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Algumas considerações sobre a vivência da sexualidade na adolescência

A adolescência compreende os indivíduos na faixa etá- ria entre 10 e 19 anos de idade, considerando a definição da Organização Mundial da Saúde (OMS) (Brêtas, Ohara, Jardim, Aguiar Junior, & Oliveira, 2011). É uma fase na qual normalmente predominam expectativas e dúvidas (Almeida & Centa, 2009) e ocorre a construção da identidade (Alencar, Silva, Silva, & Diniz, 2008; Santrock, 2014). É nesse momento também que os jovens geralmente começam a ter as primeiras experiências sexuais o que, nos últimos anos, tem acontecido cada vez mais cedo. Esse fenômeno contribui, muitas vezes, para que o jovem não se proteja nas primeiras relações sexuais em função de

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sua imaturidade e de questões relativas ao próprio período de desenvolvimento (Brêtas et al., 2011). Ainda predomina a ideia de que se transar só uma vez não vai engravidar e/ou que não vai “pegar” alguma doença.

Além disso, há uma dificuldade de alguns pais em abordar o assunto da sexualidade com seus filhos adolescentes. A maneira como os jovens se comportam e vivenciam a sexualidade pode ser bem diferente de como os pais vivenciaram sua própria sexualidade quando adolescentes. Isso porque o exercício da sexualidade está relacionado ao contexto sociocultural de cada época e cada fase tem sua própria historicidade (Brilhante & Catrib, 2011). Considerando que a adolescência é uma fase de dúvidas, expectativas e curiosidade sexual, é de se imaginar que muitos desses jovens tenham certa dificuldade nesse início como medos, preocupações e falta de informação. Ou ainda, o que é mais grave, vivenciem a sexualidade como sendo restrita ao ato sexual e, muitas vezes, sem usufruir seus aspectos mais prazerosos e sem a devida proteção. Sendo assim, vários autores consideram a importância de orientação e educação sexual desde o início da adolescência e, principalmente, que essa orientação/ educação parta dos pais (Alencar et al., 2008; Brêtas et al., 2011; Santrock, 2014).

Quando os adolescentes têm uma relação mais aberta com seus pais e que estes conseguem abordar esse assunto com seus filhos de maneira tranquila, a tendência é adiarem o início da vida sexual, usarem contraceptivos com mais frequência e se sentirem mais à vontade em relação à sexualidade. Contudo, embora seja um papel e uma obrigação da família, nem sempre isso acontece de maneira natural e tranquila. Muitos pais, em função de algumas crenças e valores, evitam tocar no assunto por acreditarem que não é correto falar de sexualidade ou mesmo por não saberem como abordar o tema.

Alencar et al. (2008) lembram que a educação sexual faz parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), pois “inclui

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a orientação sexual entre os temas transversais nas diversas áreas do conhecimento, com finalidade de impregnar toda a prática educativa com as questões da orientação sexual” (p. 160). Dessa maneira, fica evidente também a contribuição da escola e de outras instâncias educativas no esclarecimento sobre a sexualidade. Contudo, tais abordagens devem ser o mais livre de preconceitos possível, tentando compreender as sensações dos adolescentes e suas diferentes maneiras de conceber a experiência sexual. Quanto mais moralista o discurso do profissional de saúde ou do professor, mais distante este ficará do jovem que está no auge das sensações sexuais e desejos diversos que nem sempre correspondem àquele modelo tradicionalmente passado pelos mais velhos.

A mídia e a TV geralmente exibem programações nas quais o sexo é comum e nem sempre com um conteúdo educativo. Por um lado, esses programas podem estimular uma sexualização precoce. Por outro, podem minimizar a importância da sexualidade saudável na vida da pessoa. Mais uma vez, reitera-se a impor- tância dos pais e da escola no processo de conhecimento sobre a sexualidade e de orientações de como vivê-la de forma plena e satisfatória. Lembrando que vivê-la de forma plena é sentir-se bem consigo mesmo, com suas sensações e desejos, e saber suportar as consequências dessas experiências.

Atualmente, orientações e esclarecimentos são extrema- mente necessários em função do paradoxo que é viver plenamente a sexualidade. De acordo com Foucault (1988), a sexualidade ocidental é repleta de contradições: de um lado exibe, de outro, reprime.

Na cultura, o tema do sexo transmite mensagens contraditórias para os jovens: por um lado, é dito aos adolescentes (especial- mente às garotas) para não manterem relações sexuais, por outro lado, eles vêem o sexo retratado na mídia como positivo (especialmente para os rapazes) (Santrock, 2014, p. 210).

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Desde o início da adolescência, os jovens aprendem como se comportar diante de situações dentro dos scripts prescritos para cada gênero. Os scripts sexuais são diferentes para homens e mulheres. De acordo com Santrock (2014), “a maioria das experiências sexuais adolescentes consiste de os homens ten- tando avançar sexualmente e ficando a cargo das mulheres estabelecerem os limites dessas investidas sexuais” (p. 214) e “a iniciação sexual, o prazer, a exposição da vida sexual tendem a ser diferentes para meninos e para meninas. Há um padrão duplo para as mulheres: “elas devem ser atraentes, mas devem controlar o seu desejo” (p. 215). Dessa forma, as mulheres não podem ou não devem mostrar quanto desejo sentem e exercem plenamente esse desejo, mas devem se esforçar ao máximo para serem desejadas. Desejar não pode, ser desejada, sim. Isso traz uma série de implicações na vivência das moças em relação aos afetos e à sua vida sexual, tais como receber cantadas indesejadas e não conseguir negar o assédio, não acreditar ser possível tomar a iniciativa em função dos estereótipos de gênero e depender sempre do outro para iniciar uma relação.

A educação sexual também deve trazer à baila às questões de gênero porque mesmo com os avanços das discussões sobre o masculino e o feminino, ainda é muito forte o machismo e a ideia de que a mulher deve reprimir sua sexualidade (Reis & Santos, 2011). De acordo com esses autores, as mulheres são educadas para serem mães e, muitas vezes, dependentes emocionalmente dos seus parceiros. Geralmente também desconhecem o próprio corpo, não se tocam e não aprendem como sentir prazer.

Nesse sentido, “não é a sexualidade feminina que tem um problema, é a sociedade que é problemática na sua definição de sexo e no papel subordinado que esta definição confere às mulheres” (Brêtas et al., 2011, p. 3224).

Muitas vezes, a escola contribui para a manutenção de relações de gênero desiguais quando prescreve como a menina deve se comportar, geralmente sendo mais meiga, delicada e se

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preservando do assédio, evitando comportamentos mais ousados (Reis & Santos, 2011).

Entretanto, o que se mostra ao adolescente é um contraste pro- fundo. De um lado, a superexposição do corpo e da sexualidade humana. De outro, um moralismo cortante, que impede que o assunto seja discutido profundamente, formando consciências e opiniões. Apesar do avanço dos discursos progressistas, faltam atitudes (Brilhante & Catrib, 2011, p. 507).

Em relação à reprodução, por exemplo, as mulheres ainda são consideradas responsáveis pela gravidez não planejada, como se ao homem não coubesse metade dessa responsabilidade (Brêtas

et al., 2011). Fica evidente que a sexualidade é mais do que a

informação sobre como acontece o ato sexual. É um tema que envolve inclusive a questão do gênero, a maneira de se relacionar com o outro e também as suas consequências, tais como as doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e a gravidez.

Assim, os pais, a escola e a sociedade precisam desenvolver uma práxis mais contextualizada com as necessidades emocionais e afetivas dos adolescentes, sobretudo em relação à sexualidade. Não só promover informações assertivas, mas também fomentar espaços de discussão, rodas de conversa, sobre as questões inter -relacionadas tais como as relações afetivas, a orientação sexual, bem como as diversas formas de vivenciar a sexualidade, por que é nesse contexto que os jovens irão conviver.

Não adianta só informar tecnicamente como ocorre o ato sexual, mas esclarecer como o jovem se sente diante dessa possibilidade, como resolver os conflitos inerentes a essa vivên- cia, trabalhando essas dificuldades de maneira clara e simples. Ademais, trazer para o campo de discussão, orientação e prática as questões de gênero, e nesse sentido, “as adolescentes necessitam de um cuidado muito próprio quanto à sua sexualidade” (Brilhante & Catrib, 2011, p. 507).

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Conversando sobre sexualidade