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1 INTRODUÇÃO

3.2 Concorrência Paradigmática

3.2.1 Abordagem da Escolha Estratégica

A orientação para o mercado, segundo Perin (2001), tem sido um tema central na área de marketing, principalmente em função das recentes mudanças no ambiente competitivo e a conseqüente necessidade de se buscar diferenciais sustentáveis. Na sua visão, poucos temas receberam semelhante destaque tanto no meio acadêmico quanto empresarial. Dentre as abordagens mais aceitas, destaca-se a de Naver e Slater (1990) que compreendem a orientação para o mercado como sendo composta, simultaneamente, por uma orientação para o cliente e para o concorrente, associada à coordenação interfuncional de todas as atividades da empresa com o objetivo de criação de valor superior para os segmentos-alvo. Para estes autores, empresas de fato orientadas para o mercado têm foco no longo prazo e na rentabilidade, assim como apresentam performance superior.

Day (2001) afirma que as organizações podem se tornar mais orientadas para o mercado pela construção de capacidades especiais que as tornem distintas das demais, sendo uma tarefa crítica da administração a definição de quais capacidades desenvolver e enfatizar. Na percepção deste autor, as empresas orientadas para o mercado tomam decisões estratégicas a partir de um senso compartilhado sobre (a) o que é importante para o cliente; (b) os valores que são ofertados pelos concorrentes; (c) os diferenciais competitivos / competências centrais da empresa. Nesse sentido, Naver e Slater (1990) argumentam que a orientação para o mercado pode ser potencializada pela orientação para a aprendizagem enquanto Day (2001) ressalta que não se deve restringir o processo de produção de inteligência competitiva à compreensão das demandas dos clientes e sua tradução em novos produtos, mas também em novas formas de atuar nos negócios.

Toledo e Amigo (1999), ao estudar a relação entre orientação para o mercado e competitividade, afirmam que esta última deve ser compreendida como um desempenho superior nos fatores críticos de sucesso, segundo avaliação dos clientes e em relação aos concorrentes. Desta forma, a competitividade decorre da oferta de um valor percebido como superior pelos clientes, cabendo à empresa o desafio de criá-lo em um contexto adequado de custo / benefício.

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Treacy e Wiersema (1995), após estudar 80 empresas líderes em 20 setores de atuação, concluíram que elas optavam pela construção de excelência em uma das três formas de valor consideradas importantes por seus clientes (melhores produtos, melhor custo total ou melhor solução total) e desenvolviam um modelo operacional que lhes dava a capacidade de cumprir sua proposição de valor, além de manter padrões razoáveis nas outras dimensões de valor. Na visão desses autores, os clientes conseguem distinguir entre as várias espécies de valor e, em geral, não exigem todas do mesmo fornecedor.

A busca da satisfação e da lealdade dos clientes, na visão de Treacy e Wiersema (1995), não cria, por si só, um valor inigualável. Para eles, o valor é criado a partir da escolha dos clientes e do estreitamento do foco da empresa para melhor atendê-los na disciplina de valor considerada mais importante por eles. Além disso, como a escolha da disciplina de valor definirá o modelo operacional necessário à criação desse valor, a própria natureza da empresa também estará sendo definida. Nesse sentido, Toledo e Amigo (1999) argumentam que no centro do modelo operacional estará um conjunto de processos essenciais, que serão isolados para receber atenção especial e dos quais dependerá a capacidade da empresa de criar um valor insuperável com lucro.

Segundo Treacy e Wiersema (1995, p. 48),

as empresas operacionalmente excelentes entregam uma combinação de qualidade, preço e facilidade de compra que ninguém em seus mercados consegue igualar. Elas não são inovadoras em produtos ou serviços, nem cultivam relacionamentos individualizados com seus clientes. Elas executam extraordinariamente bem e sua proposição aos clientes é a garantia de preços baixos e/ou de atendimento sem amolações.

O modelo operacional desse tipo de corporação pode ser caracterizado por processos de suprimento e atendimento otimizados, visando minimização de custos; operações padronizadas e simplificadas, que são planejadas, centralizadamente e rigidamente controladas, deixando poucas decisões a critério de funcionários da linha de frente; sistemas gerenciais que focalizam transações integradas, confiáveis e rápidas, além da obediência a normas; uma cultura que abomina o desperdício e premia a eficiência (TREACY E WIERSEMA, 1995).

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As empresas identificadas com a liderança de produto procuram oferecer o melhor produto, superando sempre as fronteiras do desempenho. Esse tipo de organização ainda é caracterizado por inovação constante, superação (canibalização) de seus próprios produtos, além de agilidade no lançamento dos mesmos. De acordo com Treacy e Wiersema (1995, p.53), “uma empresa em busca da liderança em produtos empurra continuamente seus produtos para o domínio do desconhecido, do não tentado ou do altamente desejável. (...) A proposição para os clientes é o melhor produto e ponto final”.

As organizações que adotam esta disciplina de valor têm seu modelo operacional configurado pelo foco sobre os processos essenciais de invenção, desenvolvimento de produtos e exploração do mercado; possuem uma estrutura frouxamente alinhavada, para se ajustar às iniciativas e redireções empreendedoras que caracterizam o trabalho em territórios inexplorados. Também têm sistemas gerenciais voltados para resultados, que medem e premiam o sucesso de novos produtos e não punem a experimentação necessária à sua criação. Além disso, a cultura organizacional encoraja a imaginação e a realização individuais, bem como a mentalidade aberta e movida pelo desejo de criar o futuro (TREACY; WIERSEMA, 1995).

As empresas que praticam a intimidade com o cliente focalizam não o que o mercado deseja, mas o que clientes específicos desejam, cultivando relacionamentos ao especializarem-se em satisfazer necessidades únicas que, com freqüência, apenas elas reconhecem. Nesse sentido, o cliente é quem define os produtos da empresa, o que possibilita a ela ser a melhor solução para esse comprador.

As organizações que são íntimas com o cliente têm modelos operacionais que são caracterizados pela obsessão com os processos essenciais de desenvolvimento de soluções, gerenciamento de resultados e gerenciamento de relacionamentos, ou seja, elas ajudam os clientes a compreenderem exatamente o que necessitam e garantem a implementação adequada da solução. Também têm uma estrutura que delega a tomada de decisão aos funcionários próximos aos clientes e lhes dá autoridade para agir e fazer o acompanhamento das suas decisões. Os sistemas gerenciais são voltados para a criação de resultados para os clientes, cuidadosamente selecionados e estimulados. E ainda possuem uma cultura que prefere soluções específicas em vez de genéricas, que prospera com relacionamentos profundos e duradouros com os clientes (TREACY; WIERSEMA, 1995).

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Nos estudos realizados por Porter (1989), a posição favorável de uma empresa em uma indústria é explicada pela escolha deliberada de uma estratégia competitiva que lhe confere vantagem competitiva. Esta escolha tem como referência a atratividade da indústria em termos de rentabilidade a longo prazo e os fatores que determinam esta atratividade (novos entrantes, concorrentes na indústria, produtos substitutos, fornecedores e clientes). Para ele, a manutenção e a renovação das vantagens competitivas são pré-condições para que essas empresas mantenham sua liderança, o que implica a necessidade permanente de investimentos em inovação.

Segundo Porter (1989, p.23), “...as grandes estratégias consistem em uma configuração singular de muitas atividades de reforço que dificultam a imitação pura e simples”. A escolha e gestão destas atividades constitui, nesta perspectiva, o modelo de organização que viabiliza a criação e sustentação da vantagem competitiva.

Para melhor compreender a dinâmica destas atividades, Porter (1989) propõe uma ferramenta denominada “cadeia de valor”, a qual permite desagregar uma empresa nas suas atividades de relevância estratégica, permitindo a compreensão da estrutura de custos e das fontes existentes e potenciais de diferenciação. Assim, para este autor,

as atividades de valor podem ser divididas em dois tipos gerais, atividades primárias e atividades de apoio. As atividades primárias são aquelas envolvidas na criação física do produto e na sua venda e transferência para seu comprador, bem como na assistência após a venda. (...) As atividades de apoio sustentam as atividades primárias e a si mesmas, fornecendo insumos adquiridos, tecnologia, recursos humanos a várias funções no âmbito da empresa. (PORTER, 1989, p. 34)

Este autor também chama a atenção para o fato de que as atividades da cadeia de valor não devem ser vistas como blocos imóveis. Ao contrário, são interdependentes e relacionam-se por meio de elos dentro da cadeia. Inclusive, são estes elos que viriam determinar a relação existente entre as diversas áreas de uma organização. Identificá-los significa, portanto, descobrir em qual ponto uma atividade de valor afeta ou é afetada pelo desenvolvimento de outra, sendo o seu controle a principal forma de diagnosticar ou obter vantagem competitiva.

Cabe ressaltar que os elos não estão presentes somente dentro da cadeia de valor de uma empresa (elos horizontais). Os elos verticais (estabelecidos entre as atividades da empresa e

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seus fornecedores ou canais) também desempenham um importante papel, afetando tanto no custo quanto na diferenciação. Neste caso, segundo Ribeiro, Rezende e Rezende (2001), a competitividade já não depende apenas de um ator isolado mas de sua inserção sistêmica.

Outra observação importante é que os compradores também possuem cadeia de valor. Nesse sentido, os produtos fornecidos por uma empresa constituem os insumos que serão utilizados pelos seus compradores em suas cadeias numa tentativa de criar valor. Diante disso, uma empresa deve dispensar bastante atenção ao relacionamento estabelecido entre a sua cadeia de valor e a dos seus compradores. Segundo Porter (1989, p.121), “a cadeia de valor de um comprador comercial, institucional ou industrial reflete sua estratégia e método de implementação, enquanto a cadeia de valor de uma família reflete os hábitos e as necessidades de seus membros”.

Da mesma forma que a análise da cadeia de valor dos compradores pode contribuir para compreender seus padrões de demanda, ela é uma ferramenta que favorece a interpretação das ações dos concorrentes. Analisando as atividades de valor desenvolvidas pela concorrência, é possível compreender, por exemplo, seu posicionamento competitivo e o seu curso de ação.

Além de ser responsável pela criação e sustentação de valor, a cadeia de valor também pode desempenhar uma importante função no projeto da estrutura organizacional. Ela pode proporcionar a base para a divisão do trabalho em atividades distintas, assim como facilitar a integração destas mesmas atividades a partir do gerenciamento dos elos. Nesse contexto, a gestão dos elos depende da capacidade empresarial de coordenação ou otimização das atividades, assim como da presença de sistemas de informação integrados.

A principal vantagem da utilização da cadeia de valor enquanto ferramenta de análise empresarial é, de acordo com Fine et. al. (2002, p.110), o fato dela destacar que “a verdadeira capacidade essencial de uma empresa – talvez a única efetivamente sustentável - é sua habilidade de projetar e redesenhar sua cadeia de valor a fim de descobrir continuamente fontes de vantagem máxima, mesmo que temporária”.

Segundo Porter (1989, p.10), existem três estratégias genéricas que podem conduzir as empresas ao alcance de vantagem competitiva sustentável, sendo que elas implicam em formas específicas de combinar as atividades da cadeia de valor. São elas: liderança no custo,

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diferenciação e enfoque (no custo ou na diferenciação). Na sua visão, para se obter vantagem competitiva é fundamental que a “empresa faça uma escolha (...) sobre o tipo de vantagem competitiva que busca obter e sobre o escopo dentro do qual irá alcançá-la”.

Nesta perspectiva, um líder em custo apresenta um amplo escopo, atende a muitos segmentos, podendo estar presente em indústrias correlatas, sendo que “a vantagem de custo resulta se a empresa obtém um custo cumulativo na execução das atividades de valor mais baixo que o custo da concorrência” (PORTER, 1989, p. 53).

Outro ponto que merece ser destacado é o fato da estratégia de liderança em custo requerer inovações e racionalizações de processo ou de fontes de matérias primas para que a empresa consiga operar com um nível de custos abaixo do de seus concorrentes. Essas inovações devem ser de difícil imitação para que a vantagem competitiva não seja erodida.

A estratégia de diferenciação, por sua vez, pressupõe que uma empresa deva procurar ser única em sua indústria, sendo que os meios de diferenciação são específicos para cada setor industrial. Estes meios podem basear-se no próprio produto, no sistema de distribuição e de comercialização, no marketing e em uma grande variedade de outros fatores. Mas essa fonte de diferenciação deve ser, também, de difícil imitação, sustentável e renovável ao longo do tempo.

De acordo com Porter (1989, p.115), o valor exclusivo fornecido pelas empresas que adotam a estratégia de diferenciação provém das atividades da cadeia de valor, pois cada uma delas pode constituir-se em uma fonte em potencial de singularidade. Na sua visão,

os condutores da singularidade são as razões subjacentes pelas quais uma atividade é singular. Sem identificá-los, uma empresa não pode desenvolver inteiramente meios para a criação de novas fórmulas de diferenciação ou para diagnosticar o grau de sustentabilidade da diferenciação existente.

Deve-se ter em mente, entretanto, que a singularidade por si só não resulta em diferenciação. A singularidade deve representar um valor para o comprador para se constituir em um diferencial competitivo. Segundo Porter (1989, p 123), “o valor de ser singular em uma atividade de valor é seu impacto direto e indireto sobre o custo ou o desempenho do

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comprador. O nível geral de diferenciação de uma empresa é o valor cumulativo da singularidade para o comprador em toda sua cadeia de valor”.

Na tentativa de fornecer os valores que são importantes para os clientes, a estratégia de diferenciação altera os condutores de custos das atividades em que a singularidade está baseada. Nesse sentido, segundo Porter (1989, p.123), “uma empresa que pode obter e sustentar uma diferenciação será um competidor acima da média em sua indústria, se seu preço-prêmio for superior aos custos extras a que ela fica sujeita por ser única”.

Na visão de Porter (1989, p.141), uma das grandes preocupações e o objetivo final da estratégia de diferenciação é a sustentabilidade da singularidade, uma vez que

a diferenciação não resultará em um preço-prêmio a longo prazo, a menos que suas fontes permaneçam valiosas para o comprador e não possam ser imitadas pelos concorrentes. Assim, uma empresa deve encontrar fontes duradouras de singularidade protegidas por barreiras contra imitação.

Neste sentido, Porter (1989, p. 146) ressalta que “uma empresa com uma vantagem de custo sustentável na execução das atividades que levam à diferenciação desfrutará de uma sustentabilidade muito maior”.

Ao escolher a estratégia genérica por meio da qual buscará alcançar vantagem competitiva, uma empresa almeja conquistar e/ou consolidar sua posição no mercado, assim como ser facilmente identificada por seus consumidores a partir de seus diferenciais competitivos. Segundo Porter (1989, p.52), “o lema da estratégia competitiva é ser diferente. Significa escolher, de forma deliberada, um conjunto diferente de atividades para proporcionar um mix único de valores”.

Entretanto, Porter (1989, p.128) ressalta que o valor criado através da administração de todas as atividades que compõem uma cadeia de valor precisa ser percebido pelo consumidor para que a vantagem competitiva seja alcançada. Para ele, “a percepção do comprador sobre uma empresa e sobre seu produto pode ser tão importante quanto a realidade daquilo que a empresa oferece”.

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Pode-se notar que existe um diálogo entre a teoria de Treacy e Wiersema (1995) e a de Porter (1989) na medida em que estes autores destacam que o ponto de partida de uma boa estratégia é ter o objetivo correto, que, na visão deles, é um excelente retorno sobre o investimento a longo prazo. Para eles, estratégia é sinônimo de escolha, já que é preciso decidir quais necessidades de quais clientes a empresa quer satisfazer. Da mesma forma, eles ressaltam que cada disciplina de valor ou estratégia genérica está baseada na escolha entre atividades e requer diferentes processos, organização e cultura organizacional. Assim, ao optar pela adoção de uma disciplina de valor ou estratégia genérica como forma de se orientar para o mercado, as empresas devem realizar trade offs e serem efetivas na gestão das atividades de sua cadeia de valor/modelo operacional visando alcançar os resultados pretendidos com essa escolha. É nesse contexto que Hunt e Morgan (1995) chegam a afirmar que a orientação para o mercado deve ser vista como um modelo de organização que viabiliza a implementação da estratégia competitiva.

Como pôde ser percebido, os autores representativos da abordagem da escolha estratégica acolhem o princípio da ação racional-instrumental, sob o qual formular uma estratégia significa escolher meios mais eficientes para atingir resultados econômicos deliberadamente traçados. Ou seja, busca-se maximizar o uso de informações e a alocação de recursos, visando a superação/desvio de ameaças ou o aproveitamento de oportunidades ambientais. Nessa perspectiva, segundo Carrieri (1998), a estratégia é vista como um grupo de técnicas racionais para se conseguir algum controle sobre o ambiente, sendo que “a escolha é considerada o principal elo de ligação entre a organização e o ambiente” (FONSECA; MACHADO-DA- SILVA, 2002, p. 195). A estratégia é, assim, adaptativa, reativa e mimética, sendo que as organizações, a ação organizacional e a estrutura constituem respostas do estrategista às diversas condições objetivas do ambiente.

Carrieri (1998, p.03) destaca, ainda, que, ao se conceber a estratégia como modelos exclusivamente racionais a serem seguidos pela empresa, passa-se, também, a acreditar que a organização que não a segue não é racional, podendo sucumbir à “mão-invisível” do mercado. Desta forma, visando a sobrevivência e o crescimento, elabora-se “uma seqüência de ações imaginadas, pensadas por quem tem poder, que devem ser concretizadas por quem não tem poder”.

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Tal modelo revela o posicionamento no topo da hierarquia somente daquele indivíduo capaz de definir os propósitos da organização e de coordenar as atividades dos demais segundo a sua própria determinação, exercendo como funções básicas as atividades de planejar, organizar, gerenciar, dirigir e controlar. Assim, pode-se dizer que suas atribuições englobam a escolha de domínios de produto e de mercado, de tecnologias apropriadas para a produção e distribuição dos produtos oferecidos, além da criação de um sistema de informações, de comunicação e de controle das operações, preparando a organização para ajustar-se ao ambiente.

Esse dirigente, segundo Fonseca e Machado-da-Silva (2002, p. 97), garante tais prerrogativas pela sua “habilidade de controlar situações críticas ou de alocar recursos escassos”. Ele integra um grupo que exerce influência por meio da capacidade de articular interesses pessoais e organizacionais, assim como manipular forças internas e externas, conforme sua avaliação das circunstâncias ambientais. Em outras palavras, ele é um agente econômico que “lida com o mundo real de maneira objetiva, procurando enfrentar toda a sua complexidade, o que lhe confere uma onisciência racional...”.