• Nenhum resultado encontrado

A resiliência enquanto resultado e enquanto processo desenvolvimental

Factores Protectores Face ao Risco Psicossocial na Adolescência: O Estudo da Resiliência

3. Estudar a resiliência nos adolescentes

3.1. A resiliência enquanto resultado e enquanto processo desenvolvimental

Embora o termo resiliência tenha ganho muita popularidade, diferentes grupos de pesquisa têm investigado o constructo de resiliência em diferentes contextos de risco, examinado o impacto de diferentes processos protectores e ainda, definido os resultados da resiliência de acordo com diferentes critérios. A literatura actual sobre a resiliência na adolescência apresenta duas áreas principais de investigação: a) Uma investigação sobre os resultados psicossociais do desenvolvimento, que consiste maioritariamente no estudo da adaptação psicossocial em jovens oriundos de populações de risco e; b) Uma investigação dos mecanismos protectores importantes no processo da adaptação bem sucedida. Cada uma destas abordagens oferece uma perspectiva útil sobre a resiliência, salientando os diferentes elementos do constructo e sugerindo diferentes abordagens à avaliação (Olsson et al., 2003).

A resiliência pode assim, ser definida como um resultado caracterizado por padrões específicos de comportamento funcional/adaptativo apesar do risco para comportamento desviante ou mal-adaptativo, caracterizado por diversos autores como resiliência enquanto resultado (Constantine et al., 1999; Olsson et al., 2003; Fergus & Zimmerman, 2005). Esta operacionalização focalizada no resultado enfatiza a manutenção da funcionalidade, ou seja, os padrões de comportamento competente ou de funcionamento eficaz em jovens expostos ao risco. Existe, no entanto, uma considerável variabilidade entre estudos relativamente aos tipos de resultados psicossociais que os investigadores consideraram

Capítulo 3. Factores protectores face ao risco psicossocial na adolescência: O estudo da resiliência

serem representativos de resiliência durante a adolescência. Assim, tem-se frequentemente, definido o resultado da resiliência em termos de manutenção de competências individuais em condições de risco que apontam para expectativas de resultados desenvolvimentais negativos ou desfavoráveis. Por exemplo, boa saúde mental, competências vocacionais ou competências relacionais /sociais. A variabilidade nos tipos de resultados considerados tem conduzido a uma confusão considerável sobre a natureza do conceito em discussão (Olsson et al., 2003). Esta abordagem tem sido criticada como tendo tantas definições da resiliência no adolescente quanto o número de estudos e poucas medidas validadas psicométricamente (Blum, 1998).

De forma alternativa, a resiliência pode ser definida como um processo dinâmico de adaptação a um contexto de risco, o que implica uma interacção entre uma amplitude de factores de risco e factores protectores, individuais e sociais, factores estes que funcionam como mediadores no processo de resiliência, atenuando ou incrementando o resultado adaptativo num dado momento do desenvolvimento do indivíduo. Estamos então a falar de resiliência enquanto processo (Olsson et al., 2003).

A pesquisa focalizada no processo tem por finalidade perceber os mecanismos que agem de forma a modificar o impacto de um contexto de risco e ainda o processo desenvolvimental pelo qual os jovens se adaptam com sucesso. Perceber a forma como se processa a adaptação torna necessária a avaliação quer dos mecanismos de risco que agem de forma a intensificar a reacção de um indivíduo à adversidade, tornando-o mais vulnerável, quer dos mecanismos protectores que agem para aliviar a resposta de um indivíduo à adversidade e desta forma, tornando-o mais resiliente (Rutter, 1999).

Capítulo 3. Factores protectores face ao risco psicossocial na adolescência: O estudo da resiliência

Contudo, apesar das diferenças relativas a estas duas abordagens, desde que seja estabelecida uma distinção entre processo e resultado no delineamento das investigações, ambas contribuem para o estudo da adaptação face aos riscos na adolescência (Masten et al., 1999; Olsson et al., 2003). Nesta ordem de ideias, os dois tipos de abordagem ao estudo da resiliência constituem uma forma útil de operacionalizar o constructo.

De forma a analisar a relação entre a adversidade crónica e os resultados desenvolvimentais a nível do desempenho académico e do comportamento pró-social ou anti-social Masten e colaboradores (1999) conduziram um estudo longitudinal prospectivo. Uma amostra de 205 adolescentes de ambos os sexos, a residir em meio urbano, foi seguida a partir do início da escolaridade e durante dez anos, até ao final da adolescência. Foram classificados como resilientes os adolescentes que, apesar de expostos a elevada adversidade contextual, apresentavam competências elevadas a nível do rendimento académico e das relações sociais. Estes adolescentes apresentavam níveis médios ou superiores a nível das capacidades intelectuais, do bem-estar psicológico e melhores recursos parentais por comparação com os sujeitos classificados como não resilientes. Por sua vez, os adolescentes não resilientes, revelaram poucos recursos que pudessem agir de forma protectora face à adversidade psicossocial. Também Stoiber e Good (1998) identificaram como adolescentes resilientes, aqueles que apesar de residirem em meios urbanos problemáticos não apresentavam problemas de comportamento e tinham um melhor rendimento académico. Comparativamente ao grupo de adolescentes com comportamento anti-social, os adolescentes caracterizados como resilientes eram oriundos de famílias intactas ou biparentais.

Capítulo 3. Factores protectores face ao risco psicossocial na adolescência: O estudo da resiliência

Uma outra investigação (Masten et al., 2004) seguiu uma amostra de 173 sujeitos ao longo de vinte anos, centrando-se no estudo da relação entre a presença de adversidade e os recursos psicossociais relevantes na transição para a adultez. Os resultados indicaram que os recursos internos e externos na infância (i.e., presença de suporte de pelo menos um adulto, QI médio ou acima da média, estratégias de coping, projectos para o futuro e estatuto sócio-económico) previam uma transição bem sucedida da adolescência para a adultez. Os autores concluíram ainda que, para alguns sujeitos cujas capacidades resilientes mudaram ao longo do seu percurso desenvolvimental a transição para a adultez apresentou- se igualmente bem sucedida, o que coloca a tónica nas possibilidades de inversão face a um percurso desenvolvimental negativo que a adolescência proporciona enquanto período chave de transição.

3.2. A relação entre resiliência e saúde mental na adolescência

A utilização do bem-estar emocional como um padrão de funcionalidade é uma questão particularmente complexa, na medida em que a tendência para definir a resiliência adolescente somente em termos da manutenção de bem-estar emocional na presença de adversidade pode ser questionável. Será pouco realista acreditar que a repercussão emocional causada por ameaças graves à integridade psíquica e/ou física das pessoas (como sejam os maus-tratos físicos ou psíquicos) pode ser ultrapassada ou resolvida rápida ou facilmente, principalmente se essa pessoa for criança (Olsson et al., 2003; Garbarino, 2005a). Temos que atender a que o sofrimento psíquico, sendo um sinal de adversidade,