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O custo das obrigações tributárias acessórias

HIPÓTESE:

6. ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA

6.5. O custo das obrigações tributárias acessórias

O nosso Sistema Jurídico Tributário emana de normas contidas no Texto Constitucional, sendo que o Poder de Tributar decorre do consentimento do Povo, ou seja, o Povo consente que seu patrimônio seja tributado, de modo a atender aos anseios do Estado.

Contudo, a participação do particular (Povo) na realização das funções e tarefas da Administração Tributária vem aumentando com o passar do tempo. E o instrumento capaz de dar efetividade ao cumprimento das normas jurídicas tributárias cujo objeto é o pagamento de tributos são as chamadas obrigações tributárias acessórias. São elas obrigações que têm por objeto prestações positivas ou negativas direcionadas a auxiliar a arrecadação e fiscalização tributária no que tange à instauração da relação jurídica tributária de pagamento de tributo ou de aplicação de penalidade tributária.

160 Então, a preocupação maior existente (ao menos da Administração Tributária) é quanto à arrecadação tributária. Por isso, vemos todos os dias, seja na mídia escrita, seja na mídia falada, as discussões acerca da carga tributária no Brasil, de modo a levar a atenção somente para o custo dos tributos, isto é, a base de cálculo e respectiva alíquota.

A atenção dispensada ao custo das obrigações tributárias acessórias ainda é pequena no país, mas já há algum tempo ela é muito sentida pelos destinatários da norma jurídica. Para que eles possam efetivamente cumprir as normas jurídicas impositivas de obrigações tributárias principais, isto é, destinadas ao abastecimento dos cofres públicos com pagamento de tributos, eles deverão realizar diversas ações administrativas que antecederão a instauração ou não do vínculo relacional da obrigação tributária tida como principal, mas que possui um custo para operação. Segundo Elidie Palma Bifano169, o custo das obrigações acessórias representa, hoje, verdadeira tributação oculta que deve ser computada quando se discute o encargo tributário brasileiro, em seu conjunto.

Para o cumprimento das obrigações tributárias acessórias, são reunidos diversos procedimentos, que com o passar do tempo ficam cada vez mais especializados e sofisticados. A documentação em suporte físico, como as notas fiscais e escrituração em livros, dão lugar à informatização e à digitalização das informações, com a entrega on-line à Administração Tributária. O agente fiscal que dá abertura ao procedimento de fiscalização de uma empresa, hoje, não precisará compulsar livros de escrituração ou solicitar notas ficais de vendas ou prestação de serviços: bastar-lhe-á solicitar um arquivo magnético, e ele terá todas as informações necessárias170.

169 Elidie Palma Bifano. Deveres Instrumentais: Cessão de Créditos e Legalidade do Uso de Meios

Coercitivos na Cobrança do Crédito Tributário. in III Congresso Nacional de Estudos Tributários –

Interpretação e Estado de Direito. São Paulo: IBET, 2006, p. 189.

170 A propósito, vide a Portaria CAT 52, de 6 de junho de 2007 e suas alterações que prescrevem as normas

que deverão observar os contribuintes do ICMS no Estado de São Paulo, quanto à geração e guarda de arquivo digital de equipamento Emissor de Cupom Fiscal – ECF – e nota fiscal eletrônica.

161 No estado de São Paulo, objetivando obter maior controle na arrecadação e fiscalização do ICMS, o Governo do Estado de São Paulo instituiu o Programa de Estímulo à Cidadania Fiscal do Estado de São Paulo, com a introdução da Lei n.º 12.685, de 28 de agosto de 2007, implantando por seu intermédio a nota fiscal eletrônica. O objetivo inicial era incentivar os consumidores a exigirem documento fiscal hábil e, assim, trazer como benéficos a redução dos custos com o papel, impressão, espaço de armazenamento dos documentos fiscais, bem como a facilidade no cruzamento das informações fiscais; enfim, possibilitar um maior controle da fiscalização e da arrecadação do ICMS.

Todavia, se por um lado a modernização e a sofisticação dos instrumentos de cumprimento das obrigações tributárias acessórias trazem benefícios à Administração Tributária, por outro lado impõem encargos e custos de transação que são sentidos pelos pequenos comerciantes ou prestadores de serviços.

As normas jurídicas tributárias, em respeito ao principio constitucional da isonomia, são gerais, isto é, não fazem qualquer distinção entre os seus destinatários. Assim, o dever de adquirir máquinas de emissão de documentos fiscais, promover a transmissão de informações etc., é igual para todos os contribuintes. Contudo, o custo não se comporta dessa maneira. É claro que para uma grande rede de supermercados tal custo, mesmo sendo de grande monta, será sentido de uma maneira menos significativa; já um pequeno comerciante de um estabelecimento familiar, sentirá mais o dispêndio de recursos, pois deverá arcar com o custo de equipamentos eletrônicos, profissionais habilitados, etc.

A busca pelo controle da ocorrência dos fatos jurídicos tributários resultou na implantação do Sistema Público de Escrituração Digital – SPED171, instituído pelo Decreto n º 6.022, de 22 de janeiro de 2007, que representa um avanço na informatização da relação

162 entre o Poder Público Fiscal e os contribuintes, pois consiste na modernização do cumprimento das obrigações acessórias, transmitidas pelos contribuintes às administrações tributárias e aos órgãos fiscalizadores, utilizando-se da certificação digital para fins de assinatura dos documentos eletrônicos, garantindo assim a validade jurídica dos mesmos apenas na sua forma digital.

Sabemos que os mecanismos capazes de facilitar a fiscalização e a arrecadação tributária são válidos e necessários, até porque a quantidade, variedade e complexidade da burocracia no cumprimento das obrigações tributárias acessórias podem inviabilizar a finalidade do instituto, que de fato é assegurar o interesse da Administração Tributária.

Contudo, o cuidado que deve ser tomado ao instituir as normas de imposição das obrigações tributárias acessórias diz respeito aos direitos e garantias individuais do contribuinte ou destinatário legal da norma. O custo com a aplicação das normas veiculadoras de obrigações acessórias não pode ultrapassar a capacidade contributiva do sujeito passivo de modo a limitar o livre exercício de qualquer atividade econômica. 172

E neste sentido, observa Estevão Horvath173 que o custo do correto cumprimento das obrigações tributárias acessórias às empresas é alto, podendo ser considerado uma forma de expropriação patrimonial não consentida pela Constituição da República.

Portanto, vimos que o cumprimento das obrigações tributárias acessórias tidas como essenciais no atendimento do interesse da Administração Tributária é de obrigatória

172

Cf. a Constituição Federal de 1988: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...). Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

173 Estevão Horvath. Deveres Instrumentais e seus Limites, in III Congresso Nacional de Estudos Tributários

163 observância, impondo ao destinatário legal a sujeição a custos operacionais que em muitos casos lhe são superiores à carga que pode suportar, como no caso do pequeno contribuinte.

Assim, as considerações apresentadas reforçam o que defendemos no que tange à observância aos limites constitucionais para imposição de normas de obrigações tributárias acessórias, assegurando assim a aplicação do regime jurídico constitucional-tributário.

6.6. Síntese Conclusiva

Neste capítulo, demonstramos a natureza e a função da administração tributária, principalmente no que concerne à atividade de arrecadação e fiscalização de tributos. Trata-se de uma parte da administração pública referente à atividade financeira do Estado que é efetivamente realizada por servidores públicos. Estes, por sua vez, promovem a aplicação da lei ao caso concreto, realizando fiscalização, constituição e cobrança dos tributos.

A atividade da administração tributária deve pautar-se apenas pelo processo de execução das normas jurídicas, faltando-lhe a competência legislativa. Esta – é claro – é constitucionalmente conferida ao Poder Legislativo.

Vimos, contudo, que mediante a edição de atos normativos, a administração tributária poderá regular sua atividade de fiscalização e arrecadação de tributos. Mas esta atividade volta-se apenas ao sentido de explicitar o conteúdo da lei, jamais devendo ultrapassar os limites prescritos pela lei em sentido estrito.

Ao final, demonstramos que o cumprimento das obrigações tributárias acessórias gera custos consideráveis ao destinatário da norma, que em muitos casos implicam a limitação do livre exercício de qualquer atividade econômica, principalmente a dos

164 No próximo capítulo, demonstraremos a aplicação de sanções pelo inadimplemento das obrigações tributárias acessórias, bem como o resultado da tentativa da administração tributária em legislar, isto é, veremos que a busca de instituir obrigações tributárias acessórias acaba por desvirtuar a sua finalidade, algo que resulta em verdadeiras sanções políticas.

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CAPÍTULO VII

7. AS OBRIGAÇOES TRIBUTÁRIAS ACESSÓRIAS E AS SANÇÕES