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3. Formação experiencial

4.2. A prática dos afetos e das emoções

As emoções são consideradas a primeira linguagem do ser humano, a primeira forma de que dispõe para comunicar com o mundo (Oatley & Jenkins, 2002). Embora seja universal, as pessoas diferenciam-se pela capacidade de regular as suas emoções (Lopes, Brackett, Nezlek, Schütz & Salovey, 2004). As emoções têm sido alvo de diversos estudos, apesar de só recentemente terem ganho maior relevância. Segundo Oatley & Jenkins (2002), já no século VI a.c., o filósofo chinês Lao-Tzu acreditava que as emoções, fazendo parte do pensamento humano, deveriam ser alvo de atenção. Alguns séculos mais tarde, o grande filósofo grego Aristóteles, lançou alguns pilares da psicologia das emoções, pois acreditava que, aliadas à ação, advinham daquilo em que cada um acreditava.

“as emoções são todos os sentimentos que mudam [as pessoas] de forma a afetar os seus julgamentos e são também assistidas pela dor ou pelo prazer. Esses são a Ira, a piedade, o medo e outros, com os seus opostos” (Oatley & Jenkins, 2002, p.33)

Oatley e Jenkins (2002) sintetizam vários autores e perspetivas relacionados com as emoções, ao longo dos tempos. Para Platão, as emoções eram como “drogas, que corrompem o raciocínio” (ibidem, p.35) e interferem com a razão, pelo que deveriam ser eliminadas (Silva, 2002). Platão sugeria uma ida ao teatro como catarse das emoções, eliminando-as. Para Cícero, uma vida equilibrada só seria possível com base no equilíbrio das emoções. Segundo Rosseau, era através das emoções que pode guiar-se a forma de estar e de ser. Para Descartes, a melhor compreensão das emoções que ocorre no aspeto meditativo de nós mesmos, é a “alma”. Simultaneamente, estão intimamente ligadas ao corpo, por exemplo, no choro e no riso associam-se ao ritmo cardíaco mais acelerado (ibidem, p.37). Se as perceções fornecem ferramentas importantes para conhecer o mundo exterior, as emoções oferecem ferramentas para compreendermos a alma. Sem o total controlo pelo raciocínio, as emoções podem ser reguladas pelos pensamentos (ibidem, p.37). De acordo com Espinosa, as emoções estão fortemente ligadas à Natureza, baseando-se em formas de pensar; “para compreender as nossas emoções e as suas origens devemos libertar-nos da servidão” (ibidem, p.39). Ou seja, compreender e aceitar as nossas emoções é um processo libertador.

É a partir do século XX que o estudo das emoções se desenvolve. Os fundadores da Psicologia, da Fisiologia e das Ciências Sociais tentam contribuir ou refutar as teorias existentes, através de investigações importantes. Arnold e Gasson (cit. por Oatley & Jenkins, 2002) consideram que as emoções resultam de apreciações que o ser humano faz dos eventos. A pessoa aproxima-se do

171 objeto que considera adequado ao seu “eu” e afasta-se, caso considere o objeto inadequado ao seu “eu”, o que conduz ao conceito de “emoções positivas” e “emoções negativas”. Logo, as emoções são essencialmente relacionais.

Nos nossos dias, poucos especialistas negam que o fenómeno das emoções deriva das ações neuronais e químicas do cérebro, considerado-as “a base das emoções” (Oatley & Jenkins, 2002, p.44). Damásio (2000, p.75) aponta duas funções biológicas das emoções: (1) a produção de uma reação específica para a situação indutora; (2) a regulação do estado interno do organismo. Assim, as emoções são respostas a estímulos, internos ou externos, que ajudam a regular a sobrevivência do ser humano.

“a palavra emoção traduz, em geral, à mente uma das seis emoções ditas primárias ou universais: alegria, tristeza, medo, cólera, surpresa ou aversão.” (Damásio, 1999, p.71)

Mas Mesquita e Frijda (1994) acrescentam, na sua definição de emoção, o fator social, referindo que a expressão das emoções tende a surtir reações nos outros. Lopes, Brackett, Nezlek, Schütz e Salovey (2004) vincam a importância das emoções para a interação social, referindo o seu papel determinante no comportamento humano, com funções sociais, que poderão facilitar (ou não) a interação com o outro. Greenberg (2008) chega até a atribuir às emoções a responsabilidade pelo significado que damos à vida.

Sem uma definição comummente aceite de “emoção”, vários são os contributos de diversos autores, em diversos campos de estudo para a sua definição. Assim, e principalmente devido aos esforços feitos pela Psicologia, as emoções são atualmente consideradas fundamentais e necessárias à sobrevivência humana, consideradas estágios primitivos do indivíduo, inerentes ao ser humano, por norma acompanhadas por um comportamento físico e retratadas como estados temporários, devido a uma resposta biológica orgânica.

Mas a emoção é indissociável da razão (Goleman, 2012). Como característica do ser humano, universal e transcultural, a expressão emocional pode ser condicionada pela interação cultural e social. Quer a cultura, quer a relação com o outro (Blanco 2004b) influem no comportamento emocional. Goleman (2012) explica que as diferenças na forma como expressamos as nossas emoções são consequência da nossa cultura e da própria experiência de vida. Damásio (2000) defende que, quando pensamos, fazemo-lo com o corpo e as emoções. O raciocínio não existiria sem emoções e as mesmas estruturas cerebrais necessárias para desencadear uma emoção estão envolvidas no desenvolvimento do raciocínio. “a emoção faz parte integrante dos processos de raciocínio e tomada de decisão, para o pior e para o melhor” (Damásio, 1999, p.61). Damásio (1999) acredita que a as emoções, quando bem dirigidas, poderão ser um grande sistema de apoio à razão, sem o qual a razão não funcionará eficazmente. Reprimir a expressão de uma emoção é um gesto parcial, porque não é possível na totalidade. O que o ser humano consegue é desenvolver a capacidade de encobrir ou disfarçar a sua manifestação externa (Branco, 2004a). Também Goleman

172 (2012) salienta constantemente o papel fundamental que as emoções representam na vida, defendendo que os seres humanos devem, em grande parte, a sua existência às emoções.

“guiam-nos quando temos de enfrentar situações e tarefas demasiado importantes para serem deixadas ao cargo do intelecto [e acrescenta que] uma visão da natureza humana que ignore o poder das emoções é tristemente míope” (Goleman, 2012, p.26)

Ekman (2003) demonstra que a qualidade de vida é fortemente influenciada pelas emoções, fazendo a diferença na forma como se encara a vida e nos relacionamos com o outro. Os afetos são um combinado de reações que unem as pessoas entre si e até às coisas, em redor. E é esta ligação direta às emoções que dificulta a sua definição. Mas Wallon (1968) faz uma útil distinção entre emoção e afetividade. A afetividade goza de uma natureza mais ampla, traduzida numa maior série de manifestações, que incluem sentimentos e emoções. Por seu lado, Golse et al. (2005, p.28) apontam para a dualidade do termo “afeto”, nomeadamente para os aspetos qualitativo e quantitativo, na medida em que “é uma tonalidade emotiva mais ou menos intensa no plano energético”. Amado, Freire, Carvalho e André (2009) defendem que o conceito de afetividade apresenta vários sentidos, desde definições conducentes a sentimentos de ternura, apego, empatia, amizade, amor e carinho, a outras, muito diversas, sublinhando as “que apontam para atitudes de respeito, de empatia, de abertura ao outro, e que se prendem com sentimentos (bem-estar subjectivo) e emoções (alegria, satisfação, confiança, sentimento de si)” (ibidem, p.77). O afeto relaciona-se, por exemplo, com a ideia de impulso instintivo ou processo de descarga instintiva. Mas Maslow (1971), na sua teoria da hierarquia das necessidades, destaca a importância dos afetos para o ser humano. Refere “a necessidade de realização pessoal, antecedida pela necessidade de autoestima e esta pela necessidade de amor e sentimento de pertença. A base é a necessidade dos aspetos fisiológicos” (ibidem, p.209). Sabendo, à partida, que o ser humano é, desde logo, um ser social, os vínculos afetivos encontram-se presentes do nascimento à morte, ampliando-se progressivamente, ao longo da vida, e acompanhando o crescimento humano. “deve ocorrer algum relacionamento logo no início da vida da criança se se quiser que esta seja capaz de, mais tarde, formar vínculos significativos” (Davidoff, 1983, p.98)

Na senda de Vygotsky (cit. por Almeida, 1999), que atribuiu grande enfoque às interações sociais e defendeu que é através delas que o ser humano constrói a sua maneira de ser, moldando as suas atitudes, Glose et al. (2005) defendem a necessidade de vinculação afetiva, por ser fundamental para o desenvolvimento da personalidade e a socialização, já o ser humano é um ser social, que se desenvolve em interação com o meio, logo, com o outro, que faz parte desse meio. Portanto, as emoções são, fundamentalmente, impulsos para agir, traduzidas em formas de “planear” como se pode enfrentar a vida. Todas as emoções sugerem uma ação e causam diferentes reações no corpo. Segundo Goleman (2012, p.28), cada emoção “prepara o corpo para um tipo de resposta diferente”.

173 Tommasi (2009) compara a necessidade de afetos, para o ser humano, com a necessidade de água para a terra e do sol para as plantas.

“A necessidade de afecto para a pessoa humana é semelhante à necessidade de água para a terra, de sol para as plantas, de asas para os pássaros. Sem afeição, parecemos um céu nocturno sem o brilho das estrelas. Todos temos capacidade para amar e sermos amados. Estas potencialidades precisam de ser desenvolvidas.” (Tommasi, 2009, p.13)

Vários estudos dividem as emoções em categorias, agrupando-as em “emoções básicas ou primárias” (Moreira, 2010) ou em “famílias de emoções” (Ekman, 2003, p.75), agrupadas de acordo com o seu nível de relação, as suas variações, mutações e tonalidades. Oatley e Jenkins (2002) e Moreira (2010) são alguns dos autores que defendem dois tipos de emoções: (1) as negativas, que causam sensações de mal-estar ou ameaçam a autoestima, como o medo, a tristeza e a cólera, entre outras; e (2) as positivas, que contribuem para a melhoria da autoestima e a sensação de bem-estar. Mas Ekman (2003) alerta para dois tipos de problemas nessa distinção: ignorar algumas diferenças nos fatores que desencadeiam este tipo de emoções e a forma como as pessoas reagem às mesmas; e generalizar erradamente, pois não se pode considerar que sempre que se sente este tipo de emoções, as possamos chamar de desagradáveis. Por isso, defende a análise de cada uma das emoções por si e não agrupadas.

As emoções básicas têm uma função vital para a nossa sobrevivência (Goleman, 2012), até porque todas as emoções desencadeiam alterações em quatro níveis: (1) físico ou fisiológico, (2) emocional, (3) cognitivo e (4) comportamental. Estes quatro níveis condicionam a forma como se perceciona o estímulo e como se responde a ele (Moreira, 2008, 2010, 2011; Branco, 2004b). Vários investigadores (Sternberg, Goleman & Mayer, entre outros) defendem teorias acerca da valorização das inteligências múltiplas, rompendo com os paradigmas tradicionais, que ainda se centram na tradição do QI, porque existe inteligência para além do QI (Branco, 2004a). Em 1990, Salovey e Mayer avançaram com uma primeira proposta para a designação de “Inteligência Emocional”, para descrever a forma de conhecimento, compreensão e regulação emocional (Goleman, 2012). As aptidões emocionais básicas podem ser aprendidas e melhoradas, mais até que o próprio QI (Goleman, 2012), porque “inclui o autocontrolo, o zelo e a persistência, bem como a capacidade de nos motivarmos a nós mesmos” (ibidem, p. 20). Inclui, ainda, um conjunto de características, que podem ser ensinadas, permitindo que cada um rentabilize e utilize o seu potencial intelectual.

“a capacidade de persistir a despeito das frustrações; de controlar os impulsos e adiar a recompensa; de regular o seu próprio estado de espirito e impedir que o desanimo subjugue a faculdade de pensar; de sentir empatia e de ter esperança” (Goleman, 2012, p.54)

174 A inteligência emocional permite o domínio do impulso emocional: “ler os sentimentos mais íntimos de outra pessoa; saber gerir as nossas relações” (ibidem, p.64). Goleman (2012) explica que saber gerir as nossas relações é ter a rara capacidade de “zangar-se com a pessoa certa, na justa medida, no momento certo, pela razão certa e da maneira certa” (Aristóteles, cit. por Goleman, 2012, p.21). Este “modelo” de inteligência situa as emoções no núcleo das aptidões para viver, pois uma pessoa emocionalmente competente dispõe de uma “alta percepção daquilo que consegue ou não controlar” (Branco, 2004b, p.49) e tem consciência dos seus sentimentos para, se necessário, ter a capacidade de (se) acalmar, ao reconhecer sinais de aviso.

E “se expressarmos todas as emoções conforme as experienciamos, seremos punidos pelo exterior, se as negarmos ou reprimimos, emergem de uma forma ou de outra…através de problemas psicofisiológicos, donde a necessidade de educar as emoções” (Jung, cit. por Branco, 2004b, p.50)

A inteligência emocional emerge da ligação entre sentimentos-caráter-instintos morais (Branco, 2004b). As decisões na vida, mesmo as mais importantes, são marcadas pelas nossas posições éticas, assentes em capacidades emocionais implícitas. Cabe à formação docente trabalhar a capacidade de identificar as emoções; reconhecê-las (em si e nos outros); e ser capaz de lidar com elas, ou seja, fazer uma regulação emocional efetiva. Moreira (2008) defende que devem ser tomadas medidas para três tipos de alfabetização, sendo a terceira a que o autor intitula de “Alfabetização Emocional”: “fazer com que todos os indivíduos da sociedade saibam reconhecer, ler e gerir as emoções, sentimentos e pensamentos” (Moreira, 2008, p.17). Moreira (2008) justifica: lidar com as emoções, de forma a aumentar o bem-estar e o desenvolvimento pessoal e profissional, é um facto vantajoso para a sociedade, pelas menores hipóteses de comportamentos desviantes. Quem compreende e lida com os seus estados emocionais tende a apresentar melhores relações com os outros e níveis mais elevados de satisfação, o que se repercute nas mais diversas áreas da vida. Conhecer as emoções e o que elas despoletam, no momento em que são sentidas, permite abarcar uma maior liberdade para melhor resolver determinadas situações. Conhecer as emoções permite, também, respeitar o que se sente (deixando-se sentir).

Um dos focos da formação contínua de professores deveria ser a regulação emocional, capacitando os docentes para regular impulsos e emoções, que podem causar desconforto emocional e intolerância à frustração (Moreira, 2008, p.48). Moreira (2010) refere-se à capacidade de “ajustar” e “acertar” a experiência emocional. “o que estamos a sentir, a vivenciar, a experimentar (…) ajustar àquilo que for adequado para cada situação.” (Moreira, 2010, p.34). Acresce que a inteligência emocional permite, também, reconhecer e valorizar o outro como ser emocional, favorecendo comportamentos altruístas e de respeito pelas emoções alheias, permitindo o desenvolvimento da empatia, que, segundo Branco (2004b, p.62), “passa por um fenómeno de partilha”.

175 Embora se verifique já uma maior valorização das inteligências múltiplas e um maior empenho no seu desenvolvimento, particularmente no que concerne à inteligência emocional, a escola ainda persiste em “atrofiar” inteligências de alguns alunos e de alguns pares profissionais. Este fator comprova-se pela valorização da inteligência de tipo analítica. Evitar esse atrofiamento, depende do clima criado pelos próprios professores, com os pares e os seus alunos. “ganhar confiança em si próprias, nas suas potencialidades, e [a] incentivá-las a desenvolver todas as inteligências e não apenas uma pequena parte delas” (Branco, 2004a, p.90).

Goleman (2012) explica que grande parte dos problemas da Educação contemporânea residem na supervalorização do racional. “é aí que reside o problema: a inteligência académica não dá praticamente qualquer espécie de preparação para o tumulto – ou as oportunidades – que as vicissitudes da vida nos trazem” (Goleman, 2012, p.56). Além disso, aprender emocionalmente desequilibrado é uma dificuldade que advém da influência neuronal, pois o poder das emoções perturba o próprio pensamento. A “memória de trabalho” define a capacidade de atenção que mantém na mente os factos essenciais para executar uma tarefa ou resolver um problema. O córtex pré-frontal é a região do cérebro responsável pela “memória do trabalho”. Mas os circuitos que ligam o cérebro límbico aos lóbulos pré-frontais significam que os sinais de uma emoção forte podem criar uma estática neuronal, impedindo a capacidade do lobo frontal de manter essa memória (Goleman, 2012, p.49). Portanto, essa valorização tem sustentação científica: “o intelecto não pode funcionar no seu melhor sem a inteligência emocional” (Goleman, 2012, p.50)

Face às evidências, a formação docente tem de valorizar a inteligência emocional e os benefícios que advém da capacidade de encontrar um equilíbrio entre inteligência racional e inteligência emocional. Ou seja, desenvolvendo-a desenvolve-se a capacidade intelectual. A importância dos componentes emocionais, afetivos e intuitivos na edificação do conhecimento apontam para o corte com certos medos incutidos pela sociedade. O que sabemos, sabemo-lo com o nosso corpo inteiro, com a nossa “mente crítica”, mas também com os nossos sentimentos e as nossas emoções (Queirós, 2012). Isto é, aprendemos a reprimir as emoções, em vez de falar sobre elas, pois a inteligência emocional ainda é “tabu” em Portugal. E o mais perigoso é que a constante repressão emocional, socialmente imposta, pode acionar situações de depressão (Goleman, 2012) e de insucesso académico-profissional. A importância das relações sociais e afetivas, na Educação, é incontestável (Fernández, 1991; Piaget, 1973; Vygotsky cit. por Oliveira, Mello, Vitória & Ferreira, 1992). Para Vygotsky (cit. por Oliveira et al., 1992), o ser humano constrói-se nas suas relações e trocas com o outro e a qualidade dessas experiências interpessoais e de relacionamento delimitam o seu desenvolvimento, incluindo o afetivo. Piaget (cit. por Oliveira et al., 1992) salienta que é nas vivências que o ser humano se concretiza com os outros, superando a sua fase do egocentrismo, edificando a noção do “eu” e “do outro”, como referência. Para Fernández (cit. por Oliveira et al., 1992), a primazia da troca social é da Educação e o alargamento dos vínculos emocionais e afetivos vai dos educadores-pais aos professores, num vínculo entre ensinante-

176 aprendente, para que haja aprendizagem.

“Não aprendemos de qualquer um, aprendemos daquele a quem outorgamos confiança e direito de ensinar” (Fernández cit. por Oliveira et al., 1992, p.52). “a consideração sócioafectiva do ensino ainda é mais complexa, já que pelo seu dinamismo, adequação permanente e transformação exige uma singular preparação para o autoconhecimento e para a construção de climas plenificadores das relações humanas” (Medina cit. por Vilar, 1994, p.66)

Na mesma senda, Queirós (2012) argumenta uma urgente formação dos professores nesta área. Muito mais do que aprendizagens instrumentais, intelectuais e profissionais, é um direito que deriva do interesse pessoal e social, sobre todas as aprendizagens necessárias ao desenvolvimento de outras dimensões da personalidade, física, afetiva, estética, ética, cívica, e deve realizar-se sem discriminação, instrumentalização ou violência, para alimentar o desejo de aprender e para que as aprendizagens tenham sentido e utilidade (Monteiro, 1998). Apesar de, na maioria dos diferentes cargos, a inteligência geral constituir o maior preditor de desempenho profissional e produtividade, não se pode negligenciar o facto de que o valor das pessoas numa organização não se reduz ao seu desempenho objetivo, ou às suas capacidades técnicas necessárias para a execução de determinado ofício. Também devem ser levadas em conta outras qualidades, não menos essenciais: a confiança e a iniciativa, além das suas habilidades para trabalhar e conviver com outros.

Com base nesta premissa, tem sido apontada uma série de competências emocionais e sociais, precursoras cruciais do sucesso ocupacional (Cooper & Sawaf, 1997; Goleman, 1998; Matthews, Zeidner & Roberts, 2002). Estas competências envolvem a: (a) autoconsciência emocional (insights psicológicos, reconhecimento de emoções e sentimentos próprios e alheios); (b) capacidade de identificar as necessidades dos outros e responder adequadamente e (c) capacidade

de regulação emocional. Desta forma, tem-se postulado que a inteligência emocional apresenta

validade preditiva para uma série de comportamentos organizacionais, num nível superior ao da inteligência (Cooper & Sawaf, 1997). Ela influencia a habilidade de lidar de forma efetiva e adaptada em situações de pressão ou ambientes constrangedores. Similarmente, Salovey, Bedell, Detweiler e Mayer (2000) argumentam que pessoas emocionalmente inteligentes são mais bem- sucedidas na resposta a situações de stress, porque são mais capazes de avaliar as emoções e regulá-las. Além disso, a capacidade de compreender os outros é importante na gestão afetiva (Goleman, 1998). Embora envolva capacidades técnicas, inclui também capacidades emocionais; e a posse dessas habilidades combinadas fornece informações relevantes para otimizar a execução dos trabalhos organizacionais (Matthews et al., 2002). Da mesma forma, Mayer, Salovey e Caruso (2000) sugerem que a inteligência emocional pode contribuir para comportamentos organizacionais, especialmente no desempenho profissional e nas relações interpessoais estabelecidas no ambiente de trabalho. Day e Carroll (2004) afirmaram que o sucesso no trabalho

177 envolve, além do trabalho propriamente dito ou desempenho da tarefa bem-sucedida, o desempenho de outros comportamentos considerados relevantes para um grupo ou organização. Já em 1964, Katz (cit. por Matthews et al., 2002) havia referido que o sucesso no trabalho seria também determinado por comportamentos que promovessem a ajuda mútua entre colegas e a própria instituição, criando um clima organizacional positivo. Mayer et al. (2000) atestam que pessoas emocionalmente inteligentes estão mais aptas a identificar o estado emocional dos seus colegas, clientes e superiores, além de responderem de forma mais apropriada às suas perceções. São mais hábeis para conjugar grupos e promover cooperação, sendo mais empáticas (Ciarrochi et al, 2000). Portanto, mais inclinadas a adotar a visão da organização e agir de forma benéfica para a empresa (Abraham, 1999). Giles (cit. por Mayer et al., 2000) encontrou correlações positivas entre os aspetos de envolvimento organizacional dos subordinados e a inteligência emocional dos supervisores. Na perspetiva de Amado, Freire, Carvalho e André (2009), as práticas educativas não devem descurar uma “afetividade individualizadora” e um “cuidado personalizado”.

“a Educação constitui-se como um campo onde as dimensões ética, política, científica, experiencial, emocional e afectiva terão, forçosamente, que se articular de um ponto de vista prático para a realização plena de cada um e do universo dos seres humanos.” (Amado, Freire, Carvalho & André, 2009, p.58)