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A proteção social no Brasil: da filantropia à política pública de direitos

CAPÍTULO 1 – O Sistema de Proteção Social: um resgate na perspectiva da

1.5 A proteção social no Brasil: da filantropia à política pública de direitos

A incursão da proteção social na agenda pública brasileira remonta o período Vargas (1930 a 1945) que, mesmo restrita às categorias profissionais, trouxe para o campo da institucionalidade práticas protetivas até então relegadas à filantropia e à benemerência.

Este período foi marcado por intensas alterações na estrutura política, econômica e social brasileira, destacando-se, no campo da economia, o acelerado processo de industrialização, que alterou os padrões de produção e acumulação de riquezas. Esta alteração não representou o desenvolvimento do país, mas sua inserção na divisão internacional do capital na condição de subdesenvolvido, revelando uma singularidade histórica, porque o que era colônia foi transformado em periferia do capitalismo, cuja única função era “formar elementos para acumulação do capital no centro”. (OLIVEIRA, 2003, p. 126).

O compromisso estatal está subjugado aos interesses do capital, alinhando as ações de proteção social a incorporação do trabalhador no sistema produtivo industrial. Sob esta lógica foram criadas, nesse período, as primeiras legislações trabalhistas com a instituição da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), das concepções da Carteira de Trabalho, da Justiça do Trabalho, do salário mínimo e do descanso semanal remunerado.

Estas iniciativas marcaram a intervenção estatal na questão social sob uma nova orientação que, como considera Santos (2012), constituíram um marco em relação ao volume e o perfil diferenciado que essa legislação vai assumir como resposta à “questão social”. Contudo, a preservação dos direitos sociais e a regulação dos contratos de trabalho, por parte do Estado, são identificadas conjuntamente com “o controle ideológico do governo sobre os sindicatos, como corporativismo sindical” (SANTOS, 2012, p. 75).

Esse processo interfere na construção do modelo de proteção social brasileiro, que terminou por se caracterizar como contributivo, meritocrático e particularista, protegendo apenas algumas categorias profissionais, sobretudo aquelas de maior relevância para o setor produtivo.Neste contexto, o sistema de seguridade social brasileiro limitava-se ao segurado, na condição de possuidor de vínculo empregatício, ou seja, para ser assistido, era necessário ter a carteira assinada.

Deste modo, o sistema de proteção social brasileiro assume caráter de seguro social, cujo financiamento prevê a contribuição compulsória do trabalhador, tributos indiretos e subvenções fiscais, por parte do empregador, referendando-se no modelo bismarckiano. Este modelo excluía grande parte dos trabalhadores urbanos sem qualificação para o mercado e os trabalhadores rurais que, neste período, ainda representavam maioria da população.

Somam-se a isto as péssimas condições de vida, sobretudo nos grandes centros, assim caracterizados por Vieira (1995, p. 61 apud SANTOS, 2012 p. 80):

[...] revelou-se haver no Brasil perto de 10 milhões de domicílios particulares (37% nas cidades e 63% fora delas), dos quais nada menos que 7

milhões eram constituídos com madeira, pau a pique ou algo semelhante. Não existiam mínimas condições de conforto e higiene, pois apenas 16% do total de domicílios ocupados no país, possuía, naquela ocasião, água encanada; 25% deles tinha iluminação elétrica e 33% era dotado de aparelho sanitário, achando-se somente 6% dos aparelhos ligados à rede coletora geral.[...] Com o crescimento das principais cidades brasileiras, cada vez mais se configurava a triste opção para o trabalhador urbano: morar em favelas sob os morros, mas no centro, bem próximo ao seu emprego; ou então despender diariamente quatro a cinco horas, indo para sua ocupação e voltando para o subúrbio, onde ele residia de modo nem sempre diferente do favelado. (VIEIRA, 1995, p. 61 apud SANTOS, 2012, p. 80).

Esse quadro revela o agudizamento das expressões da questão social, o que vai demandar para o Estado a implantação de serviços sociais universais e não contributivos que sejam capazes de atenuar os impactos perversos da política econômica sobre as condições de vida da maioria da população. Neste contexto, inscreve-se a política de assistência social como ação pública de proteção social, no âmbito do estado, tendo em vista atender o contingente de pobres que ocupavam os centros urbanos. Conforme aponta Paiva (2006):

o modelo econômico – periférico e dependente, com forte timbre semicolonial – revela uma triste e conhecida situação do país, integrada por um expressivo contigente de trabalhadores informais e de desempregados, para os quais não há acesso aos benefícios pecuniários ou à proteção social decorrente da sociedade salarial e que por isso, estão a demandar um tipo mais amplo de proteção social não-contributivo e incondicional, como os direitos contemplados pela assistência social. (PAIVA, 2006, p. 13).

A estratégia governamental para atender os indivíduos e famílias alijados do processo de trabalho e das seguranças dele decorrentes foi lançar mão das ações da assistência social consolidadas na esfera privada, com a criação da Legião Brasileira de Assistência Social (LBA). Inicialmente incorporada ao Ministério de Previdência Social (1969), e, em seguida, vinculada ao Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (MPAS), desenvolveu um conjunto de ações diversas que, segundo Draibe (1989, p. 135), marcaram a ausência de um conteúdo específico desta política, traço ainda presente na atualidade.

As ações da LBA incluíam programas e auxílios pontuais direcionados à infância, à velhice, aos deficientes e aos indivíduos excluídos do sistema formal do trabalho. Bastante diversa, a LBA empreendia atividades de creche, alimentação, nutrição materno-infantil, assistência jurídica, lazer e programas educacionais e de qualificação profissional, tendo em vista a inclusão dos indivíduos no mercado de trabalho.

Outro aspecto a destacar nesse período é a forma de gerir a Assistência Social, que, mesmo vinculada ao Ministério de Previdência e Assistência Social (MPAS), sob a

coordenação da LBA, a responsabilidade pela execução dos programas e ações ficou a cargo das entidades privadas e da Igreja Católica, através de sistema de convênios, imprimindo e reforçando uma herança conservadora com base na filantropia e benemerência cristã. Na concepção de Ávila (1991, apud MESTRINER, 2010, p. 38), este aspecto significou a legitimação, por parte do Estado, das ações tradicionais das entidades sociais e promoveu sua desresponsabilização, delegando às organizações da sociedade civil a responsabilidade da proteção social, ao tempo que atendia a interesses na difusão da doutrina da Igreja Católica.

A institucionalização da assistência nesse período é revestida pelo o primeiro- damismo, no seu modus operandi, com figura de senhora Darcy Sarmanho Vargas à frente da LBA (1942), o que de fato possibilitou a expansão de suas ações às populações mais distantes dos centros, atingindo uma capilaridade importante no campo institucional e político. De acordo com Torres (2002, p. 24), o primeiro-damismo no Brasil tem uma função política, uma vez que as mulheres dos governantes são chamadas a intervir na questão social, através de estratégias de enfrentamento à pobreza, desresponsabilizando o Estado de garantir à população o acesso a políticas públicas de caráter universal, uma vez que a atuação da primeira-dama se dá no âmbito do voluntariado e da filantropia.

De certo, a presença do primeiro-damismo imprimiu um caráter assistencialista à assistência, de favor às suas ações, contrapondo-se à lógica de direito constituído, sendo assim um entrave a ser superado no campo da Assistência Social, enquanto política pública. (SPOSATI, 2007). Longe de ser extinta e, para surpresa daqueles mais otimistas, atualmente a presença das esposas dos prefeitos à frente das secretarias de assistência social está em 24%6 dos municípios brasileiros, demonstrando o quanto esta prática está impregnada na cultura e na operacionalidade da Assistência Social em nosso país.

Além de emblemático, este elemento causa estranhamento ou perplexidade frente a uma realidade que, para muitos, fora superada dados os avanços que a assistência tem galgado nas últimas décadas, conforme revelado por Vânia Pacheco7: citada por Clarisse Thomé (2010):

Acreditava-se que a presença da primeira-dama (nas secretarias de assistência social) estivesse abolida. Por isso foi uma surpresa grande quando encontramos a primeira-dama como gestora de assistência social em 1.352 municípios. Não estamos desmerecendo a figura da

6 Dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais – Munic, realizada em 2009, pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística – IBGE, com publicação em 2010, demonstra que dos 5.565 municípios do país, 1.352 tinham a primeira-dama na condução da política de assistência social naquele ano.

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primeira-dama. Mas esta é uma prática antiga, que representa uma política assistencialista.

A intervenção da LBA junto às entidades filantrópicas, algumas, capitaneadas pela Igreja Católica, fazendo dessas seus membros e sustentáculos, terminou por definir “a concepção e atuação de organizações privadas e públicas na área da assistência social” (NOZABILLI, 2008, p. 45), estabelecendo uma linha tênue entre estes setores, na qual o Estado continuou tendo um papel de subsidiariedade à frente dessa política.

Cabe aqui reconhecer a importância desse período para a institucionalização da assistência no campo estatal, contudo, é pertinente registrar que a forma como foi engendrada nesse espectro terminou por comprometê-la enquanto política pública estatal, ficando marcadamente caracterizada como clientelista, tuteladora, da benesse e do favor.

Os anos subsequentes à era Vargas não representaram alterações importantes às políticas socais em curso e em especial à Assistência Social, deixando, segundo Santos (2012, p. 77) uma espécie de “vazio”, uma vez que considera como pobres as respostas do poder público ao quadro de intensas mobilizações rurais e urbanas que mais a frente vão desencadear no processo de redemocratização do país.

É no cenário da redemocratização do país, na década de 1980, que se percebe uma mudança de concepção acerca da proteção social brasileira, na qual esta passa a ser engendrada sob o entendimento republicano e universalizante. Nesse terreno ganha destaque a proteção social não contributiva que aos poucos vai se colocando na perspectiva do direito social. Esse período foi marcado por um amplo processo de mobilização popular, que segundo Raichelis (2000):

[...] põe em discussão não apenas o padrão histórico que tem caracterizado a realização das políticas sociais em nosso país - seletivo, fragmentado, excludente e setorizado - mas também a necessidade de democratização dos processos decisórios responsáveis pela definição de prioridades e modos de gestão de políticas e programas sociais (RAICHELIS, 2000, p. 5)

No texto constitucional de 1988, firma-se o compromisso institucional com a proteção social sob uma nova perspectiva embasada nos princípios da universalidade, integralidade e da participação social. Os artigos de 193 a 204 sacramentam esse processo na sua redação, ao estabelecerem que a proteção social brasileira dar-se-á por meio de um Sistema de Seguridade Social composto por três políticas centrais - saúde, previdência e assistência social - formando o que muitos autores denominam de tripé da seguridade social.

Para Sposati, esse processo significou a incorporação no texto da Constituição de 1988 de “formas não monetárias de proteção social, por meio da operação de serviços públicos de saúde e de assistência social na condução de direitos sociais” (2010, p. 26).

No que tange a política de saúde, regulamentada pela Lei 8.080/90, o conteúdo do Sistema Único de Saúde (SUS) já resguardava a organicidade da responsabilidade pública dos três entes federados na provisão de condições para todos, sejam previdenciários ou não previdenciários. Este sistema constitui-se num “conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público.” (BRASIL, 1990).

No que se refere à Assistência Social, a redação constitucional a define como uma política de benefícios e de serviços, o que vai exigir, segundo Sposati (2010, p. 28), uma capacidade gerencial inédita neste campo, como também coloca em evidência as duas formas de proteção social, “a monetária e a de cuidados por meio de serviços sociais, no âmbito de uma mesma política”. Assim, enfatiza a autora, referindo-se às políticas de saúde e assistência social, “são dirigidas a todos os cidadãos e não só aqueles, que previamente filiam-se a um sistema contributivo como é o caso da previdência social” (Idem).

No que tange a Assistência Social, referência para esse estudo, transpor os conceitos constitucionais em contextos vividos tem sido seu maior desafio. No entanto, é fundamental reconhecer os avanços e desdobramentos que o marco constitucional representou no interior desta política, ao lhe conferir o estatuto de direito social, definindo-a como campo de política pública a ser materializada, majoritariamente, por iniciativas dos setores estatais e complementarmente da sociedade, tendo em vista assegurar direitos a todos que dela necessitarem.

A introdução do caráter descentralizado e participativo, a partir da Constituição de 1988, na condução e organização da Assistência Social, produz uma nova lógica na estruturação dos serviços e benefícios ofertados à população. As ações são operadas sob a partilha de responsabilidades entre as esferas de governo, cabendo ao órgão federal coordenação e definição das normativas gerais da política, aos órgãos estaduais, a supervisão e aporte técnico, e aos municípios, a oferta dos serviços e benefícios. Tudo isto sob as vistas da população, convocada a formular e vigiar os desdobramentos desse processo, garantindo assim a participação social através dos conselhos, conferências e comissões deliberativas.

A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS/8.742, de 7 de dezembro de 1993) representa um esforço na perspectiva de regulamentar e assegurar os direitos sociais8 no âmbito desta política, estabelecendo princípios, diretrizes e procedimentos que devem norteá- la e dar-lhe concretude pela viabilização de serviços e benefícios, definindo o campo socioassistencial como locus de intervenção pública. A LOAS, no artigo 1º, ao regulamentar o campo socioassistencial, “articula a relação entre assistência social e necessidades sociais ou humanas ou ainda básicas, bastante fecundas para auxiliar na composição das medidas socioassistenciais no âmbito da proteção social. (PAIVA, 2006, p. 22).

Contudo, esse processo sofre recuos diante dos reflexos negativos da crise econômica demarcada pelos vieses neoliberais que marcaram as décadas de 1980 e 1990 no Brasil que, segundo Vianna (2000, p 12), “[...] atinge as políticas sociais, culpando-as simultaneamente por omissão diante do aparecimento de novos focos de pobreza e pelo aumento da inflação e déficit público”, no qual o binômio privatização e seletividade demarcou as inovações no campo da proteção social.

Cabe aqui registrar que o processo de reestruturação econômica, política e social, que demarcou as últimas décadas do século XX, tem em seu bojo a crise do padrão fordista/keynesiano que vem sendo substituído pelo modelo japonês, tendo como base a flexibilização do trabalho. Esta mudança acentuou a superexploração do capital sobre a força de trabalho, traduzida na redução e desaparecimento dos postos de trabalho, na ampliação do desemprego estrutural e acentuação das diversas modalidades de flexibilização do trabalho expressas nos contratos temporários, ausências de garantias e vínculos trabalhistas, dentre outros, acentuando e complexificando ainda mais os estágios de pobreza e carência dos indivíduos.

Os rebatimentos da crise do capital, imbuída no discurso neoliberal - que transfere e responsabiliza o Estado por suas consequências, exigindo o enxugamento da máquina pública e a redução da intervenção estatal na implantação e implementação das políticas sociais - comprometem seguramente a proteção social que, ao invés de, uma vez por todas, ser estatizada no país, reconstrói-se na esfera privada sob a condução do Estado.

A Lei nº 9.637/97 (11.12.1997), conhecida como Lei da Privatização, é um exemplo claro do esvaziamento do Estado na garantia da proteção social, à medida que regulamenta a transposição de responsabilidades estatais para a esfera privada. Neste sentido, a

8 São direitos sociais: a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à

transformação de instituições estatais, como universidades, hospitais, dentre outras, em entidades com personalidade jurídica de direito privado, bem como a criação de novas entidades com este perfil, configurando o chamado processo de desestatização das áreas de serviços de educação, saúde, meio ambiente, pesquisa e desenvolvimento tecnológico [...] (ABREU, p. 180, 2002).

Diante desse cenário, a Assistência Social segue alinhada às demais políticas sociais que, incorporadas à lógica neoliberal em contraposição à política de Estado de Bem-Estar Social, estruturam e organizam suas ações a partir de critérios de seletividade e focalização; distanciando-se da proteção social de cunho estatal e universalizante, aprofundando sobremaneira seus laços com a benemerência e o solidarismo social.

Assim sendo, as propostas neoliberais em relação ao papel do Estado na esfera da Proteção Social são propostas reducionistas, voltadas apenas para

situações extremas, portanto com alto grau de seletividade e direcionadas aos estritamente pobres através de uma ação humanitária coletiva, e não como uma política dirigida à justiça e à igualdade. Ou seja: é uma política social que passa a ser pensada apenas para complementar o que não se conseguiu via mercado ou ainda através de recursos familiares e/ou da comunidade (SHONS, 1995, p. 2 apud YAZBEK, 2008, p. 8).

Draibe (2003), ao analisar a proteção social brasileira nos anos 1990, mais precisamente nas gestões do governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002), identifica ciclos9 de reformas, as quais foram submetidas às políticas sociais destacando-se, no primeiro ciclo, a saúde, a previdência e a assistência social. Situando-se na Assistência Social, em particular, destacam-se a publicação da LOAS (Lei 8.742/93) e os desdobramentos dela decorrentes. No segundo ciclo, ressalta-se sua implementação a partir de serviços e programas sociais e a introdução de programas de combate à pobreza.

No âmbito das mudanças e por força da LOAS, é implantado o programa de transferência monetária direcionado às pessoas com deficiência e idosos, sob a denominação de Benefício Prestação Continuada (BPC), é destituída a LBA e são criadas novas instituições e órgãos que conduzirão a Assistência Social: o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), os conselhos e os fundos estaduais e municipais em todo território nacional. Estas medidas terminam por definir, no campo institucional, formas novas de garantir a proteção social de assistência no contexto brasileiro.

Desse modo, Draibe (p.87, 2003) afirma:

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Reformas do Sistema de Proteção Social: primeiro ciclo, de 1985- 1988; segundo ciclo, de 1995- 2002

ao final do primeiro período do governo FHC, o país já contava com um sistema de nacional de assistência social de forte institucionalidade, apoiado em fundos, órgãos e conselhos municipais e estaduais e periodicamente mobilizado por conferências nacionais, foro privilegiado da formação política. (DRAIBE, 2003, p. 87).

Ao lado do fortalecimento da institucionalização da Assistência Social, seguiu-se uma agenda de combate à pobreza, por meio de um conjunto de programas e projetos sociais, a citar: o Programa Comunidade Solidária, o Projeto Alvorada e a Rede de Proteção Social. Mais à frente, o Programa Comunidade Solidária sofreu inflexão, passando a ser chamado Comunidade Ativa, cuja função era articular, juntamente com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), programas de desenvolvimento local nos municípios pobres. Paralelamente, seguia o Projeto Alvorada, focando suas ações nos municípios de menor Indicador de Desenvolvimento Humano (IDH), operando diversos programas federais nas áreas de educação, geração de renda e saúde.

Deste modo, a política de FHC operou no campo das reformas e não de rupturas com a lógica econômica vigente.

A busca da estabilização da economia e do equilíbrio orçamentário e fiscal a partir do Plano Real leva, no período dos governos de FHC (1995-1998 e 1999- 2002), a resultados pouco favoráveis para a Proteção Social, na esfera pública estatal. O ambiente é de desacertos e tensões entre a adequação ao ambiente neoliberal e as reformas sociais exigidas constitucionalmente (YASBEK, 2010, p. 18).

As reformas operadas no âmbito da política social estabeleceram uma relação de complementaridade entre universalização e seletividade, na qual as políticas de saúde e educação sobrepõem-se no primeiro eixo, recaindo sobre a Assistência Social o caráter focalizado e seletivo de suas ações à medida que sua intervenção é direcionada a minimizar os efeitos decorrentes dos processos de pobreza e do desemprego estrutural.

Neste contexto, cabe à Assistência Social promover processos de ressocialização e reinserção dos trabalhadores desempregados, prestar apoio às famílias no que tange a dirimir conflitos, identificar potencialidades e soluções frente aos estados de carência e de destituição de direitos sociais.

Como aponta Paugam (2003), essa intervenção visa à redução dos efeitos dos estados de carência, de pobreza, que levam os indivíduos ao isolamento social, devendo assegurar o

acesso e permanência destes nos serviços sociais existentes e disponíveis, com apoio na formulação do direito social e numa prática coletiva.

Este processo, se, por um lado, reforça a posição de subsidiariedade que a Assistência Social historicamente assumiu no campo da seguridade, por outro, avança na construção de um aporte teórico-normativo e técnico-operativo formulando respostas efetivas de proteção frente aos indivíduos e populações estigmatizadas e empobrecidas, de modo que o Sistema de Proteção Social não contributiva vem se adensando e ganhando visibilidade nos