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Capítulo 4. A seletividade e a extrafiscalidade

4.5. A extrafiscalidade no ICMS

A extrafiscalidade que atenda a metas chamadas de desenvolvimento econômico está insculpida na regra que trata da não-incidência do ICMS nas operações com mercadorias ou serviços destinados ao exterior, exceto os semi-elaborados, nos termos da Lei Complementar n.º 87/96, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores. Objetiva-se, nesses termos, desonerar as exportações de mercadorias e serviços, fazendo com que as empresas exportadoras brasileiras tenham melhores preços no mercado internacional e produzam riquezas para o país.

Outra regra que atende à extrafiscalidade, na medida em que se busca o desenvolvimento econômico de determinada categoria de contribuintes, é a que permite a concessão de regimes especiais ou simplificados, no caso do ICMS, às microempresas e às empresas de pequeno porte. Esses regimes especiais permitem que o pequeno empresário seja tributado de forma diferenciada, beneficiando-se de carga tributária menor, com deveres instrumentais simplificados, permitindo o crescimento econômico dessa categoria.

250 AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do. Imposto sobre o valor agregado – IVA – value added tax – VAT –

A limitação tributária sobre as operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais visa a atender à extrafiscalidade, uma vez que se impõem restrições à incidência de outros tributos, exceto o ICMS e o imposto de importação, para atender ao protecionismo econômico de setores da economia. O objetivo econômico é identificado no momento em que não se oneram com muitos tributos251 bens indispensáveis à indústria, ao comércio e à população.

Por fim, a extrafiscalidade quanto ao desenvolvimento econômico é observada na regra que trata da não-incidência do ICMS nas prestações de serviço de comunicação, modalidades de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita. Entendemos que essa regra constitucional não tem necessidade de existir, haja vista que a prestação do serviço de comunicação, tributada pelo ICMS, é apenas a onerosa, como já demonstrado no presente estudo.

No que se refere à extrafiscalidade presentes em regras do ICMS que atendam à justiça social, temos a seletividade, em função da essencialidade dos produtos e serviços, a ser estudada no capítulo seguinte. Têm-se, ainda, as regras que permitem a criação de adicional de até dois pontos percentuais na alíquota do ICMS, sobre os produtos e serviços supérfluos e nas condições definidas na lei complementar, destinados ao Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza. Trata-se de aumento de carga tributária para atender às necessidades de 50 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza.252

251 Tal afirmação pode tornar-se falsa, pois a quantidade de tributos não significa menor carga tributária. A

aplicação de apenas uma alíquota elevada sobre determinado bem implica alta carga tributária, inviabilizando-se, muitas vezes, o consumo desse bem pela população com capacidade econômica menor.

252 O Estado do Rio de Janeiro previu, como fonte de custeio do Fundo Estadual de Combate à Pobreza,

adicional de um ponto percentual da alíquota vigente do ICMS, com exceção de alguns casos, e, além dessa incidência, mais quatro pontos percentuais, transitoriamente, até 31 de dezembro de 2006, sobre o ICMS incidente sobre o fornecimento de energia elétrica e a prestação de serviços de comunicação. A Lei n.º 4.056, de 30/12/2002, com redação dada pela Lei Estadual n.º 4.086/2003, foi regulamentada inicialmente pelo Decreto n.º 32.646, de 8/1/2003 (DOE-RJ de 9/1/2003), e desde 6/5/2003 encontra-se regulamentada pelo Decreto nº. 33.123, de 5/5/2003 (DOE-RJ de 6/5/2003).

Os recursos tributários, nesse caso, serão destinados ao Fundo, “com o objetivo de viabilizar, a todos os brasileiros, acesso a níveis dignos de subsistência, cujos recursos serão aplicados em ações suplementares de nutrição, habitação, educação, saúde, reforço de renda familiar e outros programas de relevante interesse social voltados para melhoria da qualidade de vida”.253

A extrafiscalidade assume papel no direito brasileiro de duas maneiras, seja favorecendo operações consideradas como necessárias, úteis ou convenientes à sociedade, seja dificultando, por meio de incidências mais pesadas, a prática de outras operações.254

Com isso, aplicar a extrafiscalidade não é apenas reduzir tributação. Há casos que a operação é inversa, para proteger determinados setores ou desestimular a produção e comercialização de produtos. Além disso, em alguns momentos cria-se ou majora-se carga tributária para atender a questões sociais.

ROQUE CARRAZZA vislumbrou ainda que a outorga de benefícios fiscais pelas pessoas políticas atende à extrafiscalidade:

“Por meio de incentivos fiscais, a pessoa política tributante estimula os contribuintes a fazerem algo que a ordem jurídica considera conveniente, interessante ou oportuno (p. ex., instalar indústrias em região carente do País). Este objetivo é alcançado por intermédio da diminuição ou, até, da supressão da carga tributária”. 255

As concessões de benefícios fiscais são práticas reiteradas dos Estados, promovendo, assim, a chamada guerra fiscal, já analisada neste trabalho.

253 CF, artigo 79 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (Emenda n.º 31, de 14/12/2000). 254 Veja, nesse sentido, Eduardo Domingos Bottallo, in Fundamentos do IPI, p. 62.

A pergunta que se faz é se a guerra fiscal mediante outorga de benefícios fiscais atende à extrafiscalidade, ou é critério utilizado para não se perder receita, mantendo empresas e prestadores de serviços instalados no território do Estado.

Conforme demonstrado, a fiscalidade e a extrafiscalidade atuam de forma conjunta em determinadas regras jurídicas. Os benefícios fiscais, isenções e reduções do critério quantidade da regra-matriz de incidência atendem ao objetivo do desenvolvimento econômico-social, e com maior intensidade objetiva-se manter a arrecadação do Estado nas operações realizadas por empresas e prestadores de serviços de comunicação e transporte, estabelecidos nesse Estado, mantendo-os como contribuintes do ICMS.