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3. UMA PAUSA PARA O ESTUDO DO SUJEITO

3.3. AINDA ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Examinando as gramáticas que servem de base para a orientação do ensino da frase na escola, verificamos haver uma defasagem em relação às estruturas do sujeito, expostas no capítulo dedicado ao tema, e às estruturas subjetivas, presentes no capítulo de concordância verbal. Devemos, porém, considerar que um dos objetivos de se introduzir o estudo da sintaxe na escola é o de propiciar ao aluno o reconhecimento dos termos da oração como um dos pré-requisitos para o manejo mais elaborado das relações flexionais entre os termos, no que tange à norma escolar. Entendendo que tal saber é pré-requisito, defendemos que a discussão sobre a organização estrutural do sujeito deva ser alargada, contemplando, inclusive, a introdução de formas que, até então, só aparecem no estudo da concordância verbal.

A aquisição de determinado conteúdo, para não se configurar numa atividade mecânica de retenção mnemônica, implica envolvimento de subjetividade a fim de que seja possível a produção crítica do sentido. Nessa perspectiva, uma entrada orientada no texto de concordância verbal pode resultar num estudo mais eficaz. Em outras palavras, não se trata da extração de informações aleatórias, mas de delinear os limites daquilo que se tem para estudar, centrando o foco no que merece mais atenção. Essa atitude permite o salto da mera extração de informações aleatória para uma leitura orientada.

Lembremos que o ato de ler/compreender não é neuro-físico exclusivamente. Ao entrar no texto é preciso saber o que se quer achar. Afinal, mito ou não, não se trata aqui de certa maçã que cai sobre a nossa cabeça e revela uma lei gravitacional. Dificilmente se descobre aquilo que não se procura. A produção de sentido, a leitura compreensiva depende de um olhar direcionado.

4. UMA INTERFACE ENTRE O PARADIGMA MORINIANO E OS CAMINHOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DE SILVA: UM OUTRO OLHAR PARA O ESTUDO DA CONCORDÂNCIA VERBAL

Uma teoria não é o conhecimento; ela permite o conhecimento. Uma teoria não é uma chegada; é a possibilidade de uma partida. Uma teoria não é uma solução; é a possibilidade de tratar um problema. (MORIN, 2003, p. 335)

Um dos objetos do desejo, presente no imaginário dos falantes, em relação ao ensino de Língua Portuguesa, é o domínio de todas as regras de concordância verbal. Isso se deve, como já afirmamos na introdução desta tese, ao fato de a aquisição desse saber ser considerada uma instância de (des)valorização social. Além disso, pela tradição de nosso ensino, o usuário tende a acreditar que o conhecimento pode ser detido em sua totalidade, sentindo-se devedor daquele saber.

Por entendê-lo como pronto, acabado, em determinado momento, é possível que ele, sem atinar para a natureza do problema, jamais se pergunte se o tipo de organização do conteúdo com que se depara é o modo mais eficaz de o assunto ser apresentado. Nessas situações, a grande pergunta que alguém pode fazer é se, ao tentar guardar regra a regra, caso a caso, algum dia será capaz de ser bem- sucedido e se livrar do sentimento frustrante de não alcançar exatamente seus objetivos.

De nossa parte, afirmamos que a aquisição desse conhecimento, anterior a esta pesquisa, deve-se às incontáveis vezes em que, ao longo do exercício da profissão, tivemos que lidar com tal conteúdo. Contudo, cumpre assinalar que, nas atividades prévias à aula, não foram raras as vezes em que centrávamos recidivamente foco em um ou outro ponto específico da concordância, em virtude da fragilização da memória.

Por esses, entre outros motivos, ao termos contato com a obra de Silva (2009a; 2010), antes mesmo do processo de gestação desta tese, vimos, na orientação teórico-metodológica, um caminho para tentarmos chegar a uma reorganização mais produtiva do capítulo de concordância verbal da GN, fato que agora estamos efetivando com o desenvolvimento desta tese. Os motivos que nos levaram a escolher os caminhos propostos por Silva não foram, portanto, aleatórios.

Paralelamente, vínhamos tendo contato com algumas das ideias de Morin sobre a teoria da complexidade. Para esse pensador, o paradigma clássico da simplificação do conhecimento não dá mais conta da realidade que se impõe.

No âmbito da Escola, observamos que os caminhos estão desnorteados, a pedir novos rumos, nova fundamentação, nova metodologia. A Instituição escolar precisa responder, com novas proposições, a um público que, conforme vimos observando, apresenta, cada vez mais e de forma mais evidente, mecanismos de rejeição, metamorfoseados em desatenção, em esquecimento. Público que reduz os conteúdos ensinados a um parco grau de aquisição, por desconhecer o lugar do saber que a escola reproduz.

A escolha dos pressupostos teórico-metofológicos de Silva se justifica pelo modo substantivo de pôr em prática, no âmbito do que a disciplina de Língua Portuguesa pode contribuir, muito do que defende a pedagogia da complexidade proposta por Morin. Na perspectiva dessa complexidade,16 Morin reconhece que: “existe a necessidade de ressituar o saber, que ora se encontra parcelado, mutilado

e disperso” (PETRÁGLIA,1995, p. 68). Assim, no nosso caso, pelo viés da disciplina,

desejamos provocar no aluno um olhar complexo sobre outras facetas da sociedade. E no que tange especificamente à disciplina, um olhar complexo sobre a sua própria natureza.

Todavia, as leituras de caráter puramente teórico alargam nossas concepções em direção a novos horizontes, mas quase nunca nos apontam caminhos práticos por onde começar a aventura. Quando entramos em contato com as ideias de Silva, vimos muitas afinidades entre o que este defende e o proposto por Morin.

Assim, finalizando essa breve introdução do nosso capítulo, assinalamos que, para reorganizar o capítulo de concordância verbal, adotaremos a orientação teórico- metodológica de Silva porque consideramos que ela contempla

a) a complexidade e a incompletude do saber e daquele que o produz ; b) o círculo vicioso consequente e necessário à (re)formulação do saber;

16

“Complexus significa o que foi tecido junto; de fato, há complexidade quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo (como o econômico, o político, o sociológico, o psicológico, o afetivo, o mitológico), e há um tecido interdependente, interativo e retroativo entre o objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as partes, as partes entre si. Por isso a complexidade é a união entre a unidade e a multiplicidade (...) A educação deve promover a ´inteligência geral´ apta e referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidimensional e dentro da concepção global.” (MORIN, 2001, p. 38-39)

c) a percepção de que o aprendizado exige “provocações complexas”, tais como, o desenvolvimento da capacidade de estabelecer relações de similitudes e diferenças na categorização dos conhecimentos.