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A Segunda Campanha de Nacionalização do ensino nas escolas sulistas.

E. K Durante o enterro, eles cantavam músicas nazistas (KAESTNER, 2005, 2° cassete sonoro Lado B).

3.2.2. A imprensa teuto-brasileira.

Deve-se também atentar para a crise que foi instaurada, durante a instauração do decreto-lei n°.383, nos meios de comunicação, sobretudo no jornal e no rádio que circulavam entre os teuto-brasileiros. Jornais como o Kolonie- Zeitung – Jornal da Colônia –, ao lado do Blumenauer Zeitung – Jornal de Blumenau – e do Urwaldsbote – Mensageiro da Floresta –, todos redigidos em língua alemã, eram importantes órgãos de divulgação do pensamento teuto-brasileiro e de notícias sobre a NSDAP.

Alguns jornais editados em língua alemã em Santa Catarina, como o Blumenauer Zeitung se aproximariam dos ideais nazistas. Em Joinville destaca-se o “Jornal de Joinville” editado em português. Outros, porém, entre eles o Kolonie Zeitung, adotariam uma linha de reafirmação da identidade étnica teuto-brasileira, embora não totalmente desvinculados dos princípios ideológicos do nacional- socialismo. A base de tal reafirmação girou em torno das idéias sobre pátria do teuto-brasileiro, do seu relacionamento com o Estado e da valorização de sua índole ao trabalho interpretada como superior e determinante no progresso do Brasil (COELHO, 1993, p.88).

Diante de tais circunstâncias o Estado Novo não poupou esforços para intervir na editoração de tais jornais, tomando como primeira medida a proibição da publicação de tais periódicos em língua alemã. Em seguida, notar-se-á que estes jornais deveriam vetar notícias e textos que remetessem à Alemanha e às ações políticas da NSDAP, ou seja, deveriam publicar notícias que estivessem vinculadas à propaganda do governo Vargas, ou mesmo emitindo informações sobre acontecimentos ocorridos no país. De maneira semelhante ao que aconteceu nas associações recreativas, o Estado Novo novamente se deparou com o problema do idioma alemão e do calendário local. Conforme sugere Anderson (1989):

O leitor de jornal, vendo réplicas exatas de seu jornal sendo consumidas pelo seu vizinho, sente-se permanentemente tranqüilo a respeito de que o mundo imaginado está presente na vida cotidiana [...] criando aquela notável segurança de comunidade anônima que é a marca de garantia das nações modernas (ANDERSON, 1989, p.44).

Os jornais publicados em língua alemã em período anterior ao decreto n°. 383

para a população teuto-brasileira possibilitavam uma idéia de simultaneidade firme e sólida através do tempo com o cotidiano do país de origem. Esses jornais faziam com que a população estivesse constantemente atualizada com fatos que ocorriam em sua sociedade e na Alemanha. Tal fato, associado ao isolamento geográfico em que eles se encontravam no Brasil, fez com que as notícias de âmbito nacional se tornassem secundárias, dando prioridade ao cultivo de seus valores próprios. Observa-se que

A situação da identidade étnica teuto-brasileira na década de 30 fica bem caracterizada através da análise de Seyferth sobre os chamados “dez mandamentos do teuto-brasileiro”. Publicado em 1937 por vários jornais (inclusive pelo Kolonie-Zeitung em 19/08/1937), esses mandamentos exprimiriam os principais componentes da identidade do grupo étnico teuto-brasileiro: a ênfase na utilização da língua alemã, a necessidade do teuto-brasileiro em educar seus filhos numa escola alemã e a importância de sua atuação política como cidadão brasileiro sem prejuízo da sua particularidade alemã: 1. Mostra e confessa, como brasileiro, que tu és um descendente de alemães, mesmo quando no momento não pareça vantajoso. 2. Fala e escreve em alemão nas relações com alemães, sejam eles alemães natos ou descendentes de alemães como tu. 3. Leia também jornais e livros alemães; se a ordem natural é dominar a língua oficial portuguesa, não deve ser descuidado o uso da tua magnífica língua materna alemã. 4. Promove também a utilização da língua alemã na tua família e dá para teus filhos ensino alemão: eles te agradecerão por isso. 5. Não modifiques em nenhum ponto o teu nome de família alemão, para que tenhas de imediato o direito de domicílio no Brasil, como fazem com os nomes de família os portugueses, espanhóis, italianos, eslavos e sírios. Teu nome alemão é tua bandeira pessoal. 6. Seja, de preferência, apenas membro de um partido nacional brasileiro, que conceda a ti, como descendente de alemães, direitos iguais, tais como os outros membros, e que não sufoque a tua particularidade. Quando tu, com todos os teus compatriotas de origem, se filiarem como membros ativos desse partido, terás guardada tua particularidade para o bem da tua pátria brasileira. 7. Consagra um dia do ano para teu Volkstum, no qual tu, com toda a tua família, festejarão o dia do teuto-brasileiro, o dia do colono, e dele toma parte. 8. Não inveja o êxito dos teus compatriotas de origem alemã, dá antes o melhor de ti ajudando-os. 9. Ordena tua ânsia pessoal de desenvolvimento, pondo acima disso os grandes objetivos da vida cultural dos teuto-brasileiros. 10. Atua na tua sociedade com a finalidade de elevar os interesses do nacionalismo teuto-brasileiro junto às associações estatais maiores (SEYFERTH apud COELHO, 1993, p. 91).

Conforme se lê acima, observa-se que esses dez mandamentos do teuto-brasileiro

procuravam revigorar a conduta étnica que os membros de origem alemã deveriam adotar, e também realizam um discurso enfatizando que o teuto-brasileiro deveria valorizar a sua origem, preservando a sua língua através da oralidade, da escrita e da leitura. Assim se reforçaria a coesão do seu grupo e de suas particularidades culturais. Quanto às estações de rádios da região onde viviam os teuto-brasileiros, a prática não foi diferente, pois essas noticiavam informações sobre a Alemanha e tinham sua programação cultural vinculada às tradições alemãs locais. Contudo, assim como os jornais, estas estações de rádio também foram suspensas. Em substituição a essas foram

inseridos canais que transmitiam notícias nacionais e governamentais, e todas as notícias tinham que ser transmitidas na língua portuguesa.

Manoel Coelho, inspetor da nacionalização em Joinville, relata a Monteiro (1979) que os pedidos de licença realizados pela imprensa e pelo rádio geralmente não eram concedidos, já que as atividades propostas em forma de programa feriam diretamente os princípios da Nacionalização, seja porque fossem escritos em alemão, seja porque neles constavam músicas folclóricas e marchas militares germânicas, o que representava manifestações de valorização da nacionalidade alemã e exortação ao nazismo.

Desta forma, a proibição de estações de rádio alemãs promoveu uma fratura na cultura e na identidade dos teuto-brasileiros com sua nação de origem, ou seja, sofreram uma violência simbólica (BOURDIEU, 1989). Cabe salientar, ainda, que talvez a proibição de rádios tenha sido mais violenta que a dos jornais, já que neste último caso os leitores, com as modificações e fechamentos sofridos pelas Editoras, ficavam apenas privados do consumo de tais periódicos. Já a proibição dos rádios fez com que, em muitos casos, a polícia ou os inspetores da nacionalização invadissem residências para realizar a apreensão dos aparelhos.

Em entrevista realizada com as teuto-brasileiras Eleonora Kaestner (KAESTNER, 2005) e Martha Joenk (JOENK, 2005) pôde-se constatar tais ações coercitivas, uma vez que as entrevistadas relataram que era muito comum os inspetores, após rondarem próximos às janelas das casas e constatarem o acompanhamento de programas radiofônicos germânicos pelos moradores, invadirem a residência e retirarem à força o aparelho. Sendo assim, nota-se como o discurso do governo Vargas de assimilação das regiões mais afastadas, como as colônias alemãs rurais em Santa Catarina, era um processo de diluição das particularidades no interior da sociedade

nacional, e a base de sustentação desse processo conjugava uma ação militar, policial e medidas coercitivas.