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A competência profissional é uma “mobilização de forma particular pelo profissional na sua ação produtiva de um conjunto de saberes de naturezas diferenciadas (que formam as competências intelectuais, técnico-funcionais, comportamentais, éticas e políticas)” que gera “resultados reconhecidos individual (pessoal), coletiva (profissional), econômica (organização) e socialmente (sociedade)” (Paiva & Melo, 2008, p.360)

Este conceito espelha um repertório de saberes que pautam ações realizáveis em determinadas situações, denotando a natureza contextual da competência (Tigellar, Dolmans, Wolfhage, & Van Der Vleuten, 2004; Schneckenberg, 2006). Por outro lado, o conceito reflete uma disposição ou motivação do sujeito para agir, de modo a obter os resultados pretendidos: o professor esforça-se pela aprendizagem do aluno e, nesse sentido, envida esforços de naturezas diferenciadas. Nesse

74 sentido, Schneckenberg (2007) propõe o conceito de “ação competente”, ou seja, uma ação que combina componentes cognitivos e motivacionais, sendo os primeiros de caráter motivacional, e os segundos, de caráter comportamental. Zabalza (1994) define “competência” como um construto decorrente do conjunto de conhecimentos e habilidades que os docentes necessitam para desenvolver algum tipo de atividade. Aceder ao pensamento do professor é ter “acesso aos construtos que caracterizam a sua visão peculiar da realidade” (ibidem, p.36).

O conceito de competência define-se como capacidade para a ação, de saber mobilizar (Le Boterf, 1994), em situações práticas e em interação, diversos recursos cognitivos (Perrenoud, 1999, 2000). Integra saberes, saberes fazer, capacidades, valores e atitudes para a tomada de decisões e ações face a situações imprevisíveis, de forma rápida e eficiente. E sustenta-se numa dimensão epistemológica: integra múltiplos contributos e o reconhecimento individual do professor, nas suas práticas profissionais singulares, porque expressam na ação, a compreensão pessoal e dialética dos conhecimentos sobre ela, segundo critérios reguladores do quadro de valores que orientam a sua ação (Sá-Chaves, 2000). Associa-se ao domínio da habilidade e das técnicas, mas assume um sentido mais globalizante, por integrar o que faz o professor e a forma como se constrói na sua ação profissional, “a sua forma pessoal de fazer e de ser”.

Competência é “uma conceptualização que estende o olhar ao continuum da práxis humana, enquanto dimensão intencional, deliberada e consciente do sujeito pelo que vem carregada de sentidos e marcada pelas atitudes subjacentes ao quadro de valores pelo qual o sujeito que age se pauta e se rege” (Sá-Chaves, 2000, p.98)

Perrenoud (1993, 1996, 1999b, 2000) questiona o conceito de saber ou conhecimento, enquanto argumento da prática do professor. Os conhecimentos ou saberes são “representações organizadas do real”, que contribuem para a convicção interna acerca do conhecimento da realidade, “estreitamente conectados a uma pragmática”, permitindo agir em conformidade (Perrenoud, 1999a). Principalmente, face à diversidade e complexidade das situações quotidianas. Logo, os saberes ou conhecimentos são representações, de caráter descritivo ou explicativo (integrando saberes eruditos, comuns, de experiência ou simples crença) ou de caráter normativo ou prescritivo (valores, regras, finalidades, modelos), que só importam e significam se tiverem reflexos na prática. Perrenoud (1996) distingue três tipos de saberes: (1) os declarativos; (2) os de procedimentos (explicam como agir, fazer ou ser); (3) as competências (estrutura da ação). Segundo Perrenoud (1993), a complexidade da prática pedagógica força o docente a uma reconstrução diária, pessoal e relativamente intuitiva de (a) uma política de educação; (b) uma ética da relação; (c) uma epistemologia dos saberes; (d) uma transposição didática; (e) um contrato pedagógico; e (f) uma teoria da aprendizagem. Particularmente, obriga-o a uma prática entre a rotina-improviso, entre o previsto-imprevisto, que só será verdadeiramente compreendido segundo uma perspetiva de

75 competência, enquanto “conjunto de recursos que se mobilizam na ação”, que permite compreender como os saberes são mobilizados nela (Perrenoud, 1999a).

As competências são esquemas operatórios de perceção, decisão ou ação e de avaliação, verificáveis em contextos da prática e construídos pela experiência, que sustentam os cálculos mentais e os atos do ator social, maior parte sem consciência, mas que dão consistência ao seu

habitus (Perrenoud: 1993, 1996, 2002). As competências mobilizam saberes-para-a-ação,

relacionados com saberes teóricos que “são críticas, pragmáticas, até mesmo oportunistas” (Perrenoud, 1999b, p.135).

As representações e esquemas complementam-se, operacionalizando a articulação entre “teoria e prática, entre representação do mundo e ação” (ibidem, 1993, p.179; 1996, 1999a) e articulando-se de duas formas: a figurativa e a operatória. As competências remetem para uma “teoria do pensamento e da ação situados, mas também da prática como ofício e condição” (Perrenoud, 2000, p.16). Articulam três aspetos complementares: (1) tipos de situações; (2) recursos mobilizados (saberes, atitudes, saberes-fazer, esquemas de perceção e de avaliação, de antecipação e decisão); (3) natureza dos esquemas de perceção (aspeto mais difícil de descrever, por não ser diretamente observável e só poder ser acedido pelo processo de inferência, a partir das observações das práticas dos professores e dos seus objetivos), que permitem a mobilizar e articular os recursos mais adequados a uma situação. Portanto, as competências integram e mobilizam uma duplicidade de saberes: os objetiváveis e os implícitos, “os saberes de ação e de experiência sem os quais o exercício de uma competência está comprometido” (Perrenoud, 2000, p.18).

À competência é essencial o conhecimento, que sustenta todo o trabalho de análise, compreensão, síntese e crítica, necessários à construção das competências (Perrenoud, 1999a, 2000), proporcionais à complexidade dos problemas e da profissão (Esteves, 2009). Se as competências se definem como “poderes de agir, apoiados em saberes”, condição “de uma ação eficaz” (Perrenoud, 2004), a competência profissional é uma “reflexão crítica sobre a praxis” (Sá-Chaves, 2002). Todavia, Perrenoud (1993, 1996, 1999a, 1999b, 2000, 2004) alerta para o facto de competência não ser garantida só pelo domínio dos saberes.

Ser um profissional competente significa “possuir um vasto e diversificado repertório de conhecimentos e de capacidades (…) [que o professor] toma, executa e avalia as decisões que seleciona, em circunstâncias quase sempre imprevisíveis, de modo a que estas se constituam como soluções adequadas, socialmente legitimáveis e abertas a constantes reajustamentos para poderem garantir a sua responsividade à instabilidade permanente.“ (Sá-Chaves, 2000, p.98).

“(...) ter competência é diferente de ter conhecimento e informação sobre o trabalho, sobre o que se faz. Conhecer implica visão de totalidade, consciência ampla das raízes, dos desdobramentos e implicações do que se fez, para além da situação; consciência das origens, dos porquês e das finalidades. Portanto, competência, pode significar ação imediata, refinamento do individual e

76 ausência do político, diferentemente da valorização dos conhecimentos em situação, mediante o qual o professor constrói conhecimento.” (Anastasiou e Pimenta, 2010, p.134)

Reduzir os saberes docentes a competências é ignorar a amplitude e complexidade que está subjacente a um processo que vai além do saber fazer, um saber epistemológico, reflexivo e construído para, na e com a prática, que se materializa em momentos e espaços sociais, históricos e culturais. Assim, os saberes antecedem e superam as competências que são os resultados de um processo necessariamente sistémico e engenhoso. As competências são um conjunto de saberes e qualidades posto em ação, em situações concretas. Associam-se a toda a formação do sujeito, ao nível formal e informal, integrando a formação de base e a da experiência da ação, adquirida ao longo do tempo, de forma empírica, não sistematizada.

Com base num modelo construtivista de competência (Trépos, 1992), os saberes são socialmente construídos e existem a partir dos trabalhos que os grupos desenvolvem sobre eles. A aquisição de competências é feita ao longo do tempo, na trajetória pessoal, social e profissional e resulta de um processo dinâmico, forjada pelo tempo, ao longo de um percurso feito de experiência, projetos e práticas, estudos e atividades, por aspetos operacionais, afetivos e intelectuais. É uma potencialidade individual, que se pode traduzir num desempenho. No âmbito da formação de adultos, a abordagem das competências centra-se sobre a pessoa e as suas aquisições, valorizando o indivíduo e a sua história singular. Em última análise, inscreve-se num processo de socialização, em que a aquisição de conhecimentos é feita em situação, a partir da estrutura de aquisição do próprio indivíduo, que vai sendo construída por si próprio. As novas competências profissionais são estudadas e referidas por um conjunto vasto de autores. Apesar de denominadas e caracterizadas de forma ligeiramente diferente, são muito próximas na essência. Nos contributos mais significativos, identificam-se três classificações:

(i) as competências genéricas ou transversais - Liétard (2001) aborda o problema das competências relacionado com o reconhecimento dos saberes adquiridos. Atesta existirem "competências sociais, transversais", tais como a iniciativa, a criatividade, a confiança em si, denominadas como "competências genéricas". Casanova (1991), com trabalhos ligados ao reconhecimento das competências genéricas, define-as, citando Mac Ber, como características do indivíduo que acentuam o seu funcionamento eficaz durante a vida, e que determinam um comportamento, mas não são sinónimo dele. Segundo Cleland e Ireland (2002), as competências manifestam-se através de comportamentos reveladores de características pessoais, umas observáveis, outras latentes. Estas definições implicam o reconhecimento de qualidades pessoais que o sujeito desenvolve na sua vida, através de experiências vividas, por oposição à aquisição de conhecimentos, na aprendizagem escolar. Baseada no trabalho de Mac Ber, em 1987, Casanova (1991) identifica onze competências genéricas principais: (1) Espírito de iniciativa (fazer coisas ou propor ações necessárias, sem ser forçado pelos acontecimentos ou antes de ser solicitado por

77 alguém); (2) Perseverança (tentar mais do que uma vez ou de diferentes maneiras, ultrapassar obstáculos que se interpõe a consecução dos objetivos); (3) Criatividade (criar um produto original, imaginativo ou expressivo, aplicável às ideias); (4) Sentido de organização (habilidade para desenvolver planos lógicos, detalhados, a fim de orientar as ações em relação a um objetivo); (5) Espírito crítico (habilidade para pensar de forma analítica e sistemática; aplicar princípios ou conceitos de análise de problemas, a fim de descrever um conjunto de acontecimentos); (6) Autocontrolo (manter-se calmo, com poder sobre os seus meios, em situações emotivas ou stressantes); (7) Atitude de liderança (habilidade de se responsabilizar por um grupo, por uma atividade, e a organizar os esforços coletivos de forma eficaz); (8) Persuasão (habilidade de persuadir os outros ou de obter o seu apoio, com a finalidade de realizar as suas ideias); (9) Autoconfiança (sentimento de segurança ou de certeza nas suas próprias capacidades, habilidades e julgamentos; uma vontade aberta para defender o seu próprio julgamento de valores face a oposição); (10) Perceção e interação nas relações pessoais (habilidade em ler preocupações, interesses e estados emotivos dos outros, reconhecendo e interpretando indícios subtis); (11) Preocupação e solicitude em relação aos outros (preocupação com os outros, pelas suas necessidades e bem-estar, e uma vontade infinda para escutar os seus problemas, encorajá-los e dar-lhes segurança). Este tipo de competências que se desenvolvem a partir de experiências-chave do itinerário pessoal e profissional do indivíduo leva Arnour (1991) a definir competências genéricas como um conjunto de qualidades pessoais enunciadas em termos de “saber-ser”, de atitudes e comportamentos relacionados com a personalidade e não necessariamente ligadas ao exercício de uma função, reconhecendo-lhes transferibilidade e utilidade em diversas funções (no trabalho, na formação, na vida familiar, nos tempos livres, em atividades sociais, etc.).

(ii) atitude de autoformação e "soft skills" - Nyhan (1991) desenvolve o conceito de "da atitude à autoformação”, ou seja, a competência-chave da formação contínua, pelo poder ativo dos indivíduos quando se envolvem e comprometem sistematicamente com a sua experiência, de forma aberta e investigativa, para a entender e dominar. Traduz-se numa atitude de autoformação, que subentende a capacidade que um trabalhador tem de fazer um exame crítico e compreender tudo o que se passa no local de trabalho. Os fatores que guiam todas as outras atividades são a compreensão e o conhecimento prático, traduzidos num julgamento pessoal. As novas competências, que retratam o perfil dos profissionais no futuro, relacionam-se com essa atitude de autoformação: (1) capacidade de tomada de decisões; (2) capacidade de iniciativa; (3) capacidade de planificação; (4) capacidade de comunicação; (5) capacidade de cooperação; (6) responsabilidade; (6) flexibilidade. Essa atitude de autoformação está presente em todas as situações da vida, através de experiências naturais da existência e de situações convencionais de formação, recorrendo continuamente à experiência acumulada pela pessoa. Esta atitude pode desenvolver-se num "meio formador ativo", promotor do desenvolvimento da abertura de espírito.

78 , "...um meio no qual as pessoas são encorajadas a adquirir domínio e compreensão agindo por si próprias e interagindo com outras pessoas, situações ou objectos, fazendo prova de uma atitude de resolução de problemas e de investigação."(Nyhan, 1989, p.5)

Também no âmbito dos trabalhos da EUROTECNET (Nyhan, 1991), as "soft skills" foram listadas como conjunto de competências fundamentais: (1) flexibilidade, (2) adaptabilidade, (3) autonomia, (4) responsabilidade, (5) criatividade, (6) iniciativa, (7) abertura a novas ideias, (8) motivacão, (9) liderança, (10) capacidades de trabalho em grupo, (11) capacidades de comunicação, (12) capacidades de análise, (13) capacidades de aprendizagem.

(iii) as competências de terceira dimensão - Aubrun e Orofiamma (1990) definem como competências de terceira dimensão as que não fazem estritamente apelo às capacidades intelectuais do indivíduo ou às suas capacidades psico-motoras. A terceira dimensão do comportamento da pessoa, o saber-ser ou atitudes socio-afetivas ou características pessoais, agrupam-se em quatro categorias distintas: (1) comportamentos profissionais e sociais (ligados a tarefas concretas de um determinado contexto social ou profissional); (2) atitudes (relacionais e de comunicação; capacidades relativas a autoimagem; capacidades de adaptação e de mudança); (3) capacidades criativas; (4) atitudes existenciais ou éticas. O estudo das “competências de terceira dimensão” (Aubrun & Orofiamma, 1990) sugere a sua análise à luz do habitus (Bourdieu, 1997) e do processo de socialização profissional (Dubar, 1997). Os resultados obtidos reforçam o contexto de trabalho como um autêntico fator de promoção do desenvolvimento das competências. Na perspetiva de Vygotsky (1978), o ser humano desenvolve-se pela interação social. Assim, o desenvolvimento cognitivo mantém uma estreita relação com a situação de aprendizagem que, quando é significativa, estimula e desencadeia o avanço para um nível de maior complexidade, o qual serve, por sua vez, de base para novas aprendizagens. As dimensões relacionais (comunicação, informação, apoio emocional, cortesia, disponibilidade) evidenciam o papel dos contextos no processo de ensino-aprendizagem, na medida em que exercem uma grande influência sobre o sujeito que aprende, promovendo mudanças nos domínios cognitivo, psicomotor e das atitudes, podendo responder a necessidades no trabalho e desenvolver competências relevantes para atividades futuras. Pode considerar-se como uma variável responsável pelas diferenças de comportamento. Segundo Fishbein e Ajzen (1980), as atitudes e as normas podem influenciar o comportamento de forma indireta através da intenção comportamental, o que revelaria uma posição mediadora. À luz da revisão de literatura, os aspetos da socialização e do habitus seriam bastante relevantes para o desenvolvimento das “competências de terceira dimensão”. Nesta perspetiva, o modelo de Nonaka e Takeuchi (1997) evoca quatro processos de criação do conhecimento: (1) socialização, (2) explicitação, (3) combinação e (4) incorporação. Evidencia diferenças fundamentais entre a informação, o conhecimento e a competência, pelo que os autores distinguem o conhecimento explícito do conhecimento tácito. Os comportamentos profissionais e sociais têm

79 como referência tarefas concretas, num contexto social ou profissional, e podem ser estabelecidos de vários modos, nomeadamente a partir da análise de trabalho (decomposição da atividade profissional ou social visada; descrição de um conjunto de sub capacidades que constituem as competências, a partir da decomposição da ação em micro comportamentos, identificando o modelo ideal, numa abordagem do tipo comportamental, das teorias behavioristas); e de situações profissionais bem determinadas (as funções são abordadas do ponto de vista da "organização qualificante", na medida em que é a partir dos novos contextos de trabalho, dos desafios e dos projetos propostos numa organização aberta, que as competências são enriquecidas). As atitudes que, do ponto de vista psicológico integram diferentes dimensões (afetivas, emocionais, cognitivas), originam disposições e conceções próprias, traduzidas em comportamentos. A forma de estar da pessoa.

"As atitudes designam as competências não relacionadas directamente a uma tarefa precisa, mas definem um perfil de comportamento adaptado a um dado contexto profissional e cultural" (Aubrun & Orofiamma,1990, p.22). Ser competente implica trabalhar “(...) em rede, com todos, em qualquer modalidade de ensino, em qualquer lugar. Um professor que consegue enfrentar as diferentes realidades educacionais e adequar suas estratégias de acordo com as necessidades de seus alunos e os suportes tecnológicos que tenha a sua disposição. Um professor para novas educações, que saiba trabalhar em equipes e conviver com pessoas com diferentes tipos de formação e objetivos (alunos, técnicos, outros professores), unidos com a preocupação de oferecer o melhor de si para que todos possam aprender. Um novo professor-cidadão preocupado com sua função e com a sua atualização. Um profissional que conheça a si mesmo e saiba contextualizar as suas melhores competências e seus limites para poder superar-se cada momento. O professor flexível, competente, humano, e compreensivo que o ensino em tempos de mudança está a esperar.” (Kenski, 2011, p.224)

O conhecimento sobre o perfil de competências, além de identificar possíveis tendências individuais de ação, serve de parâmetro para planear programas de capacitação e de ajuda, para decisões estratégicas. Aderir a um modelo de competências pode ser útil para estabelecer objetivos pessoais de aprendizagem docente, com vista à gestão de competências docentes (Tigellar, Dolmans, Wolfhage & Van Der Vleuten, 2004), promover maior consciência do que se sabe e do que não se sabe (Ropé & Tanguy, 2004) e descobrir um rumo para a formação contínua e o desenvolvimento profissional.

Na tentativa de construção de um referencial de competências profissionais ou conjunto estruturado de competências essenciais ao exercício de uma profissão, Paquay (1994) alerta para o perigo da uniformização, de um perfil ideal ou a “robotização da profissão docente”. Paquay (1994) e Paquay e Wagner (1998) defendem uma “integração” das competências em cada um dos paradigmas (comportamental e personalista), articulando as competências profissionais e os diversos aspetos que constituem a profissão de professor. Paquay (1994) reforça as complementaridades

80 potencialmente inovadoras de definir-se “professor”, simultaneamente como artesão, profissional reflexivo, ator social, técnico, mestre instruído e pessoa. Porém, Le Boterf (cit. por Paquay, 1994) advoga que um quadro de competências deve exprimir necessidades individuais de formação, em função das necessidades da organização profissional (não apenas os seus desejos de desenvolvimento pessoal, destituídos das exigências profissionais). Le Boterf (1994) identifica cinco competências profissionais em profissões complexas, relacionadas com o saber, como é o caso da docência: (1) agir com pertinência; (2) mobilizar saberes e conhecimentos dentro do contexto profissional; (3) combinar saberes diversos; (4) aprender a aprender; (5) empenhar-se. Le Boterf (1994, 2000) distingue também os conceitos de competência individual e de competência coletiva, dependendo da participação em redes de conhecimento, integrando trabalhos de equipa, num sistema organizado em rede.

Nesta linha, para uma formação por competências, Nóvoa (2008) apela a programas que se desenvolvam em torno de três competências, relacionadas com o saber: (1) relacionar e relacionar-

se (ser abordado, avaliado ou chamado a dialogar com o exterior à escola - famílias, associações,

empresas e entidades diversas); (2) organizar e organizar-se (saber analisar e saber analisar-se decorre da compreensão do conhecimento profissional como dependente de uma reflexão prática e deliberativa. Um conhecimento, uma dimensão teórica e uma dimensão empírica, que integra um “conjunto de saberes, competências e atitudes, mais (e esse mais é essencial) a sua mobilização numa ação educativa determinada” (Nóvoa, 2008, p.231). Realizar as tarefas atribuídas: utilizar rotinas e esquemas de ação contextualizados; refletir sobre as práticas (e analisar suas consequências); produzir instrumentos inovadores (professor-investigador); estar em desenvolvimento pessoal; ter projeto de desenvolvimento profissional; estar em relação; dominar saberes disciplinares e interdisciplinares, didáticos e epistemológicos, pedagógicos, psicológicos e filosóficos; utilizar técnicas (audiovisuais e outras), aplicar saberes-fazer técnicos e regras formalizadas, comprometer-se em projetos educativos, analisar os contextos antropológicos e sociais das situações quotidianas; (3) analisar e analisar-se. Alega que os professores são, simultaneamente, objetos e sujeitos de formação, e o seu desenvolvimento profissional desenvolve- se pelo trabalho de reflexão individual e coletivo.

Nestas três competências, sustentadas na relação, organização e análise, Nóvoa (2008) defende ser essencial enfrentar e ultrapassar três dilemas relacionados com questões de comunidade, autonomia e conhecimento. Assim, uma escola em diálogo com a comunidade requer professores com participação política no trabalho e com a comunidade, exigindo novas competências profissionais. O trabalho docente é uma “competência coletiva”, de saberes e capacidades, que requere espaços de aprendizagem entre professores, de partilha, troca de saberes e experiências com “possibilidade de inscrever os princípios do coletivo e da colegialidade na cultura profissional dos professores” (Nóvoa, 2008, p.231). Sanches (2004) apresenta três competências identitárias do professor, na sociedade do conhecimento: o conhecimento que se amplia e renova; a promoção da inovação e

81 progresso (criatividade, flexibilidade e adaptabilidade); e a transversalidade, facilitadora da compreensão da diversidade cultural (promover aprendizagens sociais e emocionais; desenvolver uma identidade cosmopolita; aprender a trabalhar em grupo e de forma cooperativa; desenvolver a capacidade de compreensão emocional; continuar as aprendizagens com colegas; estabelecer confiança com e entre todos).

Em suma, destaca-se um aspeto sublinhado por diversos autores (Paquay, 1994; Perrenoud, 2000, 2002): um referencial flexível aos contextos, à pessoa do professor, à evolução do ofício docente e ao emergir de novas competências. Atualmente, o conceito de competências profissionais apresenta quatro traços distintivos: (1) constituídas por recursos diversos, desde disposições inatas a recursos cognitivos; (2) ações contextualizadas; (3) ações de mobilização de recursos decorrentes de redes operatórias; (4) imbuídas de conhecimento e com conhecimento profissional (mesmo que tácito ou implícito), o qual “é ou pode ser fundamento e resultado do exercício de competências, seja para os que se preparam para a profissão, seja para os profissionais já em exercício.” (Esteves, 2009, p.43).