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A LÍNGUA PORTUGUESA É NOSSA, É MOÇAMBICANA

No documento reflexões sobre lusofonia e identidade (páginas 86-89)

2 MOÇAMBIQUE E A LÍNGUA PORTUGUESA

4.3 A LÍNGUA PORTUGUESA É NOSSA, É MOÇAMBICANA

A pergunta que justifica este tópico é Como você vê o papel da Língua Portuguesa

como Língua Oficial de Moçambique? Para uma compreensão melhor dessa relação do

circunstâncias/situações você usa a língua portuguesa?, Em que circunstâncias você usa as

línguas autóctones?, Na sua opinião, como você avalia a heterogeneidade linguística

moçambicana? e A língua portuguesa e as línguas autóctones convivem bem?.

Para o professor A, “o português não funciona tão bem assim”. Para este informante, a

língua portuguesa ainda é uma língua de elite e de difícil acesso para o povo. Já que “não há

nem um milhão de tiragem de jornal num país em que a população é cerca de 20 milhões”.

Por isso, ele usa a língua portuguesa somente “em sessões formais, como esta [entrevista]”,

por exemplo.

Para o professor B, a língua portuguesa ainda não representa bem toda a população

moçambicana, exceto a que vive em Maputo. Segundo ele, se nos deslocarmos para Gaza, a

província mais próxima de Maputo, é possível notar uma diminuição significativa no número

de falantes de Língua Portuguesa, por isso, ele defende algo similar ao que é proposto por

Armando Jorge Lopes:

E sou defensor de que as línguas moçambicanas devem andar lado a lado, com o português. Por uma questão de princípio, porque nós temos línguas. Por que é que vamos importar uma outra língua com a qual nos devemos identificar de facto, quando nós temos as nossas? A língua portuguesa é língua de unidade nacional, muito bem. É preciso que seja dominada pelos moçambicanos, é preciso que os moçambicanos saibam falar a língua muito bem, certo. Mas, isso não deixa de fora esta questão, que não defendemos o que é nosso.

Nessa mesma perspectiva, o Professor C afirma que:

O português é a língua oficial, infelizmente é a única língua oficial. [...]. Embora, a maioria seja nos centros urbanos, nas cidades, não é? Já há uma camada jovem já muito grande, que fala português como língua materna. E eu sinto que esta apropriação do português é muito boa porque é uma das línguas, não é, nós não dizemos que temos esta, esta, esta e o português.

Portanto, português é mais uma língua moçambicana. Nós não sentimos

que seja uma língua estrangeira no nosso país, é uma língua moçambicana. E sentimos que aquela língua que nós falamos não é igual à língua que falam os outros.

Apesar da consciência da necessidade de um país com idiomas locais bilíngues, o

Professor D ressalta que:

O português, contrariamente àquilo que muitas pessoas costumam veicular por aí, veio para ficar. É uma língua que nós herdamos, por via colonial. A história assim o ditou e ela veio para ficar. E eu penso que o papel da língua portuguesa como língua franca vai continuar. Porque para nos cimentarmos. É, materializarmos de forma consistente este Moçambique, que do ponto de vista linguístico é diverso, tem essa diversidade toda. E termos, portanto, sucesso, sermos bem-sucedidos, o papel da língua portuguesa tem que estar lá. É a língua franca, é a língua coma qual os moçambicanos falantes das diferentes línguas bantu podem usar para se comunicar.

Apesar disso, o Professor G, reconhece que a língua portuguesa é “é imprescindível,

tem que ser, tem que ser, é a nossa língua oficial”.

Diante do exposto, observamos que a língua portuguesa não é um “problema” para os

moçambicanos. A ausência das línguas nacionais como línguas oficiais é que tem sido um

problema, já que 51% da população moçambicana ainda não tem conhecimento do português.

Logo, há um bom convívio entre as línguas autóctones e a língua portuguesa. Do mesmo

modo em que é possível perceber como positiva essa heterogeneidade das línguas

moçambicanas.

Enquanto as línguas autóctones não são elevadas ao estatuto de língua oficial, são

usadas como língua de afeto, como podemos perceber na fala do informante E:

Para dizer a verdade, gosto mais de changana. Porque eu me sinto mais à vontade. Consigo chorar em changana, não é, seja por assuntos bons, seja por assuntos maus. Choro nessa língua com mais, digamos, liberdade. Agora, português é uma língua com outro lugar em mim. Não me permite transmitir as emoções na sua profundidade. [...] Posso dizer que naquele momento em que queremos ser mais originais, queremos ser emocionais, até metemos uma palavra em changana, no meio da língua portuguesa. É fascinante isso. [...] changana eu uso numa situação mais doméstica, não é. Estou em casa, ocorre-me que tenho que me expressar em changana, expresso-me, sem reservas. [...]

Entre os professores entrevistados a maioria utiliza a língua materna no convívio com

os amigos e a família. Por exemplo, o Professor J que, afirma que usa as línguas nacionais

para “falar com algum parente ou alguém que não se comunica devidamente na língua

portuguesa”. Por outro lado temos, como exemplo, a professora H que faz a seguinte reflexão:

[Vejo a língua portuguesa] como língua nacional também. Deve,

porque eu, se não, se me disserem que não é língua nacional, então

estão a chamar-me a mim de não moçambicana. Estão a dizer a mim,

particularmente, que nasci a saber falar: “-Mamã, papa, bom dia,

boa tarde.” Não em língua dos meus pais, que eu não tenho

identidade moçambicana. Eu só me identifico com a língua

portuguesa. Não estou a desprezar as outras línguas, estou a dizer

aquilo que é a minha realidade. Se disserem que a língua

moçambicana, a língua portuguesa não é moçambicana, então estão a

excluir a minha identidade e de muitos outros que eu sei que também

têm a mesma situação que a minha.

Dessa forma, percebemos que já há moçambicanos que falam somente a língua

portuguesa e que, por isso, o português já não pode mais ser um questionamento. O português

já é de fato uma língua moçambicana, visto que parte dos moçambicanos já aprenderam a

falar somente em língua portuguesa.

No documento reflexões sobre lusofonia e identidade (páginas 86-89)