• Nenhum resultado encontrado

2.5. Epidemiologia da Tuberculose

2.5.1. A Tuberculose no mundo

Com um terço da população mundial, i.e. cerca de 2 biliões de pessoas, infectada pelo

Mycobacterium tuberculosis, estimaram-se 14,4 milhões de casos prevalentes e 9,2

milhões de novos casos em 2006 (139/100.000 habitantes), que resultaram em 1,7 milhões de mortes em todo o mundo. É este o mais recente balanço apresentado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a tuberculose (World Health Organization, 2008a), que, apesar de curável, é a doença infecciosa que mais mata em todo o mundo a seguir à SIDA. De facto, 0,7 milhões dos casos de tuberculose (8,0% do total) são co- infectados pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH), sendo que as mortes por tuberculose associadas à SIDA atingem um número de 0,2 milhões por ano a nível global.

Um total de 5,1 milhões de novos casos de tuberculose foram notificados em 2006, por 202 dos 212 países e territórios ao nível mundial, dos quais 2,5 milhões (50,0%) foram

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

casos bacilíferos. Três regiões – Sudeste Asiático, Pacífico Ocidental e África – constituíram 83,0% do total de notificações à OMS. De facto, a situação da tuberculose é particularmente dramática no Sudeste Asiático e na África Subsariana (World Health Organization, 2008a), onde os números mostram uma realidade assustadora, com mais de 300 casos por 100.000 habitantes por ano (figura 3). Segundo as estimativas da OMS, o Sudeste Asiático e o Pacífico Ocidental contribuíram para 55,0% do total de casos em todo o mundo, seguidos de África com uma estimativa de 31,0%.

Figura 3 – Estimativas da taxa de incidência de tuberculose por país em 2006 (World Health Organization, 2008a)

Em 2006, e de acordo com a informação disponível de 114 países e 2 regiões administrativas da China, indica-se a proporção de qualquer resistência aos antituberculosos e de resistência à isoniazida, com base em 2.509.545 casos de tuberculose declarados à OMS (tabela 2) (World Health Organization, 2008a).

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

Tabela 2 – Estimativas da proporção de resistências em 2006 (World Health Organization, 2008a)

Estimativas de resistências Casos sem história de

tratamento anterior

Casos de retratamento

Todos os casos

% IC95% % IC95% % IC95%

Qualquer resistência 17,0 13,6-20,4 35,0 24,1-45,8 20,0 16,1-23,9 Resistência à isoniazida 10,3 8,4-12,1 27,7 18,7-36,7 13,3 10,9-15,8

Ainda em 2006, foram estimados 489.139 (IC95% 455.093-614.215) casos de tuberculose multirresistente de um total de 10.229.315 casos incidentes em 185 países, assinalando a necessidade de se prestar mais atenção a esta forma de tuberculose, dado que, potencialmente, não tem cura. A China e a Índia constituem os países com mais casos incidentes de tuberculose multirresistente, representando 50,0% do total de casos estimados (World Health Organization, 2008a). A proporção de tuberculose multirresistente foi estimada em 4,6% (IC95% 4,6-6,0) em todo o mundo, variando entre 0,0%-3,0% na Europa Ocidental e entre 15,0-35,0% na Europa de Leste. Na China e na Índia estima-se que 5,0%-8,0% dos casos de tuberculose sejam multirresistentes, e na Europa de Leste que um em cada cinco doentes tenham uma tuberculose multirresistente. De facto, e segundo a OMS, os maiores desafios no controlo da tuberculose continuam a ser a tuberculose multirresistente e a tuberculose associada a outras infecções, como é exemplo a infecção pelo VIH (World Health Organization, 2008b). Na tabela 3 indicam-se as estimativas da OMS sobre a tuberculose multirresistente nos casos sem e com história de tratamentos antibacilares anteriores, no mundo e em Portugal em 2006.

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

Tabela 3 – Estimativas da proporção de tuberculose multirresistente no mundo e em Portugal em 2006 (World Health Organization, 2008a)

Estimativas de tuberculose multirresistente* Casos sem história de

tratamento anterior

Casos em retratamento

Todos os casos

% IC95% % IC95% % IC95%

Em 185 países da OMS 3,1 2,9-4,3 19,3 18,2-21,3 4,6 4,6-6,0

Em Portugal 0,9 0,4-1,5 9,3 5,4-14,7 1,7 1.1-2,5

*tuberculose multirresistente – doente que apresenta resistência simultânea à isoniazida e rifampicina, com ou sem resistência a outros fármacos antituberculosos.

Falar de multirresistência é também falar da sua forma mais grave, a tuberculose extensivamente resistente, i.e., do doente que além de resistência à isoniazida e rifampicina apresenta também resistência a uma fluoroquinolona (ciprofloxacina ou ofloxacina) e a um dos injectáveis de 2.ª linha (canamicina, amicacina ou capreomicina). Reconhecida em Novembro de 2005 em todo o mundo (Shah, Wright, Drobniewski et al., 2005; Centers for Disease Control and Prevention, 2006; World Health Organization, 2006; Gandhi, Moll, Sturm et al., 2006), a tuberculose extensivamente resistente é mais difícil de tratar, implica custos mais elevados, e apresenta uma mortalidade mais elevada. Hoje, não há dúvidas de que a emergência de casos extensivamente resistentes é uma realidade sempre que os antituberculosos de 2.ª linha são usados inapropriadamente e em grande escala (Madariaga, Lalloo, Swindells, 2008; Raviglione, 2008). De acordo com o relatório da OMS de 2008, foram notificados 4012 casos de tuberculose multirresistente, dos quais 7,5% (301/4012) foram extensivamente resistentes (World Health Organization, 2008a). A proporção de casos de tuberculose extensivamente resistente em países da Europa Central e Ocidental, da América e da Ásia variou entre 0,0% em 11 países e 30,0% no Japão. No

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

Leste, a tuberculose extensivamente resistente varia de 4,0% na Arménia para 24,0% na Estónia. Dados recentes da África do Sul indicam uma proporção de 5,6% casos extensivamente resistentes num total de 17.615 doentes multirresistentes entre 2004 e Outubro de 2007 (World Health Organization, 2008a). Nos Estados Unidos da América, entre 1993 e 2007, 3,9% (83/2087) dos casos multirresistentes estudados para os fármacos de 2.ª linha foram extensivamente resistentes (Shah, Pratt, Armstrong et al., 2008). Estes 83 casos extensivamente resistentes constituíram 0,04% do total de casos de tuberculose com resultado do teste de susceptibilidade aos antituberculosos, e a 2,5% (83/3379) dos casos multirresistentes notificados nos Estados Unidos da América no período 1993-2007.

Na figura 4 estão assinalados os países que até Fevereiro de 2008 declararam à OMS casos confirmados de tuberculose extensivamente resistentes.

Figura 4 – Países com casos confirmados de tuberculose extensivamente resistente (Madariaga, Lalloo, Swindells, 2008)

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

De facto, a selecção dos doentes e a prática de realizar testes de susceptibilidade aos antituberculosos de 2.ª linha variam ainda de país para país, e ao longo do tempo. No entanto, desde 2002, 45 países ao nível mundial notificaram à OMS pelo menos um caso de tuberculose extensivamente resistente. Muitos outros países encontram-se ainda a realizar testes de susceptibilidade aos antituberculosos de 2.ª linha.

Contudo, e em geral, o número de novos casos de tuberculose per capita parece encontrar-se estabilizado ou em ligeira queda nas seis regiões da OMS, exceptuando a Europa. Na realidade, os dados epidemiológicos apontaram para um pico em 2003, seguindo-se uma estabilização da incidência na Europa ou relativa descida nas restantes regiões. O aparente aumento dos números de novos casos pode explicar-se pela diferença demográfica, com uma população crescente na Europa e decrescente em África (World Health Organization, 2008a).

O sexto objectivo da Declaração do Milénio, definido pela parceria “Stop TB” e Assembleia Mundial da Saúde da OMS, dizia respeito à suspensão da progressão da tuberculose, ou seja, propunha-se voltar aos números de 1990. Com os dados mais recentes, só a Europa e África não o conseguirão atingir, devido aos aumentos dos números relativos à infecção em 1990. No entanto, o objectivo deu uma atenção renovada à problemática da tuberculose.

As principais razões para o aumento global da tuberculose estão há muito definidas: - a pobreza e as discrepâncias sociais e económicas crescentes em vários países; - a mobilidade das populações para os grandes centros urbanos;

- a negligência na gestão da doença, desde a deficiente capacidade de detecção, passando pelo diagnóstico tardio, até à baixa taxa de cura;

Transmissão Recente da Infecção pelo Complexo Mycobacterium tuberculosis Capítulo 2 na Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo – Contributo Epidemiológico Introdução

Se não forem instituídos programas de controlo eficazes, estima-se que em 2020 existirão 1000 milhões de pessoas infectadas pelo Mycobacterium tuberculosis, das quais 150 milhões irão desenvolver a doença, e 36 milhões morrerão de tuberculose.