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A Tarefa “Caixas de Pastéis”

No documento Pedro da Cruz Almeida (páginas 103-106)

7. As tarefas

7.2. A Tarefa “Caixas de Pastéis”

Figura 15: Enunciado da tarefa "Caixa de pastéis".

Esta tarefa (Figura 15) foi resolvida pelos participantes na entrevista feita na quarta semana de aulas, no primeiro período do 4.º ano (2014.10.19).

Nesta tarefa são apresentados dados numéricos numa tabela cuja interpretação é essencial para entender as relações estabelecidas entre eles. Tais relações não são totalmente explícitas, nomeadamente as relações numéricas. O contexto contribui para uma interpretação da tabela. Por fim, a tarefa pede que o problema formulado seja modelado por uma multiplicação. Tendo em atenção, apenas o facto de os dados serem apresentados numa tabela e ser pedida uma pergunta modelada por uma dada operação, classifica-se a tarefa nas que envolvem o processo Traduzir definido por Christou et al. (2005). No entanto, o contexto da pastelaria e da embalagem dos pastéis fornece um ambiente, uma história, que antecipa ou condiciona a interpretação da tabela e esta aparece como uma forma sintética de apresentar os dados. Nessa medida, a tarefa está muito próxima das que envolvem o processo Editar (Christou et al., 2005). A inclusão nas que envolvem o processo Traduzir exige-se pelo facto dos dados serem apresentados numa representação matemática bem definida e ser pedida que a resolução passe por uma determinada operação (outra representação).

Dado que estamos perante o enunciado de um problema em que os dados e as relações entre eles estão definidas, consistindo a tarefa de formulação na explicitação das perguntas, pode-se enquadrar esta tarefa na classe das estruturadas, definida por Stoyanova e Ellerton (1996).

Esta tarefa apresenta uma coleção de dados distribuídos espacialmente numa tabela, estabelecendo entre eles relações não explícitas, isto é, as relações têm necessariamente de resultar de uma interpretação.

Há uma relação de proporcionalidade direta entre duas grandezas: o número de caixas e o número de pastéis. Trata-se de uma situação que se enquadra dentro do Isomorfismo de medidas. A Figura 16 dá visibilidade às relações multiplicativas entre os dados numéricos apresentados na situação. A relação multiplicativa visível verticalmente é de quádruplo-quarta parte. É a relação funcional ou constante de proporcionalidade. A relação multiplicativa que se observa horizontalmente entre dois números seguidos, tanto no número de caixas como no número de pastéis, é de dobro-metade e refere-se à covariação das duas variáveis.

Figura 16: Relações multiplicativas entre os dados apresentados na tarefa "Caixa de Pastéis".

Podem ser feitas várias perguntas, mas todas têm de ser solucionadas por meio de uma multiplicação. Se se quiser manter o contexto realista explicitado no enunciado, as perguntas dirigem-se ao número de pastéis embalados num determinado número de caixas ou ao número de caixas necessárias para embalar um determinado número de pastéis. Para cumprir estas restrições (uma só multiplicação dentro do contexto realista) é preciso acrescentar um novo dado na pergunta15.

E para que a resposta envolva apenas uma operação é preciso que o dado introduzido seja criteriosamente escolhido. O critério para a seleção do dado a introduzir tem de ser deduzido da interpretação da tabela. O que se afirma neste parágrafo parte do princípio de que a formulação da pergunta supõe e depende da antevisão da resolução. E é assim mesmo, porque é exatamente isso que a tarefa pede: que a pergunta seja respondida com recurso a uma multiplicação. Pensar numa pergunta nestas condições exige uma cuidadosa observação dos dados.

Quem, olhando para os dados, observa a sequência de dobros (4, 8, 16) no número de caixas e a correspondente (16, 32, 64) no números de pastéis embalados, pode ser levado a perguntar sobre o número de pastéis que são embalados em 32 caixas, cuja resposta é dada pela multiplicação 2×64 pastéis. O dado “32 caixas” tem de ser introduzido na pergunta. Este dado, o número 32, não é escolhido ao acaso, mas exatamente porque se observou a relação multiplicativa “dobro” e se tem a certeza de poder encontrar uma resposta à pergunta antevendo a multiplicação 2×64. Embora seja

15 A pergunta “quantas vezes o número de pastéis embalados é maior que o número de caixas?” não acrescenta nenhum dado e pode ser equacionada numa multiplicação, contudo não manifesta um interesse pela realidade que contextualiza o problema. Ela é essencial na interpretação matemática da tabela.

possível, não é espectável que, desejando-se saber responder à pergunta que se faz, se introduza um número qualquer. Ainda dentro do conhecimento desta relação de dobro também se poderia responder por meio de uma multiplicação à pergunta sobre o número de caixas necessárias para embalar 128 pastéis (ao dobro de 64 pastéis corresponderiam o dobro de 16 caixas).

Num nível de conhecimento superior mas ainda dentro da relação de covariação das variáveis dentro das grandezas, quem souber que pode usar qualquer outra relação multiplicativa como o triplo, o quádruplo,… pode inserir outros valores. Por exemplo, pode perguntar sobre o número de pastéis embalados em 12 caixas (o triplo de 4), respondendo através da multiplicação 3×16 pastéis.

Se é preciso ser criterioso na escolha do dado a introduzir na pergunta pelo facto de só se ter apercebido da relação de covariação dos dados apresentados, tal exigência não é necessária para quem é capaz de observar a relação funcional entre as grandezas.

Quem é capaz de, olhando para os dados apresentados, perceber que há 4 pastéis por caixa porque o número de pastéis embalados é sempre 4 vezes superior ao número de caixas, pode selecionar, para inserir na pergunta, um valor qualquer. Saber quantos pastéis são embalados em n caixas é possível pela operação 4 pastéis/caixa × n caixas. Tendo como dado apenas a relação funcional (o número de pastéis por caixa) não será espectável que os alunos formulem uma pergunta que procure determinar quantas caixas são necessárias para embalar m pastéis uma vez que isso implicaria uma divisão por 4 e não uma multiplicação, se bem que isso pudesse ser ultrapassado multiplicando o número de pastéis por 1/4. Além disso, dado que o número de caixas é sempre menor que o número de pastéis, tal pergunta teria de ultrapassar o modelo primitivo e intuitivo básico da multiplicação pelo qual se pensa que o produto é (sempre) maior que os fatores (Fischbein, Deri, Nello e Marino, 1985).

Resumindo, para dar resposta às condições impostas pela tarefa é necessário que os alunos interpretem os dados apresentados e retirem daí, como dado adicional, a relação funcional ou a relação escalar (ou ambas). Tanto com uma informação como com a outra, a pergunta mais plausível é a que procura saber quantos pastéis são embalados em n caixas na medida em que ela se adequaria ao modelo intuitivo da multiplicação. É também possível fazer uma pergunta sobre o número de caixas necessárias para embalar uma quantidade de pastéis, mas tal aconteceria, provavelmente, tendo por base a identificação do fator escalar (a covariação). Num estudo mencionado por Vergnaud (1983), tendo como participantes alunos com idade compreendida entre os 11 e 15 anos, verificou- se que o recurso ao fator escalar na resolução de problemas de proporcionalidade foi o processo mais frequente.

Na resolução desta tarefa esperava-se que os alunos identificassem com maior facilidade o fator escalar dentro das grandezas e formulassem uma pergunta que procurasse saber o número de

pastéis em função do número de caixas, muito provavelmente 32 caixas por ser esse o número de caixas que se seguiria após na sequência apresentada na tabela.

No documento Pedro da Cruz Almeida (páginas 103-106)