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A Inspetoria Geral de Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino

A Segunda Campanha de Nacionalização do ensino nas escolas sulistas.

E. K O professor, do jeito que ele sabia Porque esses professores já estavam mais ou menos preparados, antes de vir da Alemanha para cá eles já aprendiam um pouco de português e nós

3.1.1. A Inspetoria Geral de Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino

contrário eram definitivamente fechados. Segundo Monteiro (1979), foi freqüente o fechamento de escolas que continuavam ministrando o ensino de língua estrangeira para as crianças, em substituição ao idioma nacional, ou, então, que promovessem dificuldades nas visitas dos inspetores escolares, além de realizarem fraudes ou simulação de registros.

Outro autor que oferece evidências desta ação política é Luna (2000), que comenta ter havido a proibição de muitas escolas e professores de continuarem a oferecer serviços escolares, pois não conseguiram dentro do prazo estipulado pelo governo alcançar as metas exigidas. Com isso, diversas escolas foram gradativamente sendo assumidas pelo governo e deixaram a condição de escolas particulares para virarem escolas públicas.

Este é um ponto importante para o presente estudo, pois a substituição sucessiva de estabelecimentos escolares particulares pelos mantidos pelo governo abriu a possibilidade ao Estado Novo de, finalmente, adentrar nestes espaços educacionais constituídos em torno de uma cultura regional, que se apresentavam fechados dentro de uma organização burocrática e filosófica própria e independente do cenário político nacional. Com estas medidas políticas, o governo federal obteve parte da meta de desterritorializar (DELEUZE; GUATTARI, 2000) os municípios de origem teuto-

brasileira - desta cultura germânica - e reterritorializá-los (DELEUZE; GUATTARI, 2000) com a legítima cultura nacional. No entanto, esta é uma discussão que será complementada mais adiante.

3.1.1. A Inspetoria Geral de Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino

A fim de fiscalizar e orientar tais medidas exigidas pelo governo e efetivar o decreto-lei n°. 88, o Interventor Federal de Santa Catarina, Nereu Ramos, estabeleceu

em 18 de junho de 1938, por meio do decreto-lei n°. 124, a Inspetoria Geral de Escolas Particulares e Nacionalização do Ensino. Neste decreto composto de cinco Artigos, o interventor decretou que este cargo de inspeção deveria ser um departamento educacional subordinado à Superintendência Geral do Ensino80, e funcionaria como um ponto intermediário entre o governo Federal e o governo Estadual, uma etapa burocrática responsável por receber os relatórios dos inspetores escolares de cada circunscrição municipal e enviar, também, relatórios para o governo federal. Desta forma, competia à Inspetoria Geral:

b) velar pelo fiel cumprimento das leis estaduais quando à adoção dos programas, normas de ensino e educação, orientação pedagógica e eficiência dos professores nas escolas particulares, dando as necessárias instruções aos inspetores escolares e docentes; c) tornar efetivas as exigências do decreto-lei n° 88, de 31 de março de 1938, e das leis federais, no tocante à nacionalização do ensino, propondo à Superintendência Geral do Ensino as medidas que, para esse fim, julgar necessárias, especialmente quanto ao afastamento de professores e interdição de estabelecimentos escolares que transgridam aquelas leis; d) fiscalizar as associações a que se refere o decreto-lei n° 76, de 4 de março de 1938, e exigir delas o cumprimento das leis do Estado e das determinações do Departamento de Educação, quanto à educação cívica e organização de programas comemorativos; e) cooperar com a Superintendência Geral do Ensino nos trabalhos que esta indicar e com ela colaborar para o aperfeiçoamento do ensino e educação nas escolas primárias particulares; f) auxiliar a fiscalização federal do ensino primário privado no Estado, tomando as providências que por ela forem solicitadas em beneficio do ensino; g) aplicar penalidades regulamentares aos funcionários que lhe forem diretamente subordinados (decreto-lei nº 124 apud MONTEIRO, 1979, p. 135).

Todavia, apesar dos esforços dos inspetores escolares e seus superiores em realizar as visitas nos estabelecimentos escolares, era comum o não cumprimento das leis em algumas escolas81, já que, como aponta Monteiro (1979), estas em geral

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A Superintendência Geral do Ensino era um departamento educacional responsável por encaminhar as propostas do governo federal aos estados federativos.

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Através da consulta no Arquivo Histórico de Ibirama de um “Termo de visita” redigido pelo inspetor escolar Adolfo da Silveira, foi possível saber o que era inspecionado pelos inspetores escolares. “No dia 8 de julho de 1939, visitei a escola mista municipal de Nova Bremen, no município de Hamônia, regida pelo professor Snr. Alfredo Cardoso, e observei o seguinte: 1°. – que a matrícula total era de 366 alunos, sendo 17 do 1° ano, 12 do 2° ano e 7 do 3° ano; 2°.- que não faltavam alunos; 3°. – que a sala de aula é

situavam-se a uma distância considerável umas das outras e uma inspeção durava em média de 3 a 4 horas. Em geral, se a escola seguinte fosse próxima da que estava sendo inspecionada, então era possível serem visitadas duas por dia. No entanto isso não era comum.

As quinze circunscrições escolares em que estava dividido o Estado de Santa Catarina eram constituídas, em sua maioria, de extensas áreas rurais, ficando as escolas distantes umas das outras dezenas de quilômetros. As precariedades das estradas, dos meios de transportes e número reduzido de diárias disponíveis a cada inspetor dificultavam sobremaneira esta tarefa. No ano de 1938, quando se intensificou o processo de nacionalização, as escolas visitadas pelos inspetores atingiam o índice de 56,5%. De um total de 2.104 escolas, foram visitadas 1.190, ficando 914 delas, sem qualquer orientação direta dos inspetores escolares (MONTEIRO, 1979, p.67).

Assim, o mais corrente era uma inspeção por dia, gastando-se o resto do tempo com o transporte (automóvel, carroça e estrada de ferro), sem se levar em consideração as inspeções repetidas. O autor comenta, ainda, que no ano de 1938 ficaram sem qualquer trabalho de orientação e fiscalização 101 escolas; isso em uma zona onde havia uma preocupação especial com a nacionalização. No caso da circunscrição de Hamônia havia 95 unidades escolares. Destas apenas 78 foram inspecionadas num período de 88 dias82.

Para enfatizar essa questão, a seguir cita-se um artigo retirado do jornal escolar

O Sabiá, de 1943, escrito pela aluna do 3° ano do primário, Rosa Wippel.

Dias passados, quando todos os alunos estavam reunidos na escola após o recreio vimos parar um auto em frente da escola. A professora abriu a porta e entrou o Sr. Inspetor Escolar e um outro Senhor. Fazia já quase três anos que na nossa escola não tinha entrado nenhuma pessoa estranha a não ser pais dos alunos e as vezes o Padre Francisco para dar 45 minutos de aula do catecismo. Maior parte de alunos nunca tinham visto Inspetor nenhum porisso ficaram muito assombrados, apesar que a Irmã professora tinha alguns dias antes regular. Pertence a Comunidade Escolar; 4°. – que não faltava material didático; 5°. – que a escrituração estava em ordem; 6°. – que o aproveitamento dos alunos foi bom em leitura, regular a bom em linguagem, bom em aritmética, geografia, história e canto. 7°. – que tive em geral, boa impressão. Recomendo ao Snr. Professor continuar a dedicar-se com o mesmo esforço que vem empregando para o bom aproveitamento de sua escola.”

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avisado, que algum dia chegava na escola o Sr. Inspetor que ele era muito bonsinho muito amigo do professor e das crianças espertas mas naquele momento ninguém se lembrou disso. Quando porém o Sr. Inspetor saiu ficamos com muita pena. Ele porém antes de partir prometeu vir mais uma vês visitar a nossa escola. Agora sim nos todos esperamos com ância o Sr. Inspetor porque todos o conhecemos (WIPPEL, 1943, p.3).

Através dos jornais escolares A Sineta, de 31 de janeiro de 1943, e A Folha, de 31 de março de 1943, publicados respectivamente na Escola Municipal de Rafael e na Escola Mixta Municipal de Rafael Cedro – pertencentes ao município de Hamônia – é possível acompanhar a vistoria do mesmo inspetor escolar, João Rodrigues de Araújo, nesta região e a impressão causada nos estudantes locais. Sendo assim, n’A Sineta constata-se:

No dia 25 deste mês a nossa escola foi visitada pelo Sr. Inspetor Escolar João Rodrigues de Araújo, ao qual agradecemos muitas vezes pelo serviço que prestou aqui, ensinando-nos muitas coisas e nos disse que passava outra vez aqui no mês de abril. Nos queremos se esforçar bastante para outra vez saber responder melhor ainda do que essa vez (KRÜGER, 1943, p. 04).

Dois meses depois o mesmo inspetor vistoriou a Escola Mixta Municipal de Rafael Cedro, conforme o jornal A Folha relata:

Aos 13 dias do corrente mês, nossa escola recebeu com alegria, a digna visita do Sr. João Rodrigues de Araújo, M.D. Inspetor escolar da 13° Circunscrição de Hamônia. Ao Sr. Inspetor apresentamos os votos de boas-vindas a nossa escola (REINERTE, 1943)

Com isso pode-se concluir que as visitas escolares demandavam um tempo considerável por parte dos inspetores escolares, bem como uma disciplina rígida no processo de vistoria. Além disso, através destes fragmentos apresentados acima, é possível afirmar que tal trabalho era bem recebido por parte dos alunos, que não hesitavam em cooperar.

3.1.2. A Liga Pró-Língua Nacional.

Com o passar do tempo, a Inspetoria Geral das Escolas Particulares e Nacionalização, sob chefia de Luiz Sanches B. de Trindade83, percebeu que não seria suficiente apenas realizar o fechamento de escolas, suspensão e afastamento de professores, ou ainda aplicar punições aos pais infratores. Em seus relatórios enviados à Superintendência Geral do Ensino, Trindade observou a necessidade de fazer com que os dispositivos legais aplicados sobre as escolas particulares fossem incorporados pelo próprio corpo docente e discente das escolas vistoriadas, facilitando o trabalho de acompanhamento que os inspetores escolares deveriam realizar.

Foi então que Trindade propôs a criação da associação escolar Liga Pró- Língua Nacional nas escolas. Esta associação era composta por alunos do primário que estivessem avançados no aprendizado do idioma português em relação aos demais. Sob a orientação de um professor, com a supervisão do diretor da escola, auxiliavam os demais alunos com dificuldades no aprendizado do idioma oficial, possibilitando uma maior integração entre as crianças que não falavam o português com os demais alunos. Esta assistência despendida aos alunos atrasados no ensino era realizada durante o intervalo escolar. Neste momento era impreterivelmente proibido conversar em idioma alemão e, para isso, havia professores espalhados pelo pátio que exigiam o cumprimento desta norma84. No intervalo, entravam em cena os membros da Liga Pró- Língua Nacional que, através de formas lúdicas como jogos, canções e pequenas histórias, familiarizavam os demais alunos com o novo idioma que devia ser aprendido. É sabido, também, que durante este intervalo era recomendado aos alunos a troca de

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Já havia trabalhado anteriormente, como integrante da equipe de Orestes Guimarães, na Primeira Campanha de Nacionalização do ensino.

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Em entrevista realizada com o teuto-brasileiro Carl Ernst Hoppe (HOPPE, 2005), ele relatou que, quando aluno, junto com outros estudantes, foi convidado pelo professor a participar de uma equipe responsável por delatar alunos que se comunicassem em alemão escondidos, durante o intervalo.