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ABORDAGENS SOBRE O DESENVOLVIMENTO E O BRASIL NESSE CONTEXTO

CAPÍTULO I ESPAÇO GEOGRÁFICO, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA FAMILIAR

1 ESPAÇO GEOGRÁFICO, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA FAMILIAR

1.2 ABORDAGENS SOBRE O DESENVOLVIMENTO E O BRASIL NESSE CONTEXTO

O termo desenvolvimento remete a várias interpretações e, normalmente, está acompanhado de um adjetivo que o qualifica. A referida temática ganhará fundamento a partir, principalmente, da noção histórico-desenvolvimentista de Furtado (1981, 1992 e 1997), mas também na liberdade substantiva dos indivíduos enquanto promotores de desenvolvimento, expressa em Sen (2000); e na correlação das ideias de ambos os autores, juntamente à análise preconizada por Favareto (2006). Posteriormente, a análise do desenvolvimento rural será focada a partir de correlação de Kageyama (2004 e 2009), Schneider (2010), Veiga (2001) e Abramovay (2003); adentrando-se, em seguida, as

discussões realizadas por Pereira (1997), Bastos (2006) e Delgado (2011) – todos numa perspectiva de inserção do rural na análise do Brasil após a Ditadura Militar, considerando as mudanças nos parâmetros de desenvolvimento, que se volta agora primordialmente para as demandas socioeconômicas.

Os estudos que levaram em consideração o desenvolvimento remetem ao período do

Welfare State (Estado de Bem-estar Social), com embasamento na perspectiva keynesiana,

isto é, na valorização do poder estatal sobre as bases econômicas no período pós-Segunda Guerra Mundial. Deste modo, o desenvolvimento, na sua origem, preconizava o produtivismo e a expansão contínua de capital. Com isso, o desenvolvimento passa a ser interpretado como sinônimo de crescimento, em termos produtivos e de evolução, no sentido histórico e natural.

Esse momento também é vivenciado no Brasil até 1990, quando a ideologia neoliberal força a retirada das instituições estatais das políticas econômicas dirigidas ao setor produtivo e, assim, desarticula o interesse pelas lógicas desenvolvimentistas. A concepção de desenvolvimento foi retomada no século XXI, a partir do ideário de “justiça distributiva”, através de maior intervenção do Estado, se comparada ao período da chamada década perdida (Filippi, 2011).

Todavia, no seu progresso histórico, o termo desenvolvimento alude à questão da competitividade entre os sistemas políticos-ideológicos e à possibilidade de intervenção estatal por meio de políticas que visavam o bem comum. O termo resulta da história humana, que concebe o homem como responsável pela produção dessa estrutura e de seu funcionamento. Deste modo, o homem é o produtor de modelos e de processos sociais que, “[...] ao longo do tempo e de acordo ao espaço físico, modifica conceitos e ideias do que seria desenvolvimento” (ALCANTARA, 2013, p. 43). Tais modelos e processos são refletidos na ação do Estado enquanto promotor de políticas públicas em prol do desenvolvimento.

No Brasil, o termo desenvolvimento ganha relevância com Furtado (1981), quando é definido relacionado à evolução de um sistema social de produção que, a partir da utilização de técnicas modernas, eleva a produtividade. Nesse sentido, o autor (1981, p.16) apresenta três dimensões do desenvolvimento: 1- incremento na eficiência do sistema social de produção; 2- satisfação das principais necessidades da população; e 3- promoção dos objetivos almejados por grupos sociais dominantes, os quais competem na utilização de recursos escassos.

Por essas dimensões, o autor explicita que o desenvolvimento não se refere apenas ao aumento de eficácia do sistema de produção, nem da implantação de uma ideologia, mas também, por meio de condicionamentos técnicos, possui a incumbência de favorecer a

evolução dos sistemas produtivos, que, por consequência, deveriam contribuir na seara da igualdade social bem como possibilitar a expansão continuada dos gastos no segmento do consumo. O desenvolvimento econômico é, assim, analisado como uma abordagem para os processos sociais, em que a assimilação de novas técnicas e o aumento da produtividade conduzem à melhoria do bem-estar da população e, consequentemente, à homogeneização social (Furtado, 1992).

Assim, a questão do desenvolvimento proposto por Furtado (1997b) denota uma análise espaço-temporal do pós-guerra, quando, ainda estudante na França, pôde observar a força local de reconstrução da Europa e também a repercussão do Plano Marshall na economia. Esse reflexo se faz sentir no Brasil, que teve sua economia descolada com a guerra, ao se crer em um auxílio norte-americano. Em tal condição, o Brasil definiu o Plano SALTE4 em 1948, constituído em um plano de prioridade para investimentos em saúde, alimentação, transporte e energia. Esse plano mostrava a necessidade de concentrar investimentos na agricultura, principalmente para produtos que se voltassem ao mercado interno.

Entretanto, para que esse plano sobressaísse, era preciso ter controle total sobre as importações, a fim de reduzir os gastos e pagar os atrasos dos financiamentos externos. Além disso “[...] os norte-americanos insistiam em que se aumentasse o rigor da política de ajustamento que já vinha sendo aplicado, negando-se a considerar a hipótese alternativa de uma ajuda externa” (FURTADO, 1997b, p.135). O plano fora desenvolvido ainda assim com capitais nacionais advindos do Tesouro Nacional e capitais externos. Mas como seus resultados não surtiram efeitos esperados, o plano fora abandonado em 1951.

Durante a Era Vargas (1930-1945), observa-se a racionalização da máquina burocrática, com base, por exemplo, na organização do trabalho. Não havia plano de governo e nem diretrizes de desenvolvimento, mas apenas ações localizadas que dependiam das iniciativas de ministros e de políticas estaduais que estivessem sob o domínio do “ditador”. Nessas linhas, Furtado (1997b) mostra a necessidade de ajudar o Brasil a vencer o subdesenvolvimento, através de incentivos à industrialização, à criação de novos empregos e à impressão de finalidade aos excedentes de população na produção primária. Além disso, o país deveria ter um desenvolvimento equilibrado, estimulado por recursos próprios existentes, isto é, por meio de sua capacidade de exportação, estimada em diminuir as importações e da orientação a “[...] recursos e assistência técnica para o campo, a fim de estimular a oferta de alimentos e matérias-primas agrícolas” (Op. Cit., p.323).

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Plano SALTE: a sigla significa Saúde, Alimentação, Transporte e Energia. O plano fora lançado no Governo Dutra (1946-1951) e previa o melhoramento das respectivas condições junto à sociedade brasileira.

Na década de 1970, o desenvolvimento brasileiro se sustentou na organização da economia e da sociedade, de modo flexível e descentralizado. Operava-se no país a fase do “milagre econômico” que, além da industrialização na região Sudeste, estimulava a modernização da economia agrícola do Sul, as fronteiras agrícolas no Centro-oeste e a exploração das reservas minerais na região Norte, sobretudo no Pará. Nesse contexto, o planejamento estatal operava por maior interligação regional com a consolidação de infraestruturas em transportes e comunicações.

Entretanto, muitos dos projetos desenvolvimentistas desse momento não levavam em consideração a diversidade econômica, social e política. Eram projetos que se concentravam em objetivos abstratos e distantes da necessidade da coletividade. Por isso, conforme Celso Furtado (1974, p. 89), a universalização do desenvolvimento econômico aos moldes dos países centrais seria um simples mito, pois não considera ações básicas como, “[...] identificação das necessidades fundamentais da coletividade e das possibilidades que abrem ao homem o avanço da ciência, para concentrá-las em objetivos abstratos, como são os investimentos, as exportações e o crescimento” (Op. Cit.). Sendo assim, Furtado já previa a necessidade de analisar as especificidades locais.

Por consequência, o desenvolvimento esteve sempre amparado no crescimento das atividades secundárias que usufruem industrialmente de recursos, sobretudo, não renováveis. No Brasil, essa realidade foi vivenciada no período de 1930 a 1980, quando há um avanço das atividades industriais concentradas na região Sudeste. Apesar do crescimento econômico pregado pela lógica desenvolvimentista, Furtado (1997a, p.357) apontava que, “[...] o desenvolvimento ocorrera ali onde tomara pé o progresso tecnológico e as circunstâncias permitiram que certos agentes sociais o canalizem para o progresso de formação social” (Op. Cit.). Isso contribuiria para que os agentes sociais participassem do processo de formação de capital equilibrado, sem desconsiderar uma série de problemas que são específicos a cada realidade.

Em consonância com essas ideias, na década de 1990, observou-se que as organizações internacionais reformulariam a ideia de desenvolvimento, incorporando a ideia de capital social5, isto é, incorporando a participação da sociedade na deliberação de decisões

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O capital social remete ainda, na visão de Putnam (1993), a cooperação entre membros refletindo a constituição de redes de relacionamento, estabelecidas por laços de confiança e normas efetivas. Em suas palavras: “"social capital" refers to features of social organization, such as networks, norms, and trust, that facilitate coordination and cooperation for mutual benefit. Social capital enhances the benefits of investment in physical and human capital.” (Putnam, 1993, p. 01). Enquanto para Bourdieu (2005) o capital social são relações sociais que podem ser capitalizadas. Tal conceituação agrega foco político e enseja o reconhecimento das institucionalidades nos relacionamentos estabelecidos. Trata-se de “[...] vinculação a um grupo, como o conjunto de agentes que não

sobre a ação das instituições públicas locais. A partir disso, é criado o Índice de Desenvolvimento Humano pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) que passara a considerar indicadores sociais (Educação, Saúde, etc.) para fundamentar o desenvolvimento. Esse quadro definia o desenvolvimento como reflexo da liberdade (PNUD, S/A).

O pensamento construído por Amartya Sen (2000), Prêmio Nobel da Economia de 1998, definia o desenvolvimento como um processo de expansão da liberdade real que as pessoas desfrutariam, isto é, liberdades substantivas de participação política, de recebimento de educação básica e de assistência médica. Nesse sentido, o desenvolvimento não é promovido apenas com o crescimento econômico que se remete ao aumento da renda das famílias, da intensificação da industrialização e dos avanços tecnológicos, mas também decorre da remoção de privações, isto é, do atendimento das necessidades reais da população, e mais, com a universalização dos direitos humanos. Logo, a ablação de privações só ocorreria mediante um equilíbrio das relações de trocas que desse, a toda sociedade, a oportunidade de desfrutar dos resultados do processo produtivo.

Além disso, o desenvolvimento devia se associar à importância dos mercados e à liberdade de produção, trocas e transação para haver crescimento econômico e desenvolvimento do território, pois, “[...] a liberdade de participar do intercâmbio econômico tem um papel básico na vida social” (SEN, 2000, p.22). A negação da liberdade de acesso aos mercados ocorre principalmente entre pequenos agricultores sujeitos às normas de organização e às restrições tradicionais. Essa privação aos indivíduos pobres pode torná-los indefesos à violação de outros tipos de liberdade.

Assim, o desenvolvimento, além dos aspectos econômicos, deve incluir aspectos sociais e políticos, tendo a liberdade como meio e não como fim. Tais aspectos são liberdades instrumentais que têm de contribuir para os indivíduos sobreviverem livremente e manterem relações complementares com as outras. Logo,

Os fins e os meios do desenvolvimento exigem que a perspectiva da liberdade seja colocada no centro do palco. Nessa perspectiva, as pessoas têm de ser vistas como ativamente envolvidas – dada a oportunidade – na conformação de seu próprio destino, e não apenas como beneficiários passivas dos frutos de engenhosos programas de desenvolvimento. O Estado e a sociedade têm papéis amplos no fortalecimento e na proteção das capacidades humanas. São papéis de sustentação das capacidades humanas e não de entrega sob encomenda. (SEN, 2000, p.71)

somente são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros e por eles mesmos), mas também que são unidos por ligações permanentes e úteis” (Op. Cit, p.67).

Portanto, mesmo em espaços-tempos e ideologias diferentes, Furtado6 (1974 e 1997a) e Sen (2000) mostram um traço em comum nas suas abordagens: a de que somente a sociedade pode ser gestora de transformação, pois só a partir de suas demandas e intervenções é que o Estado e as instituições poderão proferir ações planejadas na dimensão do desenvolvimento. Sendo que Sen (2000) vai mais além, ao colocar que essas demandas devem ocorrer de forma livre, considerando interesses individuais que se consubstanciem em solicitações e comprometimento de toda a sociedade, sem ser uma meta governamental a ser vencida, nem uma proposta de acumulação de riquezas e muito menos a de crescimento do produto, correlacionado às variáveis de renda. Deve, sim, ser um planejamento com voluntarismo responsável, retomando de Furtado a noção de planejamento.

Para Celso Furtado (1997b), o desenvolvimento do indivíduo só ocorre mediante a orientação racional das relações sociais e com a valoração da liberdade. Por esse contexto, Furtado (1997b, p.219-220) defendia que,

[...] a sociedade brasileira deverá avançar no processo de democratização, abrindo espaço para a participação de todos os segmentos sociais da vida política. O desenvolvimento é uma aspiração da coletividade e nenhum governo se legitima, se descura esse ponto. Mas, o desenvolvimento não pode ser pago com a alienação da liberdade, sem a qual a vida social se desumaniza. (Op. Cit.)

Por tudo isso, Furtado (1997b) defendia que o Brasil era uma nação com matriz cultural, e o Nordeste era uma parte integrante desse conjunto, talvez mais integrada às raízes originais e, por isso, a importância em planejar os recursos naturais e a atuação na agricultura, mostrando que “[...] Estávamos conscientes de que é quando começa a intervir na pesquisa sistemática dos recursos potenciais e no próprio homem que o poder público se constitui em efetivo agente de desenvolvimento” (Op. Cit., p.221). Deste modo, pode-se correlacionar a necessidade de liberdade individual para o engajamento social à promoção espacial, conforme especifica Sen (2010).

Nessa esteira, Furtado (1997b, p. 35), já em meados da década de 1950, refletindo sobre as disparidades regionais brasileiras e focalizando o Nordeste como “região problema”

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Apresenta um pensamento Estruturalista e, ainda, o contexto histórico em que esteve inserido, dentro do Brasil principalmente, permitia a avaliação dos problemas e a indicação de ações por parte do Estado, haja vista ter sido membro diretivo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), participante do Conselho de Desenvolvimento do Nordeste (CODENO) e criador e primeiro superintendente da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE, entre 1959-1962; 1963-1964) e em 1962, quando passa a titular do Ministério do Planejamento.

com foco economicista, mostrava a necessidade de mudar os rumos da história. Isso a partir de “[...] amplo processo de mudança social, todo ele orientado para recuperar o atraso político e abrir espaço a fim de que parcelas crescentes da população regional assumisse em plenitude os direitos de cidadania” (Op. Cit.). Além disso, ao avaliar a realidade empírica de Israel, com a experiência social no sentido de esforço de trabalho e da renda coletiva traçadas na agricultura através dos Kibbutz, fazia comparação com o Nordeste brasileiro e inferia que o desenvolvimento advém da qualidade do fator humano, concluindo que

Sempre me pareceu que a sociedade ideal seria aquela em que o indivíduo alcançasse elevado grau de integração, no sentido de viver em harmonia com o todo. [...] No sentido de um desenvolvimento pleno, de preferência não competitivo, das personalidades. Isso somente seria possível abrindo espaço para o indivíduo. (Op. Cit, p.150)

Nessa linha, Favareto (2006, p. 77) também trabalha o desenvolvimento na dimensão atual, em que se reflete a integração entre as dimensões econômicas, sociais e ambientais, sem desconsiderar a evolução histórica de uma sociedade,

[...] que nada tem de linear e que pode se dar em diferentes direções, aproximando-se ou distanciando-se do ideal contido no projeto normativo do desenvolvimento como melhoria dos indicadores econômicos, socais e ambientais de um dado país, região ou grupo social. (FAVARETO, 2006, p. 77)

Nesse ponto, Favareto (2006) também se aproxima de Furtado e de Sen (2000), já que considera a lógica de que é a sociedade a gestora de mudanças e criadora de estruturas promotoras de desenvolvimento. Sendo assim, o desenvolvimento não deve ser analisado apenas no seu caráter normativo ou evolutivo, mas a partir da inter-relação entre espaço, instituição e sociedade. Na atual conjuntura, são as demandas da sociedade por ações estatais, seja no mérito público seja no privado, que esboçam o desenvolvimento.

Deste modo, a palavra desenvolvimento, que quase sempre refletiu apenas a perspectiva de crescimento econômico, ganha novas acepções, no século XXI, incorporando, além de fundamentos econômicos, aspectos sociais, culturais, políticos e ambientais. As interações desses aspectos refletem a característica da liberdade, que abrange preocupação com o aumento das liberdades individuais e comprometimento social.

Por essa nova perspectiva, também ganha destaque o desenvolvimento rural como possibilidade de analisar processos sócio-espaciais e seus impactos econômicos, pois o espaço rural representa um modo de vida que emerge com multifuncionalidade, mas também a partir

da introdução de novas possibilidades de geração de renda e definição de qualidade de vida. Por essa assertiva, define-se a importância de pontuar o desenvolvimento rural.

1.2.1 O Desenvolvimento Rural no Brasil: Algumas Pontuações

O desenvolvimento rural traz em si a ideia de alterações políticas, sociais e econômicas, influenciadas pelas demandas sociais, para além das práticas produtivas, considerando as características específicas do local a partir da geração de oportunidades de trabalho e renda. Nesse sentido, o desenvolvimento rural deve associar aspectos sociais e de melhoria da qualidade de vida do agricultor com os aspectos econômicos, com vistas a aumentar a renda via produção agropecuária ou através de atividades complementares no campo (Kageyama, 2009, p. 250).

A significação do desenvolvimento rural ultrapassa o aspecto econômico, pois reflete a relação sociedade-natureza, num quadro de definição do espaço geográfico e de suas especificidades. Nessa lógica, Chalita (2005, p.104) enfatiza que a “[...] relação sociedade- natureza, porém, não se explica apenas pelos desafios colocados pela globalização, mas também pelos fatos que constituíram o chamado ambientalismo e suas transformações internas, no caso do Brasil”. Nessa esteira, sedimentam-se duas linhas de interpretação do desenvolvimento rural contemporâneo que rompem barreiras de separação entre os mundos natural e social, considerando diferentes realidades e concepções de produção e de mercado. A primeira caracteriza-se pelo regime alimentar e pela regulação, vinculada à globalização, em que se segmentam o mercado de consumo e o refluxo de políticas de apoio à atividade agrícola, na qual o rural é avaliado a partir da reorganização das atividades econômicas, do progresso técnico, da concentração produtiva e da diminuição da importância da terra. Já a segunda parte de noções de localização e de diversidade (Mior, 2009), em que se avaliam as mudanças ocorridas no rural a partir de perspectivas exógenas. Mas, nessa mesma vertente,

[...] a localidade está embebida nas decisões espacial e de escala do trabalho, o que significa que cada ator social está também ligado, através de redes, direta ou indiretamente, a atores externos. A localidade, portanto, é construída socialmente a partir da interação de atores operando sobre uma variedade de distâncias (local e não local). (MIOR, 2009, p.279)

Por essa análise, a definição do desenvolvimento rural vai muito além do aspecto econômico, já que ultrapassa os valores mencionados pelo produto interno bruto per capita. No momento atual, considera-se um espaço rural desenvolvido quando se correlacionam os seguintes indicadores de desenvolvimento: 1- densidade demográfica, evoluindo positivamente; 2- educação, em termos de anos de estudo das pessoas de 10 anos, taxa de escolarização (% da população de 7 a 14 anos que frequenta escola) e taxa de analfabetismo (% da população de 15 anos a mais); 3- bem-estar social, em que se observam instalações infraestrutura sanitária, existência de água encanada, eletricidade, tecnologias de comunicação e eletrodomésticos; 4- meio ambiente, quando se avaliam causas específicas de poluição do ar e solo, além do uso de agrotóxicos; 5- economia e mercado de trabalho, na perspectiva de renda domiciliar, número de empregados com carteira assinada, produtividade do trabalho e da terra e rendimento das culturas (Kageyama, 2009).

No Brasil, as discussões sobre o desenvolvimento rural sofreu também, influência das ações de caráter normativo e das políticas de intervenção do Estado que refletem demandas sociais. O desenvolvimento rural ocorre mediante a capacidade empreendedora e inovadora dos agricultores familiares, responsáveis pela diversificação social e produtiva dos territórios em que vivem; pela reorganização do espaço rural através da agropecuária moderna (agronegócio) e de atividades não-agrícolas; pela promoção de liberdades que contribuam para a emancipação social e para a criação de mecanismos de responsabilidade; bem como, pela integração dos pequenos agricultores familiares a lógica produtiva demandada pelos mercado (Schneider, 2010, p.518-526). Deste modo, o desenvolvimento rural é uma categoria de análise já definida, mas que se valida em características como as pré-definidas acima.

Por conseguinte, o desenvolvimento corresponde à ampliação das possibilidades de expansão das potencialidades humanas, buscando reduzir a vulnerabilidade dos indivíduos e das famílias, orientando suas ações e ampliando a sua autonomia nos processos decisórios e no fortalecimento de ações e estratégias, principalmente mercadológicas. Deste modo, a agricultura familiar é apontada como uma categoria necessária ao desenvolvimento, pois sua economia se baseia na diversificação da produção. A isso devem ser somadas as condições favoráveis de comunicação e de serviços que estimulam o empreendedorismo, uma vez que são os empreendedores os principais agentes de crescimento econômico, através de geração, disseminação e aplicação de inovações. Nesse aspecto, o empreendedorismo, apesar de suas diferentes intensidades por área, também é entendido por Veiga (2001, p. 108) como “[...] a essência do dinamismo econômico e a certeza de que sua promoção é uma ótima maneira de expandir o emprego”.

Portanto, o desenvolvimento rural poderá ser operado a partir de incentivos a diversificação das economias locais, a começar pela própria agricultura familiar. No mais, as dinâmicas criadas pelas próprias famílias rurais, que articulam outras atividades em suas unidades produtivas, proporcionam a complementação da renda, sem que todos os membros