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POUCOS AVANÇOS, MUITOS OBSTÁCULOS

5.1 Resistências e entraves

5.2.4 Alcance da formação

As formações, como são realizadas hoje, não representam reais avanços no tocante à inclusão ou recontextualização do debate em sala de aula (SOUZA, J. B; 2015). Uma medida comumente adotada, mas que tem se mostrado bastante ineficaz refere-se à formação de multiplicadores/as. O método consiste na oferta de formação continuada ao/à professor/a coordenador/a ou professores/as representantes de área, que devem levar até as escolas onde atuam as propostas do curso (ARRUDA, 2013; SARAIVA, 2009). Em análise de um projeto com esse método, Arruda (2013) constata que em algumas escolas não havia nenhum/a multiplicador/a ou, quando havia, os/as participantes dos cursos não conseguiram levar os projetos até a instituição.

A formação profissional como um ato isolado do professor, possibilita a significação/ ressignificação dos saberes e práticas deste profissional que se compromete com esta formação; porém, na maioria das vezes, não implica numa significação/ressignificação dos saberes e práticas escolares de modo sistêmico com vistas à melhoria da educação em conjunto. (PAULA, 2013, p. 294)

Consoante a afirmação de Paula (2013), reafirmamos que ações isoladas não serão capazes de provocar as mudanças almejadas. O que não significa, como temos afirmado ao debater outros aspectos, que ações de formação não tenham resultado algum.

No tocante à formação inicial (cursos de licenciaturas e pedagogia), algumas mudanças, ainda que tímidas e em situações específicas, evidenciam respostas positivas quanto à sensibilização dos/as professores/as responsáveis pela formação dos/as futuros/as licenciados/as bem como a inclusão em algumas universidades de disciplinas específicas (ÁVILA, 2010; CEREZER, 2015; GRASSO, 2016; MARINHO, 2014), o que aponta que as possibilidades de transformação que poderiam resultar da real implementação da legislação em nível macro, capaz de possibilitar a reestruturação da grade curricular nos cursos de graduação em todo o país.

Contudo, seguindo a tendência, embora algumas mudanças curriculares surjam no cenário (FERREIRA, M. C., 2013; JESUS, 2015),demonstram-se tímidas, pontuais e, portanto, insuficientes reproduzindo um modelo de formação conservadora e preconceituosa (CEREZER , 2015; DUARTE, 2015).

As conclusões das pesquisas envolvendo ensino superior apontam para déficits na formação inicial dos/as profissionais da educação em função da ausência de disciplinas voltadas à Educação para as Relações Étnico-raciais no currículo da educação superior (BONIFÁCIO, 2016; CEREZER, 2015; COSTA NETO, FERREIRA,2012,M.C., 2013; GOMES, 2014; GROCETTA, 2014; MOREIRA, 2012; MURINELLI, 2012; PASSOS, 2014; RIBEIRO, 2014; SANTOS, R., 2007; SILVA, G., 2013; SILVA, N., 2013; SOUZA, A. F., 2015; WASILEWSKI, 2015). Essa lacuna na formação inicial empurrará toda a responsabilidade de formação para as políticas de formação continuada (BONIFÁCIO, 2016; SILVA, G. C., 2011; VIEIRA, 2011).

Os cursos de formação após a graduação são denominados “Cursos de formação continuada” exatamente porque deveriam complementar a formação inicial (graduação). Diferente disso, os cursos são, como regra, o primeiro contato com o debate proveniente de ações estatais.

No espaço acadêmico, as recentes pesquisas em nível de pós-graduação na área de educação com recorte racial representam importante avanço para a compreensão das relações étnico-raciais que se estabelecem no ambiente escolar, contudo, como afirma Carvalho (2005-2006), o espaço destinado a tal temática nos cursos de pós- graduação hoje não corresponde à relevância e pertinência do combate ao racismo no âmbito educacional.

Ocorre que a maioria dos/as professores/as do Ensino Superior também não querem ou não estão preparados para pensar a temática (BORGES , 2014; SOUZA, A. F., 2015). E ainda há muita resistência por parte das pessoas que estão à frente das instituições quanto às alterações curriculares (SILVA, G., 2013). Apesar de alguma abertura à questão da diversidade, o currículo dos cursos de licenciatura segue eurocêntrico e as discussões encontram resistência, são silenciadas ou negligenciadas (CEREZER, 2015; OLIVEIRA, C.I.S, 2012; SANTOS, 2011). Sobre essa questão, o pesquisador Glênio Silvia (2013) alerta sobre a falta de interesse, envolvimento e conhecimentodos profissionais e das instituições de Ensino Superior diante da necessidade de inclusão da temática nas disciplinas, abertura de disciplinas específicas eacontratação de professores/as especializados/as. (SILVA, G., 2013)

Contudo, ajustes e construção de propostas para a formação docente no campo as relações étnico-raciais estão ainda em fase embrionária (CEREZER,2015; CHIERICATTI, 2014). Como identifica Damasceno (2011) sobre a formação em instituições de Ensino Superior, nas esferas estadual e municipal, ainda estão distantes de atenderem às orientações curriculares e aponta o quanto as ações desenvolvidas são isoladas e insuficientes.

As ementas de algumas disciplinas permitem a inclusão da temática de forma interdisciplinar, contudo sem uma ação institucional; mais uma vez fica a cargo do/a docente, de forma individualizada, incluir a questão. A exemplo daquilo que vem ocorrendo na educação básica, a inclusão das temáticas tem partido de ações de professores/as ativistas por meio da oferta de disciplinas optativas envolvendo a temática (JESUS,2015; RIBEIRO, 2014) e buscando implantar e/ou fortalecer linhas de pesquisas nas universidades envolvendo a questão racial.

Na pós-graduação, embora as linhas de pesquisa venham crescendo, permanece o desfalque quando comparamos o total de universidades no País com aquelas que contam com linhas de pesquisa específica na área de educação e racismo. Izabel da Silva (2009) entende que o caráter da concepção eurocêntrica nos espaços acadêmicos inviabiliza o acesso de pesquisadores/as interessados em estudos

envolvendo relações étnico-raciais na educação. Soma-se a isso o fato de que nem todos/as os/as orientadores/as evidenciam interesse e abertura em acompanhar pesquisas nesta linha.

A essa altura, entendemos que todas as universidades brasileiras deveriam apresentar currículo e linhas de pesquisa que atendessem ao debate da temática racial obrigatório na educação básica.

Dentro das linhas de pesquisa que conseguiram se formar, Moreira (2012) chama a atenção para a distância entre o que é produzido na academia e o solo das escolas. Não há um diálogo entre as constatações dos/as pesquisadores/as e os/as profissionais da educação, distanciando ainda mais a teoria das possibilidades de transformação social.

Constatou-se que as ações de formação estão concentradas em iniciativas pontuais e normalmente partem de parcerias com Coletivos; Grupos de pesquisa, Neabs, ONGs; Fóruns de Educação e Diversidade Étnico-Racial e movimentos sociais negros. A atuação desses núcleos tem sido fundamental no processo formativo de professores/as, contudo, não conseguem alcançar número significativo de professores/as, uma vez que a demanda é bastante significativa e os recursos, por vezes, escassos.

O destaque entre as parcerias fica nas ações desenvolvidas pelos Neabs, citados em 112 pesquisas. Esses núcleos, normalmente compostos por militantes, promovem ações como seminários, palestras, jornadas e cursos sobre a temática.

O diálogo com o Coletivo Negro58 e as escolas, relatado por Ellen Souza (2014), permitiu a inclusão da temática nos cursos de licenciatura em ciências e matemática, áreas que normalmente apresentam bastante dificuldade e resistência, por meio de do desenvolvimento de estudos trabalhos voltados à produção e divulgação de materiais e estratégias de inclusão daHistória eCulturaAfro-brasileira e Africana em cursos de licenciatura das áreasde ciências e matemática.

Além dos NEABs (CAMARGO, 2015; PAULA, 2013; SILVEIRA, 2009; (SILVA, R., 2010; SOUZA,J.B.,2015),aparecem ainda protagonistas nos processos de formação docente coletivos como a Coafro/PMU, o Proafro/SRE/SEE, PROEX/UFU (PAULA, 2013); Centros Culturais (FARIA, 2011); UNEGRO (COSTA, 2013); Núcleo de Relações Étnico- Raciais e de Gênero, que compõe o Núcleo de Coordenação de Bibliotecas de Belo Horizonte (NUNES, 2010); Grupo de Estudos Africanidades em Esteio/RS (CHAGAS,

58Grupo de Estudos da Cultura Afrobrasileira e Africana e o Ensino de Química vinculado ao Laboratório de

2010); Centro de Formação Continuada de Professores da Educação Básica – CEFOR- PUC/MG (SANTOS, 2010); Movimentos negros (VALE, 2013).

Os parceiros que contribuem para materialização de projetos envolvem ainda instituições que não estão, necessariamente, ligadas à temática, mas aparecem como importantes fornecedores de recursos. É o caso do Programa de Reflexões e Debates

para a Consciência Negra (PRDCN),que contou com os seguintes parceiros: integrantes

dos movimentos sociais negros; empresa de equipamentos PINACLE- que proporcionou a capacitação dos/as professores/as para as oficinas de Áudio e Vídeo; estudantes do Instituto de Artes da UERJ; Arquivo Nacional; Comitê pela Democratização da Informática (CDI), que capacitou professores/as para a utilização de ferramentas de Áudio e Vídeo e para o uso das TIC`S em comunicação comunitária – metodologia utilizada nas oficinas (LOPES, 2010).

Bárbara Rosa (2012) apresenta em sua pesquisa o papel dos Fóruns de Educação e Diversidade Étnico-Racial como espaços de participação social. Os Fóruns atuam principalmente na divulgação das ações e em atividades de formação.

Sobre a atuação de integrantes dos movimentos negros em âmbito nacional, Vale (2013) identificou o fortalecimento e ampliação dos debates sobre políticas afirmativas na educação. Segundo avaliação da pesquisadora,a assessoria fornecida à SECADI/MEC e CNE nas ações realizadas pela Comissão Técnica Nacional de Diversidade para Assuntos Relacionados à Educação dos Afro-brasileiros (CADARA) afetou positivamente ao orientar os rumos das ações de combate ao racismo na educação.

O cenário posto evidencia o papel de instituições e grupos parceiros no processo de formação. Chama-nos a atenção, contudo, a descontinuidade das ações,a marcante presença do ativismo nas iniciativas e a dependência, evidenciada pelas escolas, desse apoio externo. Nesse último caso, marcada pela precariedade e limitações postas ao trabalho docente nas escolas.