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3. Dimensões da profissão docente

3.2. Afetiva e emocional

Os valores afetivos no processo de ensino-aprendizagem são de crucial importância e, longe de linearidade, suscitam dilemas de caráter ético, que decorrem também da relação do professor com a necessidade de manter a disciplina, com o desenvolvimento curricular, com a escola, com o ministério da educação, com a profissão, com as famílias e consigo próprio (Estrela, 2010). Segundo Seibert, Nascimento, Vilani, Silva e Brancer (2006), a aprendizagem é um processo evolutivo, que depende e muito do relacionamento do aluno com a aprendizagem e com a figura do professor. Ensinar não se resume a uma tarefa objetiva e concreta, mas implica vivências, experiências interativas e trocas recíprocas entre aluno-professor, num ambiente favorável. Assim, o professor é o grande estratega, com conhecimento do seu espaço de atuação para decidir como atuar, saber onde quer chegar e com que elementos pode contar.

“O professor é responsável pelo ambiente de sua sala de aula, ele deve cuidar para oportunizar a manifestação dos melhores pensamentos e de sentimentos nobres, pois, assim a criança se sentirá atraída pelo estudo, porque se encontrará fortalecida. Este preparo começa na mente do docente, que deve ordenar seus pensamentos, habituar o uso da reflexão antes de atuar com o aluno e fazer as tarefas com gosto. É preciso tornar tudo estimulante, usar da correção individualmente e em forma de raciocínio. Há de despertar na criança o interesse pela própria vida, além de dar elementos para que ela construa o conceito de estudo.” (Vieira, 2006, p.61)

31 Os afetos, etimologicamente um “estado psíquico ou moral (bom ou mau), afeição, disposição de alma, estado físico, sentimento, vontade”, significam atualmente um “sentimento terno de adesão por uma pessoa ou um animal” ou “afinidade, ligação espiritual terna em relação a alguém ou a algo”. Logo, os afetos são fundamentais no processo da aprendizagem, porque afloram a sensibilidade, tornando tudo mais significativo e, portanto, inesquecível (é o caso do efeito surpresa na arrumação diferente da sala; uma mensagem no quadro no início da aula; uma fotografia de grupo no final do período letivo; a ajuda no momento certo; saber ouvir, quando menos se espera). Um afeto na palavra ou no gesto predispõe a aprender, a superar-se e a estimular a vontade de ser mais feliz. Sem o afeto, nada se constrói, porque ele é a manifestação sincera de querer ajudar o outro a ser, criando vínculos entre professor-aluno e professor-professor, os quais pressupõem o interesse e o conhecimento do outro (saber o quê, o porquê e o para quê). Para que o aluno aprenda é necessário que ele queira e se autorize a aprender. Caso contrário, bloqueios de vária ordem impossibilitam a aprendizagem.

Em suma, a construção do conhecimento pelo aluno depende da formação de um vínculo positivo com quem o ensina, pela confiança desenvolvida no processo de ensino-aprendizagem. Neste âmbito, a crítica negativa altera nefastamente o comportamento do aluno, uma vez que o educador lhe revela não acreditar na sua capacidade de aprender e mostra não estar disponível para examinar a melhor peculiaridade do aluno, para o saber motivar. Curiosamente, o mesmo ocorre entre os pares profissionais. Neste sentido, a inteligência emocional destaca as relações afetividade- pensamento-ação, com pertinência funcional, tanto na educação emocional dos professores como na dos alunos, em quatro eixos de análise, de crescente complexidade: (1) da perceção e expressão das emoções, (2) à sua compreensão e análise, (3) passando pela sua regulação reflexiva, (4) até à facilitação do pensamento (Salovey & Mayer cit. por Letor, 2006).

O “modelo misto” de inteligência emocional, desenvolvido por Goleman (2006), apresenta cinco categorias ou áreas-chave: (1) Autoconhecimento (conhecer os próprios sentimentos, avaliar com precisão o que se é capaz de fazer, quando se precisa de ajuda, e quais os próprios nós emocionais); (2) Autogestão (manter as emoções sob controlo, quando se está perturbado, controlando explosões, discutindo calmamente sobre as divergências e evitando atividades geradoras de autopiedade ou pânico); (3) Motivação (para o bem da alegria pessoal, curiosidade ou satisfação de ser produtivo); (4) Empatia (habilidade e prática da leitura das emoções dos outros, para respostas adequadas); (5) Habilidades sociais (aplicar a empatia, saber negociar as necessidades dos outros e equilibrá-las com suas próprias, incluindo encontrar um espaço comum com os outros, gerindo as relações no ambiente de trabalho e ser persuasivo).

Goleman (2006) sugere estratégias para um melhor autoconhecimento das próprias emoções: escrever um diário de emoções, interrogar os outros sobre si, manter a calma e meditar até recuperar o controlo; para a autogestão das emoções: quebrar rotinas e direcionar a atenção do que incomoda, canalizar a energia emocional para algo produtivo, desistir do controlo de impulsos

32 intensos e procurar ajuda profissional; para a motivação: realizar ações que permitam alcançar os objetivos, identificar valores, para manter a coerência no que se acredita, encontrar estratégias para descobrir o que se quer da vida; para a conquista do que se pretende: treino de paciência e persistência. Para o exercício da empatia, já que nas relações estão em causa um conjunto de sentimentos, desejos e medos de si e dos outros, Goleman (2006) propõe também três estratégias: calar e ouvir, sem preconceitos nem ceticismo; experimentar uma posição contrária à própria, assumir a posição do outro ou pontos de vista diferentes; e tentar entender, investigar sobre o assunto e pensar sobre o que os outros dizem, porque a compreensão é fundamental.

No âmbito das habilidades sociais, Goleman (2006) sugere ser capaz de entrar em sintonia com os sentimentos de outra pessoa, entender como ela pensa sobre os assuntos, colaborar e trabalhar em equipa, etc. Todas essas habilidades podem ser aperfeiçoadas, com a ajuda de um mentor. Para resolver conflitos, sugere ainda um percurso: (1) identificar e lidar com as suas emoções (tempo para desabafar antes de retornar ao problema e lembrar o outro, antes de criticá-lo, de que se preocupa com ele); (2) com calma, concordar sobre qual é, verdadeira e realmente, o problema; (3) buscar soluções mutuamente benéficas; (4) terminar em tom cooperativo, com todos os envolvidos em sintoma, pois a última intenção verbalizada deve ser sempre construtiva. Mas Goleman (2006) estudou também a inteligência social que, com um caráter específico, serve a eficácia das relações sociais, através de dois constituintes: a consciência social (empatia primária ou capacidade de estar em sintonia com o outro, por exemplo através da linguagem gestual; a sintonia ou capacidade de escutar, promotora de uma maior conexão, capacidade exigível aos líderes; a acuidade empática ou competência essencial da inteligência social, que permite prever e, por isso, assegura o controlo de situações de conflito e permite estabelecer um clima favorável; a cognição social ou compreensão do modo de funcionamento do mundo social, possibilitadora de corretos modos de agir face às regras implícitas e explícitas); e a facilidade social (sincronia ou interação percetiva adequada de sinais não verbais; a autoapresentação segundo as expetativas quanto ao carisma pessoal; a influência ou orientação das interações sociais com tato e autodomínio; o interesse ou sensibilidade às necessidades e interesses dos outros, para atitudes de apoio e ajuda).