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CAPÍTULO II O EMPREENDEDORISMO

2.4. O Empreendedorismo e a Criação de Valor

2.4.2.2. O Crescimento Enquanto Aumento em Quantidade: Principais

Tal como se pode constatar, é já considerável o número de estudos realizados com vista à identificação dos factores críticos do crescimento das organizações empreendedoras. No entanto, este número avultado não tem contribuído para uma melhor entendimento do crescimento, dada a inconsistência de resultados que geraram (Davidsson, Achtenhagen & Naldi, 2005; Weinzimmer, Nystrom & Freeman, 1998). Várias razões de ordem conceptual, de operacionalização e metodológica podem ser apontadas para explicar este facto.

Em primeiro lugar, esta inconsistência de resultados pode ser explicada com base na definição de crescimento. Uma análise aos estudos realizados revela que os autores têm feito uso de uma multiplicidade de indicadores para analisar o crescimento, tais como o volume de vendas (e.g. Delmar & Shane, 2006), as expectativas dos empreendedores sobre as vendas (e.g. Watson, Steward & BarNir, 2003), o lucro (e.g. Reid & Smith, 2000), a quota de mercado (e.g. Skrt & Antoncic, 2004), o número de empregos criados (e.g. Davidsson & Delmar, 2001) ou as mais valias internas (assets) (e.g. Heirman & Clarysse, 2005). A par destes indicadores generalistas, os autores tendem a usar, também, indicadores mais específicos, em função do sector de actividade/ indústria em que o estudo é conduzido, como o número de táxis ou carros de aluguer, no caso de

estarem a ser investigadas empresas do sector de aluguer de viaturas (e.g. Bolton, 1971). Para além destes indicadores objectivos, outros de natureza subjectiva, também, têm sido empregues, tais como a percepção dos empreendedores acerca do crescimento e do lucro da empresa (e.g. Watson et al, 2003) ou a satisfação com o crescimento da organização (e.g. Gupta & Govarinrandja, 1984).

Como o crescimento organizacional constitui uma variável multidimensional, os autores devem fazer aplicar os diferentes indicadores mencionados (e.g. Delmar, Davidsson & Gartner, 2003). Dada a dificuldade em aceder a dados nas organizações empreendedoras, pela falta de informação histórica (Brush & Vanderwerf, 1992), os autores tendem a recolher um só tipo de indicador. No entanto, a utilização de diferentes indicadores leva à obtenção de diferenças em termos das variáveis que melhor predizem o crescimento, o que dificulta a construção de uma teoria sólida sobre o crescimento das

organizações (Venkataraman & Ramanujam, 1986; Whetten, 1987). Para minimizar estas diferenças, é aconselhável utilizar todos os indicadores mencionados ou, em caso de impossibilidade, o volume de vendas. O volume de vendas é considerado a medida que melhor espelha o crescimento das empresas recém-formadas, uma vez que, desde a abertura da actividade, as organizações necessitam de vender para sobreviver (Davidsson et al., 2005). Para além disso, o crescimento das vendas é o principal impulsionador da aquisição de outros recursos, desencadeando o aumento do número de empregados e a variedade de recursos internos (Flamholtz, 1986).

Em segundo, os estudos referem a utilização de diferentes medidas de crescimento, o que vem dificultar, de igual modo, a comparação dos resultados. Os indicadores objectivos e subjectivos já referidos constituem medidas absolutas de crescimento, no sentido em que se baseiam na diferença entre os valores absolutos - das vendas ou do número de empregos criados – registada entre duas ou mais observações distintas no

tempo (e.g. McCann, 1991; Merz & Sauber, 1995). Como os valores absolutos são difíceis de comparar entre organizações de diferentes sectores de actividade, em função das peculiaridades dos seus produtos/serviços, a avaliação do crescimento pode, de igual modo, basear-se em medidas relativas, que comparam a percentagem do aumento das vendas ou do número de empregos de um momento para o outro (e.g. Cooper, Gimeno-Gascon & Woo, 1994; Zahra, 1993). As medidas relativas, além de permitirem os estudos inter-sectoriais, facilitam as análises em diferentes momentos no tempo.

Uma terceira razão que ajuda a explicar porque é tão difícil construir uma teoria coerente do crescimento das organizações recém-criadas prende-se com a heterogeneidade de fórmulas que são aplicadas para calcular o crescimento. Numa meta-análise realizada por Weinzimmer e colaboradores (1998), os autores identificaram quatro fórmulas distintas de crescimento que os investigadores usam nos

seus estudos: 1) a diferença entre duas observações distintas no tempo: o último ano e o primeiro ano de actividade da empresa (tf - t0); 2) o rácio entre a última observação e o

primeiro ano (tf / t0); 3) o rácio entre a diferença entre a última observação e o primeiro

ano [(tf - t0) / t0]; e 4) o rácio entre a diferença entre a última observação e o primeiro

ano, e a duração do estudo [(tf - t0) / n].

Da comparação entre estas quatro fórmulas, os autores obtiveram diferenças em termos de significância, direcção e variância explicada do crescimento organizacional. Curiosamente, a fórmula mais usada na literatura é a (tf - t0), mas aquela que aumenta a

capacidade preditiva em relação ao crescimento organizacional é a (tf - t0) / t0). A fórmula a utilizar para avaliar o crescimento continua a não ser uma escolha fácil. A título ilustrativo, Davidsson e Wiklund (2006) consideram que a fórmula (tf - t0) / n] é a

mais adequada para medir o crescimento, por não se revelar tão sensível ao tamanho inicial da organização como as restantes fórmulas. Weinzimmer e colaboradores (1998),

contudo, verificaram que esta mesma fórmula era a que piores resultados gerava, no sentido em que diminui a capacidade preditiva em relação ao crescimento organizacional.

Para além da heterogeneidade de indicadores e de medidas, as contradições encontradas nos estudos sobre o crescimento podem ser atribuídas ao baixo controlo das variáveis demográficas, como o tamanho, a idade ou o sector de actividade. Em relação ao factor tamanho, os estudos têm revelado alguma incongruência, ao apontar que o crescimento é directamente proporcional ao tamanho, relação que ficou conhecida como a lei de Gibrat (e.g. Sutton, 1997). Outros, porém, defendem uma relação inversa entre estas variáveis, considerando que a lei de Gibrat não se aplica a pequenas empresas (e.g. Dunne & Hughes, 1994; Evans, 1987). Quanto à idade, os estudos revelam-se mais concordantes, ao demonstrarem que o crescimento tende a diminuir em função da idade

das organizações (e.g. Barron, West & Hannan, 1994). Os estudiosos da teoria ecológica consideram que o sector de actividade, embora não afecte directamente o crescimento, detém características que variam de sector para sector, pelo que os estudos comparativos devem ser realizados dentro de uma mesma população (e.g. Hannan & Freeman, 1977). Dada a influência que o tamanho, a idade e o sector de actividade detêm no crescimento das organizações empreendedoras, o seu efeito deve ser controlado aquando da condução de estudos sobre o crescimento organizacional.

Em quinto lugar, os estudos nem sempre têm contribuído para uma melhor clarificação em relação ao crescimento organizacional pelo facto de não distinguirem entre “insucesso” ou “fracasso” e “encerramento da firma”. Tal como evidenciado por Headd (2003), que analisou a base de dados das start ups dos Census dos E.U.A., cerca de um terço dos encerramentos ocorriam numa fase em que as firmas estavam a ter êxito. Duas teorias foram levantadas para explicar o encerramento de empresas empreendedoras

bem sucedidas: a avaliação dos custos-benefícios e o modelo da aprendizagem activa (e.g. Bates, 2005). O capital humano dos empreendedores constitui um importante factor explicativo, no sentido em que o encerramento da firma é mais provável quando os empreendedores percepcionam alternativas de emprego mais aliciantes e fazem uma avaliação inferior dos custos associados à sua saída (Gimeno, Folta, Cooper & Woo, 1997). A abertura de uma nova empresa pode ser encarada como um processo de aprendizagem, em que o empreendedor deposita esforço, tempo e dinheiro (Ericson & Pakes, 1995). De acordo com estes autores, os empreendedores podem decidir encerrar a nova empresa, por se sentirem tentados a aplicar todos os conhecimentos adquiridos num outro contexto. Estes casos de encerramento de empresas bem sucedidas devem ser levados em conta, aquando do estudo do crescimento organizacional.

Em sexto lugar, os resultados inconclusivos obtidos em relação ao crescimento

organizacional podem ser atribuídos à regularidade com que o crescimento é avaliado. De facto, a maior parte dos estudos tende a seguir a metodologia transversal, retirando conclusões com base na avaliação do crescimento em dois momentos pontuais no tempo (e.g. Delmar et al., 2003; Weinzimmer et al., 1998). Este procedimento não leva em conta duas questões essenciais. Ao retirar conclusões com base na avaliação de dois momentos isolados no tempo, os autores estão a assumir, ainda que implicitamente, que o crescimento é regular ao longo do tempo. Este postulado não vai ao encontro da literatura (e.g. Spilling, 2001) que tem demonstrado que as organizações estão em mudança constante, pelo que o crescimento não pode ser encarado como uma variável línear e contínua, mas antes temporária. A um padrão elevado de crescimento pode

seguir um baixo e vice-versa, para uma mesma firma, o que implica que os estudos sobre crescimento devam assentar na medição do ritmo de crescimento anual, ao longo de um período de pelo menos dois ou três anos.

Neste seguimento, o autor propõe uma categorização das organizações, em função do ritmo de crescimento: organizações de crescimento modesto (taxa de crescimento médio entre 30% a 50% ao ano); organizações de crescimento médio (taxa de crescimento médio entre 50% a 100% ao ano); e organizações de crescimento elevado (taxa de crescimento médio entre 30% a 50% ao ano). Esta categorização é apoiada por outros autores (e.g. Barringer, Jones & Neubaum, 2005; Delmar et al., 2003), que vêm chamar a atenção para a importância de compreender o que leva as organizações a apresentarem ritmos de crescimento elevados, com o intuito de promover o desenvolvimento deste tipo de organizações, uma vez que são responsáveis pela geração de mais valor para a sociedade.

Para além da irregularidade que está inerente ao crescimento organizacional, a avaliação desta variável em momentos esporádicos no tempo não leva em conta uma outra

questão essencial: o crescimento ao longo do tempo. O crescimento é um processo que que perdura no tempo, pelo que deve ser estudado ao longo do tempo (e.g. Davidsson & Wiklund, 2000; Delmar et al, 2003). A avaliação do crescimento em momentos esporádicos não permite capturar as dinâmicas do crescimento que se desenrolam no tempo. Esta lacuna aplica-se, igualmente, ao estudo dos factores que influenciam o crescimento organizacional. Os dados relativos a estes factores tendem a ser recolhidos num único momento, também não levando em conta a natureza dinâmica destas variáveis (Davidsson & Wiklund, 2000). Deste modo, pode-se afirmar que os estudos realizados, baseando-se em reconstruções retrospectivas do crescimento, têm contribuído para a predicção do passado, de um passado estático, comprometendo a