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Psicopatologia e Risco Psicossocial na Adolescência

3. Factores de risco psicossocial para o desenvolvimento de psicopatologia na adolescência

3.2. Os factores de risco familiares

Duma forma geral, diversos estudos epidemiológicos e clínicos têm mostrado associações entre os eventos particularmente negativos na infância e a manifestação de perturbações psicopatológicas posteriores (Bru, Murberg, & Stephens; 2001; Harland et al., 2002; Steinhausen & Metzke, 2000; Tiet et al., 2001). Os resultados destes estudos permitem afirmar que a adversidade psicossocial está claramente associada à manifestação de problemas psicopatológicos nos adolescentes e as suas implicações representam uma ameaça psicológica a longo termo.

Capítulo 2. Psicopatologia e Risco Psicossocial na Adolescência

Embora o stresse e as adversidades psicossociais representem factores de risco para o desenvolvimento de psicopatologia, segundo Taylor e Rutter (2005), estes têm revelado pouca especificidade diagnóstica relativamente à manifestação de psicopatologia, não se podendo estabelecer geralmente uma relação causal específica com dada perturbação. Isto é, se os factores de risco psicossociais estão associados ao desenvolvimento de psicopatologia na adolescência, estes não predizem o tipo específico de perturbação que o adolescente poderá desenvolver. No entanto, são referidas pelos autores, duas condições situacionais específicas que representam excepções importantes a esta situação diagnóstica, por estabelecerem uma relação clara com o desenvolvimento de um tipo específico de perturbação. São estas:

a) A privação social severa nos primeiros anos de vida – a institucionalização prolongada da criança desde a primeira infância tem dado provas de uma associação relativamente específica com síndromes que envolvem uma perturbação da vinculação;

b) As experiências de stresse excepcionalmente graves e agudas conduzem a perturbação de stresse pós-traumático;

Um factor de risco para o desenvolvimento de perturbações de ansiedade, assinalado por estes autores, é a perda psicológica (por morte ou abandono por parte de figuras de vinculação na infância).

Um outro factor de risco assinalado na literatura é a doença mental de figuras parentais. As crianças cujos pais têm problemas de saúde mental têm também uma maior probabilidade de manifestar problemas emocionais e/ou de comportamento (Gordon et al., 2003; Lerner et al., 1998; Qin, Agerbo, & Mortensen, 2002; Serbin & Karp, 2004; Schmidt & Maras, 2001).

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Não só têm sido identificados factores de risco social e psicológicos como também têm sido objecto de estudo as influências biológicas dos pais sobre os filhos (incluindo a herança genética e outras influências físicas tais como a saúde e nutrição materna pré-natal) (Axelson & Birmaher, 2001). Se bem que os dados sugiram que as tanto as influências genéticas quanto as biológicas actuam no desenvolvimento de psicopatologia nas crianças, é importante realçar que muitas crianças com uma história familiar de perturbações mentais ou de exposição a factores de risco biológicos não desenvolvem psicopatologia (Lerner et al., 1998). Da mesma forma, também acontece que, crianças sem uma história aparente de psicopatologia e de exposição a condições biológicas nefastas desenvolvem quadros psicopatológicos. Apesar do reconhecimento da necessidade de continuidade de estudos neste domínio, torna-se então necessário examinar outras características que possam incrementar ou proteger face ao risco para o desenvolvimento de psicopatologia nas crianças e adolescentes.

Assim, para além das influências biológicas, os estilos de parentalidade e a socialização mais vasta (i.e., as escolas e as comunidades onde as crianças estão inseridas), são influências marcantes no desenvolvimento. Além do mais, as famílias partilham o mesmo tipo de ambientes físicos e sócio-culturais e os acontecimentos históricos familiares têm impacto ao longo de várias gerações (Serbin & Karp, 2004).

Diversos estudos estabeleceram relações estatisticamente significativas entre as experiências adversas na infância e o funcionamento psicossocial na adolescência. A este respeito, Wolf (1995) indicou como factores de risco para psicopatologia na infância a privação sócio-económica, os conflitos familiares, o divórcio e a depressão materna. Aronen e Kurkela (1998) conduziram um estudo longitudinal sobre a influência de factores

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de risco nos primeiros seis meses de vida e a intervenção precoce em famílias de risco psicossocial. Posteriormente, 160 dos sujeitos avaliados inicialmente foram novamente avaliados aos 14-15 anos de idade relativamente aos efeitos dos factores familiares sobre as suas competências sociais. Os resultados deste estudo sugeriram uma relação significativa entre os factores de risco precoces, as competências sociais e o rendimento académico dos adolescentes, sugerindo que as interacções sociais negativas na primeira infância estão positivamente relacionadas com um precário desenvolvimento de competências sociais e académicas na adolescência.

Também os resultados do estudo longitudinal de Christchurch (Fergusson & Lynskey, 1996) sugeriram uma relação linear entre o número de factores de risco (como sejam, pobreza, conflito parental, separação, interacção pais-criança pobre) no ambiente de uma criança e o número de problemas psicossociais apresentados aos 15-16 anos. Os autores concluíram que a probabilidade de haver uma interacção entre os vários factores de risco aumenta em função do aumento de factores de risco. Então o efeito de múltiplos factores de risco poderá ser exponencial.

Apesar dos resultados destes estudos pressuporem um predomínio das experiências precoces sobre o desenvolvimento ulterior da criança e do adolescente, Rutter (1991) defendeu que uma tal conclusão seria precipitada do ponto de vista empírico, uma vez que temos de atender a que os ambientes adversos na infância tendem a persistir. Assim sendo, os resultados desenvolvimentais negativos que estamos a observar nas crianças, podem ser meramente o reflexo de uma continuidade nos factores de risco.

Se as experiências negativas têm de facto efeitos prolongados no tempo, então, é necessário considerar quais os mecanismos que medeiam uma tal continuidade nas sequelas

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psicológicas ao longo do tempo. Sandberg e Rutter (2005) adiantam dois tipos possíveis de explicações para a persistência de psicopatologia ao longo do tempo:

a) A persistência pode surgir porque as experiências iniciais adversas levam a alteração dos padrões de interacção interpessoal, os quais por sua vez, conduzem a mais experiências negativas. Abonatória desta hipótese é a constatação de que as crianças e os adolescentes com perturbações psiquiátricas diferem das amostras comunitárias na exposição a acontecimentos de vida. Os sujeitos oriundos de amostras clínicas da população apresentam mais ocorrências de morte de uma figura parental por comparação às amostras comunitárias, e apresentam ainda uma maior exposição a adversidades psicossociais crónicas, como viver numa zona de residência pobre e, ser oriundo de uma família com baixos recursos económicos.

b) Noutros casos, a ameaça é primeiramente cognitiva, ou seja, a mudança no ambiente da criança ou adolescente foi pouco significativa do ponto de vista da exposição a um acontecimento adverso real, mas no entanto, existiu uma alteração drástica na sua auto- percepção ou na sua auto-estima; por exemplo, o ter-se sido submetido a uma humilhação grave ou ainda o seu sentimento de segurança ou suporte emocional ter sido minado por uma ameaça de abandono.

De acordo com Cicchetti e Rogosch (2002) e com Johnstone e Cooke (2004), torna- se necessário atender à equifinidade e à multifinalidade do desenvolvimento. A equifinidade refere-se aos diferentes factores ou percursos que estão na etiologia de um determinado problema de comportamento. A multifinalidade reporta-se ao diferente peso que determinado factor de risco pode ter no desenvolvimento em diferentes indivíduos. Por

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exemplo, uma família numerosa pode ser um factor de risco para o desenvolvimento de problemas de comportamento num dado adolescente mas ser uma fonte de suporte social e portanto um factor protector para outro (Wasserman & Saracini, 2001). Esta constatação é sugestiva da importância de uma abordagem multivariada na pesquisa de factores de risco, devendo tomar-se em consideração a possibilidade de um grupo de factores aparentemente independentes entre si estarem de facto relacionados. Assim, Wasserman e Saracini (2001) chamam a atenção para o facto de um factor poder expressar os seus efeitos através de outro, pelo que “o ingrediente activo pode não ser um qualquer factor isolado, mas antes a combinação ou acumulação de uma variedade ou número de factores” (p. 166). Neste sentido, a importância dos factores de risco familiares para a vulnerabilidade psicopatológica do adolescente tendem a surgir agrupados (como por exemplo, a morte de um membro da família e a perda de emprego de uma figura parental).

Por sua vez, Lerner e Castellino (2002) referiram que, embora estejamos longe de compreender de forma exaustiva os factores que se encontram na etiologia da psicopatologia na fase da adolescência, os dados das investigações longitudinais são convergentes no que se refere às seguintes conclusões: Em primeiro lugar, a psicopatologia da criança e do adolescente é resultante de uma interacção complexa entre variados factores ambientais e factores intrínsecos ao indivíduo; em segundo lugar, os indivíduos estão sujeitos a muitos tipos de influências e não devemos atribuir a um único factor a responsabilidade por dada perturbação emocional e comportamental; em terceiro lugar, os factores de risco parecem ter um efeito multiplicativo e não somente aditivo, pelo que a probabilidade de desenvolvimento de uma perturbação aumenta consideravelmente com o número de factores de risco que afectam a criança ou o adolescente; por último, alguns

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factores de risco são comuns a uma amplitude de perturbações emocionais e comportamentais, enquanto outros, apresentam uma relação mais específica com determinados quadros psicopatológicos (idem).

São vários os estudos que têm procurado identificar as características familiares que estão associadas com o desenvolvimento de psicopatologia. Por exemplo, Harland e colaboradores (2002) identificaram grupos de crianças em risco para problemas comportamentais ou emocionais, com base em características sócio-demográficas, características familiares e acontecimentos familiares negativos recentes – o desemprego e divórcio dos pais. Utilizaram o Child Behavior Checklist (CBCL) numa amostra representativa de 4480 pais de crianças em idade escolar (entre os 4 e os 15 anos), através duma entrevista sobre as suas características demográficas e familiares e sobre os acontecimentos de vida familiar recentes (um período inferior a 1 ano). As variáveis familiares avaliadas foram: a estrutura familiar (famílias cujos pais não estavam separados ou divorciados / famílias cujos pais estavam separados ou divorciados (monoparentais) / outra estrutura familiar (adoptiva, etc.); o estatuto profissional dos pais; o nível de escolaridade dos pais e o número de irmãos pertencentes ao agregado familiar.

Os resultados desta investigação, mostraram que as características sócio- demográficas da família (estrutura e nível sócio-económico) e os acontecimentos de vida recentes, estavam mais fortemente associados com os riscos para problemas comportamentais e emocionais nas crianças do que outras características demográficas. Os riscos para problemas de comportamento ou emocionais, eram mais elevados para crianças cujos pais tinham tido experiências recentes de desemprego, divórcio ou separação

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conjugal, comparativamente crianças cujos pais não tinham passado recentemente (no último ano) por tais acontecimentos.

Por sua vez, Helgeland e Torgersen (2004) investigaram quais os factores desenvolvimentais na infância e adolescência que estavam na génese do desenvolvimento da Perturbação Borderline ou Estado-Limite da Personalidade (PEP) no adulto. Foram avançadas as seguintes hipóteses: a) os sujeitos com PEP terão histórias desenvolvimentais caracterizadas por uma incidência altamente significativa de factores traumáticos como abuso, negligência, rejeição e separações, comparativamente com sujeitos sem PEP; b) uma história de conflito familiar, super-protecção, controlo parental e psicopatologia parental seria significantemente mais provável em sujeitos com PEP do que em sujeitos sem PEP e ainda: c) sujeitos com PEP terão tido uma probabilidade significantemente superior de ter tido histórias de crescimento em contextos familiares caóticos e instáveis que os não- borderline.

Os resultados deste estudo indicaram 5 variáveis que distinguem os borderline dos não borderline: abuso, negligência, instabilidade ambiental (definida como mudanças de casa, mudanças de escola, violência pelos pares, famílias estigmatizadas pelos vizinhos); psicopatologia paterna, e a falta de factores protectores (como sejam, talento artístico, desempenho escolar superior e uma capacidade intelectual acima da média).

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3.2.1. Os recursos sócio-económicos familiares

Um outro factor a considerar quando procuramos uma abordagem multifactorial no estudo do desenvolvimento de risco para psicopatologia na adolescência são os recursos sócio-económicos da família. De acordo com Serbin e Karp (2004) as histórias de vida problemáticas podem ser preditores directos de um pobre desenvolvimento nos adolescentes, tanto em grupos de nível sócio-económico elevado ou médio, quanto em grupos de níveis sócio-económicos baixos. Podem ser também preditores indirectos de futuros resultados desenvolvimentais negativos, através das trajectórias parentais problemáticas, como sejam o insucesso escolar e a parentalidade na adolescência. No entanto, consoante sublinham os autores, o comportamento parental problemático e a pobreza estão mais frequentemente associados a grupos vulneráveis da população. Por exemplo, um estudo transversal efectuado por Ackerman, Schoff, Levinson, Youngstrom & Izard (1999) com 159 famílias de nível sócio-económico baixo, indicou uma relação significativa entre a inadaptação e a instabilidade familiar e os comportamentos agressivos e a manifestação de ansiedade e depressão nas crianças.

Um grande número de autores tem concluído que a pobreza persistente está associada a uma acumulação de factores de risco que se ampliam uns aos outros, como sejam, elevadas taxas de problemas de saúde mental, condições habitacionais precárias, cuidados pré-natais precários e nutrição inadequada das crianças (Balbernie; 2002; Knutson, DeCarmo & Reid, 2004; Schoon & Parsons, 2002). Os baixos recursos sócio- económicos, estão frequentemente associados a situações de negligência parental, porque a

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vulnerabilidade económica pode interferir com a capacidade dos pais em serem consistentes e em estarem mentalmente disponíveis, (Knutson et al., 2004).

A falta de recursos económicos está associada, não apenas com a morbilidade psiquiátrica em adultos (i.e., ansiedade e depressão), como também tem sido confirmado que os adolescentes de famílias com baixos recursos económicos demonstram maiores problemas de comportamento (i.e., perturbação de comportamento, perturbação de oposição, perturbação de hiperactividade com défice de atenção e sintomas depressivos) do que os seus pares de nível sócio-económico mais elevado (Balbernie, 2002; Bender & Losel, 1997; Pulkkinen, 2001).

Num estudo desenvolvido por Buchanan, Brinke e Flouri, (2000) um baixo rendimento sócio-económico e viver num contexto de desvantagem social na infância, estava relacionado com a manifestação posterior de problemas psicológicos aos 16 anos. O nível sócio-económico baixo tem também sido associado a abandono escolar, maternidade e paternidade na adolescência, abuso de substâncias, perturbações do comportamento e delinquência juvenil (Chase, Maxwell, Knight & Aggleton, 2006; Gordon et al., 2003; Serbin & Karp, 2004; Rutter et al., 1998).

Neste âmbito, está bem documentada na literatura, a relação entre o nível educacional obtido e a progressão económica nos jovens de meios familiares mais empobrecidos (Gordon et al., 2003). Estes resultados sugerem a importância de promover programas de intervenção contra a adversidade em meios sócio-económicos desfavorecidos. Os indicadores sócio-económicos são pois, correlatos da saúde e da obtenção de sucesso em adolescentes e adultos. Tais associações têm sido estabelecidas em comunidades onde existe uma maior concentração de pobreza, as quais contêm também

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níveis mais elevados de problemas sociais como delinquência, abuso de substâncias, maus- tratos infantis e abandono escolar. Assim, o risco psicossocial para as crianças oriundas de contextos sócio-familiares de risco advém frequentemente de um conjunto de variáveis complexas e multifactoriais.

3.2.2. O nível educacional e a profissão dos pais

A educação parental está associada com a capacidade que os pais têm para ajudar nos trabalhos de casa, potenciar a exposição ao conhecimento em termos académicos ou culturais, estabelecer objectivos educacionais e fornecer competências de resolução de problemas. O nível de educação parental também propicia o acesso a determinados estratos sociais, porque a rede social da família geralmente tem o mesmo nível educacional que esta. A estratificação social e o estatuto social são usualmente inferidos a partir da ocupação e educação parentais (Baer, 1999). No entanto, esta relação não é linear. Se, de forma geral, a educação e a profissão dos pais estão relacionadas, no entanto, o significado da ocupação parental vai para além dos recursos monetários, uma vez que o tipo de profissão tende a associar-se aos tempos livres disponíveis para o adolescente e o stresse ocupacional pode fazer diminuir a disponibilidade interna dos pais para os filhos. A indisponibilidade emocional e a negligência educacional dos pais não pode ser avaliada exclusivamente pelo seu nível sócio-económico, uma vez que o stress profissional atinge indivíduos de todos os níveis sócio-económicos.

Vander Vem e Cullen (2004) estudaram a relação entre o comportamento anti-social e a actividade profissional das mães, numa amostra de 702 adolescentes com idades

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compreendidas entre os 15 e os 19 anos, seguidos retrospectivamente entre 1986 e 1994 e concluíram que não era a experiência do emprego materno que estava associada ao percurso delinquente, mas sim a qualidade do emprego materno. Assim, um emprego insatisfatório, com tarefas que exigem uma baixa qualificação profissional e mal remunerado (mas não o número de horas de trabalho contabilizado), estava associado a comportamento anti-social por parte dos filhos.

Se a adversidade familiar está fortemente relacionada com o nível sócio-económico (NSE), e mais especificamente com as variáveis que compõem a classificação do NSE, este deve ser considerado como um indicador de risco importante, entre os outros factores de risco a serem considerados no desenvolvimento de problemas psicossociais e psicopatologia na criança e no adolescente.

3.2.3. A estrutura e a dimensão da família

Uma questão contemporânea no estudo da família diz respeito às mudanças no tecido social na transição do século XX para o século XXI e particularmente as transformações na estrutura familiar. As investigações que se debruçaram sobre o impacto da estrutura familiar nos comportamentos de risco na adolescência sugerem que existem vários aspectos da formação da família que podem ter um impacto negativo no processo desenvolvimental na adolescência, como sejam o divórcio e a monoparentalidade (Baer, 1999; Barber, 1995; Garnefski & Okma, 1996; Murry, Bynum, Brody, Willert & Stephens, 2001; Schoon & Parsons, 2002).

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Um dos aspectos que estes estudos destacam é o facto que os adolescentes oriundos de famílias divorciadas, vivendo com a mãe, apresentaram maiores níveis de perturbações do comportamento e um funcionamento social mais pobre. Por exemplo, Baer (1999) encontrou diferenças significativas nos níveis de conflito entre famílias monoparentais e famílias intactas – nas famílias monoparentais a comunicação era sentida pelo adolescente como menos satisfatória, o grau de coesão era menor e o nível de conflitos era superior.

Estes resultados podem ser justificados pelo facto da monoparentalidade15 estar associada com maior frequência à não acessibilidade a modelos masculinos. Isto pode ser visto como um factor de vulnerabilidade familiar, contribuindo desta forma para os problemas de comportamento nos adolescentes (Zimmerman & Becker-Stoll, 2002; Flouri & Buchanan, 2003).

Para testar esta hipótese, Buchanan e colaboradores (2000) investigaram se a relação entre a estrutura familiar (biparental biológica, reconstituída ou monoparental) ou o contexto sócio-económico (a desvantagem social severa) na infância estava associada com a manifestação de problemas psicológicos na adolescência e na adultez. Os dados foram recolhidos numa amostra de 8.441 sujeitos do National Child Development Study, avaliados relativamente a problemas de adaptação comportamental aos 16 anos de idade e de problemas psicológicos aos 33 anos. Os resultados desta investigação sugeriram que ser oriundo de uma família reconstituída ou de recasamento, onde não existiam problemas sócio-económicos graves, não era um factor de risco para problemas de comportamento aos 16 anos. No entanto, crescer numa família monoparental pautada pela adversidade económica estava associada a manifestação de problemas psicológicos na adultez nos

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Atende-se aqui a que, a grande maioria dos agregados familiares monoparentais é constituído pela mãe biológica e pelos filhos menores.

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rapazes, mas não nas raparigas. Deste modo, os autores sugiram que, não é a estrutura familiar em si o factor responsável pelos problemas de adaptação na adolescência, mas sim o contexto familiar marcado pela desvantagem socio-económica.

Uma explicação possível para a presença de problemas de comportamento nos adolescentes oriundos de famílias monoparentais é a de que o provimento de suporte emocional e as atitudes educativas a ter em relação aos filhos, ao não serem partilhadas, poderão conduzir a um aumento da tensão nas relações mãe-filho ou pai-filho (Baer, 1999).