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Capítulo 2. Princípios e o subsistema constitucional tributário

2.3. Valor e limite objetivo

Classificar é uma forma de nomear elementos comuns aos objetos de estudo, por meio de um processo de cisão abstrato, separando-os de acordo com suas semelhanças, mantendo-os em posições fixas e determinadas em relação às outras classes nomeadas.119

Do enfoque da lógica dos termos,120 todas as classes podem ser divididas em outras classes, e os grupos de uma classificação recebem nome de gênero e espécie. O número de classes possível é infinito, bastando existir uma diferença para que seja possível a criação de outra classe.

Diante disso, não existem limites para a criação de classes, bem como para sua separação em grupos. Formando-se as subclasses, estas podem ainda ser divididas.

Todavia, as classes são criadas para que haja uma divisão dos elementos de forma útil, devendo-se utilizar critérios adequados e únicos.

Para melhor elucidar a análise dos princípios constitucionais tributários, classificamos os princípios sob o critério de valor ou limite objetivo.

Distinguir princípio como valor ou como limite objetivo apresenta grandes efeitos práticos, porque, se constatarmos a presença de critérios valorativos em um princípio, teremos de ingressar obrigatoriamente na Axiologia (ciência que estuda os valores) para estudarmos seus aspectos.

Não poderíamos deixar de trazer as descrições de MIGUEL REALE sobre a Teoria dos Valores, identificando os traços que demonstram a presença de valores nos princípios, em contraposição à existência de limites objetivos:

119 Sobre as classificações, veja as descrições de Eurico Marcos Diniz de Santi. As classificações no sistema

tributário brasileiro. Justiça tributária: 1º congresso internacional de direito tributário – IBET. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 125-147.

120 Paulo de Barros Carvalho escreveu sobre a lógica dos termos ou lógica dos predicados, tratando da

composição interna dos enunciados simples. Esse jurista analisou os termos sujeito e predicado do enfoque da Teoria das Classes desenvolvida por G. Cantor, in IPI – comentários sobre as regras gerais de interpretação da tabela NBM/SH (TIPI/TAB). Revista Dialética de Direito Tributário nº 12. São Paulo: Dialética, 1998, p. 53.

“A bipolaridade enuncia a questão da existência de um valor e de um desvalor ao mesmo tempo, ocorrendo entre os valores negativos e positivos uma relação de implicação mútua. A referibilidade traz em sua essência a necessidade de tomada de uma posição pelo sujeito cognoscente perante alguma coisa. A preferibilidade se traduz sob o direcionamento e uma finalidade presente no valor. Não sendo possível de medição, mensuração, os valores são incomensuráveis, embora apresentam forte tendência à graduação hierárquica, diante do escalonamento existente entre eles. Os valores sempre requerem objetos da experiência para neles assumir objetividade. Os valores apresentam o caráter de historicidade, diante da evolução do processo histórico-social, sendo também inexauríveis”.121

O intérprete, quando se depara com valores, passa a navegar sobre elementos de subjetividade, entrelaçados em redes complexas, fazendo com que a interpretação seja decorrente de função ideológica do sujeito cognoscente.122

Os princípios, muitas vezes, são normas vagas. RICARDO GUASTINI, ao tratar do assunto, observou que o princípio é vago, ora porque não possui um campo exato de aplicação, ora porque possui um conteúdo teleológico ou pragmático. Afirma o jurista italiano que o princípio “não prescreve uma conduta determinada, mas exprime solenemente um valor, ou recomenda sem, todavia, estabelecer os meios que devem ser empregados (os comportamentos que devem ser praticados) para atingir esse fim”.123

Tais palavras aplicam-se ao presente estudo, na medida em que a seletividade abrange essas características de princípio vago. Como veremos a seguir, o legislador constitucional traduziu em poucos enunciados a diferenciação tributária que almeja para

121 REALE, Miguel. Filosofia do direito. 20ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 195-207. 122 Pensamento de Paulo de Barros Carvalho, in Curso de direito tributário, p. 145. 123 Das fontes às normas, p. 189.

certos tributos, mas outorgou grande discricionariedade ao legislador ordinário, que fixará nas regras jurídicas os parâmetros desse princípio.

Entendemos que, diante do critério valorativo dado a certos princípios, acabou-se atribuindo aos princípios características como a vaguidade, já não identificada quando tratamos do princípio como limite objetivo.

São exemplos de princípio valorativo: a seletividade do IPI, do ICMS e do IPTU; a capacidade contributiva; a igualdade; a vedação ao confisco etc. Em todos esses casos, torna- se indispensável que o intérprete atenha-se a elementos axiológicos, para chegar a uma posição hermenêutica concisa.

Em relação ao “limite objetivo”, os critérios são outros, pois é possível identificar de plano e imediatamente os critérios presentes no princípio para a construção dos enunciados prescritivos.

A vaguidade e a amplitude, trazidas em certos princípios, dão lugar à objetividade, e os enunciados são aplicados limitadamente, passivos de verificação imediata. Tais restrições não são absolutas, haja vista que expressões lingüísticas sempre conservam um mínimo de vaguidade, o que não lhes afasta o esforço e a tentativa de sua limitação, mesmo que em vão.

São exemplos de princípios formados por “limite objetivo”: o princípio que veicula a não-cumulatividade; a legalidade; a irretroatividade; a anterioridade etc. Em todos eles, basta observar a técnica da dedução do crédito do imposto devido (não-cumulatividade); se o tributo foi veiculado por ato que não seja infralegal (legalidade); e se o tributo instituído não venha a alcançar fatos pretéritos à sua inserção no sistema tributário nacional (irretroatividade).

Assim, os “limites objetivos” são colocados para se atingirem determinados fins, alcançados por meios objetivos e concretos. Esses fins é que muitas vezes assumem o porte de valores, e não os “limites objetivos”.