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Nossa Visão quanto à Doutrina da Patrimonialidade da Obrigação Tributária Acessória

HIPÓTESE:

5. REGIME JURÍDICO DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS ACESSÓRIAS

5.3. Visão Crítica das Doutrinas Tradicionais a respeito do que é veiculado no Código Tributário Nacional sob a designação de “Obrigação

5.3.3. Nossa Visão quanto à Doutrina da Patrimonialidade da Obrigação Tributária Acessória

As doutrinas apontadas buscam solucionar a problemática da patrimonialidade da obrigação acessória emitindo proposições que facilmente são refutadas pelo ordenamento jurídico.

Os critérios utilizados não são corroborados pelo ordenamento jurídico-positivo, porque não podem ser testados empiricamente. A afirmação de que existem obrigações cujas prestações têm efetivamente caráter patrimonial e outras que não possuem esse atributo, a partir da constatação de que predominará sempre o interesse econômico do credor (sujeito ativo), ainda que a prestação não seja suscetível de valorização econômica não se baseia um critério jurídico, mas metajurídico, construído pelo jurista a partir da análise do seu objeto. É uma decisão arbitrária do jurista ao promover a classificação do seu objeto, mas esta classificação deverá valer-se de meios capazes de construir ciência sem os vícios da contradição. Neste sentido, ensina-nos Paulo de Barros Carvalho122:

“(...) Toda ciência requer a observância estrita da lei lógica da não contradição, de modo que a permanência de dois enunciados contraditórios – A é B e A é não-B – destrói a consistência interior do conjunto, esfacelando o sistema. Logo, no plano cientifico, não devemos encontrar contradição entre as múltiplas

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proposições descritivas, a despeito de tais enunciados relatarem normas jurídicas algumas vezes antagônicas. O sistema da Ciência do Direito é isento de contradições (...)”.

A doutrina analisada de que a obrigação tributária acessória é patrimonial, mas também pode não ser patrimonial, traz uma contradição interna. Por ser uma metalinguagem doutrinária, subordina-se ao princípio de não contradição. E, se houver agressão a esse princípio, o discurso normativo-científico será prejudicado.

A concepção doutrinária da patrimonialidade da obrigação acessória parte da tentativa de resgatar o enunciado jurídico estritamente universal123 de que toda obrigação é patrimonial.

Contudo, a tentativa de restaurar essa universalidade estrita pela tese da patrimonialidade da obrigação tributária acessória não será empírica, porque não poderá ser corroborada pelo ordenamento jurídico-positivo.

José Souto Maior Borges124 afirma que é impossível verificação empírica do enunciado “toda obrigação tem caráter patrimonial”, porque ela não poderá ser exaustivamente testada por via indutiva.

E ensina-nos esse autor125:

“E, como, numa decorrência do seu grau de generalidade, não é testável esgotantemente a sua veracidade, resta somente a possibilidade de testar-se a sua falseabilidade. Embora não sendo porque é impossível sê-lo – conclusivamente verificável (comprovável), essa assertiva é, contudo, empiricamente falseável. Se não há como indutivamente demonstrar a veracidade de um enunciado universal desse tipo, é todavia viável falseá-lo, pela formulação de enunciado(s) sobre normas válidas em sentido contrário. Dito noutras palavras: o conteúdo informativo desse enunciado responderá (I) apenas a uma aproximação da verdade, na medida em que for empiricamente corroborado, mas (II) será falseado (delimitado) por exemplos detectados de normas válidas em sentido contrário. É, nesses termos, sempre viável refutar

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Cf. José Souto Maior Borges (in Obrigação Tributária (...) p. 60): “Noutras palavras: a universalidade do enunciado decorre de que não haveria obrigação sem patrimonialidade”.

124 José Souto Maior Borges,Op. cit.,, p. 74. 125 José Souto Maior Borges, Op. cit., p. 74-75.

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empiricamente aquele enunciado normativo com o recurso ao ordenamento jurídico e pela constatação de quaisquer normas jurídico-positivas em sentido contrário. A falseabilidade atua como um critério de demarcação científica do próprio enunciado, na sua generalidade.”

A Ciência do Direito estuda o seu objeto sem atingi-lo, pois é uma metalinguagem que tem a função de descrevê-lo. E, sendo o direito positivo o objeto de estudo da Ciência do Direito, esta não pode alterá-lo. O Código Tributário Nacional delimitou as espécies de obrigação tributária: a principal e a acessória. A primeira terá como objeto uma prestação pecuniária compulsória, pois possui relação direta com o fato jurídico do critério material da norma jurídica de exigência do tributo. A segunda não terá caráter pecuniário porque é fundada num fazer, não fazer ou tolerar. Esta, embora não possua caráter pecuniário, não deixa de ser obrigação. O interesse econômico haverá em qualquer relação jurídica, seja ela obrigação tributária principal ou acessória. Ocorre que aquilo com o que o direito positivo se preocupa não é com o que interessa ao credor, mas sim como esse interesse é respeitado, isto é, o bem jurídico a ele vinculado. Por certo, o interesse é uma categoria psicológica que se situa fora de uma visão jurídico-positiva, portanto, transcendental e não empírica.

As doutrinas que defendem a patrimonialidade da obrigação tributária acessória, por não terem sustentação empírica, perdem a referibilidade que deveriam ter ao direito positivo, porque o Código Tributário Nacional não traz qualquer autorização para uma construção doutrinária de regime jurídico dicotômico à obrigação tributária acessória com patrimonialidade ou não. O Código Tributário Nacional traz a prescrição de uma única espécie de obrigação tributária acessória: a de caráter não patrimonial.

109 José Wilson Ferreira Sobrinho126 critica a postura das doutrinas que defendem a patrimonialidade da obrigação acessória e nos ensina:

“O que a ciência do direito não pode é, de forma arbitrária, estabelecer divisão na norma jurídica, que se apresenta unitária, a fim de pretender corroborar, artificialmente, suas proposições. A linguagem de objeto não é infirmada por metalinguagens doutrinárias, senão que estas é que o são por aquela. O ordenamento jurídico-positivo é que testa as construções doutrinárias, infirmando-as ou corroborando-as, não estas àquele”.

A Ciência do Direito não deve se preocupar em formar consenso entre a comunidade científica sobre determinada doutrina, mas, sim, preocupar-se apenas com a teoria em si mesma, porque a Ciência do Direito descreve a realidade contida na linguagem do seu objeto, na busca de determinadas conclusões, isto é, “para falar sobre uma linguagem é preciso usar outra linguagem127”. É a chamada metalinguagem doutrinária, ou seja, a linguagem que fala e explica o seu objeto.

Contudo, no campo da Ciência do Direito – metalinguagem doutrinária –, o que temos são apenas opiniões e conclusões aceitas ou não pela comunidade científica. O que torna possível a aceitação de determinada doutrina científica é a realização de testes de base empírica de aplicação direta com o nosso ordenamento jurídico-positivo para que possam ser confirmadas ou refutadas. Portanto, a solidez da ciência do direito está no seu próprio objeto para que possa testar as teorias que a compõem.