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191 Idem – Op.Cit.p.55.

6. A (IN) DECISÃO DOS BENEFICÁRIOS

Mas, afinal, quais são as opções atualmente dadas aos pais em relação aos seus embriões, mais especificamente aos excedentes? Como o descarte e a destruição estão regulados, ainda que de forma limitada? Resta-lhes a implantação ou a entrega para adoção.

Em relação à expressão “doação” utilizada por diversos autores e encontrada em vários diplomas normativos para tratar do destino dos embriões excedentários, preferimos entendê-la por “entrega para adoção”, justificando, nas palavras de Silmara Juny Chinelato, que “o termo “doação” é próprio às coisas” (CHINELATO, 2003, p.369), o que veementemente não é passível de se considerar o “ser” o embrião.

A autora defende ainda que a adoção desses embriões excedentários é ato que respeita o princípio da dignidade da pessoa humana e, sobretudo, persegue o deslinde de uma das maiores problemáticas do Biodireito. (CHINELATO, 2003, p.369)

Pois bem, tomando-se por base que a decisão caberá, primeiramente, aos pais, eles deverão fazê-lo, no momento da criopreservação, pois essa é decisão deverá fazer parte de tudo aquilo que deverá levado em consideração quando se opta pela utilização de técnicas de fertilização.

A doutora Stela Marcos de Almeida Neves Barbas assevera que “ a afirmação de que a personalidade jurídica começa com a concepção significa que desde o momento da fecundação existe um ser humano ao qual devemos conferir as prerrogativas de pessoa”. (BARBAS, 2011, p.238)

Ainda segundo Barbas (2011, p.220), quando disserta sobre a pessoa humana e personalidade jurídica explica:

“ a personalidade e capacidade são conceitos conexos, mas não são sinônimos. A personalidade é um princípio, um valor ético que emana, que é intrínseco à própria pessoa. A capacidade é atribuída pelo ordenamento jurídico: é a medida da personalidade. Se existe vida humana, existe personalidade, gozando de toda a proteção que o direito lhe confere, em especial no que diz respeito ao próprio direito à vida e à dignidade.”

Não se pode permitir qualquer ato displicente por parte de nenhum dos envolvidos na aplicação das técnicas reprodutivas, pois, afinal, estamos lidando e cuidando da vida humana. Quando afirmamos que os métodos médico-científicos são válidos, pois permitem a procriação àqueles que têm problemas de esterilidade e/ou infertilidade, não podemos tratar de uma “meia realidade”.

Renata Furtado de Barros (2010, p.68) ao explicitar alguns princípios do biodireito assim descreve:

“Conforme Princípio do Biodireito do Consentimento Informado, as experiências que envolvam seres humanos só poderão ser informadas após o seu consentimento prévio. O consentimento informado pressupõe que o paciente fique a par de todos os procedimentos aos quais será submetido, o objetivo do seu tratamento ou da pesquisa e os possíveis riscos”.

A decisão tem de ser tomada, sabendo-se de todas as suas implicações, ou seja, quando se decide pela submissão às técnicas reprodutivas que podem gerar embriões excedentes, deve-se pensar, antes mesmo que eles sejam formados, qual seria o destino a lhes ser dado.

Não se pode defender que o ordenamento jurídico permita, ainda que seja, pela não proibição, a prática de diversos procedimentos médicos para viabilizar o surgimento de um novo ser, e não se ocupe dos embriões que restaram do procedimento, como se eles não existissem ou como se pudessem ficar eternamente congelados ou ainda ser passivelmente eliminados.

Da mesma forma os pais que, por um lado, buscam com determinação passar por todo o processo para conseguir a concepção e o nascimento de um filho, e, de outro, se esquecem de todos os que poderiam vir a existir, seja por sua decisão de implantá-los, seja por sua decisão de entregá-los à adoção.

Guilherme de Oliveira (2005, p.24), professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, sobre o tema, comenta:

“Não deve desprezar-se o risco de esta possibilidade estimular a tendência para criar embriões excedentários. Conhecidas as dificuldades de praticar a adopção por falta de crianças nas condições legais e sociais idóneas, poderia ser tentador procurar as “adopções pré-natais” de embriões excedentários, contrariando, afinal, o preceito básico de evitar a superfecundação in vitro. ”

A busca, portanto, a nosso ver, num primeiro momento, deve ser no sentido do esforço máximo para que os embriões sejam concebidos em número mínimo, bastando que seja suficiente para atender às necessidades da técnica médica a ser implementada.

Tomada essa decisão cercada de cautela e empregando o devido conhecimento médico em busca de maior precisão no que tange à matéria, os que restarem poderão ser implantados e dar origem a novos filhos do casal, ou entregues, como defendemos, à adoção.

Interessantes as palavras de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (2007, p.449) sobre a proteção da vida humana, incluindo a situação dos embriões. Vejamos:

“Enquanto bem ou valor constitucionalmente protegido, o conceito constitucional de vida humana abrange não apenas a vida das pessoas, mas também a vida pré-natal, ainda não investida numa pessoa, a vida intrauterina (independentemente do momento em que se entenda que esta tem início) e a vida do embrião fertilizado.”

Nessa esteira, afirmamos que a decisão quanto ao destino a ser dado aos embriões excedentários deve se pautar pelo respeito aos direitos e princípios constitucionalmente garantidos à família, que vão desde a dignidade da pessoa humana, paternidade responsável, liberdade de planejamento familiar e à sua proteção integral.

Renata Furtado de Barros é taxativa ao afirmar que “ o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é basilar para a estruturação de toda a bioética, pois viabiliza a pesquisa científica de acordo com a evolução

da espécie humana e proíbe o exercício de práticas abusivas o que, além de resguardar a dignidade da pessoa humana, protege a manutenção da espécie”. (BARROS, 2010, p.49)

Stela Marcos de Almeida Neves Barbas assevera “que a procriação deve estar no domínio das leis da natureza, a competência exclusiva e responsabilidade dos pais na procriação do filho, sem interferências, no tratamento do ser humano como pessoa e não como coisa, ou seja, rejeitando-se em princípio como objeto de transformação mesmo que pareça ser em seu benefício.” (BARBAS, 2011, p.399)

Os direitos a serem garantidos ao nascituro, ou seja, àquele que ainda não havia nascido sempre foram objeto de discussão e estudo nos ordenamentos jurídicos. Porém, não se podia imaginar que o futuro residente no ventre materno, ou seja, o embrião, poderia residir em outro local, como uma proveta, ou num banco de células, por exemplo.

Os direitos fundamentais devem sim ser garantidos aos filhos advindos do emprego das técnicas de reprodução artificial, em estrito cumprimento aos mandamentos fundamentais constitucionais. Usando as palavras de Jorge Miranda diga-se que “para além da unidade do sistema, o que conta é a unidade de pessoa. A conjugação dos diferentes direitos e das normas constitucionais, legais e internacionais a eles atinentes torna-se mais clara essa luz”. (MIRANDA, 1998, p.182)

Em contrapartida, a decisão de ter ou não filhos, ciente de toda a cadeia de consequências advindas dessa decisão, deve ser pautada no sentido de só se produzir os embriões estritamente necessários que serão utilizados no processo de procriação assistida em respeito à vida e a dignidade da pessoa humana.