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5.3. Processos que perpassam a apropriação de conhecimentos pedagógico-tecnológicos em

5.3.2. Experiências vividas no uso de tecnologias

Além das pré-concepções dos sujeitos da pesquisa, outros aspectos da cultura e prática docente da realidade focada foram evidenciados nas interações promovidas ao longo do Curso, os quais permearam o processo de apropriação de conhecimentos pedagógico- tecnológicos em matemática, tais como as experiências vividas no uso de tecnologias. Os relatos apresentados no excerto 26 explicitam esse aspecto.

Excerto 26 Chat de 15/09/2007

Questão disparadora do debate: Sobre a falta de familiaridade com as TIC ser uma barreira

para muitos professores, de que forma podemos contribuir para mudar esse quadro? Como podemos mobilizar nossos colegas a enfrentar esses obstáculos?

(15:00:28) Clara fala para pesquisadora: Eu sei, já vivenciei a experiência:1º com meus alunos, onde usei simplesmente o excel, pois é um programa de domínio comum. Num 2º momento foi oferecido um curso para os meus colegas de escola no NTE, onde fui convidada

pelas tutoras, a tb orientar... percebi q a maioria dos profs tem fobia de micro...

(15:11:47) Sandra fala para Todos: Gostaria de colocar que a escola precisa nos incentivar nestas mudanças, eu precisaria deste "empurrão"

(15:13:19) Melissa fala para pesquisadora: No curso de capacitação que fiz pelo estado, aprendi um recurso [...] e que apliquei com os alunos, a construção de um blog pessoal [...] depois de ver e discutir um vídeo com eles a respeito daquele livro quem mexeu no meu queijo, cada um criou seu blog e lá expos sua opinião. agora vou trabalhar com eles outras coisas que terão que disponibilizar naquele ambiente, criei também um blog e lá estou colocando gabaritos e outros recados para eles.

Os relatos de Clara, Melissa e Sandra, em particular, ressaltam a carência de experiências formativas voltadas ao uso pedagógico e investigativo das tecnologias. Clara, primeiramente, pontua que os professores em geral “têm fobia de micro”, medo esse que está associado ao novo, ao desconhecido, uma vez que o professor não tem vivenciado experiências formativas voltadas à apropriação de novas práticas ou ao uso de tecnologias, pois a formação profissional docente, incluindo a tecnológica, tem sido negligenciada no RS.

Em outras palavras, a resistência manifestada pelos professores da escola pública em usar as tecnologias nas atividades educativas escolares decorre da carência de políticas públicas de formação docente, das concepções sobre ensino e sobre ser professor, impregnadas na cultura escolar, da ausência e/ou carência de experiências formativas baseadas no uso desses recursos, bem como pelas mudanças que essa nova prática pode deflagrar na prática pedagógica em sala de aula, as quais, segundo Penteado (1997) colocam o professor em uma “zona de risco”.

Já Melissa destaca a realização profissional propiciada por uma atividade educativa usando tecnologias, aspecto esse que ressalta a tendência predominante no uso educacional desses recursos, que não contempla a abordagem do conteúdo curricular, mas sim, atividades que priorizam o acesso à tecnologia, a inclusão tecnológica dos alunos, conforme preconizam as políticas de informática educativa no RS.

A esse respeito, Kenski (2007) pontua que a escassez ou a ausência de experiências com tecnologias, levam o professor a utilizá-las de maneira limitada, inserindo-as em sua prática como uma ferramenta de aprendizagem, sem, contudo, modificá-la. Ou seja, uma vez que muitos alunos conhecem mais sobre tecnologia que seus professores, “que não sabem como mostrar suas inquietações e desconhecimentos, a ênfase ainda está no uso da tecnologia como ferramenta e suporte para a aprendizagem” (KENSKI, 2007, p. 92).

Clara, Melissa e Pedro haviam participado de ações formativas pautadas em tecnologias e essa participação, portanto, perpassou o processo de apropriação de conhecimentos pedagógico-tecnológicos em matemática. Notei que as conjecturas sugeridas

por esses docentes, assim como as discussões matemáticas em torno das atividades eram permeadas por questionamentos sobre as possibilidades de abordar matemática a partir desses, revelando uma visão diferenciada em alguns aspectos sobre o uso desses recursos. Melissa, contudo, manifestou dúvida sobre como promover a incorporação das tecnologias no ensino de matemática.

Analisando as falas de Melissa em diferentes momentos da prática formativa e seus relatos de experiências com tecnologias, nota-se que as experiências por ela vivenciadas focavam o uso da Internet no ensino e, com isso, o modo como essa docente vislumbra o papel das tecnologias no ensino de matemática, geralmente, envolve os recursos de busca da WWW. Portanto, tal como preconiza Dayrell (1996), os aspectos das práticas sociais do professor, sejam elas escolares, extra-escolares ou da sua formação influenciam diretamente em sua prática docente e na cultura escolar da qual faz parte.

Por outro lado, a ausência de experiências formativas, voltadas ao uso pedagógico de tecnologias na abordagem do conteúdo curricular, foi novamente manifestada no âmbito dessa discussão. Ao refletir sobre as possibilidades de uso desses recursos na prática docente escolar, os sujeitos da pesquisa sublinharam o medo em relação ao novo e a falta de formação para promover esse uso. Esses aspectos são evidenciados nas falas dos professores mostradas no recorte seguinte.

Excerto 27 Chat de 15/09/2007

Questão disparadora do debate:Idem a <E26>.

(14:24:50) Marina fala para Todos: Para usarmos cada vez mais os benefícios do computador precisamos antes nos sentir seguros quanto as novas tecnologias para daí então provocar-nos a mudança de professor tradicional para um professor que saiba tirar proveito do computador como ferramenta e então ser o orientador, "professor do futuro".

(15:14:06) Pedro fala para Todos: [...] vejo que o "medo do novo" é o fator mais importante da resistência a mudança ou a tentativa da mudança. Assim, com a formação continuada de professores e estudo em grupos e principalmente alguém como suporte, faz com que os professores sintam-se melhor para explorar estas novas tics

Os depoimentos, destacados em <E27>, reafirmam a necessidade do professor ter acesso a ações formativas diversas, as quais sejam voltadas ao uso pedagógico e investigativo das tecnologias, como uma forma de viabilizar mudanças na prática docente e na educação como um todo. Marina sublinha, novamente, a necessidade do professor dominar o conteúdo matemático e Pedro sugere a constituição de grupos de trabalho como um caminho possível para o desenvolvimento profissional docente.

As considerações de Pedro e Melissa estão em consonância com o entendimento de Ponte (2000). Para esse autor, para que o professor se aproprie das tecnologias, incorporando- as à sua prática, ele precisa, primeiramente,

ser um explorador capaz de perceber o que lhe pode interessar, e de aprender, por si só ou em conjunto com os colegas mais próximos, a tirar partido das respectivas potencialidades. Tal como o aluno, o professor acaba por ter de estar sempre a aprender. Desse modo, aproxima-se dos seus alunos. Deixa se ser a autoridade incontestada do saber para passar a ser, muitas vezes, aquele que menos sabe (o que está longe de constituir uma modificação menor de seu papel profissional) (PONTE, 2000, p.76).

Sobre o “medo do novo”, destacado por Pedro em <E27>, considero que a ausência de experiências com tecnologias nas ações formativas oferecidas aos docentes da rede pública contribui para expandir a insegurança dos professores. Em contrapartida, potenciam o medo desses profissionais incorporarem tais recursos na prática pedagógica e a resistência dos mesmos em apropriar-se desses recursos, interferindo, por fim, no processo de desenvolvimento profissional.

Além disso, tal como mostrado na subseção 5.3.1, as concepções sobre o papel da tecnologia na prática docente em matemática, daqueles professores que haviam participado de práticas formativas baseadas nesses recursos eram distintas das concepções daqueles que não tiveram oportunidade de vivenciar essas experiências. E essas concepções, por sua vez, permearam o modo como esses sujeitos apropriaram-se de conhecimentos pedagógico- tecnológicos em matemática, pois limitaram seu olhar sobre o papel desses recursos na abordagem matemática, assim como no processo de desenvolvimento das atividades matemáticas nas sessões presenciais e a distância.

Assim como Pedro, outros sujeitos da pesquisa destacaram a importância e a necessidade de haver comprometimento do professor com seu processo de desenvolvimento profissional e colaboração entre todas as pessoas envolvidas na dinâmica da ação educativa. Em outras palavras, tal como propõem Kenski (2007) e Ponte (2000), o uso pedagógico das tecnologias implica todos trabalhando em favor da inserção desses recursos na prática educativa escolar. É esse o foco do recorte 28.

Excerto 28 Chat de 15/09/2007

(15:23:36) Débora fala para Todos:Acho que temos que interagir mais entre os professores, temos que realmente entrar em contato, trocar idéias, auxiliar um ao outro [...] precisamos nos comprometer.

por uma formação pedagógica, didática e tecnológica. Muitos de nós possuem as duas primeiras, mas não tiveram a tecnológica. Acho que é esta que está dificultando o andamento do trabalho, por isto é que devemos procurar nos aperfeiçoar em cursos ou formação continuada na área da tecnologia. Todos sabemos o conteúdo (didática) e utilizamos diversas estratégias em nossas aulas, sempre com base nas teorias (pedagógicas), mas no momento de implantarmos nossa formação tecnológica temos dificuldades.

(15:59:51) Débora fala para Todos: Aprendizagem colaborativa, professor-formador com sensibilidade para trabalhar no ritmo e tempo, construindo um grupo de aprendizagem colaborativo ao percurso cognitivo de cada , trabalhando com a telematica para privilegiar a reflexão e a organização dos professores envolvidos.

(16:00:08) Pedro fala para Todos: e esta dificuldade é por não conhecer ou saber utilizar os diversos softwares, tecnologias digitais e outros materiais técnico-educacionais

(16:01:23) Marina fala para Todos: cabe a nós profes nos adequarmos ao momento e fazermos das nossa práticas em sala experiências novas, acertando e errando também, [...]

Subjacente aos aspectos evidenciados nos depoimentos apresentados no excerto 27, destaco, entre outras coisas, a carência de políticas públicas e programas de formação continuada para uso educacional das tecnologias no âmbito da rede pública de ensino do RS. Por conseqüência, ao refletirem sobre formação continuada versus incorporação das tecnologias na prática pedagógica, os professores apresentaram discursos evasivos e desprovidos de argumentos teóricos ou práticos. Interpreto isso como um discurso sem reflexão, que muitas vezes reproduz discursos oficiais ou chavões.

Diante do exposto, considero que as experiências formativas voltadas ao uso pedagógico das tecnologias podem favorecer a apropriação de conhecimentos pedagógico- tecnológicos em matemática, pois ampliam o leque de possibilidades de uso desses recursos, vislumbradas pelos professores, potenciando o desenvolvimento profissional docente. Por outro lado, entendo que a ausência dessas vivências restringe o campo de visão dos professores em relação às possibilidades de uso, limitando o seu desenvolvimento profissional e suas práticas sociais e profissionais.

Contudo, vale lembrar que apenas a participação do professor em ações formativas dessa natureza não garante o sucesso da apropriação de conhecimentos pedagógico- tecnológicos ou de novas práticas. Antes de tudo, o professor precisa ser apoiado e incentivado nesse processo de mudança por todos os segmentos escolares, tal como propõe Dayrell (1996), e também por um projeto de informática educativa.

Outro fator, associado à ineficiência das ações que são promovidas, diz respeito ao propósito dessas que, na maioria das vezes, consiste em favorecer a formação básica para uso desses recursos ou apenas favorecer a inclusão tecnológica de professores da rede pública.

Esses aspectos contrapõem-se as considerações de Bairral (2005). Esse autor defende a necessidade do professor da escola pública vivenciar experiências formativas baseadas no uso das tecnologias, como uma forma de favorecer mudanças em termos da concepção sobre o uso desses recursos na educação, bem como mudanças na prática pedagógica do professor e na escola em seu conjunto.