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A Incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos ao Direito

CAPÍTULO II A APLICABILIDADE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE

2.2 A Incorporação dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos ao Direito

No art. 5º, § 2º, da Constituição Brasileira consagra-se, de forma inédita, que “os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros direitos decorrentes dos tratados internacionais”. Portanto, foram incorporados, incluídos na relação de direitos constitucionalmente protegidos, a contrario sensu, os direitos previstos nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte.

De fato, os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos ratificados pelo Brasil foram erigidos à condição de fonte normativa do sistema jurídico nacional, como bem assinala Mazzuoli (2011a, p. 820), para quem, com a disposição do § 2º, do art. 5º, a Constituição de 1988

[...] passou a reconhecer claramente, no que tange a seu sistema de direitos e garantias, uma dupla fonte normativa: a) aquela advinda do Direito interno (direitos expressos e implícitos na Constituição, estes últimos subentendidos nas regras de garantias, bem como os decorrentes do regime e dos princípios pela Constituição adotados), e; b) aquela outra advinda do Direito Internacional (decorrente dos tratados internacionais de direitos humanos em que a República Federativa do Brasil seja parte). De forma expressa, a Carta de 1988 atribuiu aos tratados internacionais de proteção dos direitos

humanos devidamente ratificados pelo Estado brasileiro a condição de fontes do sistema constitucional de proteção de direitos.

Como se vê, os direitos elencados em tais tratados integram e complementam os direitos fundamentais previstos constitucionalmente, devendo conferir-se a esses direitos o regime constitucional previsto para os demais direitos e garantias fundamentais.

[...] Esse processo de inclusão implica a incorporação pelo Texto Constitucional de tais direitos.

Ao efetuar a incorporação, a Carta atribui aos direitos internacionais uma natureza especial e diferenciada, qual seja, a natureza de norma constitucional. Os direitos enunciados nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é parte integram, portanto, o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados. Essa conclusão advém ainda da interpretação sistemática e teleológica do Texto, especialmente em face da força expansiva dos valores da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais, como parâmetros axiológicos a orientar a compreensão do fenômeno constitucional (PIOVESAN, 2013a, p. 114).

Destarte, com o advento da Constituição Federal de 1988 (art. 5º, § 2º), vem a lume nova classificação dos direitos fundamentais. Piovesan (2013a, p. 120) propõe, nesse sentido,

uma nova classificação de direitos previstos pela Constituição. Por ela, os direitos seriam organizados em três grupos distintos: a) o dos direitos expressos na Constituição (por exemplo, os direitos elencados pelo texto nos incisos I a LXXVII, do art. 5º); b) o dos direitos expressos em tratados internacionais de que o Brasil seja parte; e finalmente, c) o dos direitos implícitos (direitos que estão subentendidos nas regras de garantias, bem como os direitos decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição). Grifou-se.

Na mesma linha, afigura-se atualmente pacífico no Brasil o entendimento de que todas as normas constitucionais servem

[...] não somente como modelo para auferir-se a constitucionalidade das normas ordinárias e complementares, como de parâmetro hermenêutico para a interpretação e fixação do alcance das normas infraconstitucionais, além de vincularem a atuação do Poder Executivo (MELO; PFEIFFER, 2000, p. 312).

Por isto mesmo, quando o § 1º, do art. 5º, da Constituição Federal dispõe que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”, resta fixada uma relevante regra hermenêutica: a regra será a

aplicabilidade imediata, sendo a eficácia limitada situação absolutamente excepcional.

Trazendo-se tal raciocínio para os tratados internacionais de direitos humanos, pode-se seguramente afirmar que a regra é que os tratados internacionais de direitos humanos possuem aplicabilidade imediata.

Saliente-se que, além do § 1º. do art. 5º, da Constituição Federal impor tal conclusão, a autoaplicabilidade advém das próprias normas de direito internacional, pois se um Estado-parte, ao ratificar o tratado, compromete-se a acatar os seus preceitos, é óbvio que as normas devem ser imediatamente exigíveis. A este respeito, são esclarecedoras as considerações de Trindade:

Pode-se mesmo admitir uma presunção em favor da autoaplicabilidade dos tratados de direitos humanos, exceto se contiverem uma estipulação expressa de execução por meio de leis subsequentes que condicionem inteiramente o cumprimento das obrigações em apreço (1996, p. 24). [...]

Por meio desse dispositivo constitucional, os direitos humanos consagrados em tratados de direitos humanos em que o Brasil seja parte incorporam-se

ipso facto no direito interno brasileiro, no âmbito do qual passam a ter

‘aplicação imediata’ (art. 5 (1)) da mesma forma e no mesmo nível que os direitos constitucionalmente consagrados. [...]

Assim, a novidade do art. 5º, § 2º, da Constituição de 1988 consiste no acréscimo, por proposta que avancei, ao elenco dos direitos constitucionalmente consagrados, dos direitos e garantias expressos em tratados internacionais sobre proteção internacional dos direitos humanos em que o Brasil é parte. Observe-se que os direitos se fazem acompanhar necessariamente das garantias. É alentador que as conquistas do direito internacional em favor da proteção do ser humano venham a projetar-se no direito constitucional, enriquecendo-o, e demonstrando que a busca de proteção cada vez mais eficaz da pessoa humana encontra guarida nas raízes do pensamento tanto internacionalista quanto constitucionalista (1991, p. 139-140 e p. 631).

No mesmo sentido:

Tal significa que os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil podem ser imediatamente aplicados pelo Poder Judiciário, com

status de norma constitucional, independentemente de promulgação e

publicação no Diário Oficial da União e independentemente de serem aprovados de acordo com a regra do novo § 3º do art. 5º da Carta de 1988 (MAZZUOLI, 2011a, p. 847).

Por todo o exposto, da imediata aplicabilidade dos tratados internacionais de direitos humanos na ordem interna (conjugação dos §§ 1º e 2º, do art. 5º, da Carta de 1988), decorre que, em regra, todas as disposições que estabeleçam direitos são

imediatamente exigíveis, afigurando-se inválidas todas as disposições legais (sejam ou não autoexecutáveis) com conteúdo contrário às normas estabelecidas nos tratados.

Assevere-se que na hipótese

[...] absolutamente excepcional, de ser necessária lei para tornar plenamente executável uma disposição contida nos tratados, há a obrigação do Estado em editar tal lei. Nestes casos, não se trata de uma faculdade, mas sim de um dever de legislar. Em tais hipóteses a inércia legislativa configura omissão inconstitucional (PIOVESAN, 2000, p. 314).

2.3 A Hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos no Direito

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