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3.1 EXEMPLOS INTERNACIONAIS

3.1.2 A Experiência de Nova York

A cidade de Nova York, nos Estados Unidos, também apresenta um mecanismo de PSA criado a partir da necessidade de manter a qualidade da água consumida por sua população com resultados positivos. Segundo Franco e Prado [42], a experiência teve início em 1990, quando se verificou que a água de uma das bacias de abastecimento, responsável por 10% do total de água distribuída na cidade, encontrava-se degradada devido à urbanização em seus arredores e as alterações no uso do solo, e o mesmo poderia acontecer com as demais bacias.

De acordo com Veiga Neto [18], o Sistema de Águas da cidade de Nova York abastece mais de nove milhões de habitantes e fornece aproximadamente 1,2 bilhões de galões de água por dia utilizados em 600 mil residências e 200 mil estabelecimentos comerciais. Toda essa água é obtida de três bacias diferentes localizadas na região norte da cidade. São elas as Bacias de Croton, Catskill e Delaware, abrangendo mais de 830 mil hectares de área.

Perrot – Maître & Davis [43] destacam que 90% do abastecimento da água utilizada na

14A tabela com os Indicadores de desempenho histórico até o ano de 2011 com dados sobre os hectares até então pertencentes ao Programa de Pagamento por Serviços Ambientais na Costa Rica, bem como a quan- tidade de emissões de carbono evitadas ou capturadas neste período e as projeções para os próximos anos encontra-se no Plan Operativo Institucional 2015, p. 18, elaborado por Unidad de Planificacion y Control de Gestão. Disponível em: http://www.fonafifo.go.cr/quienesomos/planificacion/PL_POI_2015.pdf.

cidade provém das bacias de Catskill, localizada no meio rural, e da Bacia de Dalaware, localizada a aproximadamente 125 quilômetros da cidade. A Bacia de Croton representa os outros 10% do abastecimento, cobrindo uma área estimada em 1.600 quilômetros qua- drados, com uma população de aproximadamente 77 mil habitantes e com 75% da área total da bacia coberta por florestas onde há a presença também da indústria florestal.

Segundo Favretto [33], com base em Teixeira [32], no início dos anos 80 a cidade passou a enfrentar uma crise relacionada à qualidade da água captada. A bacia de Croton passou a ser influenciada de forma negativa pela urbanização e pela poluição que chegava até ela, obrigando o governo a implantar um sistema de filtragem, resultando em uma chamada de atenção para a importância da preservação das outras bacias. Porém, apenas 30% delas eram administradas pelo Poder Público, as demais pertenciam a produtores rurais, os quais, na busca por novas formas de produção, acabavam por gerar mais poluição e riscos.

Veiga Neto [18] destaca que no final dos anos 80, evidenciou-se que as atividades tra- dicionais realizadas na região apresentavam uma lucratividade cada vez menor. A busca por novas atividades, especialmente as chamadas de “segundas residências”, caracterizada pela urbanização no entorno das grandes cidades, começou representar a geração de novas fontes de poluição, não podendo ser revertido simplesmente pela regulamentação exis- tente. O autor, com base em Appleton15 , afirma que, assim como acontece no Brasil,

os tradicionais modelos de comando e controle impostos para os produtores rurais com base em regulamentações para a proteção da água, tendem a não funcionar, especialmente quando interferem na economia dos proprietários, que entendem estas regulamentações como “irrealista, arbitrária, ‘top-down’ e dirigida por interesses urbanos sem entender ou se preocupar com os interesses econômicos dos stakeholders rurais”[18].

Como solução, pensou-se, de início, na construção de estações de tratamento da água ou na preservação das áreas rurais para que, como sugerido por Appleton, ao contrário de tratar a água poluída, se mantivesse ela limpa e com qualidade. Além disso, os custos com o tratamento, na época, poderiam ser de 4 a 6 bilhões de dólares, mais os custos de operação, de cerca de 250 milhões de dólares, o que acarretaria em taxas de água e esgoto muito mais caras. Em contrapartida, alguns cálculos iniciais realizados mostraram que a criação de um programa para a proteção da bacia custaria muito menos do que a construção de um sistema de tratamento e poderia trazer inúmeros benefícios para a cidade e para seus habitantes [32].

Escolheu-se, então, a opção de manter a qualidade da água através do pagamento por sua preservação e criou-se um programa que passou a ser conhecido como “Whole Farm”16,

que quer dizer “Fazenda Inteira” [33]. Dessa forma, os produtores rurais “estavam gerando renda através do gerenciamento de seus recursos ambientais, renda esta que os estava

15Albert Appleton foi um dos mentores do Programa Bacias de Nova York e era diretor do Sistema de Águas e Esgoto da cidade durante o período de sua implantação.

16O Programa Whole Farm apresentava como objetivo principal atender as demandas econômicas dos produtores rurais com as exigências ambientais feitas pela agência de águas.[32]

ajudando a permanecer como produtores, ao invés de venderem seus terrenos para o processo de urbanização” [32].

Mas, conforme Teixeira [32], para que o programa tivesse êxito, deveria manter seu caráter voluntário, sendo desejado pelos envolvidos e contar com a adesão de um grande número de proprietários. De acordo com o autor, já nos primeiros anos de implantação, houve a adesão de 93% dos produtores pertencentes à bacia e, depois de mais de vinte anos, continua obtendo resultados através da conscientização de que um ambiente saudável é uma ótima estratégia para a manutenção da quantidade e da qualidade da água.

De acordo com Appleton17, alguns fatores foram fundamentais para que a iniciativa

pudesse ter sucesso. Entre eles, a aposta em uma maneira instintiva para a conservação da bacia hidrográfica como uma das melhores alternativas para que o abastecimento da água seja realizado com qualidade por muito mais tempo. Para ele, o ecossistema precisa ser visto como um todo, incluindo os recursos naturais e humanos e as principal lição aprendida foi a identificação dos serviços ambientais, colocando-os em patamares mais altos de acordo com os níveis dos serviços prestados. Desta forma, aumentando também o valor de seu benefício econômico e a capacidade de encontrar formas de monetizar o serviço ambiental de um jeito que o valor estipulado possa ser capturado, reconfigurando instituições e suas regulações e normas para que isso possa ser feito.

Segundo Perrot – Maître & Davis [43], o programa implantado na cidade de Nova York, apresenta as seguintes características: 1) modernização e reforma da infraestrutura, o governo municipal paga para que sejam criadas ou reestruturadas estações de trata- mento de esgoto em propriedades, barragens e instalações de abastecimento da água; e 2) programa divisor de águas, o governo municipal paga por serviços de conservação das florestas em fazendas existentes na região, promovendo a manutenção dessa vegetação, a melhoria das práticas de gestão agrícola e instituindo programas de educação sobre a importância ambiental.

Através de estudos e estimativas de gastos em relação à implantação do sistema de filtração e tratamento da água, percebeu-se que o investimento em gestão e proteção da área era muito mais vantajoso. O município fez um investimento de aproximadamente US$ 1,5 bilhões ao longo de dez anos. O financiamento principal desses custos foi proveniente do aumento de 9% nos impostos referentes à utilização da água, pagos através das contas pelos consumidores, por um período de cinco anos. Caso fosse investido na planta de filtragem da água, o aumento necessário nas contas de água dos contribuintes para o financiamento da obra seria duas vezes maior [43].

O financiamento ocorreu através da tributação repassada aos moradores de Nova York, na forma de um adicional nas contas de água, aprovada pelos próprios contribuintes através de votação. O New York City Bonds emitiu notas de obrigação para que houvesse o financiamento adicional do programa e os Fundos Fiduciários que concederam subsídios para a realização de projetos ambientais sustentáveis [43].

Perrot–Maître e Davis [43], explicam que o programa foi responsável pelo pagamento de US$ 40 milhões para os produtores de leite e silvicultores. Dos 350 produtores pertencentes à região, 317 concordaram em participar do programa, mediante a adoção de técnicas de exploração que causam pouco impacto ambiental e da tributação a formas diversificadas do uso da terra, onde proprietários de terras com 50 hectares ou mais, ao se comprometer com um plano de manejo florestal por um período de dez anos, têm uma redução de 80% nos impostos sobre suas propriedades.

Os autores destacam outras medidas tomadas pelo governo, como a compra de terras hidrologicamente sensíveis, pântanos ou cursos de águan e a compra do direito ao desen- volvimento dos proprietários das terras mais suscetíveis a danos ambientais, permitindo que os proprietários vendam suas terras apenas para quem pretenda continuar com o programa.

A qualidade da água é mantida através de um contrato de compra do direito ao desenvolvimento, onde o fazendeiro continua como dono e pode ampliar seu negócio, desde que a propriedade continue para sempre como fazenda. Apesar do grande investimento que precisa ser realizado, de acordo com Emily LIoyd, secretária de meio ambiente do Departamento de Águas de Nova York, os moradores da cidade não precisam pagar a mais pelo benefício, uma vez que a água não precisa ser tratada, apenas filtrada, o que reduz muito seus custo. Antes da implantação do programa, um dos principais problemas ambientais na região era a poluição da água por causa das fazendas de leite, o que foi praticamente controlado. Os dejetos, que antes eram lançados diretamente no ambiente, são armazenados em grandes tanques provisoriamente e, duas vezes por ano, lançados como adubo. O monitoramento é feito através da coleta e análise da água da região e do controle da quantidade de nutrientes presentes nela. Além disso, foi investido em educação e em incentivo a práticas de combate ao desperdício, inclusive com a troca de encanamentos para evitar vazamentos18.

Atualmente, a cidade de Nova York tem cerca de um milhão de habitantes e o consumo de água diminuiu aproximadamente um terço do que era consumido na década de 90, sendo considerada uma água de ótima qualidade, não necessitando passar por processos de tratamento, apenas pela filtragem.