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ANEXOS ANEXO A KEY WORDS LÍNGUA INGLESA

3 ENFOQUE TEÓRICO

3.3 A TERMINOLOGIA E SUAS VERTENTES

Em decorrência dos inúmeros avanços das ciências naturais, tem surgido ao longo dos últimos anos a necessidade de comunicação sobre assuntos sempre mais especializados e, com isso, a imperativa criação e delimitação de signos linguísticos para a designação da estrutura conceitual das mais diversas ciências. É fato notável que a produção de novos conhecimentos é condicionada a uma proliferação de novos termos. Consoante Barbosa (1990:155) “[...] qualquer ciência tem necessidade de um conjunto de termos rigorosamente definidos, pelos quais designa as noções que lhe são úteis: esse conjunto de termos constitui, pois, a sua terminologia”. Para serem comunicadas em um âmbito especializado, as ideias precisam ser designadas por um termo e o progresso de uma área depende, em certo grau, do processo de transferência da informação em que os termos são utilizados. Ao associar-se o uso de termos aos avanços técnico-científicos presenciados nos últimos anos se faz necessário ressaltar que o uso de terminologia vem de longa data.

A terminologia é tão antiga quanto a linguagem humana. Desde os tempos mais remotos o homem dá nome às coisas, aos animais, às plantas, às fontes naturais de alimentação e sobrevivência, aos instrumentos de trabalho, aos artefatos para a defesa pessoal, às peças de vestuário, em suma, a tudo que lhe está à volta. (BARROS, 2004: 28).

Já era empregada por filósofos gregos e como língua de negócios dos comerciantes cretas, também manifestada nos vocabulários especializados da arte militar (Rondeau, 1984).

De acordo com Barros (2004), muito das contribuições essenciais para o campo da terminologia surgiram a partir de trabalhos realizados por pesquisadores de outras áreas do conhecimento, por vezes indiretamente voltadas às Ciências da Linguagem enquanto disciplina, como é o caso da proposta de um sistema universal de nomenclatura binomial desenvolvida pelo botânico, zoólogo e médico Carl von Linné (1707-1778), nome conhecido no Brasil por sua forma aportuguesada: Lineu. Este pesquisador elaborou um sistema de classificação em que organizava, descrevia e unificava os nomes atribuídos em sua época aos diferentes tipos e grupos conhecidos de animais, plantas e minerais, nomeando-os através de suas espécies e gêneros. Em sua nomenclatura, os nomes científicos eram formados de duas palavras: a primeira oferecia o nome genérico iniciado por letra maiúscula e a segunda, geralmente um adjetivo, o epíteto específico, em letra minúscula (IAPT, 2012).

Tal sistemática de denominação a plantas e animais nos moldes da nomenclatura proposta por Lineu, considerada universal, uma vez que as palavras eram grafadas em latim independendo dos diferentes idiomas, também figura em alguns subdomínios da agropecuária, principalmente em campos do saber ligados a ela, tais como a silvicultura, a fruticultura, a floricultura, a horticultura e àquelas voltadas ao estudo dos animais, tanto de pequeno, quanto de grande porte, como a zootecnia. Coffea arabica (café), Manihot esculenta (mandioca), Ricinus communis (mamona), Passiflora edulis (maracujá), Hellianthus annuus (girassol), Lycopersicum esculentum (tomate) (Ribeiro, 2010) e Equus caballus (cavalo) são alguns binômios, a título de exemplificação, que constam da nomenclatura científica para identificação das espécies empregada em domínios da agropecuária, conforme a nomenclatura binomial de Lineu.

A contribuição dos trabalhos deste pesquisador à Terminologia, segundo Assumpção (2014), se destaca no estudo morfológico, ecológico, taxonômico das plantas e à concepção de um sistema de classificação das mesmas, embora não se constate, segundo a referida autora, que ele tenha

se dedicado ao estudo dos termos propriamente dito, e sim ao estudo e identificação das plantas quanto à espécie, ao gênero e à família.

No século passado, percebeu-se a necessidade de normalização de objetos, medidas e unidades, com o fim de se estabelecer uma comunicação técnico-científica sem ambiguidades (KRIEGER; FINATTO, 2004). Nesse cenário, é reconhecida a atuação do engenheiro austríaco Eugen Wüster (1898-1977), que fundamentou a Teoria Geral da Terminologia (TGT) a partir de sua tese de doutorado intitulada "Internationale Sprachnormung in der Technik, besonders in der Elektrotechnik" (A normalização internacional da terminologia técnica) em 1931, em que expõe os princípios básicos da TGT, constituindo-se a base científica para a elaboração de princípios terminológicos e dos métodos da lexicografia terminológica pela "International Standardization Organization" (ISA), antes da Segunda Guerra Mundial e pela "International Standardization Organization" (ISO), após a mesma. Surgia aí a Terminologia como campo de estudos de natureza normativa e metodológica dos termos1.

A teoria proposta por Wüster visa à pesquisa dos conceitos e dos termos a eles associados, interessando-se pelo estudo da natureza, criação e características dos conceitos e termos, fruto da necessidade de se padronizar a comunicação entre especialistas, através da instituição e normalização de formas estandardizadas, conferindo caráter normativo à Terminologia. Essa concepção se fundamenta num modelo positivista de ciência, em que os conceitos científicos são estáveis, pragmáticos e universais e a língua científica é um lugar homogêneo e transparente, visando a expressão de verdades científicas, a fim de controle e harmonização dos usos terminológicos em nível mundial (KRIEGER, 2000).

A teoria de Wuster inspirou muitos trabalhos de terminologia desenvolvidos até nossos dias, no entanto, várias críticas surgiram nas últimas décadas questionando seus objetivos. Ainda que Cabré (1999) considere a teoria wüsteriana sistemática e coerente, também lhe aponta algumas inconsistências.

A crítica dessa autora recai sobre a natureza reducionista da TGT com relação a dois aspectos significativos: a idealização da realidade, do conhecimento e da comunicação, e, também, quanto à limitação da terminologia à normalização (CABRÉ, 1993). Para a autora, essa teoria não

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Termo pode ser entendido como uma unidade lexical com um conteúdo específico dentro de um domínio específico. É também chamado de unidade terminológica. (BARROS, 2004:40

considera os aspectos cognitivos, linguísticos, comunicativos e sociais da terminologia, visto que o trabalho de Wüster deu-se numa área muito restrita da engenharia industrial, o que limitaria sua teoria conceitual e funcionalmente. No aspecto cognitivo critica a defesa da uniformidade do conhecimento especializado separado do conhecimento geral. Quanto ao aspecto linguístico, a teoria em questão enfatiza as características prescritivas dos termos e sua concepção como unidades diferenciadas das unidades lexicais. No aspecto comunicativo desconsidera as variações discursivas, sendo permitido a utilização de um único registro padronizado. Diante de tais considerações e posicionamento, Cabré (1999:114) argumenta que “o posicionamento crítico para com a TGT não a invalida como teoria, somente destaca sua limitação conceitual e funcional, bem como sua falta de generalização, o que a torna insuficiente para explicar as unidades terminológicas em toda sua plenitude.”

Considerando os aspectos sociais, comunicativos, pragmáticos e discursivos para suprir o que considera falho na TGT, Cabré (1999) apresenta os fundamentos de sua proposta para o estudo dos termos, e a estabelece como Teoria Comunicativa da Terminologia - TCT. Tais princípios são assim definidos pela autora:

a) A Terminologia é um campo interdisciplinar, construído a partir de uma teoria do conhecimento, teoria da comunicação e da linguagem;

b) O objeto de estudo são os termos, que formam parte da linguagem natural e da gramática que descreve cada língua;

c) Os termos são unidades léxicas, que se ativam pelas condições pragmáticas (conhecimento do mundo) de adequação a um tipo de comunicação. São formados de forma ou denominação e significado ou conteúdo; d) O conteúdo dos termos é simultâneo à forma. O conteúdo nunca é absoluto, mas relativo, dependendo de cada âmbito e situação de uso;

e) Os conceitos de uma mesma área mantêm relações diferentes entre si, e o conjunto destas relações constitui a estrutura conceitual de uma disciplina; f) O valor de um termo se dá pelo posicionamento que

ele ocupa em uma área; pois os termos não pertencem a uma área, mas são utilizados em uma área com um valor específico;

g) O objetivo da Terminologia teórica é descrever formal, semântica e funcionalmente as unidades que podem ser consideradas termos. O objetivo da Terminologia aplicada é compilar as unidades de

valor terminológico em um tema e situação determinados e estabelecer as características de acordo com a situação, ressaltando mais uma vez a importância do contexto;

h) A finalidade aplicada da compilação e análise é diversa e permite muitas aplicações, nas quais se ativa a dupla função dos termos: a de representação e transferência do conhecimento especializado. (CABRÉ, 1999: 131-133)

Vista como um campo interdisciplinar, não mais autônomo, passível de interagir com bases de outras ciências, a TCT oferece uma nova forma de se conceituar o termo, sem preconizar o seu caráter absoluto, como idealizado pela TGT. A Teoria Comunicativa da Terminologia proposta por Cabré (1999) enfatiza o contexto. Agora, é nos limites de uma situação de comunicação especializada que se confere a uma unidade lexical seu valor terminológico. Consoante Barros (2004):

Contrariamente à TGT, a TCT não aceita a distinção drástica entre unidade terminológica (termo) e unidade lexical da língua geral (palavra). Considera os termos como unidades linguísticas que exprimem conceitos técnicos e científicos, mas que não deixam de ser signos de uma língua natural (geral), com características e propriedades semelhantes (BARROS, 2004:57).

Delimita-se, também, na TCT, que o termo pode ser utilizado em vários contextos e por outras formas linguísticas. Nesse sentido, podemos considerar a possibilidade de que um termo da Agropecuária também venha pertencer a outro ramo das ciências, ainda que com outro caráter. Em nosso estudo assumimos a perspectiva de que as palavras constituem o léxico geral da língua e se tornam termos de acordo com seu uso no domínio de especialidade, como é o caso do item lexical cobertura, que assume estatuto terminológico quando utilizado no domínio específico da agropecuária, como pode ser visto mais adiante no Capítulo 4.

Ademais, na TCT são consideradas as variações denominativas observadas no discurso especializado, que são passíveis de ocorrer face às diferentes situações comunicativas que se estabelecem dentro de um mesmo domínio de especialidade. A TCT considera as adaptações comunicativas, uma vez que a língua não é homogênea entre as ciências, entre os diferentes grupos profissionais ou entre as distintas regiões geográficas. Isso implica poder descrever o universo de um domínio específico em suas mais

diversas possibilidades denominativas, apontando para os seus contextos de uso.

Face ao seu estatuto teórico, que se desenvolve e se consolida como disciplina no estudo do léxico especializado, Krieger (2011:445) afirma que “a Terminologia já escreveu um percurso histórico que tem impulsionado sua investigação de forma a alinhá-la à Lexicologia e à Lexicografia, formando o trio de disciplinas que configuram as denominadas Ciências do Léxico”. Ao se colocar no mesmo nível da Lexicologia e da Lexicografia, segundo as considerações da referida autora, a Terminologia teria por objetivo o estudo do tratamento das unidades lexicais típicas de uma área científica, técnica ou tecnológica, o que subsidia a fundamentação da presente pesquisa, que como apresentada anteriormente, enfoca material textual de uma área científica específica: a agropecuária, onde a constituição dos candidatos a termos-entrada do glossário proposto é contextualizada em discursos escritos em fontes que tenham o reconhecimento da comunidade que utiliza essa linguagem de especialidade, produzindo-se, assim, seu caráter descritivo de unidades especializadas.

De acordo com Maria Teresa Cabré (1999), a Terminologia pode ser considerada: a) a disciplina, matéria que se ocupa dos termos especializados; b) a prática, conjunto de princípios que regem a compilação de termos; c) o produto gerado por essa prática, ou seja, o conjunto de termos de uma determinada especialidade. No escopo de nossa pesquisa usamos “Terminologia”, grafada com letra maiúscula, para nos referir à prática e disciplina e, “terminologia”, com letra minúscula, para o conjunto de termos. Assim, com base no princípio de que a TCT vem abrindo caminhos consistentes à Terminografia no tocante à pesquisa e elaboração de inventários de vocabulários, apresentamos na seção que segue considerações a respeito das obras terminográficas nos domínios de especialidade.