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3.2 Algumas Observações

Prosseguimos agora para estabelecer a abordagem do espaço de estados como um método alternativo para representar sistemas físicos. Esta seção prepara o cenário para a definição formal da representação no espaço de estados, apresentando algumas observações sobre os sistemas e suas variáveis. Na discussão que se segue, parte do desenvolvimento foi colocada em notas de rodapé para evitar o obscurecimento das questões principais com equações em excesso e para garantir que o conceito seja claro. Embora utilizemos dois circuitos elétricos para ilustrar os conceitos, poderíamos também perfeitamente ter utilizado um sistema mecânico ou outro sistema físico.

Demonstramos agora que para um sistema com muitas variáveis, como tensão sobre o indutor, tensão sobre o resistor e carga no capacitor, precisamos utilizar equações diferenciais apenas para encontrar a solução para um determinado subconjunto das variáveis do sistema, uma vez que todas as demais variáveis do sistema podem ser calculadas algebricamente a partir das variáveis do subconjunto. Nossos exemplos adotam a seguinte abordagem:

Escolhemos um subconjunto particular de todas as possíveis variáveis do sistema e chamamos as variáveis deste subconjunto de variáveis de estado.

Para um sistema de ordem n, escrevemos n equações diferenciais simultâneas de primeira

ordem em função das variáveis de estado. Chamamos este sistema de equações diferenciais

simultâneas de equações de estado.

Caso conheçamos a condição inicial de todas as variáveis de estado em t0, bem como a entrada do sistema para t ≥ t0, podemos resolver as equações diferenciais simultâneas para as variáveis de estado para t ≥ t0.

Combinamos algebricamente as variáveis de estado com a entrada do sistema e determinamos todas as demais variáveis do sistema para t ≥ t0. Chamamos esta equação algébrica de

equação de saída.

Consideramos as equações de estado e as equações de saída uma representação viável do sistema. Chamamos esta representação do sistema de representação no espaço de estados. Vamos agora seguir esses passos em um exemplo. Considere o circuito RL mostrado na Figura 3.1

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com uma corrente inicial i(0).

FIGURA 3.1 Circuito RL.

Escolhemos a corrente, i(t), para a qual iremos escrever e resolver uma equação diferencial utilizando transformadas de Laplace.

Escrevemos a equação de malha,

Aplicando a transformada de Laplace, utilizando a Tabela 2.2, Item 7, e incluindo as condições iniciais, resulta

Admitindo que a entrada, v(t), seja um degrau unitário, u(t), cuja transformada de Laplace é

V(s) = 1/s, resolvemos para I(s) e obtemos

a partir da qual

A função i(t) é um subconjunto de todas as possíveis variáveis do circuito que somos capazes de determinar a partir da Eq. (3.4) caso conheçamos sua condição inicial, i(0), e a entrada

v(t). Assim, i(t) é uma variável de estado, e a equação diferencial (3.1) é uma equação de estado.

Podemos agora obter a solução para todas as demais variáveis do circuito algebricamente em função de i(t) e da tensão aplicada, v(t). Por exemplo, a tensão sobre o resistor é

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1.

2.

A derivada da corrente é

Portanto, conhecendo a variável de estado, i(t), e a entrada, v(t), podemos obter o valor, ou o

estado, de qualquer variável do circuito em qualquer tempo, t ≥ t0. Assim, as equações algébricas, Eqs. (3.5) a (3.7), são equações de saída.

Uma vez que as variáveis de interesse são descritas completamente pela Eq. (3.1) e pelas Eqs. (3.5) a (3.7), dizemos que a combinação da equação de estado (3.1) com as equações de saída (3.5 a 3.7) forma uma representação viável do circuito, a qual chamamos representação no

espaço de estados.

A Eq. (3.1), que descreve a dinâmica do circuito, não é única. Esta equação poderia ser escrita em função de qualquer outra variável do circuito. Por exemplo, substituindo i = νR/R na Eq.

(3.1) resulta

que pode ser resolvida sabendo-se que a condição inicial νR(0) = Ri(0) e conhecendose ν(t).

Nesse caso, a variável de estado é νR(t). Analogamente, todas as outras variáveis do circuito

podem, agora, ser escritas em função da variável de estado, νR(t), e da entrada, ν(t). Vamos agora

estender nossas observações a um sistema de segunda ordem, como o mostrado na Figura 3.2.

FIGURA 3.2 Circuito RLC.

Como o circuito é de segunda ordem, duas equações diferenciais de primeira ordem simultâneas são necessárias para achar a solução para duas variáveis de estado. Escolhemos

i(t) e q(t), a carga no capacitor, como as duas variáveis de estado.

Escrevendo a equação da malha resulta

3.

4.

5.

Mas uma equação diferencial de ordem n pode ser convertida em n equações diferenciais de primeira ordem simultâneas, com cada uma das equações da forma

em que cada xi é uma variável de estado, e os aij e bi são constantes para sistemas lineares

invariantes no tempo. Dizemos que o lado direito da Eq. (3.11) é uma combinação linear das variáveis de estado e de entrada, f(t).

Podemos converter a Eq. (3.10) em duas equações diferenciais de primeira ordem simultâneas em função de i(t) e q(t). A primeira equação pode ser dq/dt = i. A segunda equação pode ser formada substituindo ∫ i dt = q na Eq. (3.9) e resolvendo para di/dt. Juntando as duas equações resultantes, obtemos

Estas equações são as equações de estado e podem ser resolvidas simultaneamente para as variáveis de estado, q(t) e i(t), com a utilização da transformada de Laplace e dos métodos do

Capítulo 2, se conhecemos as condições iniciais para q(t) e i(t), e se conhecemos ν(t), a entrada.

A partir dessas duas variáveis de estado, podemos obter a solução para todas as demais variáveis do circuito. Por exemplo, a tensão sobre o indutor pode ser escrita em função das variáveis de estado resolvidas e da entrada como

A Eq. (3.13) é uma equação de saída; dizemos que νL(t) é uma combinação linear das

variáveis de estado, q(t) e i(t), e da entrada, ν(t).

A combinação das equações de estado (3.12) com a equação de saída (3.13) forma uma representação viável do circuito, a qual chamamos representação no espaço de estados.

Outra escolha das duas variáveis de estado pode ser feita, por exemplo, vR(t) e vC(t), as

tensões sobre o resistor e sobre o capacitor, respectivamente. O conjunto resultante de equações diferenciais de primeira ordem simultâneas é:

conhecemos as condições iniciais e também ν(t). Além disso, todas as demais variáveis do circuito podem ser obtidas como combinação linear dessas variáveis de estado.

Existe alguma restrição na escolha das variáveis de estado? Sim! Tipicamente, o número mínimo de variáveis de estado necessário para descrever um sistema é igual à ordem da equação diferencial. Assim, um sistema de segunda ordem requer um mínimo de duas variáveis de estado para descrevê-lo. Podemos definir mais variáveis de estado do que o conjunto mínimo; todavia, dentro deste conjunto mínimo as variáveis de estado devem ser linearmente independentes. Por exemplo, caso νR(t) seja escolhida como variável de estado, então i(t) não pode ser escolhida,

porque νR(t) pode ser escrita como uma combinação linear de i(t), mais especificamente, νR(t) =

Ri(t). Nessas circunstâncias, dizemos que as variáveis de estado são linearmente dependentes.

As variáveis de estado devem ser linearmente independentes; isto é, nenhuma variável de estado pode ser escrita como uma combinação linear das demais variáveis de estado, caso contrário poderemos não ter informações suficientes para achar a solução para todas as outras variáveis do sistema, e podemos até mesmo ter problemas para escrever as próprias equações simultâneas.

As equações de estado e de saída podem ser escritas na forma vetorial-matricial se o sistema for linear. Assim, as Eqs. (3.12), as equações de estado, podem ser escritas como

em que

A Eq. (3.13), equação de saída, pode ser escrita como

em que

Chamamos a combinação das Eqs. (3.15) e (3.16) de uma representação no espaço de estados do circuito da Figura 3.2. Uma representação no espaço de estados, portanto, consiste (1) nas equações diferenciais de primeira ordem simultâneas a partir das quais pode ser obtida a solução para as variáveis de estado, e (2) na equação algébrica de saída a partir da qual todas as demais variáveis do sistema podem ser obtidas. Uma representação no espaço de estados não é única, uma vez que uma escolha diferente das variáveis de estado leva a uma representação diferente do mesmo sistema.

Nesta seção utilizamos dois circuitos elétricos para demonstrar alguns princípios que são a base da representação no espaço de estados. As representações desenvolvidas nesta seção foram de sistemas de entrada única e saída única, em que y, D e u nas Eqs. (3.15) e (3.16) são grandezas

escalares. Em geral, os sistemas possuem múltiplas entradas e múltiplas saídas. Para esses casos,

y e u se tornam grandezas vetoriais e D se torna uma matriz. Na Seção 3.3 iremos generalizar a representação para sistemas com múltiplas entradas e múltiplas saídas e sintetizaremos o conceito da representação no espaço de estados.