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SEÇÃO 2 – O ENSINO DA MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS NO BRASIL

2.1 A formação inicial e continuada do pedagogo

Para Romanowski et al (2009), o processo de aprendizagem permanente é, na atualidade, questão de sobrevivência em qualquer profissão. Para o profissional da educação, que exerce um papel fundamental no processo de formação da identidade e da autonomia intelectual dos alunos, a sua formação e autoformação constituem prioridade na construção de sua própria identidade. Assim, a formação continuada pode ser entendida como um espaço de interação entre as dimensões pessoais e profissionais, assumindo na contemporaneidade o papel de garantir a possibilidade de qualidade na educação, fundada nos princípios da equidade e da justiça social. De acordo com Freire (1996):

É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re‐forma ao formar e quem é formado forma‐se e forma ao ser formado. É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender (FREIRE, 1996, p. 25)

A formação continuada de pedagogos necessita ser compreendida como uma contínua e dinâmica construção de desenvolvimento profissional e por isso também humana e institucional, orientada à transformação do coletivo escolar para que estes, em suas atividades do cotidiano, se apropriem dos conhecimentos universalmente sistematizados e alcancem, ao mesmo tempo, objetivos mais amplos, segundo o progredir dos conhecimentos universais.

De acordo com Romanowski et al (2009), um educador em sintonia com seu tempo procurará ter como meta um processo de aprendizagem permanente para estar em condições de responder às demandas e desafios do tempo presente. Nesse sentido, a formação continuada poderá se tornar um sólido subsídio aos educadores, de maneira que tenham condições de

transformar e rever sua prática, investigando, diagnosticando e compreendendo os processos pedagógicos. Nessa perspectiva, poderão deter melhores condições para participar de maneira efetiva da construção de um projeto emancipatório de educação. Assim, a formação continuada deverá ser concebida como uma proposta de aperfeiçoamento, um espaço coletivo de produção de conhecimento pedagógico e de reflexão crítica sobre a própria prática que, associada à teoria, compõe um todo dinâmico.

É nessa direção que a formação continuada se apresenta, para o pedagogo, como uma condição para a melhoria de sua prática, especialmente se considerada a frágil formação recebida no curso de Pedagogia. A baixa carga horária para a formação nos conteúdos em matemática para as séries iniciais nos projetos curriculares, continua afetando a prática docente e exigindo reforço da formação continuada.

O processo formativo de professores constitui-se como componente fundamental para que ocorram mudanças na sociedade e na escola, bem como para que as metas educacionais sejam alcançadas. Desse modo, pergunta-se: a formação matemática dos professores que ensinam matemática nos anos iniciais do ensino fundamental tem correspondido às necessidades dos alunos e de seu desenvolvimento? Quais as demandas que emergem referentes ao ensino de matemática nos anos iniciais do ensino fundamental? Tais questões precisam de um olhar reflexivo no sentido de melhorar cada vez mais o processo de formação, o qual poderá traduzir-se num processo de ensinar e aprender significativo e satisfatório a todos os sujeitos do processo educacional.

Segundo Coelho Filho e Ghedin (2018), a sociedade contemporânea exige cada vez mais uma educação de qualidade, que corresponda às expectativas e exigências que são feitas aos profissionais e, em particular, aos professores que ensinam matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Um aspecto a ser considerado é a necessidade de acompanhamento das inovações científicas e tecnológicas para que atente para as mudanças que acontecem e estão acontecendo no meio social como um todo e, em particular, na educação. De um certo modo, para se ter uma boa educação é preciso formar profissionais responsáveis, qualificados e comprometidos com o processo educacional e com a transformação da sociedade. Para isso acontecer, de certa forma, é preciso possibilitar uma formação de professores tanto inicial como contínua que ajude a sociedade e a escola a enfrentarem as exigências e transformações que acontecem no seio da própria sociedade.

De acordo com Fiorentini e Lorenzato (2006), as investigações sobre educação Matemática nos anos iniciais do ensino fundamental são relativamente recentes e poucas.

Nacarato e Paiva (2008) realizaram um estudo no GT 07 (Grupo de Trabalho 07: Formação de Professores que ensinam matemática) da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM), buscando tendências das pesquisas apresentadas no período de 2003 a 2008. Entre as suas conclusões, uma das constatações apontadas é a pouca atenção que os pesquisadores têm dado à formação matemática do professor que atua na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, identificando um número bem reduzido de trabalhos.

Algumas pesquisas (CURI, 2004; HILLEBRAND, 2000; UTSUMI E LIMA, 2007;

GOMES, 2006) estudaram as percepções, concepções e crenças de estudantes e egressos de cursos de Pedagogia quanto à área da matemática. Nessas pesquisas destaca-se a aversão manifestada por estudantes de Pedagogia em relação a essa área do conhecimento.

Hillebrand (2000), por exemplo, afirma que muitos professores dos anos iniciais da escolarização optaram pela docência nessa etapa do ensino como forma de fugir da matemática.

Curi (2004) também menciona a fuga da matemática, retratando que, dentre as áreas de formação superior, o curso de Pedagogia é um dos que possui menor carga horária dedicada aos estudos da matemática.

Segundo Cunha (2010), essa situação faz com que o curso se torne, dessa forma, um atrativo para aqueles que “dizem” não possuir afinidade com a matemática. Isso permite inferir a existência de situação de regularidade quanto ao significado da matemática como sendo um critério por opção ou não, por um determinado curso de graduação, como se sua presença disciplinar na formação de professores fosse fato de objeção e que levou à opção pelo curso, não pela sua importância, mas pela situação pouco presente dos conhecimentos matemáticos.

A mesma situação foi discutida e apresentada por Hillebrand (2000) e Curi (2004), ao centrarem suas análises na aversão à matemática apresentada por estudantes de Pedagogia.

Estes autores observaram que, em muitas situações, a inexistência de uma disciplina vinculada ou pertencente à área de matemática, chega a ser decisiva na escolha por um curso superior e, consequentemente, pela carreira profissional.

Os desencontros e distanciamento com essa área do conhecimento têm origem, segundo os autores citados anteriormente, numa fase muito anterior ao curso de Pedagogia. Nessa direção, observa-se que, em geral, essa aversão à matemática é evidenciada durante a trajetória escolar nos ensinos fundamental e médio.

Para Cury (1999) as experiências que os alunos trazem de sua trajetória escolar são fundamentais na sua forma de conceber a matemática. Para esta autora (CURY, 1999), os indivíduos:

[...] formam suas ideias sobre a natureza da Matemática, ou seja, concebem a Matemática, a partir das experiências que tiveram como alunos e professores, do conhecimento que construíram, das opiniões de seus mestres, enfim, das influências socioculturais que sofreram durante suas vidas (CURY, 1999, p.40).

Compartilhando dessa mesma compreensão, Araújo (1999) destaca que as atitudes negativas em relação à matemática constituem-se a partir das experiências vivenciadas pelos indivíduos em diferentes situações, como exemplo, a “maneira como é trabalhada na escola, pela forma como os primeiros conceitos básicos são adquiridos, pelas habilidades que são exigidas do indivíduo e pelo sucesso e insucesso na realização de tarefas matemáticas”

(ARAÚJO, 1999, citado por CAZORLA; SANTANA, 2005, p.5).

Assim, se as concepções acerca da matemática são construídas, baseadas em sentimentos negativos, elas poderão se tornar obstáculos para a aprendizagem dessa disciplina e, no caso de professores que se encontram em processo de formação para exercer a docência, podem influenciar igualmente no ensino dessa disciplina nos anos iniciais da escolarização.

Além disso, elas poderão reforçar a continuidade de que os conteúdos de matemática na Educação Básica tenham na tabuada o ponto de partida para a sua rejeição. Por isso, não se trata apenas dessa área ser ou não critério para a realização de uma escolha, como já abordado, mas no conjunto de relações que permanecem se reproduzindo, determinando inclusive na forma como os professores se deparam com a matemática e a forma como está estruturada e organizada no currículo de formação de professores do curso de Pedagogia.

Assim sendo, torna-se imprescindível que durante a formação inicial desses profissionais sejam desenvolvidas atitudes positivas em relação à matemática e ao seu ensino, conforme assinalam Cazorla e Santana (2005):

Desenvolver atitudes positivas e desmistificar crenças negativas também deve ser preocupação dos formadores dos professores, seja nos cursos de Pedagogia, Magistério, até mesmo nos de Licenciatura em Matemática (p.18).

Ou seja, o processo de formação de professores dos anos iniciais também deve levar o futuro professor a uma compreensão diferenciada em relação à matemática, fazendo com que este profissional passe a desenvolver atitudes positivas em relação a essa disciplina, pois, só então o professor poderá “romper com várias crenças construídas e ver a matemática de uma forma diferente, construindo novas concepções sobre fazer, aprender e ensinar Matemática”

(BULOS; JESUS, 2006, p.3).

Nesta medida, é necessário que além de desenvolver os fatores relacionados ao processo do ensino e da aprendizagem da matemática, sejam observados durante a formação inicial do pedagogo, os aspectos relacionados às concepções e crenças destes futuros professores em relação à matemática, pois, suas concepções podem refletir diretamente nesse processo nessa área do conhecimento. Essa formação necessita instigar o professor a refletir sobre suas concepções e crenças sobre o ensino e a aprendizagem da matemática, a fim de propiciar novas condições para a sua aprendizagem, bem como para a sua futura prática docente nessa disciplina.

Para Cazorla e Santana (2005), assim como os conhecimentos matemáticos,

[...] as atitudes em relação à Matemática têm um papel relevante na formação do professor das séries iniciais, pois são eles que iniciam a formação matemática das crianças, bem como sua relação afetiva com a matéria (2005, p.5).