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CAPÍTULO III A IDENTIDADE ORGANIZACIONAL

3.3. A Identidade Organizacional: Delimitação de um Conceito

Embora o estudo da identidade em contexto organizacional se apresente ainda numa fase relativamente jovem, a sua definição revela já um consenso bastante considerável no âmbito da comunidade científica. Em termos conceptuais, a identidade organizacional pode ser definida como o conjunto das características centrais, distintivas e duráveis acerca de uma dada organização, que é partilhado pelos seus membros (Albert & Whetten, 1985; Albert, 1998, p. 21). Aprofundando esta definição, importa referir que: as características centrais designam os atributos que constituem a essência da organização; as características distintivas correspondem às componentes que distinguem uma organização das demais organizações e as características duráveis constituem os atributos que revelam alguma continuidade ao longo do tempo, i.e., que perduram. Neste sentido, e em termos da sua mensuração, podemos conceptualizar a identidade organizacional como o grau de consenso entre os membros da organização acerca das características - centrais, distintivas e duráveis - que melhor definem a sua organização. Estas características tendem, em grande medida, a transparecer dos símbolos organizacionais, tais como o nome da instituição, o logótipo, os cartões pessoais (Bouchikhi & Kimberly, 2003), os artefactos, a linguagem, os rituais, as histórias ou mesmo o vestuário (Pratt & Rafaeli, 1997). De uma forma sistemática, a definição da identidade organizacional está intimamente relacionada com a reposta à questão: “quem somos nós?” (Albert, Ashforth & Dutton, 2000; Albert & Whetten, 1985).

A identidade organizacional pode, no entanto, ser estudada segundo dois níveis de análise distintos. Ao nível organizacional, enquanto identidade organizacional, correspondendo ao agregado das comunalidades percebidas pelos membros da

organização acerca das características que constituem a organização. Ou ao nível individual, enquanto identidade organizacional percebida, definida como o conjunto de características de uma dada organização percebida por um único membro (Dutton, Dukerich & Harquail, 1994). Para efeitos do presente estudo, e atendendo ao papel que a identidade organizacional desempenha no comportamento das pessoas em contexto organizacional (e.g. Brewer & Gardner, 1996; Mael & Ashforth, 1992), importa aprofundar a identidade organizacional, pelo que a identidade organizacional percebida não será grandemente desenvolvida.

Embora a definição conceptual se revele relativamente consensual, a identidade organizacional ainda tende a ser confundida com alguns constructos do comportamento organizacional ou do marketing, tais como a cultura organizacional ou a imagem organizacional. Em seguida, apresenta-se a tabela 6 que procura estabelecer um paralelismo conceptual entre os constructos “identidade organizacional”, “cultura organizacional” e “imagem externa percebida”, referindo, de igual modo, os principais autores que se têm debruçado, teórica ou empiricamente, sobre os mesmos.

Tabela 6: Paralelismo teórico entre os constructos “identidade”, “cultura” e “imagem externa construída”

Conceito Definição Conceptual Autores que aprofundaram as relações entre estas variáveis

Identidade

Características centrais, distintivas e duráveis acerca de uma dada organização que é partilhado pelos seus membros.

Albert, 1998; Albert, Ashforth & Dutton, 2000; Albert & Whetten (1985); Ashforth & Mael (1989); Dutton & Duckerich, 1991; Fiol (1991); Rao, Davis & Ward, 2000. Cultura Sistema geral de regras e crenças partilhado que determina o significado e o comportamento nas

organizações.

Downey (1986); Fiol (1991); Hatch & Schultz (1997); Hatch & Schultz (2002); Rindova & Schultz (1998) Imagem

Externa Construída

Como os membros da organização julgam que os outros (os membros de outras organizações) os vêm enquanto organização.

Dutton, Dukerich & Harquail (1994); Labianca, Fairbank, Thomas, Gioia and Umphress (2001)

Da análise do quadro, podemos constatar que todos os constructos em estudo se situam a um nível interno à organização, no sentido em que reflectem as percepções, as crenças ou os julgamentos proferidos pelos membros da organização.

Comparando a identidade organizacional com a cultura, pode-se conceptualizar a cultura enquanto o contexto alargado, o sistema geral de valores onde a identidade se encontra embebida, influenciando, de forma determinante, tanto a sua construção como o seu desenvolvimento (e.g. Fiol, Hatch & Golden-Biddle, 1998; Hatch & Schultz, 1997). Fiol (1991) vai mais longe, considerando a identidade organizacional como a interpretação comportamental das regras e dos valores que orienta o desempenho das pessoas. Em concordância com a autora, a correspondência entre a cultura, enquanto sistema de valores, e o desempenho organizacional não é linear. Esta relação tende a ser mediada pela identidade organizacional, que constitui o padrão de comportamentos que une as regras e valores à performance organizacional. A identidade organizacional pode, assim, ser descrita de forma comportamental (Ravasi & Schultz, 2006), constituindo o conjunto de comportamentos que define as características mais centrais, distintivas e duradouras da organização. A identidade organizacional está embebida nas rotinas organizacionais, compreendendo os comportamentos que fazem parte do dia-a-dia da organização (Nag, Corley & Gioia, 2007). Num estudo realizado numa organização de I&D, estes autores encontraram evidências de que identidade organizacional, ao definir quem as pessoas são (who we are), explicita o que as pessoas fazem enquanto colectividade (what we do as a colective).

Estabelecendo um paralelismo entre a identidade e a imagem externa construída, pode- se considerar que a imagem agrega as percepções internas relativamente à avaliação externa da organização. A imagem pode, assim, ser traduzida pela resposta à questão: “Quem é que os outros pensam que nós somos?” (Gioia, Schultz & Corley, 2000). A

imagem externa construída tende a sofrer influência tanto por parte da identidade organizacional (e.g. Hatch & Schultz, 2002), como por parte de grupos externos à própria organização, por meio das experiências que membros internos possam apresentar com estes grupos (e.g. Rindova & Schultz, 1998). Muitos autores têm advogado a importância de manter uma consistência entre a identidade organizacional e a imagem externa construída, como forma de assegurar o bem-estar da organização (Boyed, 2003; Gioia, Schultz & Corley, 2000). Num estudo realizado por Palma, Cunha e Lopes (2006) durante uma aquisição, os autores verificaram que a falta de consistência entre a identidade e a imagem externa construída levou tanto os membros da empresa adquirida como os membros da empresa que adquiriu a sentir apreensão relativamente às interacções inter-grupais, tendo levado os dois grupos a avaliar estas interacções como não apresentando nem elevada qualidade nem elevada confiança.

Da análise comparativa destes três constructos, depara-se com algumas vantagens da identidade organizacional em relação à cultura e à imagem externa construída. Numa primeira instância, a identidade organizacional apresenta uma elevada especificidade (Fiol, 1991; Fiol, Hatch & Golden-Biddle, 1998), por comparação com a cultura, o que facilita, em grande medida, a sua delimitação conceptual e a sua mensuração. Em segundo, a identidade pode ser descrita comportamentalmente, o que facilita a sua observação, mudança e mensuração rigorosa (Fiol, 1991). Em terceiro, e atendendo à influência que a imagem recebe do meio externo à organização, o estudo da identidade permite um maior controlo das variáveis, o que vem incrementar, uma vez mais, a avaliação deste constructo.

Para melhor compreender como as mudanças organizacionais afectam a identidade das organizações empreendedoras – objectivo do presente estudo - importa analisar, em

primeira instância, a construção e o desenvolvimento da identidade organizacional ao longo do ciclo de vida das organizações.