Ao se ler a bibliografia relativa àquilo que se pode nomear de “problemas da mulher
na Igreja” (sacerdócio, participação nos ministérios, papel da leiga, mulher nas CEBs, mulher
na “vida religiosa”) não se pode deixar de formular dois aspectos. Um deles se constitui nos
efeitos dos movimentos feministas, e, de forma geral, de todo o vocabulário dos “direitos”, na
Igreja Católica e nas igrejas protestantes mais tradicionais. Em quase todos os textos sobre a
situação da mulher na Igreja há referências ao “feminismo” e do que seriam os direitos das
mulheres na Igreja, que são orientadas por concepções de condição feminina.
Tais textos expressam concepções quanto a condição feminina na Igreja,
sistematizadas por teólogos e teólogas, religiosos e religiosas com alta escolaridade,
geralmente com titulação na área de ciências humanas (sociologia e psicologia,
principalmente) e acesso às editoras vinculadas à Igreja. São os responsáveis pela elaboração
erudita sobre a mulher engajados diferentemente nas Igrejas, participando de diferentes redes
(mais ecumênicas ou mais locais, progressistas ou conservadoras, “evangelicais” ou
institucionalizadas ou menos) e mais próximos ou mais distantes em relação ao poder eclesial
e ao espaço de elaboração erudita na Igreja (e que diz respeito não só aos teólogos, mas a
outros religiosos ou leigos com formação superior voltados à produção e resolução das
questões postas nas Igrejas)50. Relacionada a isto está que a visão do lugar e do papel da
mulher na Igreja como diferenciada e como objeto de disputa. Assim, se alinham, por um
lado, os ortodoxos quanto aos lugares a serem ocupados e as formas de ocupá-los, e os
heterodoxos.
No entanto, como se tratam de eruditos, e como a tradição teológica e eclesial vai
contra as mulheres, a enunciação dos “direitos” e “reivindicações”, em suma, o “novo” é
quase sempre “fraco” porque quem o defende também o é, é necessário o uso de “argumentos
sólidos” e bem fundamentados: “é importante pôr os pés onde é necessário, senão o risco é
grande de prejudicar a causa que se quer defender” (GOMBAULT, BERNARD, CHARRIER,
2001, p. 2). Isso implica para estes agentes que fazem a tradução em termos eruditos de uma
demanda prática a necessidade de apropriar-se de outras disciplinas, entendidas como
“ferramentas”, como considera uma missionária do CESEP, pedagoga e mestranda em
ciências sociais:
É importante ter uma ação na sociedade e é essa a proposta das Pastorais. Mas para isso é preciso mediações, ferramentas sociais, contribuições de diferentes áreas da Ciência: da Medicina e das Ciências Sociais. Não podemos trabalhar só com o Evangelho. (...) A Teologia da Libertação usa a Ciência. A nossa opção pelos pobres nos ajudou a descobrir como é a exploração dos pobres. (...) É neste momento surgem novas teologias – novas reflexões” (BUENDIA, 1996, p. 20).
Esta apropriação constitui o segundo aspecto, a ser desdobrado nas formas desta
apropriação, além de suas condições de possibilidade – tanto as características dos agentes
quanto as mudanças na configuração de seus espaços de atuação. Ela implica em uma
composição de temáticas teológicas, na apropriação de releituras históricas e de noções das
ciências sociais de forma heteróclita e mesmo retórica, pois o uso de noções pode se dar sem a
50
Revistas e obras coletivas congregam estes “intelectuais da igreja” que utilizam de diferentes formas sua formação para tratar questões colocadas no espaço religioso.
adoção da epistéme na qual elas têm sentido, e algumas noções e temas são apropriados sem
que se abandone o esquema de percepção quanto à mulher, à sociedade, sexualidade, etc.,
próprio à ortodoxia católica.
A temática das transformações na vida religiosa católica constitui-se numa das formas
de tratamento dos problemas da mulher na Igreja que engaja diferentes agentes religiosos. No
Brasil, identifica-se que os que levam a cabo sua formulação estão vinculados à Conferência
dos Religiosos do Brasil (CRB). Não se dispõe de um estudo mais aprofundado das
características sociais dos integrantes ativos desta Conferência e principalmente daqueles que
possuem um cargo na mesma. A partir das informações disponíveis, investigou-se os
interesses ligados à sua formação e ao tratamento das questões relativas às mulheres
religiosas, o que será apresentado mais adiante no capítulo 4.
O “problema dos oprimidos” em voga na Igreja Católica e no protestantismo histórico
a partir da segunda metade do século XX vai dar ensejo para o tratamento da questão do lugar
da mulher na Igreja por parte dos religiosos engajados na CRB. Isto em duas modalidades: o
tratamento da mulher como oprimida ou como atuando junto aos oprimidos por sua
libertação. Assim, no documento “A religiosa hoje na América Latina”, produzido pela
Confederação Latino-Americana de Religiosos (CLAR) e divulgado no Brasil pela CRB, a
partir de um questionário enviado às religiosas do continente, a reformulação da vida religiosa
diz respeito à “missão da Igreja”, que é “continuar a missão libertadora de Cristo”. Assim,
“[a] Igreja, (...) luta pela defesa dos valores fundamentais dos homens. Se a América Latina
vive em situação de pecado, é porque nela o homem é explorado pelos próprios homens.
Contribuir para a libertação a partir da fé, é situar a missão da religiosa no Plano de Deus”
(CLAR, 1972, p. 37), o que exige a reformulação da vida religiosa, pois “muitas das
estruturas da Vida Religiosa feminina permanecem testemunhas de uma outra época
Um outro texto do presidente da CRB na época, o jesuíta Marcello de Azevedo
Carvalho, retoma o tema da “renovação da Vida Religiosa” em função da “opressão da
mulher na Igreja”, da “minoridade da religiosa”, do uso “dos serviços das religiosas”, como
“mão-de-obra gratuita ou barata”, “para os trabalhos da casa ou para a ação pastoral”,
contrastando com a “sistemática ausência de participação da mulher em instâncias
eclesiásticas de decisão para todo o Povo de Deus” (AZEVEDO, 1975, p. 592-593).
No entanto, as duas formas de tematizar a situação da mulher na Igreja parecem ser
feitas a partir de uma concepção de diferença essencial de homem e mulher que predomina no
meio religioso católico. Os “direitos das mulheres na Igreja” e mesmo o feminismo são
pensados a partir da idéia de diferença essencial. No já citado documento do CLAR, a ação da
religiosa deve estar radicada em sua “feminilidade”: “a mulher situa-se numa proximidade
natural da vida: dar a vida, cuidar da vida, fazer crescer a vida... Isso lhe dá uma
predisposição inata para sentir com o outro, para compreender mais em função das pessoas do
que das coisas”. (CLAR, 1972, p. 33-34). Neste, o que se reivindica é que o feminino não seja
motivo para “submissão e passividade”, ou que “o reconhecimento das diferenças entre
homem e mulher” não seja “convertido em atitude de inferioridade” ou “no extremo oposto, o
empenho agressivo em obter uma falsa igualdade”. Assim, os “direitos da mulher” têm a ver
com “especial capacidade de escutar, de compreender, de acolher bondosamente, uma
capacidade para tudo aquilo que possa contribuir para estabelecer, dentro da comunidade,
ambiente mais humano” (CLAR, 1972, p. 34). Da mesma forma, para Carvalho,
o importante e fundamental é o reconhecimento efetivo das diferenças, aceitando em plena liberdade o homem como diferente e tomando consciência ao mesmo tempo da própria dignidade feminina (...) O importante é abrir as responsabilidades a ambos os sexos, deixando que cada um as desempenhe segundo sua índole peculiar (CARVALHO, 1975, p. 601- 602).
O debate mais atual sobre a “vida religiosa feminina”, que incorpora a noção de
mulher e seus direitos na Igreja por parte daqueles próximos ou engajados na CRB. Segundo
Rosa Adela Osório Sierra, religiosa doutora em teologia moral, em seu texto apresentado no
V Seminário Nacional de Psicólogos e Psicólogas religiosos, cujo tema era “questões de
gênero na vida religiosa: poder, instiuição e novos horizontes”,
[a] emergência da questão e do estudo das “relações de gênero” no contexto sócio-eclesial da Vida Religiosa (...) busca afirmar que as relações novas significam viver em condições de igualdade, valorizando o homem e a mulher como pessoas em suas diferenças naturais, sem querer justificar, desde a natureza, a hierarquia ou considerar todo o feminino inferior. (SIERRA, 1999, p. 58).
A continuidade desta percepção essencialista de homens e mulheres e de seus
“direitos” está relacionada a uma circunscrição mais marcada e mais centrada no meio
religioso católico, suas instituições e redes, com definições de ação e reivindicação legítimas,
e daí, a uma maior dependência dos mesmos. Isso se percebe ao se contrastar a discussão feita
sobre “vida religiosa” pela CRB – na qual a questão da ordenação de mulheres é enunciada
por um padre51, o que não deixa de ser bastante significativo – com a forma que um grupo
europeu formado por teólogas e filósofas, o “Femmes et hommes dans l’Église” trata a
situação da mulher na Igreja e em especial a ordenação de mulheres. Estes temas são
considerados como questões de “direitos humanos”, e estas mulheres se identificam como
“feministas”: “O propósito não é de tornar a questão das mulheres uma causa em si, tão
justificada que ela possa ser, mas de recuperar a exceção de um não direito das mulheres em
uma sociedade particular, a Igreja Católica, para interrogar o caráter ético de universalidade
dos Direitos Humanos” (CHENU, 1998, p. 70). É possível que o entendimento dos problemas
das mulheres na Igreja como questão de Direitos Humanos, o que contrasta com a defesa dos
Direitos Humanos pela Igreja (CHENU, 1998, p. 74) e não como um problema interno à
Igreja esteja relacionado à configuração dos movimentos cristãos heterodoxos nos países
centrais, não voltados somente para os problemas relativos à opressão econômica – que na
51
América Latina constitui uma grande força interna à Igreja Católica, os “progressistas” – mas
de questões propriamente culturais envolvendo a Igreja Católica. Este grupo citado faz parte
de uma rede, o “Réseaux des Parvis”, que congrega grupos que demandam mudanças na
Igreja que pertencem ao terreno do “cultural”: o casamento e homossexualidade de
presbíteros, mudanças no tratamento de questões como a AIDS, ao mesmo tempo que
criticam as tomadas de posição do Vaticano (conforme LES RÉSEAUX DES PARVIS,
2003).
Na América Latina e no Brasil, ao contrário, os problemas da mulher na Igreja
Católica têm uma legitimidade menor diante dos “problemas econômicos” e daí a grande
força dos “problemas da mulher pobre”. Ligadas às filiações temáticas e aos engajamentos
práticos em nome de causas e a cristalização destes movimentos, instituições e tendências das
Igrejas estão as formas de tratamento do “feminismo”. Nota-se que as mulheres dos países
centrais engajadas na redefinição do papel da mulher na Igreja e as protestantes no Brasil se
identificam como feministas, ao passo que as católicas se distanciam desta conotação
(conforme ROHDEN, 1997, p. 73-74) – com exceção de poucas católicas como Ivone Gebara,
religiosa teóloga e Maria José Nunes, ex-religiosa e doutora em Sociologia, não por acaso
mais próximas das protestantes e com titulação obtida na Europa. Ou seja, distanciamento do
feminismo das católicas, além de sua forte inserção e dependência das redes internas à Igreja
Católica, também está relacionado a uma subordinação às formas que a Teologia da
Libertação trata os “problemas da mulher”. Como se vê no texto de Braccini, superiora da
ordem do Imaculado Coração de Maria:
[o]s movimentos feministas de emancipação da mulher foram mal colocados desde o princípio. Pecaram pela base. No afã de defender a mulher e de promovê-la, esqueceram o que é de fato a promoção da mulher. Puseram em questão a própria natureza de ser da mulher, ao invés de pôr em questão as formas sociais vigentes, que não proporcionam condições para a realização social e pessoal da mulher (BRACCINI, 1975, p. 94).
Outros autores, como uma teóloga professora da universidade de Goiás, uma leiga
aluna de teologia da PUC-Rio Grande do Sul, o presidente da CRB em 1975 também
partilham desta percepção das “incorreções” do feminismo (AZEVEDO, 1975, p. 600;
RIBEIRO, 1990, p. 137; MASCARELLO, 1973, p. 12-13). Isto não significa que ele seja
totalmente negado entre os católicos. As formas de incorporação do feminismo passam, na
Igreja Católica, pela tentativa de corrigir a visão preconceituosa sobre o feminismo no meio
religioso, como é o caso de Sierra, uma doutora em Teologia Moral em uma publicação da
CRB (SIERRA, 1990, especialmente p. 46-50). Uma outra forma seria a filiação à assim
chamada “teologia feminista”. Esta parece engajar principalmente as mulheres teólogas ou
com outra titulação superior obtida nos países centrais, as teólogas ou outras com titulação
superior protestantes latino-americanas e também algumas católicas latino-americanas.
Quanto à filiação à teologia feminista, ela agrega mulheres cristãs de diferentes países
e igrejas. No entanto, é possível identificar clivagens entre as latino-americanas e as mulheres
de países centrais, que novamente dizem respeito à subordinação dos problemas da mulher
aos problemas sociais: no caso, o que se tem é a proposição de uma teologia feminista latino-
americana, em contraposição ao mesmo tempo à teologia feita nos países centrais e ao “lado
patriarcal” das Teologias da Libertação latino-americanas. O texto de Maria Pilar Aquino,
mexicana doutora em Teologia pela Universidade de Salamanca, Espanha, identifica sua
teologia como feminista que tem como marco a teologia da libertação.
Essa nova vertente sabe-se parte da grande corrente de seiva vital que atravessa o mundo dos pobres, mas quer acolher, de forma especial, os clamores, lutas e expectativas das mulheres pobres e oprimidas na sua condição de mulheres. (...) na Teologia da Libertação em geral, a palavra e as expectativas das mulheres encontram-se com freqüência subsumidas na categoria genérica dos “pobres” e encobertas pelo forte linguajar sexista empregado pela maioria dos teólogos (AQUINO, 1997, p. 18 e 19).
Uma classificação pertinente às teologias após a Segunda Guerra Mundial é aquela
que considera as teologias relativas aos pobres, negros, índios, mulheres, questões das ex-
identificam a clivagem entre teólogas feministas de primeiro mundo, mais voltadas para o
problema da “opressão da mulher na sociedade ratificada pela Igreja” e do “sexismo nas
Igrejas” e as teólogas latino-americanas, mais voltadas aos problemas das mulheres pobres
e/ou marginalizadas (PARMENTIER, 1998; VUOLA, 2000). Esta clivagem é percebida no
“diálogo” entre as teólogas e teólogos de primeiro mundo por um lado, e os teólogos e as
teólogas de terceiro mundo, por outro, em associações como a Associação de Teólogos do
Terceiro Mundo (ASETT) (VUOLA, 2000, p.108). Haveria mesmo uma contraposição entre
teólogas de primeiro e terceiro mundo. É o que considera Parmentier, teóloga luterana
professora de Teologia Prática da Universidade Protestante de Estrasburgo. Ela mostra isto
citando a correspondência entre duas teólogas: Elsa Tamez, mexicana presbiteriana,
professora do Seminário Bíblico latino-americano na Costa Rica e Bärbel Wartenberg-Potter,
alemã luterana presidente do setor de mulheres do CMI a partir de 1980. Casada com o
presidente do CMI em 1984, lecionou teologia na Jamaica; retornando a Alemanha, trabalhou
como pastora, depois como Secretária Geral do Conselho de Igrejas Cristãs da Alemanha e
Bispa do Sínodo do Norte do Elba da Igreja Luterana Alemã. Nesta correspondência B.W-
Potter diz a Elsa Tamez:
Tu [Elsa Tamez] colocas às vezes questões muito diretas: nós poderemos ser irmãs se vocês, as mulheres do Primeiro Mundo, se retiram da realidade social que faz suas vidas e que nos torna exangues, na medida em que vocês meditam atrás de suas portas fechadas, em que vocês saboreiam os frutos de nossa dura labuta, em que vocês vestem seda fina e algodão rústico, sem por outro lado dar lugar, na sua busca de uma nova espiritualidade, ao stress das costureiras indianas? (Potter, in PARMENTIER, 1998, p. 82).
Como já foi mencionado, há uma contraposição entre teólogos e teólogas de terceiro
mundo. As teólogas de terceiro mundo consideram que a Teologia da Libertação não
contempla a mulher oprimida, a “mais pobre dentre os pobres”, e acham-se discriminadas
pelos colegas de terceiro mundo. Isto aparece no relatório da VI Conferência da ASETT,
realizada em Genebra, e que contou com a presença de “teólogos do primeiro mundo”:
Os homens progressistas no Primeiro e no Terceiro Mundos não levaram a sério o sexismo. Talvez se mostrem progressistas em suas opções sociais e
políticas, mas continuam sexistas em suas atitudes e práticas. Continuam considerando a mulher como ser inferior e incompetente. Por exemplo, em conferências internacionais, onde se exige a participação das mulheres, elas são muitas vezes convidadas por serem mulheres e não por sua competência (VI CONFERÊNCIA ..., 1984, p. 965).
Estas clivagens precisam ser olhadas com certo cuidado, principalmente porque são
propostas por teólogos participantes de um espaço teológico que põe em contato primeiro
mundo e terceiro mundo, de duas formas. Uma, as teólogas “latino-americanas” estudam ou
mesmo lecionam em instituições do Primeiro Mundo (assim como os teólogos da libertação
latino-americanos): Ivone Gebara defendeu sua segunda tese de doutorado em Louvain,
Bélgica, sendo saudada e comentada por teólogas feministas do primeiro mundo (ver
CHENU, 1998), assim como Maria Pilar Aquino e Elina Vuola. As teólogas de primeiro
mundo como E.S.Fiorenza, R.Ruether e L.Russel compartilham temáticas com as de terceiro
mundo, como ecofeminismo, teologias de grupos marginalizados ou “da libertação”(conforme
PARMENTIER, 1998, p. 100-101; também ver homenagem a Ruether na qual estava presente
como conferencistas I.Gebara). As teólogas de terceiro mundo, por sua vez, também
trabalham questões como “corpo” e fazem re-leituras feministas de passagens bíblicas.
De outra parte, o que poderia ser chamado de ecumenismo teológico permite trocas e
contatos entre teólogos de primeiro e terceiro mundos, através de revistas internacionais como
a Revista Concilium e centros teológicos referenciados internacionalmente. Duas questões
devem ser colocadas então: uma delas diz respeito a estratégias de distanciamento e
aproximação (e as disposições para isto) entre teólogas e correntes teológicas relacionadas às
definições e classificações da “teologia feminista”. Pode-se dizer que a preocupação em
situar-se “academicamente” leva Parmentier, uma teóloga “de primeiro mundo” a separar
teólogas feministas (que estão no primeiro mundo) e “teólogas de terceiro mundo”, mais
voltadas para questões como a pobreza, menos acadêmicas, “menos evoluídas em termos de
Outra questão diz respeito à configuração histórica do espaço teológico, e permite
diferenciar teólogos de primeiro e terceiro mundos, homens e mulheres. É possível que os
teólogos homens e mulheres do primeiro mundo atuem principalmente nas instituições de
ensino religioso, ou em instituições de pesquisa. No caso das mulheres, Schlusser-Fiorenza é
professora da Universidade de Harvard e editora de duas revistas teológicas. Em 2002 foi
eleita para a Academia Americana de Artes e Ciências; Ruether é professora no Garret
Evangelical Theological Seminary e membro da Graduate Faculty at Northwestern
University. O Grupo “Femmes et Hommes dans l’Église” possui um centro de documentação
e participa de Fóruns ecumênicos voltados para pesquisas teológicas52. Muito embora as
teólogas do terceiro mundo também tenham uma inserção universitária (para citar algumas
delas, Ana Maria Bidegain é professora da Universidade Nacional da Colômbia, Maria Pilar
Aquino é professora da Universidade de San Diego, Califórnia e Ivone Gebara foi professora
no Instituto de Teologia do Recife), seria necessário estudar como elas também diversificam
sua atuação junto a outros espaços – não necessariamente da esfera religiosa – divulgando a
mensagem teológica que produzem: quer dizer, as teólogas latino-americanas e os teólogos
latino-americanos, ao contrário dos de primeiro mundo, conseguem conformar novos espaços
de atuação do teólogo: as assessorias a movimentos populares, a participação em organizações
não governamentais que tiveram início na atuação de pessoas ligadas à igreja e o espaço na
fronteira entre o religioso e os movimentos sociais ou políticos – CEBs, organizações de
bairro, ONGs feministas, ecologistas, etc. É o que Colonomos (2000, p. 62) chama de lógica
de passagem: “do norte ao sul, da teoria à prática”, e encaminha para os estudos das mulheres
e homens que fazem teologia como mediadores entre igreja e política, igreja e movimentos
sociais, e, por outro lado, igreja e ideologias culturais ou políticas em voga.