprietários que queiram fazer a adesão, especialmente no que diz respeito à titula- ridade das terras, que acaba por ser um fator que resulta na exclusão de classes menos favorecidas.