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Uma importante iniciativa empreendida na busca pela melhoria da qualidade da educação ofertada nas escolas públicas gaúchas foi materializada no artigo 211 da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, aprovada em 1989. Esse artigo compromete o Estado a desenvolver políticas à formação profissional docente nas áreas em que houver carências, oferecer cursos de atualização/aperfeiçoamento para professores e especialistas nas áreas em que atuam ou que houver necessidade, bem como criar política de formação continuada docente para os professores das séries iniciais do ensino fundamental. De acordo com as diretrizes definidas nesse artigo, a formação profissional docente torna-se prioridade e condição para a qualificação da educação.

Todavia, considerando que um grande percentual11 de profissionais que atuavam (e atuam) na rede pública estadual de ensino do RS não possuía formação específica para a docência, entendo que tal medida fez-se necessária, primeiramente, com o propósito de organizar o sistema de ensino. Com isso, inevitavelmente, um processo de qualificação da educação é desencadeado, assim como há um movimento de adequação da educação às necessidades sociais e culturais dos indivíduos em diferentes momentos históricos.

Abordando essa mudança, porém no âmbito nacional, Fiorentini (2008) comenta que diante de uma demanda de 1,6 milhões de professores sem titulação, a necessidade de ampliar a oferta de oportunidades e os centros de formação, inclusive em larga escala através da educação a distância, ganha relevo no cenário político brasileiro.

Sobre o compromisso do Rio Grande do Sul com a formação de professores, esclareço que o Estado criou, em 1989, uma lei, regulamentada pelo artigo 202 da Constituição Estadual, aumentando para 35% a aplicação dos recursos arrecadados no desenvolvimento do ensino público. Esse artigo modificou a determinação da Constituição Federal, a qual obrigava os estados a destinarem não menos de 25% dos recursos tributários arrecadados para fins educacionais. Em decorrência dessa modificação foram criados alguns projetos voltados ao desenvolvimento da educação, à ampliação da rede estadual, à formação docente e à implantação do projeto de informática educativa nas escolas públicas.

O projeto gaúcho de Informática na Educação vincula-se ao ProInfo da SEED/MEC e destina-se às redes públicas estadual e municipal de ensino. Foi elaborado em 1997 por uma comissão composta por representantes da Secretaria da Educação, Secretaria da Ciência e Tecnologia, PROCERGS (Processamento de dados do Estado do RS), UNDIME, UFRGS e PUC-RS. Esse projeto inclui a instalação de laboratórios de informática, laboratórios de ensino, Núcleos de Tecnologia Educacional (NTE), oferta de formação tecnológica aos docentes da rede, bem como a criação e manutenção de cursos de Especialização em Informática Educativa, promovidos por instituições credenciadas, como a Universidade do Vale dos Sinos (Unisinos), destinadas a capacitar professores multiplicadores.

Os Núcleos de Tecnologia Educacional constituem-se em centros de qualificação tecnológica para professores vinculados à rede pública e devem ser utilizados como ambiente de aprendizagem pelos estabelecimentos que os abrigam e, também, por outras escolas da rede. Tais projetos são financiados pelo governo federal e promovidos pelo Estado, visando garantir o acesso do aluno às tecnologias por meio da formação docente para uso das mesmas.

11 De acordo com dados estatísticos da Secretaria Estadual de Educação do RS, na década de 80 havia milhares de docentes trabalhando em escolas das redes estadual e municipal sem ter habilitação para o magistério.

As metas dos NTE12 com a formação tecnológica dos professores da rede pública, estabelecidas no Projeto de Informática Educativa do RS, consistem em: estruturar um sistema de formação continuada de professores para uso das tecnologias, visando qualidade e eficiência; desenvolver modelos de capacitação que privilegiem a aprendizagem cooperativa e autônoma, possibilitando aos professores de diferentes regiões geográficas do estado e do país a oportunidade de intercomunicação e interação com especialistas, o que deverá gerar uma nova cultura de educação a distância; preparar os professores para usar as novas tecnologias de forma autônoma e independente, possibilitando a incorporação dessas à experiência profissional de cada um, objetivando a transformação de sua prática pedagógica.

Os NTE, de acordo com a legislação estadual, devem ser coordenados por professores da rede municipal e estadual de ensino, formados em curso de pós-graduação lato-sensu na área de Especialização em Informática Educativa, que são ofertados por instituições vinculadas ao projeto de informática educativa do Estado. Segundo dados da Secretaria Estadual de Educação e Cultura (SEEC) no RS, por meio dos Núcleos foram capacitados, entre os anos de 1999 e 2007, aproximadamente cinco mil professores da rede pública.

Teoricamente os Núcleos são ambientes que dispõem de equipe interdisciplinar, composta de professores multiplicadores e técnicos qualificados, para dar formação continuada aos professores e assessorar as escolas da rede pública estadual e municipal no uso pedagógico, bem como na área técnica. Estes espaços, de acordo com a Secretaria Estadual de Educação, destinam-se a atender professores, equipe diretiva, funcionários e comunidade escolar de todas as escolas da rede estadual que possuem Laboratório de Informática.

Porém, na prática não é exatamente assim que os Núcleos de Tecnologia Educacional são constituídos e gerenciados, pois em muitos desses espaços não há professor multiplicador atuando. Além disso, o assessoramento técnico, mencionado no projeto, é prestado por um único profissional, lotado em uma Coordenadoria Regional de Educação (CRE), que atende as dezenas de escolas vinculadas a essa CRE.

Em síntese, o trabalho proposto para os NTE no Estado não tem sido desenvolvido adequadamente. Até o momento, foram formados muitos professores multiplicadores para atuar nesta área, porém em algumas cidades, ainda não há professores capacitados para atuar nesses espaços. Ademais, pouco tem sido feito para preparar os professores para usar os recursos das tecnologias na abordagem do conteúdo curricular da disciplina que lecionam, assim como há carência de propostas que favoreçam a formação tecnológica dos professores.

Por fim, um levantamento realizado em Erechim revelou que não há monitores ou técnicos atuando no Núcleo de Tecnologia Educacional e, tampouco, nos laboratórios de informática disponíveis nas escolas da rede estadual. Há apenas um técnico lotado na 15ª Coordenadoria Regional de Educação, o qual dá suporte aos professores multiplicadores espalhados pelos municípios da região. Tal suporte é prestado por telefone ou à medida que os professores multiplicadores dirigem-se à 15ª CRE.

As constatações apresentadas nos dois últimos parágrafos evidenciam a problemática que permeia a implantação das políticas públicas para formação de professores e a implementação do programa de informática educativa, pois essas políticas são concretizadas parcialmente e não têm continuidade. Com isso, há melhoria da estrutura escolar em termos de recursos, mas esses programas não conseguem mudar a cultura, o trabalho docente.

Sobre a descontinuidade das políticas públicas educacionais no Estado gaúcho quero destacar um aspecto recente. No despontar de 2009 as escolas públicas estaduais tiveram seus laboratórios de informática substituídos. Além de receber novos equipamentos, adquiridos com verba federal, esses espaços passaram a ser denominados salas de aula digitais. Essa mudança parece representar um avanço em favor da política de informática educativa e da mudança da cultura e prática docente, mas encobre alguns interesses.

Pelo fato de denominar-se “sala de aula digital”, o próprio nome subentende que se trata de um espaço educativo que abriga professor e alunos e, portanto, não há necessidade de monitor ou técnico auxiliando o professor nas atividades educativas. Assim, o compromisso do Estado com a manutenção e funcionamento desses ambientes tem sofrido modificações, de modo que as ações de formação docente para uso desses espaços têm sido limitadas. Ainda, as salas de aula digitais dispõem de computadores munidos do sistema operacional Linux, juntamente com um pacote de jogos educativos e softwares freeware para diversas áreas do conhecimento. Porém, a formação oferecida aos professores para uso desses espaços e suas tecnologias consiste de um treinamento básico, de quatro horas de duração, no qual os docentes devem familiarizar-se com os tais recursos.

No âmbito da educação a distância, em 2007 o Conselho Estadual de Educação aprovou a Resolução No. 293, que estabelece e regulamenta a oferta dessa modalidade de educação no Estado, tendo por base as determinações do Ministério da Educação. Por meio dessas modificações na legislação educacional, o RS almeja intensificar os investimentos em educação e ampliar os programas de formação inicial e continuada docente, utilizando-se do potencial e das possibilidades oferecidas pela educação a distância, evidenciando, desse modo, o papel dos Núcleos de Tecnologia Educacional na democratização do ensino público.

Conforme mencionado no capítulo primeiro a questão da formação tecnológica dos professores no Rio Grande do Sul tem se mostrado ineficiente em decorrência de muitos fatores. Dentre eles, a falta de apoio das secretarias de educação e dos gestores educacionais, insuficiência de políticas públicas específicas e carência de programas de qualificação que favoreçam o desenvolvimento profissional dos professores. Sobre isso esclareço que as atividades formativas promovidas com os docentes da rede estadual constituíam-se em jornadas pedagógicas e/ou formação tecnológica básica, desenvolvidas por professores multiplicadores, as quais eram certificadas pela CRE. Hoje, porém, essas atividades foram substituídas por “reuniões pedagógicas”, não certificadas, que são promovidas no âmbito das escolas e nas quais os docentes são obrigados a participar.

Em contrapartida, segundo um levantamento realizado nas escolas públicas estaduais, localizadas no perímetro urbano da cidade de Erechim, a maioria desses estabelecimentos de ensino dispõem de laboratório de informática ou salas de aula digitais, equipados para uso pedagógico das tecnologias. Contudo, muitos desses espaços são subutilizados ou inutilizados pela falta de formação dos professores, bem como pela ausência de técnicos que os auxiliem. E, como os docentes não estão preparados para utilizar esses recursos na abordagem dos conteúdos curriculares, por conseqüência, usam apenas para a realização de pesquisa na web. Esclareço que na minha concepção, as pesquisas efetuadas na WWW são importantes, porém não são suficientes para evidenciar o papel das tecnologias nos processos educativos, assim como não constituem indicativo de mudança na prática docente.

Diante do exposto, nota-se que a realidade educacional no RS encobre algumas contradições no que se refere à política de implantação da política de informática educativa. Por um lado há um movimento de mudança favorecido pelas iniciativas que vêm sendo empreendidas no sentido de informatizar as escolas e, também, de capacitar os professores para uso das tecnologias na prática de sala de aula. Por outro, a dinâmica de mudanças dessas políticas impossibilita que as mesmas sejam concluídas ou tenham continuidade.

Ainda, uma breve análise acerca das políticas para formação docente revela que tais diretrizes podem variar de acordo com o projeto político-econômico de cada governador. Por exemplo, o atual governo13 aprovou em 2007 o decreto 44.861, que veta o afastamento de servidores e agentes públicos que implique em ônus para o Estado, para a participação em seminários e congressos realizados fora do RS e, também, à realização de pós-graduação em nível de especialização, mestrado e doutorado (RIO GRANDE DO SUL, 2007).

Este decreto impossibilita profissionais de adquirirem titulação em nível de pós- graduação, pois não existem cursos em determinadas áreas educacionais dentro do Estado. Igualmente, impede a interlocução entre profissionais que atuam em realidades distintas.

Além disso, com as mudanças impostas no governo atual, diferentes medidas foram tomadas, visando reduzir gastos com educação, dentre elas a extinção a partir de 2008 das Jornadas Pedagógicas de Formação Continuada de Professores, promovidas pelas Coordenadorias Regionais de Educação, decisão essa que tem contribuído para a precarização das ações formativas promovidas com os professores. Essa medida veio complementar outras determinações impetradas no ano de 2007, como a enturmação14, a transferência de

responsabilidade com a educação infantil do Estado para os municípios e o aumento da carga horária dos professores. E mais, o atual governo do Rio Grande do Sul modificou a lei estadual, que obrigava o Estado a alocar não menos de 35% dos seus recursos à educação, reduzindo essa contribuição para 25%. Com isso, minimizam-se as possibilidades do Estado investir na valorização do profissional docente e na melhoria da qualidade do ensino ofertado.

Por fim, no despontar do ano de 2010 o governo do Estado apresentou um projeto, em parceria com uma agência financiadora estatal, que oferece financiamento aos professores efetivos da rede pública estadual do RS para a aquisição de notebooks. A aquisição desse recurso deve permitir que o professor faça pesquisas na WWW e prepare suas aulas.

Considerando o panorama apresentado, avalio que, embora de forma modesta, alguns alunos das escolas públicas gaúchas estão tendo acesso às tecnologias, por outro lado é preciso considerar que o papel desses recursos na educação supõe complexidade, abrangência e especificidade. Isto é, esses recursos devem levar os estudantes a refletir sobre os conteúdos, pensar, pesquisar e recriar um determinado conceito, ações essas que requerem uma formação específica por parte do professor e propostas de trabalho abrangentes e contínuas. Portanto, é preciso que as ações formativas promovidas contemplem tais aspectos.

A partir desse entendimento considero que os professores precisam explorar softwares educativos, as potencialidades da Internet e os fóruns virtuais de discussão, por meio da elaboração de atividades de sala de aula e engajamento em programas de desenvolvimento profissional, visando modificar a prática docente, favorecer o acesso dos alunos aos recursos tecnológicos e o desenvolvimento dos mesmos.

14 Processo imposto pela Secretaria Estadual de Educação do RS que obriga as escolas públicas a fundir turmas de uma mesma série, constituídas de poucos alunos. De acordo com essa determinação, turmas do 6º ao 9º ano devem ter no mínino 30 alunos e turmas do ensino médio no mínino 40 alunos.

Os dados sobre as ações de formação continuada e de informatização da educação, comentados nesse capítulo, mobilizam algumas reflexões e sugerem uma análise acerca de algumas contradições que se manifestaram no âmbito dessas políticas no cenário nacional, principalmente no que se refere às incoerências entre os objetivos dessas ações formativas e o modo como têm sido interpretadas e concretizadas.

Ao fazer uma análise comparativa do número de programas destinados aos mecanismos de avaliação da aprendizagem nas escolas brasileiras e dos projetos voltados à expansão e melhoria dos processos de formação dos profissionais da educação, nota-se que há uma discrepância. Primeiramente, verifica-se que há ênfase na avaliação da educação, tanto do ponto de vista dos investimentos aplicados, quanto na veiculação dessas iniciativas.

Por outro lado, é possível observar que a questão da formação de professores (inicial, continuada e em serviço) tem preocupado os gestores da educação, mas os planos que vêm sendo concretizados ainda não produziram resultados significativos, ou seja, mudanças na prática docente e na qualificação da educação são ainda pouco significativas. Com isso, muitas críticas são feitas à formação recebida pelos professores e a qualidade do trabalho realizado por eles em sala de aula, recaindo sobre os mesmos a responsabilidade pelo baixo desempenho dos alunos nos testes de avaliação da qualidade da educação.

Outro aspecto que contribui para agravar a problemática qualificação docente é a campanha promovida pelos meios de comunicação, evidenciando um sistema de educação caótico, constituído por profissionais desqualificados e alunos com deficiências incomensuráveis. Os resultados gerados pela avaliação educacional são exibidos ao público de forma quantitativa, sem haver qualquer consideração acerca da especificidade dos contextos em que esses instrumentos foram aplicados. Além disso, sabe-se, também, pela natureza da prática avaliativa que esse tipo de procedimento revela algumas coisas ao mesmo tempo em que omite outras. Igualmente, verifica-se que não há, ainda, preocupação e interesse em analisar tais resultados em termos qualitativos.

No que se refere às políticas públicas à informatização da educação, relatórios oficiais mostram que significativos investimentos têm sido realizados na aquisição e distribuição de computadores às escolas públicas de todo o país, embora o Ministério da Educação ainda não tenha atingido a meta prevista de distribuir, pelo menos, um computador para cada 50 alunos matriculados na rede pública. Por outro lado, nota-se que em função da grande demanda por formação de professores no país, os programas de formação continuada promovidos pelo Ministério da Educação, em parceria com secretarias estaduais e municipais, têm priorizado a formação de docentes sem habilitação, deixando de lado a formação para uso de tecnologias.

Enfim, é nesse o contexto que se situam as ações formativas voltadas ao uso pedagógico das tecnologias. E tendo em vista as atuais condições de trabalho do professor, conforme sinalizado nesse capítulo, considero que há diversos caminhos a serem explorados, em particular, a partir dos recursos e possibilidades advindos da educação a distância.