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A Teoria da Transitoriedade da Obrigação Tributária Acessória

HIPÓTESE:

5. REGIME JURÍDICO DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS ACESSÓRIAS

5.4. A Teoria da Transitoriedade da Obrigação Tributária Acessória

No âmbito do direito civil, quase toda doutrina ensina que o instituto da “obrigação” possui dois elementos indispensáveis: a patrimonialidade e a transitoriedade.

126 José Wilson Ferreira Sobrinho, Obrigação Tributária Acessória. São Paulo: Gráfica Aquarela, 1988, p.

84-85.

110 Nos subtítulos anteriores, pudemos descrever e explicar a problemática das doutrinas científicas que defendem ou as que não defendem a patrimonialidade da obrigação tributária acessória. Aqui, trataremos do tema da transitoriedade da obrigação tributária e se esse atributo afasta o caráter obrigacional da chamada “obrigação tributária acessória”.

Obrigação é relação jurídica, e, como toda relação entre sujeitos sob um dado objeto, ela nasce e exaure-se, pois não há obrigações perpétuas: “Como tudo quanto no mundo existe, as obrigações nascem, vivem e morrem128”.

A adoção destes conceitos na doutrina tributária decorre de um equívoco de interpretação, pois somente seria transitória a obrigação tributária principal, ao passo que a “erroneamente” chamada de obrigação tributária acessória não possuiria este atributo, já que não seria uma obrigação, mas um mero dever.

Paulo de Barros Carvalho129, em sua doutrina, afasta a concepção de obrigação tributária acessória, por entender não existirem no direito tributário brasileiro obrigações acessórias, mas sim simples deveres de direito administrativo, porque falta aos deveres administrativos o atributo da patrimonialidade, equiparando o estudioso tais deveres ao simples dever que tem o motorista de respeitar os semáforos. E, quanto ao atributo da transitoriedade, o autor rejeita-o por entender ser um requisito dispensável para a qualificação do instituto da obrigação:

“De fato, como explicar o requisito da transitoriedade nas obrigações de não fazer? Ademais, toda relação jurídica tem por finalidade obter um determinado comportamento humano, posta a natureza do Direito como eminentemente

128 Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil – 4º Vol. – Direito das Obrigações, São Paulo:

Saraiva, 1999. Nesta obra, o autor escreve a respeito da impossibilidade de existir obrigação perpétua: “ainda que ela incidisse sobre atos contínuos, prolongados e reiterados, cuja persistência fosse indeterminada, como na locação de serviços, sempre haveria um limite à sua duração”.

129 Paulo de Barros Carvalho. Teoria da Norma Tributária, 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p.

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instrumental. Daí, aquela vocação irresistível ao desaparecimento não ser absolutamente própria da figura obrigacional, mas de toda e qualquer relação jurídica”.

Com efeito, a falta de rigor na fixação do conteúdo semântico da doutrina dos deveres administrativos enseja certa inconsistência interna nessa linha doutrinária que defende a transitoriedade como atributo indispensável para a formação do instituto da obrigação, pois o que existe é uma confusão entre normas: a norma que prescreve a obrigação e a norma do marco temporal de cumprimento da própria obrigação.

A norma que prescreve a obrigação é geral e abstrata, pois prescreve uma conduta possível de realização caso ocorram os elementos por ela descritos. Já a norma do tempo da de cumprimento da obrigação é individual e concreta, porque traz o momento de ocorrência do comportamento. Exemplificando: as normas que disciplinam a entrega das declarações – DCTF e DIRF – prescrevem que o sujeito passivo deverá apresentar suas declarações mensalmente, trimestralmente ou semestralmente. Esta norma possui o seu próprio tempo, já que no nosso ordenamento jurídico as normas são introduzidas para vigerem em tempo posterior ao seu termo inicial de vigência. Trata-se do âmbito de validade temporal delimitado pelo direito positivo em que se prescreve a vigência das normas obrigacionais. Inicialmente, teremos uma norma válida e vigente no nosso sistema que prescreve as obrigações a serem cumpridas. Em um segundo momento, teremos o tempo de cumprimento desta obrigação, ou seja, o tempo de realização da conduta prescrita na norma geral e abstrata.

José Souto Maior Borges130 faz uma observação importante ao afirmar o equívoco da teoria tradicional das obrigações tributárias, porque o problema da transitoriedade das normas obrigacionais não deve ser confundido com a questão da transitoriedade da própria

112 obrigação individual, ou seja, da conduta do sujeito passivo deonticamente havida como obrigatória, até porque o comportamento deonticamente obrigatório não se confunde com a norma que o disciplina.

Segundo o autor, o que há na verdade são dois tempos: (i) o tempo de vigência da norma veiculadora da obrigação e (ii) o tempo do comportamento do sujeito passivo. O sujeito passivo, realizando a conduta prescrita na norma veiculadora da obrigação, extinguirá a relação jurídica anteriormente instaurada. Contudo, a norma que veicula a obrigação não se extinguirá, não será expurgada do sistema jurídico, salvo nos casos prescritos pelo próprio direito positivo, como, por exemplo, a revogação. Então, temos que tanto em uma quanto em outra situação, são elas transitórias, porque “não pode a transitoriedade especificar a norma obrigacional diante de outras normas que prescrevem deveres não obrigacionais, nem de outras normas, porque a transitoriedade revestirá tanto a norma obrigacional, quanto quaisquer outras normas jurídico-positivas131”.

Assim, em apertada síntese, entendemos que a transitoriedade não é critério cientificamente apto para classificar as obrigações, pois as classificações construídas pela Ciência do Direito têm por finalidade construir arbitrariamente classes, de modo a submetê-las a diferentes regimes jurídicos para poderem legitimar o fundamento de que não há obrigações perpétuas no nosso ordenamento jurídico. “Consequentemente, responderia à formulação de uma proposição descritiva extradogmática, isto é, não controlável por um experimento vertido sobre a ordem jurídica positiva” 132.

131 José Souto Maior Borges. Op. cit., p. 125. 132 José Souto Maior Borges. Op. cit., p. 125.

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