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2 OS AGENTES RESPONSÁVEIS PELOS DEZ QUIXOTES

2.5 ALGUMAS CONCLUSÕES

Linda Hutcheon (2006: 143) chama a atenção para o que denomina “celebrity status”, atribuindo um importante papel ao status de celebridade que pode ou não acompanhar uma

É só o Começo, na prática, passa por três estágios. Primeiro, entregamos a um escritor ou jornalista experiente e com ótima formação universitária em Letras (ou em Tradução e Jornalismo) a tarefa de reduzir o texto, levando

em conta aqueles dois modelos de neoleitor, mas sem maiores preocupações a não ser a de reduzir o tamanho do

texto aos limites necessários editorialmente e de simplificar o vocabulário. […] (Em casos de textos escritos em outra língua, o texto-base é uma edição confiável na língua original). […] Em segundo lugar, reprocessamos a adaptação, numa revisão rigorosa feita por um especialista, um linguista de excelente formação na área da

Sociolinguística, o professor da UFRGS Pedro Garcez, agora com o diagnóstico de que falamos há pouco e

segundo critérios sociolinguísticos mais estritos – como está apontado na Nota Editorial dos volumes publicados, nós alteramos a redação de frases em busca de maior eficácia comunicativa, numa dimensão propriamente linguística e numa dimensão literária. Em terceiro lugar, revisamos tudo, cotejando o resultado das duas fases com

o original e medindo o mais precisamente possível a aproximação da adaptação aos leitores desejados” (Fischer, 2010: 16-17). Deve-se esclarecer que, geralmente no caso de uma adaptação, o processo se resume a uma revisão ortográfica comum, como feita em qualquer texto publicado. Como o texto é justamente um reconto, omite-se o trabalho de um preparador de texto, que faz exatamente o descrito na terceira etapa, cotejando o texto fonte com o texto traduzido, profissional contratado em regra para traduções complexas, com no caso das traduções integrais do Quixote.

133 Assistir aos depoimentos de Luís Augusto Fischer, Sergius Gonzaga (Secretário de Cultura de Porto Alegre) e

Paulo Seben, professor e um dos autores da coleção na L&PMWEBTV. Disponível em: <http://www.lpm- webtv.com.br/site/default.asp?Template=/multimidia/layout_exibir.asp&MidiaID=373773&TroncoID=539000& SecaoID=477374>. Acesso em: 17 out. 2014.

134 Antes de sua experiência com o Quixote, Pinto contou que fez uma única tradução, ainda inédita, de Aguafuertes

reescritura. A importância ou, como dissemos aqui, a grife dos envolvidos nas adaptações, define a colocação de uma adaptação dentro de um mercado como a tradução de… (Lobato, Carrasco, Gullar ou Ana Maria Machado), que também ocorre no caso do Quixote. Como pode ser apreciado pelas trajetórias dos adaptadores, editores135, todos, com exceção de Fábio

Bortolazzo Pinto e em menor grau, José Angeli, possuem um respeitável currículo como escritores, e quase todos são muito respeitados dentro da literatura infantojuvenil, incluindo os dois maiores nomes da literatura desse gênero, Monteiro Lobato e Ana Maria Machado, além de Walcyr Carrasco como conhecido autor “global” e Ferreira Gullar, o grande poeta vivo brasileiro. Vários fazem ou fizeram parte de academias de letras. O mesmo pode ser dito dos autores dos paratextos, que como veremos com mais detalhe no capítulo seguinte, são intelectuais e/ou pesquisadores acadêmicos, com estudos relevantes sobre literatura para jovens ou escritores do gênero. É significativo que muitas das informações coletadas aqui não sejam mencionadas nos paratextos, mas compreensível. Como veremos no último capítulo, existem já experimentos que mostram a influência de um paratexto positivo ou negativo (Claassen, 2012)136, portanto não esperávamos encontrar uma biografia detalhada de Angeli contando seu passado como guerrilheiro ou como roteirista de quadrinhos eróticos; ou mencionar que a idolatrada escritora infantil foi obrigada a escapar do Brasil ou que teve seu carro usado num sequestro, tampouco que o jovem autor gaúcho nunca escreveu outra obra depois da adaptação do Quixote. Enfim, respondemos neste capítulo dois a uma de nossas perguntas iniciais, também perguntada por vários críticos da tradução (Gambier, 1994 e Hutcheon, 2006), quem são os adaptadores da obra de Cervantes, como chegaram a essa hercúlea tarefa, suas fontes (declaradas ou subentendidas). As entrevistas (mesmo as não respondidas) nos obrigaram a uma profunda imersão dentro dessas histórias de vida, possibilitando uma perspectiva diferente, a do autor, suas leituras preferidas, o primeiro contato com a obra cervantina, a história de como

135 Deixamos o estudo dos ilustradores para uma outra pesquisa, mas sabemos que vários são premiados e com

carreiras bem-sucedidas.

136 Eefje Claassen (2012: 22) seleciona dois grupos e apresenta o mesmo texto ficcional (de um autor francês

fictício, de conteúdo indigesto, moralmente repreensível, mas uma parte (A) recebe uma apresentação positiva do autor, e outra (B), uma negativa. Portanto o grupo A acredita que o escritor francês recebeu vários prêmios literários e que foi embaixador da UNICEF, aprova direitos iguais para homens e mulheres e luta contra todo tipo de discriminação racial. O segundo grupo leu uma apresentação na qual se diz que ele escreveu vários romances bem controversos, foi condenado por molestar crianças, além de ser racista e sexista. Os resultados são surpreendentes, e mostram que o interesse por um escritor ou a motivação para ler um determinado livro pode surgir pela impressão positiva ou negativa que temos desse escritor, imagem que influencia nossa forma de interpretar e valorar um texto literário (Claassen, 2012: 22). Em outro experimento, esse pesquisador holandês utiliza um texto assinado por Michel Houellebecq, autor francês polêmico por suas posições, considerado por muitos como racista, sexista e intolerante com outras culturas e religiões. O pesquisador apresenta duas traduções, uma bem próxima ao texto, portanto com uma carga emocional bastante negativa, e outra atenuada, domesticada com muitos eufemismos, e registrou as diferentes respostas dos leitores, sendo que alguns sabiam da reputação do autor e outros não.

a adaptação foi parar naquelas mãos… Enfim, informações que nos ajudaram a entender a autoridade desses agentes nas obras estudadas.