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O Fato Jurídico da Obrigação Tributária Principal

4. OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA PRINCIPAL

4.2. O Fato Jurídico da Obrigação Tributária Principal

A obrigação tributária é relação jurídica entre sujeitos de direitos e deveres, que, em decorrência da veiculação em lei, têm por objeto o comportamento de levar dinheiro aos cofres públicos a título de tributo ou sob a aplicação de penalidade pecuniária, bem como o comportamento de realizar prestações positivas ou negativas em favor da Administração Tributária com a finalidade de auxiliar na fiscalização e arrecadação de tributos.

72 Teremos a oportunidade de voltar a esta discussão quando tratarmos das sanções aplicadas pelo

70 Segundo os ensinamentos de Almílcar de Araújo Falcão73, “a fonte da obrigação é a lei, mas não basta a existência de lei para que a obrigação tributária se instaure, porque para o nascimento da obrigação será necessário que surja concretamente o fato ou pressuposto que o legislador indica como sendo capaz de servir de fundamento à ocorrência da relação jurídica tributária. E é a esse fato ou pressuposto que se dá o nome de fato gerador”.

Para o citado autor74, fato gerador é, pois, o fato, o conjunto de fatos ou o estado de

fato, a que o legislador vincula o nascimento da obrigação jurídica de pagar um tributo determinado, sendo que nesta definição estão mencionados, como elementos relevantes para a caracterização do fato gerador, os seguintes: a) a previsão em lei; b) a circunstância de constituir o fato gerador, para o direito tributário, um fato jurídico, na verdade um fato econômico de relevância jurídica; c) a circunstância de tratar-se do pressuposto de fato para o surgimento ou a instauração ex lege de pagar um tributo determinado.

O Código Tributário Nacional prescreve, no artigo 114, que “o fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência”.

Vê-se que o legislador do Código Tributário Nacional destaca como necessária, para a instauração da relação jurídica tributária, a ocorrência de um fato que tenha as mesmas características das prescritas em lei. Contudo, do ponto de vista terminológico, a opção do legislador pela expressão “fato gerador” é motivo de críticas por nossa doutrina tributária, porque o legislador utiliza-se da mesma expressão para denominar tanto a prescrição de uma situação abstrata quanto uma referência a situação concreta.

73 Almílcar de Araújo Falcão. Fato gerador da obrigação tributária, 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1974, p. 26.

71 Na nossa doutrina, podemos destacar a crítica à expressão “fato gerador”, feita por Geraldo Ataliba75, que assevera:

“A nossa doutrina tradicional, no Brasil, costuma designar por fato gerador tanto aquela figura conceptual e hipotética – consistente no enunciado descrito do fato, contido na lei – como o próprio fato concreto que, na sua conformidade, se realiza, hic et nunc, no mundo fenomênico.

Ora, não se pode aceitar essa confusão terminológica, consistente em designar duas realidades tão distintas pelo mesmo nome.

Não é possível desenvolver trabalho científico sem o emprego de um vocabulário técnico rigoroso, objetivo e unívoco. Por isso parece errado designar tanto a previsão legal de um fato, quanto ele próprio, pelo mesmo termo (fato gerador).

Tal é a razão pela qual sempre distinguimos estas duas coisas, denominando ‘hipótese de incidência’ ao conceito legal (descrição legal, hipotética, de um fato, estado de fato ou conjunto de circunstâncias de fato) e ‘fato imponível’ ao fato efetivamente acontecido, num determinado tempo e lugar, configurando rigorosamente a hipótese de incidência”.

O equívoco incorrido pelo legislador do Código Tributário Nacional também não passou despercebido aos olhos da doutrina de Almílcar de Araújo Falcão76, ao ensinar que:

“Não é fato gerador quem cria, quem, digamos assim, gera a obrigação tributária. A fonte de tal obrigação, a energia ou força que a cria ou gera é a própria lei.

O fato gerador é, apenas, o pressuposto material que o legislador estabelece para que a relação obrigacional se instaure.

A obrigação tributária nasce, cria-se, instaura-se por força da lei; na lei estão todos os seus fatores germinais. O chamado fato gerador marca, apenas, o momento, o pressuposto, a fattispecie normativa para que o vinculum juris legalmente previsto se inaugure.”

Paulo de Barros Carvalho77 também despreza a denominação feita pelo legislador do Código Tributário Nacional e adota “hipótese de incidência como a descrição normativa de um evento e fato jurídico tributário como a concreção do evento previsto no descritor da regra de incidência. Fato jurídico porque tem o condão de irradiar efeitos de direito. E

75 Geraldo Ataliba, Hipótese de Incidência Tributária, 6 ed.. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 54. 76 Amílcar de Araújo Falcão. Op. cit., p. 29.

72 tributário pela simples razão de que sua eficácia está intimamente ligada à instituição do tributo”.

Importante observar que nossa doutrina tributária não é unânime em criticar a expressão “fato gerador” enunciada no artigo 114 do Código Tributário Nacional. Dentre os defensores, está Luciano Amaro78, que assevera:

“Afinal, não vemos inconveniente sério no emprego ambivalente da expressão “fato gerador” (para designar tanto a descrição legal hipotética quanto o acontecimento concreto que lhe corresponda). Crime, no direito penal, também designa a previsão da lei e o acontecimento que costuma ser relatado no noticiário policial, e essa circunstância não tem impedido o progresso da ciência penal. Cremos também que não se tenha pensado, no direito privado, em proscrever a referência, na norma legal abstrata, a atos ou fatos jurídicos, a pretexto de que, enquanto alguém não atuasse concretamente, ou enquanto não ocorresse tal ou qual fato concreto, seria imperioso restringir o discurso legal à expressão de hipóteses jurídicas.

Quando, por conveniência didática, se quiser distinguir a descrição abstrata feita pela lei e o acontecimento concreto (cuja correspondência com a primeira dá nascimento à obrigação de pagar tributo), pode-se falar em “hipótese de incidência do tributo” e “fato gerador do tributo”. Sem embargo, utilizamos esta última expressão em sentido amplo (abrangente também da descrição legal abstrata), a não ser quando haja necessidade de fazer a comentada discriminação”. (itálico original).

O nosso posicionamento a respeito do emprego ambivalente da expressão “fato gerador” enunciada no texto legal acompanha a doutrina formulada por Paulo de Barros Carvalho, conforme exposto acima. A lei veicula os pressupostos necessários ao nascimento da obrigação tributária, e estes pressupostos estão descritos abstrativamente como capazes de fazer incidir a norma jurídica tributária: “A ocorrência da vida real, descrita no suposto da norma individual e concreta expedida pelo órgão competente, tem de satisfazer a todos os critérios da norma geral e abstrata” 79 para que assim tenhamos o fato típico e capaz de fazer irromper a obrigação tributária. Então, o que temos é a materialização do direito que se efetiva em dois acontecimentos: o primeiro, pela veiculação abstrata na norma como um dado evento; o segundo, pela concreção ou efetiva

78 Luciano Amaro. Op. cit., p. 262.

73 realização no mundo fenomênico desta situação em tese (evento possível de ocorrência ou não).

Portanto, temos que o fato jurídico da obrigação tributária principal será o acontecimento composto de todas as condições típicas e pertinentes previstas no descritor da norma geral e abstrata, que, por sua vez, após sua devida construção em linguagem competente, instaurará a relação jurídica obrigacional.

Os conceitos atinentes à obrigação tributária principal poderão ser mais bem visualizados a partir da norma jurídica tributária, de modo a demonstrar sua construção formal e com o posicionamento de cada um dos seus elementos.

4.3.

A Construção da Norma Jurídica Veiculadora de Obrigação Tributária