• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES: A PROGRESSÃO DO ENSINO DE

3.3 A COMPREENSÃO TEXTUAL NAS TURMAS ACOMPANHADAS

3.3.1 A prática da Compreensão Textual na turma de 1º ano

Conforme pontuamos no texto introdutório do eixo da compreensão textual, entendemos que, durante os 12 dias observados, o investimento foi tímido frente às demais turmas do bloco (15). No conjunto das alternativas oral e escrita, bem como acerca das possibilidades de exploração textual, houve destaque à modalidade oral (12), ao compararmos com a escrita (1). Do mesmo modo, houve prioridade às perguntas de fácil localização de informações no texto (7), ao confrontarmos com o investimento em questões inferenciais (1). Já no concernente a perguntas de opinião, houve cinco momentos (5). Esse quadro revela que nem sempre, na prática de leitura, a compreensão foi assegurada. Outro aspecto que chamou a atenção foi o fato de que nem todo texto lido em sala foi objeto de reflexão coletiva quanto ao seu formato/características (2).

Em relação às estratégias de leitura, nas entrevistas, a professora do 1º ano clarificou que, na rodinha, lia para os estudantes e, em seguida, desenvolvia a compreensão. Ao descrever as atividades de compreensão leitora, explicou que destinou mais tempo para a compreensão textual na modalidade oral. Porém, afirmou que as crianças atingiam os três níveis de compreensão (explícita, implícita e crítica):

[...] quando eles vão falando, primeiro vão pensando, refletindo... E relembrando os fatos da história, eles têm mais facilidade para escrever, né! Em relação aos gêneros textuais, como no primeiro ano a gente trabalha mais é a interpretação ou aquelas objetivas de marcar x, a gente vai marcando

junto, mas eles já fazem as interpretações orais, tranquilo, sem dificuldades

(P1 – 1º ANO, 26/06/2018). [...] líamos historinhas, depois questionava,

fazia perguntas para a interpretação oral. (P1 – 1º ANO, 26/11/2018). A despeito dessa declaração, a prática indicou inexpressivo trabalho com questões inferenciais. Em relação às maneiras como as atividades foram desenvolvidas nos dias observados, na turma de 1º ano houve seis passagens em que a docente fez a leitura de histórias para os estudantes e, em seguida, realizou momentos para que eles falassem acerca delas. Um exemplo é o do episódio em que contou a história: O livro da família16, exibindo-a por meio de cartazes ilustrados.

O livro aborda assuntos polêmicos, tais como adoção, diferenças raciais, culturais e sociais. Ao descrever sobre as famílias de diversos animais, mostra as diferentes maneiras de ser uma família; todavia, todas elas têm algo em comum. As crianças ouviram e, em seguida, participaram à medida que a professora os questionava. Embora a mestra se dirigisse ao coletivo, nem todas comentaram:

P1: Vocês vivem com o pai e a mãe de vocês? A1: Eu moro com meus pais e com minha avó.

P1: Qual foi a família apresentada como grande no livro? A2: A dos coelhos.

P1: Qual era a família em que todos se abraçavam? A3: A família dos ursos.

P1: Quando é que as famílias ficam tristes? A4: Quando perdem alguém, tia.

(P1 - 1º ANO, 2º DIA – 15/03/2018).

Algumas vezes, as respostas ficaram meio divididas; porém, a maioria foi respondendo oralmente, de acordo com a história. Neste extrato, percebemos o destaque para as habilidades de compreensão por meio de perguntas de fácil localização, ou seja, aquelas cujas respostas estão explícitas, na superfície do texto. Todavia, as questões de opinião ou crítica/avaliativa, também foram contempladas; no entanto, a compreensão restringiu-se à dimensão oral.

No momento da compreensão textual, por vezes, alguns níveis ou etapas foram silenciadas. Determinados docentes contentam-se em perguntar ao leitor sobre os elementos de fácil localização; se gostou ou não do texto e o porquê, raramente é respondido.

Em outra ocasião, a P1 apresentou às crianças alguns vídeos musicais com a intenção de explorar o projeto Água, desenvolvido por toda a escola naquela ocasião. Um dos vídeos era a canção que contava a história da Gotinha Plim, Plim17. Após assistirem ao vídeo musical, a

16 PARR, Todd. O livro da família. 1ª Edição. São Paulo: Editora: Books, 2003. 17

docente abordou o conteúdo de forma expositiva para as crianças, em seguida, propiciou algumas atividades de compreensão, num primeiro momento oralmente e, depois, por escrito:

P1: Gostaram dos vídeos que assistimos? Das músicas? Todos: Sim.

P1: Como era o nome da gotinha? Todos: Plim! Plim!

P1: Onde ela vivia? Todos: No céu.

P1: Ela caiu em cima de quê? Todos: Da rosa vermelha. P1: A rosa vermelha fez o quê? Todos: Sentiu cócegas e riu. P1: Como ocorre a chuva?

Todos: As nuvens ficam pesadas, escuras e daí chove.

(P1 - 1º ANO, 3º DIA – 20/03/2018).

A compreensão escrita da letra da música foi feita em folha xerografada. A professora explicou que iriam marcar SIM ou NÃO. À medida que ela lia as perguntas, as crianças foram orientadas a acompanharem a leitura e, em seguida, marcavam o X na opção correspondente. Vale ressaltar que na atividade das crianças constavam as frases e/ou questões escritas. Foram cinco questões:

A gotinha Plim, Plim vivia no céu? A gotinha não queria ir para a Terra? A rosa chorou com a gotinha Plim, Plim?

Plim, Plim molha o solo e ajuda a raiz em seu trabalho? O sol forte sugou todas as gotinhas da Terra?

(P1 - 1º ANO, 3º DIA – 20/03/2018).

A P1, após proporcionar às crianças, conforme explicitado na seção anterior, o conhecimento da fábula: O camelo, o burro e a água, realizou algumas questões explícitas, na modalidade oral. Consideremos como sucedeu a leitura textual:

P1: Quem são os personagens dessa história? Todos: O camelo e o burro.

P1: Quando é uma história de animais, chamamos de fábula. Então é um gênero textual “fábulas”. Quem usou a água corretamente?

Todos: O camelo.

P1: Quem usou a água de maneira errada? Todos: O burro.

P1: Quem aqui na escola usa água e deixa a torneira ligada? Todos: Eu não.

P1: Quando vemos alguém desperdiçando água, vamos lá e pedimos para fechar?

Todos: Sim.

P1: Quando vamos ligar a torneira para lavar as mãos e escovar os dentes, precisamos deixar a torneira aberta?

P1: Eu já vi alguém fazendo isso...

A1: Eu vi a torneira aberta e fui lá e desliguei.

P1: Quando vamos tomar banho, como devemos fazer? Todos: Ensaboamos e fechamos o chuveiro.

P1: No banho, precisamos lavar que partes do corpo?

Todos: Pescoço, o corpo todo. As axilas (Foram falando todas as partes do corpo).

P1: Podemos andar com as unhas sujas? Todos: Não.

P1: E o pé? O que devemos fazer?

Todos: Esfregar. Nas unhas, passar a escova.

P1: Nós já falamos isso outras vezes. Tem gente que está vindo para a escola sem tomar banho...

Todos: Eu não, eu não...

P1: O camelo e o burro utilizavam a água para quê? Todos: Lavar a louças, fazer café, aguar as plantas.

(P1 – 1º ANO, 8º DIA – 10/09/2018).

Nos dois momentos apresentados, as crianças não tiveram a oportunidade de realizar inferências. Mesmo se tratando de uma turma de 1º ano, concordamos com Brandão (2006), ao realçar que a seleção, o repertório textual eleito para o trabalho em sala de aula propicia várias alternativas de exploração da compreensão, inclusive a inferencial. A condução de um trabalho oral e, progressivamente, com o uso da escrita, é crucial para que os estudantes sejam inseridos nessa prática, a fim de alcançarem uma compreensão do conteúdo implícito no texto.

Como vimos, além do nível de leitura inferencial, o nível de opinião, as características do gênero e a compreensão escrita não foram contempladas nesta aula. Neste momento, ela apenas teceu com os estudantes considerações interdisciplinares acerca do uso da água. Significou a atividade, acionando os conhecimentos apreendidos por eles durante o período em que abordou o tema, não favorecendo a compreensão plena do texto trabalhado. Entretanto, não se compreende um texto naturalmente, através de sua leitura, já que ela depende da construção de sentidos, conforme atesta Brandão (2006).

Além de não propiciar, habitualmente, essas atividades aos estudantes, não se atentou para as ricas possibilidades que o texto permitia, desconsiderou um momento propício para a interação dialética texto-leitor, o despertar da criatividade, da criticidade e a exploração dos elementos explícitos revelados pela relação imagem/interpretação, traduzido em mensagens pelas crianças. Isto porque tanto os textos verbais como não verbais são objetos de leitura.

Assim, para desenvolver a inferência na leitura, o estudante carece de interagir com a escrita, associando as informações explícitas aos seus conhecimentos prévios ou conhecimentos de mundo, fazendo conexões com aquilo que está sendo lido e com o que está por trás do texto. Desta forma, para interpretar uma informação que não está explícita no

texto, utilizamos, também, as pistas fornecidas pelo texto para lermos as entrelinhas, o que significa alcançarmos o que não está escrito (o implícito), preenchendo os vazios deixados no texto.

Variadas são as probabilidades cognitivas de trabalhar com as informações, por isso é adequada a mediação do professor, conforme defende Kleiman (2016). Ao realizar a antecipação ou previsões de informações, ativamos conhecimentos prévios e isso contribui para verificarmos hipóteses, como vimos anteriormente, no eixo oralidade. Elas são estratégias que o docente pode ensinar aos alunos para favorecer a compreensão leitora.

Apreendemos, aqui, que a P1 valeu-se de formas singulares de consumo. Ao estudar determinados temas com os estudantes, silenciou o ensino de determinada estratégia de compreensão textual (CERTEAU, 2014). Por outro lado, dedicou espaço em sua prática para a exploração desse campo de ensino de língua, favorecendo, sobretudo, a apreensão de informações explícitas nos textos enfocados.

Contudo, ao não propiciar frequentemente a identificação de elementos implícitos, não beneficiou a interação plena texto/leitor, ao mesmo tempo, não se atentou para seus próprios saberes, conforme sua declaração nas entrevistas diante do previsto nos documentos oficiais, ao expor que as crianças atingiam os três níveis de compreensão.