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6.7 O INÍCIO DA FORMAÇÃO DO/A PEDAGOGO/A E OS ELEMENTOS SIMBÓLICOS

6.7.3 A terceira categoria “Falando da profissão” 165

A característica dessa categoria configurou-se mediante os projetos idealizados pelos participantes do estudo em relação ao futuro profissional. Nas falas foram apontadas diferentes direções, sendo que a docência não faz parte dos planos da maioria. Um aspecto que também aparece é a idealização de serem “bons profissionais”. Como saber ou como ser um bom ou uma boa profissional? O propósito dessa subcategoria é justamente explorar a questão da identidade profissional, a partir do conteúdo simbolizado nas falas, para tentar entender o complexo processo de construção da identidade profissional desses atores que foi se mostrando até aqui com um misto de incertezas e desejos de buscarem novos horizontes.

Essa CATEGORIA aglutina a subcategoria “tecendo sonhos”, marcando mais um momento da pesquisa, com vistas a buscar o desnovelamento das circunstâncias geradas para que os atores da pesquisa escolhessem uma profissão sem identificação. Como a identidade profissional está se consolidando nesse contexto?

Numa breve exposição, é sabido que a formação profissional do indivíduo começa pela escolha que ele faz, e o que vem a seguir faz parte de como o conhecimento está sendo construído na formação que será articulado no exercício da mesma, no momento de sua inserção no mercado de trabalho. Não é algo dado, mas uma construção. Na perspectiva da sociologia, diferentes conotações são dadas sobre o sentido da profissão e na visão de Dubar (2005), a formação da identidade profissional é um processo social e pessoal. Cada indivíduo tem sua trajetória e, por isso sua identidade é construída no campo da experiência pessoal alicerçada em sua história de vida; ao mesmo tempo é social, haja vista ser construída na relação com outros – nesse sentido é histórica e é delineada num contexto e num tempo/espaço (D’AVILA, 2008).

Diante do exposto, as reflexões aqui tecidas remetem para algumas considerações, a partir dos dados mostrados, buscando valorizar desde as condições iniciais da formação identitária dos atores desse estudo, com base em suas escolhas, até o momento atual vivido no curso onde está se forjando a identidade profissional.

Figura 9: Ciranda dos sonhos

Hoje eu ainda estou em busca do conhecimento para ser uma boa profissional, que eu pretendo num

futuro ser uma ótima profissional. (Beatriz)

Eu realmente o que quero é ir para o ramo da literatura que sou apaixonada ou pra artes plásticas (...). Um dos meus planos era ir para Salvador fazer artes plásticas, é tentar pós, mestrado (...). Realização

é o que estou atrás, realização profissional, pessoal.

(Cecília)

De inicio meu pensamento é trabalhar como uma coordenadora, secretaria de escola ou então fazer um

concurso para trabalhar num banco, hospital ou qualquer coisa, na sala de aula não sei se sou a pessoa

ideal para sala de aula, não sei se vou conseguir que alguém aprenda alguma coisa comigo (Lili)

(...) eu quero ainda trabalhar em um hospital, com enfermagem.(...) eu quero trabalhar e estudar na minha área, que considero a minha área da saúde e eu

quero fazer minha faculdade de Enfermagem, (...) quando eu estiver na minha área fazendo o que gosto,

eu vou ta mais completa, mais feliz.(Letícia)

Quando eu entro na faculdade idealizo meu projeto profissional, minha vida profissional (...), então

pretendo ter a minha vida profissional para conseguir tudo aquilo que eu quero. (Ana) (...) o sistema acaba jogando a gente sempre para se preparar

mais, tinha que buscar um curso de qualquer forma até para arrumar um emprego, tinha que ter um curso para ganhar melhor alguma coisa. (...) eu estou mais buscando concurso por aí (...) então passar no concurso é uma coisa que vai me

(...) para que um projeto se concretize tudo deve organizar- se por quem o imaginou, mediante visualizações diversas.

Josso (2006, p.31)

Essa subcategoria foi se definindo a partir das falas dos atores ao descreverem seus sonhos, dando ênfase a projetos que se aproximaram do querer, na perspectiva de lhes promover satisfação pessoal e profissional, conforme se mostrou na ciranda abaixo.

Beatriz e Ana sonham em ser “boas” profissionais. Em outro momento do estudo Ana diz que intenciona fazer mais uma vez vestibular para fisioterapia. A pedagogia realmente não faz parte do seu projeto de vida. Já Beatriz também tem a mesma intenção de se tornar uma boa profissional, contudo, não demonstra ter a intenção de deixar a pedagogia para buscar outra profissão; ela pretende seguir por esse caminho mesmo não querendo ser professora.

Nas falas de Cecília e Letícia, pode-se perceber que ambas têm sonhos definidos. A primeira quer seguir a literatura para ter seu sonho mais ou menos atendido no campo das artes, e a segunda pretende seguir a enfermagem. Letícia plasma de forma enfática que “a minha profissão é a enfermagem”; isso leva a crer que a pedagogia está ocupando uma posição desconfortável em sua vida, já que ela não se reconhece nesse lócus, pois complementa dizendo que só sentir-se-á mais completa quando estiver na sua área, ou seja, a saúde.

Por outro lado, os planos de Lili são bem diversificados, mas dentre os caminhos prováveis não há possibilidade de se ver na sala de aula. Já Ariel tem emergência de começar a trabalhar, pois, conforme reporta, o sistema empurra o indivíduo para buscar um título, sendo induzido a fazer algo que não se afina.

Nessa ciranda emergem o enlace de sonhos com múltiplas variações no sistema psíquico dos atores, enquanto estão vivendo no mesmo espaço-temporal organizado e estruturado para o mesmo fim: receberem o diploma de pedagogos. A concepção dessa realidade vivencial encontra-se mediada entre o “princípio do prazer”, podendo jogar tudo para o alto, e começar de novo outro caminho profissional, o “princípio da realidade”, porquanto a lógica aí implicada diz que é preciso concluir o já iniciado para se ter uma profissão já definida e, com isso, atender à demanda da conjuntura social, na crença de que o diploma universitário abrirá as portas para galgar a independência financeira.

bastante pertinente ao discutir a “profissão como organização dos processos sociais estruturantes”. O autor esclarece que é necessário considerar a distinção entre as funções manifestas das funções latentes nas organizações profissionais, sendo suas colocações sustentadas por meio da análise desenvolvida nos estudos de Merton que, entre outros aspectos, chama atenção para “efeito perverso” da segregação social, quando o mecanismo da profissão está vinculado à burocratização da carreira,valorizando tão somente a função manifesta, na qual o diploma é a meta para o acesso a carreira profissional no final de um curso de graduação por meio de um currículo pré-definido.

Nas falas acima, entre as situações elencadas por Dubar (idem), também aparecem situações de inquietude pessoal referente à busca do conhecimento, do fortalecimento da identidade “para si”, identificadas na fala de Beatriz e Ana, com vistas à construção de um conhecimento coletivo para o exercício profissional, definindo-se mais pelo diploma, mesmo que esta profissão não seja a idealizada. Por outro lado, também se encontra nas demais falas dessa categoria discursos que vão ao encontro do enunciado no estudo de Merton, demonstrando assim a função manifesta que, em outras palavras, arrisco dizer, ter um “canudo universitário” abrirá as portas para a inserção no mercado de trabalho, concursos públicos e também aquietar os ânimos familiares quanto à aquisição de um diploma de um curso superior. Em outras palavras, a realização de um ideal de serviço guiado pelo processo burocrático, configurando, assim, a função latente, que passa a ocupar a função de reprodução, encarregando-se na manutenção da organização instituída.

Percebe-se que os atores desta pesquisa se encontram numa linha divisória entre o sonho de uma realização pessoal/profissional e uma realidade social configurada por suas inter-relações mais extensas, enlaçando familiares e amigos, e ainda o retrato emoldurado da produção capitalista como condições sine qua non da escolha profissional. Deste modo, passa-se a crer que é bem provável que tomar a decisão de romper com o já iniciado e lançar- se para a realização de novos sonhos seja uma tarefa bastante difícil, pois se torna imperativo ao indivíduo a ruptura com o já instituído para investir tempo e energia numa outra jornada de formação profissional.

O lançar-se pode configurar estar à beira do abismo e atirar-se às cegas sem imaginar o que se pode encontrar, ou seja, é prostrar-se frente ao falso equilíbrio profissional vivenciado. Assim, o ser educador/professor, para esses atores, é colocar-se em situação cômoda de aceitar a realidade que se apresenta ou transcender ao instituído.