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APONTAMENTOS SOBRE A AGRICULTURA FAMILIAR NO BRASIL

CAPÍTULO I ESPAÇO GEOGRÁFICO, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA FAMILIAR

1 ESPAÇO GEOGRÁFICO, DESENVOLVIMENTO E AGRICULTURA FAMILIAR

1.4 APONTAMENTOS SOBRE A AGRICULTURA FAMILIAR NO BRASIL

A pequena propriedade brasileira sempre esteve associada à produção de alimentos. Nesse sentido, a nomenclatura agricultura familiar, reconhecida institucionalmente, também focaliza a produção dos gêneros de consumo. Por consequência, houve uma inversão de terminologia e também de estímulo à prática agrícola por parte de pequenos produtores, a partir de políticas públicas de combate à pobreza e à fome. Aspecto este transcrito para a realidade brasileira na forma da lei.

Embora a denominação agricultura familiar não seja acatada por várias instâncias internacionais, 194 países-membros da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) definiram a institucionalização do ano de 2014 como sendo o Ano Internacional da Agricultura Familiar. O intuito foi dar visibilidade à categoria e chamar a atenção mundial sobre sua importância na produção de alimentos, além de contribuir para o barateamento destes na fase de comercialização.

Para a FAO, a agricultura familiar inclui atividades agrícolas, florestal, pesqueira, pastoril e aquícola executadas por gestão familiar. Essa categoria agrega relevância por atuarem na segurança alimentar; na produção de alimentos “tradicionais” e balanceados para a subsistência humana; no uso sustentável dos recursos naturais; e por representar um estímulo às economias locais, a partir de políticas específicas de proteção social e de bem-estar das populações rurais.

Nessa perspectiva, a categoria social entendida por agricultor familiar, no Brasil, define-se, segundo a FAO/INCRA7, pela relação entre o trabalho executado pelos membros da família e a gestão, ou seja, pelo processo produtivo conduzido pela família. Determina-se ainda pela ênfase na diversificação produtiva, na durabilidade dos recursos, na qualidade de vida, na utilização do trabalho assalariado em caráter complementar e na tomada de decisões imediatas, devido ao alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo.

Essa categoria vem sendo trabalhada por diferentes segmentos acadêmicos. Aspecto este que demonstra as diferentes interpretações e perspectivas. Na sociologia, interpretam-se os processos sociais agrários e, por isso, a agricultura familiar também é focalizada como uma categoria sustentável que, por sua diversificação, garante possibilidades de desenvolvimento para a sociedade contemporânea (Santos, 2001). Na economia, a agricultura familiar é

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GUANZIROLI, C. E. ET. AL. Novo Retrato da Agricultura Familiar. 2010. Disponível em < file:///C:/Users/Usuario/Downloads/brasil-redescoberto.pdf>. Acesso em 28 de junho de 2010.

referendada como base para o desenvolvimento econômico, considerando-se indicadores do nível de renda e da estrutura produtiva, além de agregar a importância da formação do mercado interno e da potencialidade econômica em outros segmentos (Dionísio, 2003). Já para a Geografia, essa categoria remete as formas de reprodução espacial, no sentido de agente transformador da natureza, ao promover o processo produtivo agrícola de modo sustentável e com diversificação, repercutindo, assim, nas formas de organização espaciais e mercadológicas.

A ênfase nessa categoria emergiu, no Brasil, em meados da década de 1990, em virtude de três fatores que tiveram impacto social e político significativo: o primeiro deles foi a adoção do termo como uma nova categoria-síntese protagonizada pelos movimentos sociais do campo, capitaneados pelo sindicalismo rural ligado à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, com apoio da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD)8 (Neves, 2007); o segundo, a legitimidade que o Estado emprestou ao termo, ao criar, em 1996, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF); e o terceiro, a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), com o revigoramento da reforma agrária (SCHNEIDER, 2003, p. 114).

Além desses critérios, Navarro (2011) aponta outros fatores definidores, tais como: a predominância da mão-de-obra familiar, mesmo que com contratação esporádica; e a ampliação de renda familiar, com a diversificação das atividades produtivas entre seus membros, inclusive, desenvolvendo atividades não-agrícolas, embora todos os membros residam nas propriedades rurais.

Entretanto, o termo agricultura familiar ganharia fundamento científico no início da década de 1990, através do Projeto de Intercâmbio de Pesquisa Social em Agricultura, publicado em 1986; da Revista Reforma Agrária (Vol. 25, nº 02 e 03, maio-dezembro, 1995), cujos números consagraram temas referentes à constituição de políticas de apoio aos agricultores mobilizados e que se enquadravam na definição do termo; e por fim, através de obras como: “O Desenvolvimento Agrícola: Uma visão histórica (1991), de José Eli da Veiga, que trata dos estudos rurais contemporâneos, a partir da evolução da atividade agrícola nos países de capitalismo avançado, articulando unidades familiares e desenvolvimento, e também da evolução dessas unidades em alguns países subdesenvolvidos até a explanação das

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Essas instituições pretenderam valorizar agricultores rurais, sendo porta-vozes em projetos de reconhecimento da racionalidade econômica e social e da capacidade de adaptação dos pequenos agricultores familiares às lógicas econômicas (Neves, 2007).

necessidades brasileiras; “Paradigmas do Capitalismo Agrário” (1992), de Ricardo Abramovay, em que é analisada a agricultura familiar como reflexo da ação do Estado Capitalista, através de políticas de controle de preços; e “A Agricultura Familiar”, de Hugbes Lamarche (1993 e 1998), que avalia o fato de a agricultura familiar ser uma categoria reconhecida e legitimada em vários países de capitalismo avançado.

Todos esses referenciais prenunciavam a agricultura familiar como componente na valorização do espaço rural e na questão político-institucional. Todavia, muitos desses relatos perpassaram pelo modo como definir essa categoria, se ao tamanho da propriedade (pequena ou grande), se à questão da renda, ou mesmo, à referência aos países de capitalismo avançado, cuja agricultura se define como familiar e patronal. De qualquer modo, o que se observa é que a agricultura familiar se adequa às exigências do desenvolvimento capitalista, sendo mais eficientes em termos de usos dos recursos produtivos quando comparados à agricultura patronal. Além disso, a agricultura familiar tem perspectivas de produção e de geração de emprego, através da adequação e da inserção tecnológica, que contribuem para a geração de renda e, consequentemente, tornam-se base para o desenvolvimento econômico espacial.

Por esse contexto, a agricultura familiar reforça também a mobilização política e o enquadramento institucional, cujo intuito foi construir, por parte do Estado, modelos de desenvolvimento econômico e social. A agricultura familiar incorpora noções de sustentabilidade na organização produtiva e social, sendo consagrada pelo Pronaf, em 1996. Da necessidade de se identificarem, nas linhas de financiamento do Pronaf, o agricultor familiar passa a acoplar um número expressivo de segmentos do setor primário da economia, tanto no aspecto político quanto sindical, correspondendo “[...] à agregação de uma amplo e diferenciado conjunto de produtores, cuja a atividade produtiva e gestão do estabelecimento tomam por base a vinculação dos membros da família”. (NEVES, 2007, p. 233)

Deste modo, o enquadramento institucional da agricultura familiar decorreu do reconhecimento de novas categorias e mesmo dos agentes sociais inseridos. Sua legitimação crescente pode ser atribuída também “[...] ao próprio enfraquecimento de outras denominações que eram usadas até então, como a de “trabalhador rural” ou “pequenos proprietários”” (SCHNEIDER, 2009, p. 35). Sendo assim, a denominação de agricultor familiar amparou inúmeras categorias que, até então, não podiam ser identificados como pequenos produtores ou trabalhadores rurais.

Tal categoria é analisada também por Neves (2007), no viés institucional que a legitimou. Por sua visão, a unidade familiar difere de uma empresa agrícola no grau de mecanização, no tamanho da área cultivada, na renda, em termos de força de trabalho,

advinda da família. Nesse contexto, a agricultura familiar é uma categoria socioprofissional, que se mantém, mas com tensão sobre a capacidade de sobrevivência, devido ao desenvolvimento do segmento industrial e manufatureiro, ligado às práticas agrícolas, que impõem concorrência e, por consequência, o desaparecimento de unidades menores. Por conseguinte, a nomenclatura reflete a luta de diversos atores por cidadania econômica e política. Deste modo, são agricultores familiares, os atores

[...] que se integram como sujeitos de atenção de políticas especiais de crédito, de formação profissional, de assistência técnica; são os usuários e atores da constituição de novos arranjos institucionais, capazes de promover, de fato e da perspectiva dos objetivos que os irmanam politicamente, o enquadramento legal e institucional. (NEVES, 2007, p.235)

De qualquer modo, a expressão agricultura familiar brasileira se define basicamente por aspectos não econômicos, excetuando-se o critério de gestão. Sua definição emergiu das diretrizes do “modelo de desenvolvimento sustentável”, que sugeria a classificação dos estabelecimentos agropecuários brasileiros. Dessa forma, a definição da agricultura familiar, no Brasil, teve um caráter sindical, político-ideológico e religioso, que demonstra a interferência de grupos sociais com foco no espaço rural. O reconhecimento oficial ocorreu em 24 de julho de 2006, pela Lei 11.326, que explicita:

Art. 3o Para os efeitos desta Lei, considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos:

I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais;

II - utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento;

III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; (Redação dada pela Lei nº 12.512, de 2011)

IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família [...]. (BRASIL, 2006.)

A referida lei não focalizou realidades empíricas e nem a história agrária do país, mas teve como objetivo ampliar a eficácia da ação governamental com políticas públicas direcionadas à categoria. Para o MDA (2006), a definição da agricultura familiar foi uma forma de incluir amplos setores sociais do campo que, historicamente, foram marginalizados pelas políticas públicas. A partir disso, a agricultura familiar tornou-se cerne de políticas, visando o desenvolvimento rural sustentável, através do estabelecimento de sistemas de produção focado na biodiversidade, na valorização do trabalho familiar, na inclusão de jovens

e de mulheres, na produção de alimentos, nos projetos de acesso à terra e nos meios de produção que medeiam à construção do desenvolvimento rural. Deste modo, o desenvolvimento rural só ocorrerá mediante combate à pobreza, gerando no campo condições de trabalho, renda e valorização social.

1.4.1 Estratégias da Agricultura familiar

A agricultura familiar é uma categoria política constituída também por pressão dos movimentos sociais que acelerou a inserção de políticas públicas no Brasil. Tais movimentos divergem em origem e natureza, mas são atuantes, como: “[...] Contag, CUT, MST, Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), sem contar movimentos mais específicos, como o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), os movimentos indígenas, ribeirinhos ou dos quilombolas” (TONNEAU et. al., 2007, p. 285-286). Estes são reflexos da história do país, em que “[...] as oligarquias rurais bloquearam o livre acesso às terras devolutas e quaisquer outras alternativas que pudessem levar a ascensão social da grande massa de população rural [...]” (GUANZIROLI et. al., 2001, p.28). Esses aspectos perfazem a evolução agrária de nosso país, em que pequenos produtores sem terra lutam por terra, água, crédito, etc., e, de modo engajado, tornam-se representantes da agricultura familiar, conseguindo dialogar com o Estado sobre suas necessidades.

Apesar das críticas definidas por esses movimentos em termos de descontinuidades dessas ações (crédito, capacitação, assistência, etc.), do descompasso temporal entre necessidades locais e projetos de efetivação das políticas públicas e dos prazos determinados pelas agências financiadoras, em termos gerais, o pequeno agricultor familiar tem sido lembrado nas ações implementadas pelo Estado. Além disso, o conhecimento sobre a agricultura familiar se faz refletir na importância conferida ao estabelecimento como patrimônio, à reprodução desse patrimônio e à presença da família. Nesse contexto, a terra como unidade de produção é um tema central para a agricultura familiar, pois é nela que se definem as relações familiares e os modos de funcionamento e reprodução dos estabelecimentos agrícolas. A terra, por ser bem fixo, perene, agrega valor enquanto renda fundiária e como bem de produção pelo agricultor familiar, podendo ser transmitida por gerações.

Nesse aspecto, a transmissão de terras de pais para filhos da agricultura familiar passou por duas “estruturas geracionais”. A primeira, fora de herança impartilhável, em que o filho mais jovem assumia os pais e a propriedade com intuito de cuidar dos genitores até o fim de seus dias e dá seguimento ao trabalho familiar. A segunda, e também o que se tornou comum no momento atual, fora a herança partilhada, em que se desfragmentam as unidades produtivas e se inclui o direito a herança para aqueles que até pouco tempo foram excluídos da transmissão de bens (Anjos, 2009).

O tamanho das famílias era, historicamente, prolífera. Por isso, a preocupação principal que ficava aos pais era a de garantir uma profissão aos filhos, por meio do trabalho e da educação. Em função dessa questão, as pequenas propriedades tendiam a se subdividirem mais, em termos de espaço de trabalhos entre todos os membros. Todavia, a dificuldade em gerar novas unidades produtivas e o desejo de muitos jovens de não dar segmento ao trabalho dos pais, na conjuntura atual, acabou gerando uma impulsão nos padrões de sucessão, sendo um dos maiores desafios do mundo rural dos nossos dias (Op. Cit.).

A isso soma-se, ainda, o fato de cônjuges rurais estarem procriando menos e, por consequência, diminuindo o número de herdeiros. Contexto que tem ocasionado a “masculinização” da população, decorrente principalmente do êxodo feminino, do envelhecimento da população, da falta de renovação e da desagrarização, isto é, há um processo de declínio da ocupação da população economicamente ativa (PEA) na agricultura brasileira. Logo, tais mudanças, em curso no meio rural brasileiro, “[...] de alguma ou de outra forma, podem estar afetando os procedimentos usualmente adotados pelas famílias para conceber seus projetos de futuro do ponto de vista da sucessão em suas propriedades” (Op. Cit., 2009, p. 196-197). Isso transcorre das dificuldades atuais em se manter famílias numerosas e, também, da pontuação sobre falta de perspectivas para a geração de trabalho e renda, incitando, assim, os agricultores jovens a buscarem formas de trabalho urbano.

Apesar da problemática sucessória, a organização do trabalho coloca-se como estratégia familiar na execução de atividades nas unidades. É ela que fundamenta as articulações existentes, a fim de adaptarem-se às pressões advindas do processo produtivo; alicerça interesses individuais e sociais; e reflete desvios e fracassos da unidade. Deste modo, a unidade produtiva constitui-se em um núcleo dinâmico - a família – que trabalha na unidade produtiva ora explorando suas estratégias, ora buscando outras formas de exploração produtiva (Stanek, 1998, p.170). A família, seus membros e suas inter-relações demonstram o contexto hierárquico em termos do conjunto social existente na agricultura familiar, pois demonstra a função executada por cada membro da família na unidade produtiva e dentro da

família. Nessa lógica, demarca-se a definição de indivíduos que vivem no campo e assumem a unidade produtiva, tendo responsabilidade com o futuro.

Além disso, observa-se a importância de bom relacionamento com a vizinhança, abrindo novas possibilidades de relações sociais no contexto local e demarcando a necessidade de esse agricultor se posicionar no plano social e na integração com o mercado. Tal integração não rompe com os vínculos entre família, unidade produtiva e território; ao contrário, reconstrói seu espaço social ao integrar as lógicas de mercado, ao mesmo tempo que tenta se defender das imposições do capital. Dessa forma, o agricultor familiar, marcado pela experiência com o mercado e com a modernização do processo produtivo, não pretende se sentir diferente ou anônimo aos acontecimentos, mas ser um agente integrado ao mundo, com a defesa e a valorização de sua identidade, sobretudo, com características próprias e produtivas, integradas aos mercados locais/regionais.

1.4.2 Agricultura Familiar: Inserção Tecnológica e Lógica Produtiva

A agricultura familiar desenvolve atividades econômicas diferenciadas de acordo com as particularidades locais, buscando se consolidar no mercado, seja de modo individual, seja em complementariedade com o segmento agroindustrial. Essa categoria tem importância fundamental no Brasil, pois garante a segurança alimentar nas áreas rurais e em pequenas cidades, representando “[...] um projeto de inclusão social para aumentar o potencial produtivo e o papel dos envolvidos, quer na Amazônia (Uruará, Marabá), quer nas zonas irrigadas (Mandacaru), com capacidade de combater a fome (território Kalunga)” (TONNEAU et. al., 2007, p. 282). A referida categoria, quando inclusa no processo produtivo, acaba valorizando o desenvolvimento rural e local.

Contudo, o desempenho dessa categoria, no âmbito produtivo, depende da disponibilidade de condicionantes, como a existência de recursos, a inserção socioeconômica, a localização geográfica, as instituições e o comportamento econômico dos indivíduos, além da própria conjuntura econômica do país. Sendo assim, são quatro os condicionantes principais que na promoção demarcam a importância da agricultura familiar no desenvolvimento rural, destacando

[...] os incentivos que os produtores têm para investir e produzir, a disponibilidade de recursos, particularmente terras, água, mão-de-obra, capital e tecnologia, que determinam o potencial de produção, o acesso aos mercados, insumos, informações e serviços que influem de forma decisiva na capacidade efetiva de produção e, finalmente, as instituições, que influenciam as decisões dos agentes e inclusive sua capacidade, possibilidade e disposição para produzir. (BUAINAIN et. al., 2003, p.339- 340)

Logo, a agricultura familiar, quando estimulada por via de incentivos, reduz a busca por alternativas fora das atividades agropecuárias e incita esta atividade como geradora de trabalho e renda para a família. A isso acrescenta-se o acesso à terra, haja vista a expressiva concentração fundiária no Brasil, pois “[...] Entre os agricultores familiares, um número significativo é proprietário de um lote menor que 5 ha, tamanho que, na maior parte do país, dificulta, senão inviabiliza, a exploração sustentável dos estabelecimentos agropecuários” (Op. Cit, p.322). A extensão territorial do maior número de unidades familiares de produção torna insuficiente o próprio consumo da família.

Segundo Vieira Filho (2014), o Brasil vem passando desde 1960, por uma mudança bem sucedida na transformação da produção agrícola, deixando de ser importador de alimentos e passando à condição de exportador. Essa mudança contextual, em todo o segmento da agricultura, deveu-se à produção de conhecimento, geração e difusão de tecnologia, graças à disponibilização de crédito rural, assistência técnica e pesquisa agrícola. Contudo, essa dinâmica não é homogênea. Mas, ainda assim, tem contribuído para o aumento da produção agropecuária, gerando o benefício de “[...] redistribuir renda, diminuindo o impacto dos preços dos alimentos na cesta de consumo das famílias” (Op. Cit, p.407). Assim, o conhecimento e a adequação de tecnologias e insumos têm possibilitado mudanças no campo, repercutindo na vida do agricultor familiar.

Na mesma linha, Alves Et. Al. (2010) demonstram que a maioria dos estabelecimentos da agricultura brasileira precisa se adequar, a fim de incorporar, em suas unidades produtivas, tecnologias, insumos e biotecnologias. Esses fatores juntam-se à necessidade de planejamento e de assistência técnica e são delimitados como impulsores para a produção agropecuária e geração de renda nas unidades familiares. Entretanto, o autor enfoca que não é só a presença de tecnologias que explicam a diferença de renda líquida entre as unidades, mas a forma de aplicação ao trabalho, isto é, a forma como se organiza e gesta temporalmente a produção. Aliado a isso explana-se, também, a falta de conhecimento e a necessidade de estímulos estatais, em termos de crédito e extensão rural.

Tal conjuntura se reflete na agricultura familiar ao se observar o setor agropecuário por grupos tecnológicos. Para Vieira Filho et. al. (2014, p. 410), “[...] na agricultura familiar, verifica-se que os estabelecimentos de PTF9 acima de 1 e de alto conteúdo tecnológico (AT)8 possuem renda bruta superior à média do Brasil”. Essa agregação de renda deve-se ao melhor aproveitamento dos implementos nas unidades familiares. Diante dessa conjuntura, observa-se que a agricultura familiar tem importante peso, apesar de modesta em termos de extensão territorial e de adesão tecnológica na produção agropecuária.

Todavia, focalizam-se ainda problemas, como a incapacidade de absorção de conhecimentos externos; a falta de mão-de-obra, motivada pela integração de trabalhadores à agroindústria; e a redução de membros da família disponível ao trabalho agrícola, devido ao acesso a estudo e a novas possibilidades de trabalho (Vieira Filho et. al., 2014). Sendo assim, se valida a necessidade de criar mecanismos para aumento da inclusão produtiva, criação de alternativas para os jovens para que vivenciem o campo e correção de falhas no mercado, em função dos preços dos artigos do produtor ser um ponto de estrangulamento, haja vista a concorrência com o preço dos produtos importados.

Em consonância com o exposto, Guanzirolli et. al., (2001, p.19), afirma que “[...] o agricultor familiar é capaz de gerar uma renda líquida superior ao custo de oportunidade de seu trabalho”, sendo que essa renda é resultado da soma da produtividade do trabalho e da terra. Acrescentam-se a isso as inovações científicas (genética e fisiologia vegetal) e o aumento da escala técnica, mesmo com o aluguel de máquinas por parte dos pequenos