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Em consonância com a concepção mais consensual de identidade organizacional - como o conjunto das características centrais, distintivas e duráveis da organização – esta tende a ser entendida como uma entidade relativamente fixa e imutável, que se mantém estável mesmo perante tentativas de mudança organizacional, dada a sua ligação com a história da organização (Albert & Whetten, 1985). Alguns autores vão mais longe ao considerar que as organizações mudam para preservar a sua identidade, entendendo a conservação da identidade como um dos motores da mudança organizacional (Gagliardi, 1986).

No entanto, dada a crescente complexidade e turbulência da envolvente, a imutabilidade da identidade organizacional pode constituir um entrave à capacidade da organização para mudar e se adaptar ao meio (Scott & Lane, 2000b). Neste encaminhamento, alguns autores vêm defender uma concepção mais dinâmica da identidade (e.g. Gioia, Schultz

& Corley, 2000; Rousseau, 1998), considerando-a como uma entidade fluida, capaz de mudar em função das mudanças do meio, assegurando a adaptação da organização.

Estas duas concepções da identidade organizacional - como entidade fixa e entidade dinâmica – implicam diferentes perspectivas sobre a mudança da identidade. A primeira, onde se incluem as teorias normativas ou modelos categoriais (e.g. Teoria da Identidade Social), está enraizada nos pressupostos modernistas, encarando a identidade como uma propriedade que tende a manter-se fixa, funcionando como um inibidor da mudança organizacional (e.g. Bouchikhi, Fiol, Gioia, Golden-Bidle, Hatch, Rao, Rindova & Schultz, 1998).

A concepção da identidade organizacional como uma entidade dinâmica está alicerçada no paradigma construtivista, concebendo a identidade como uma construção social, que deriva da interacção constante e diária entre os colaboradores e outros grupos de interesse (e.g. clientes, concorrentes, comunicação social, entidades reguladoras) (e.g. Fiol, Hatch & Golden-Biddle, 1998; Humphreys & Brown, 2002). De acordo com esta perspectiva, a identidade vai emergindo a partir dos processos de sensemaking e sensegiving (e.g. Ravasi & Schultz, 2006), que permitem a interpretação e reinterpretação dos acontecimentos e das experiências passadas, produzindo novos e/ou renovados padrões de conhecimento e significado. Esta visão considera, assim, que a identidade organizacional se encontra em constante revisão e redefinição. Esta perspectiva vem no prosseguimento dos trabalhos desenvolvidos por Weick (1995), que considerava que as interacções sociais produziam mudanças na definição do self, ou Giddens (1991), que defendia a consciência reflexiva da identidade ao longo do tempo (recriação da identidade em resultado da interacção com os outros). Esta perspectiva dinâmica da identidade tende a dominar, cada vez mais, a literatura da identidade organizacional.

No entanto, e em consonância com esta perspectiva, mesmo estando em constante mudança, a identidade organizacional consegue assegurar a continuidade da organização. Tal é possível na medida em que os nomes (labels) para as características centrais e distintivas da organização se tendem a manter inalterados, mudando apenas a interpretação e o significado que a eles estão associados (e.g. Chreim, 2005; Gioia, Schultz & Corley, 2000). Por outras palavras, as características centrais e distintivas da organização tendem a manter-se, por forma a assegurar a familiaridade, mudando as acções que estão subjacentes a elas ao longo do tempo.

A título de exemplo, salienta-se o estudo de Chreim (2005) que demonstra como um banco canadiano conseguiu proceder a uma modernização, sem no entanto perder a sua essência. O topo estratégico manteve as principais características do banco (e.g. “somos o primeiro banco do Canadá”), transformando os seus significados antigos (e.g. “somos um banco antigo e antiquado”) e associando as características a novos significados (e.g. “somos um reservatório de tradição e responsabilidade”). Mais ainda, os significados antigos, que representavam o passado, eram apresentados de forma negativa, contrastando com os novos significados, que se pretendiam associar ao presente e futuro do banco, que eram apresentados de forma muito positiva. Desta forma, a nova identidade estava em consonância com a antiga, garantindo uma duração conínua entre o passado, o presente e o futuro da organização, o que assegurou a continuidade do banco enquanto organização. Reconhecendo que a identidade está em mudança sucessiva, importa perceber o sentido dessa mudança.

Os membros da organização movem-se no sentido do alcance e manutenção de uma identidade organizacional positiva, que proporciona uma elevada auto-estima e bem- estar (e.g. Ashforth & Mael, 1989; Pratt, 1998). Assim, a mudança da identidade organizacional tende a ocorrer quando os membros da organização percepcionam uma

ameaça em termos: 1) do prestígio da identidade organizacional, que é experienciada na presença de um desfasamento entre a identidade e a imagem externa construída (e.g. Gioia et al, 2000); 2) da distintividade da identidade, que se torna saliente quando os concorrentes acumulam êxitos; e 3) da continuidade da identidade, patente quando ocorrem discrepâncias temporais na identidade, entre o passado, o presente e o futuro da organização (e.g. Corley & Gioia, 2004).

Quando uma destas três situações não se verifica, a mudança da identidade organizacional tende a constituir uma tarefa difícil de concretizar, como mostram os estudos que acompanharam mudanças organizacionais que foram mal sucedidas, dadas as resistências em mudar a identidade organizacional (e.g. Humphreys & Brown, 2002; Nag, Corley & Gioia, 2007; Salk & Shenkar, 2001). Perante a perspectiva de mudança organizacional, os colaboradores tendem a desencadear mecanismos de defesa, como a negação, a racionalização, a idealização ou a fantasia, como forma de manter a auto- estima e a continuidade da identidade organizacional (e.g. Brown & Starkey, 2000).

Para conseguir que a mudança da identidade organizacional seja bem sucedida, revela- se necessária a projecção de uma imagem futura ideal, que veicule as características mais desejadas e motive os colaboradores para a necessidade da mudança (Corley et al, 2000). Os estudos sobre a mudança da identidade organizacional (e.g. Gioia & Thomas, 1996; Ravasi & Schultz, 2006) têm evidenciado o papel fundamental da imagem futura ideal na mudança da identidade, que encoraja os membros da organização a aspirarem a uma imagem mais prestigiante. Dutton e Duckerich (1991) e Corley e Gioia (2004) vieram demonstrar a necessidade de injectar ambiguidade na organização como forma de mudar a identidade, na medida em que esta produz instabilidade nas percepções actuais, criando as condições necessárias para a mudança da identidade. A ambiguidade reportava-se a mudanças nos grupos de comparação social (concorrentes), a

discrepâncias temporais da identidade e a desfasamentos entre a identidade e a imagem externa construída.

Sistematizando, são já consideráveis os estudos que têm procurado explicar como muda a identidade organizacional (e.g. Dutton & Dukerich, 1991; Corley & Gioia, 2004; Gioia & Thomas, 1996; Ravasi & Schultz, 2006). No entanto, uma análise atenta permite verificar que estes estudos se reportam a momentos de crise, que envolveram mudanças das características da identidade organizacional. O estudo que enfatizou a mudança não das características, mas dos nomes (labels) das características centrais e distintivas da organização (Chreim, 2005) analisou a identidade partilhada entre o topo estratégico apenas (e não a identidade partilhada por todos os membros organizacionais) de uma organização secular, com base em dados de arquivo (relatório de contas e outros dados mortos). De facto, embora a perspectiva mais recente tenda a defender a concepção dinâmica da identidade, os estudos continuam a enfatizar situações de mudança radical, que não permitem explicar as dinâmicas da identidade ao longo do tempo. Esta constatação vai no seguimento dos apelos de Gioia e colaboradores (2000) e Hogg e Terry (2000) para a necessidade de realizarem estudos longitudinais que permitam perceber como a identidade vai mudando ao longo do tempo.

Neste sentido, tem ficado por explorar como as mudanças que ocorrem na organização afectam a identidade organizacional ao longo de todo o seu percurso desenvolvimentista, incluindo durante as primeiras fases do ciclo de vida organizacional. A análise da identidade nas primeiras fases do ciclo de vida organizacional mostra-se relevante quando os estudos demonstram que as condições de fundação iniciais da organização tendem a persistir e a condicionar o subsequente desenvolvimento da firma (e.g. Bramford, Dean & Douglas, 2004; Eisenhardt & Schoonhoven, 1990), por um lado, e dadas as evidências de que a identidade

organizacional, uma vez construída, constitui um filtro para a interpretação dos acontecimentos que têm lugar em contexto organizacional (e.g. Dutton & Dukerich, 1991; Rao, Davis & Ward, 2000), influenciando determinantemente o desempenho organizacional (e.g. Mael & Ashforth, 1992). Por outro lado, e atendendo aos diferentes ritmos de crescimento das organizações empreendedoras (e.g. Spilling, 2001), importa perceber como estes diferentes ritmos de crescimento afectam a identidade da organização.

Desta forma, o presente estudo tem como objectivo explorar como as mudanças organizacionais afectam a identidade das organizações empreendedoras de crescimento elevado e das organizações empreendedoras de crescimento modesto.