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Algumas vozes de algumas mulheres Parte 1 – A Tormenta

No documento EXERCÍCIOS DE DRAMATURGIA (páginas 55-62)

p. 54

Parte I – A Tormenta

(Acende a luz. No palco estão se movimentando as cinco atrizes que farão as memórias. Elas estão realizando tarefas cotidianas. Depois de alguns segundos, iniciam as falas.)

Memória 1 - Daí você mexe até dá o ponto de enrolar com a mão. Memória 2 - Nossa, mas a gente riu muito!

Memória 3 - Quando eu fiquei doente, voltei pra cá. Graças a Deus! Memória 4 – Cumadre é pra essas hora!

Memória 2 - Tô numa ressaca.

Memória 5 - Põe o nome do meu marido pra ele não ficar aborrecido que eu não falei dele.

Memória 2 - Treze filho. Memória 4 - Seis filho.

Memória 3 - Quatorze filho, 26 neto e 11 bisneto.

Memória 2 - Assim que der a puxinha, o doce tá pronto.

Memória 1 - O que me distrai é isso, minha filha! Costurá as roupa rasgada. Memória 4 – Na enxada deusde os sete ano de idade e ainda buscava lenha pra vender.

Memória 3 - Ele falou que eu contei umas coisa nada a ver. Ficou com ciúme, boba!

(Mulher entra em cena. Há uma pausa nas falas das memórias, depois elas retornam. A mulher tem os joelhos ralados e sangrando mas não parece perceber ou se importar. Está vestida com um vestido preto e salto alto como se fosse a uma festa. Duranteas falas das memórias ela estará sendo seguida, bulinada e, em alguns momentos, lutará fisicamente com as memórias.)

Mulher – Tem que por mais farinha, uai!

Memória 4 - Cheguei a pedir as coisa pros outros, não tenho vergonha de contar, não. Era muita dificuldade. (a memória quatro começa a seguir a

Parte I – A Tormenta

(Acende a luz. No palco estão se movimentando as cinco atrizes que farão as memórias. Elas estão realizando tarefas cotidianas. Depois de alguns segundos, iniciam as falas.)

Memória 1 - Daí você mexe até dá o ponto de enrolar com a mão. Memória 2 - Nossa, mas a gente riu muito!

Memória 3 - Quando eu fiquei doente, voltei pra cá. Graças a Deus! Memória 4 – Cumadre é pra essas hora!

Memória 2 - Tô numa ressaca.

Memória 5 - Põe o nome do meu marido pra ele não ficar aborrecido que eu não falei dele.

Memória 2 - Treze filho. Memória 4 - Seis filho.

Memória 3 - Quatorze filho, 26 neto e 11 bisneto.

Memória 2 - Assim que der a puxinha, o doce tá pronto.

Memória 1 - O que me distrai é isso, minha filha! Costurá as roupa rasgada. Memória 4 – Na enxada deusde os sete ano de idade e ainda buscava lenha pra vender.

Memória 3 - Ele falou que eu contei umas coisa nada a ver. Ficou com ciúme, boba!

(Mulher entra em cena. Há uma pausa nas falas das memórias, depois elas retornam. A mulher tem os joelhos ralados e sangrando mas não parece perceber ou se importar. Está vestida com um vestido preto e salto alto como se fosse a uma festa. Duranteas falas das memórias ela estará sendo seguida, bulinada e, em alguns momentos, lutará fisicamente com as memórias.)

Mulher – Tem que por mais farinha, uai!

Memória 4 - Cheguei a pedir as coisa pros outros, não tenho vergonha de contar, não. Era muita dificuldade. (a memória quatro começa a seguir a

mulher)

Memória 3 - Mas eu queria tanto voltar pro interior que não tinha uma pessoa que eu não falava disso.

Memória 1 – Buscava… buscava inhame no brejo. Não esses inhame bom de hoje em dia, não. Era o inhame pra porco, um roxo, sabe?

Memória 2 - Antes de dormir ou eu tomo caldinho de miojo ou leite com nescau, coisa pesada me dói o estômago.

Memória 4 – Eu gosto bem docinho. (dando toquinhos nela)

Memória 5 - Voltei pra cuidar da minha mãe que tava doente, em menos de um ano ela faleceu e eu fiquei tratando dos meus irmãos.

Mulher - Vai pondo a canjica de milho mas tem que ser da marca Rocinha, senão não dá certo.

Memória 1 - Depois que meus menino comia, se sobrasse, eu comia também. (memória 1 começa a seguir a mulher)

Memória 4 - Escalda o polvilho. O queijo põe só no final. Memória 5 - … das galinhas, águar as planta e de fazer teatro.

Memória 3 - … sentia o cheirinho do doce da minha mãe e corria pra porta dela pra raspar o tacho.

Memória 2 – (Risada exagerada) (memória 2 empurra a mulher) Memória 4 - As pessoa aqui tudo gosta de mim.

Mulher - Um copo de farinha de trigo. Ou dois.

Memória 3 - (memória 3 começa a seguir a mulher) Bananinha do brejo pra infecção de urina. Chapéu de couro pra reumatismo. Cipó cabeludo pra problema de rins. Hortelã do campo pra inflamação vaginal. Jurubeba de cumpim, bom pra quem tem problema de fígado. Erva de bicho pra hemorróida. Ipê roxo pra garganta inflamada. Rosa branca pra problema de útero. Hemilionio pra dor de cabeça e olho gordo. Carapiar do campo pra resfriado. Congonha bugue pra dor nas costas. Fedegoso pra verme. Barbatimão pra dor de dente.

Memória 4 – Ocê querendo eu busco procê.

Memória 1 - ... perto do jequitibá gigante. Cê já ouviu falar? Memória 4 - Se quiser por côco, pode pôr.

p. 56 Memória 5 - ...buscava água numa mina longe toda vida e carregava ela com umas lata na cabeça.

Memória 2 – Conhece finco?

Memória 3 - A minha mãe pegou o resto da farinha que tava na lata e fez um mingau pra nós. Não tinha nem gordura.

Mulher - Eu vi que ela tava chorando.

Memória 1 - Não pode colocar tudo de uma vez não, viu?

Memória 3 - Ô mãe, o mais importante é a senhora aqui com a gente. Memória 1 -(grita com braveza) ...perto do tanque.

Memória 4 - … tinha uma árvore de boneca. Dava umas boneca branquinha, branquinha.(luta corporal rápida)

Memória 2 - Morei em São Paulo 27 anos, 6 meses e 5 dias, aí eu voltei. Memória 3 - Você devia benzê suas filha, menina. Aí elas fica boa rapidinho. Memória 1 - Obrigada de você achar as nossas coisa bonitas.(a mulher cai

mas se levanta rapidamente)

Mulher - Mistura o repolho, tomate, cebola e põe um bucadinho de pimenta. Memória 5 – Põe a criança de cabeça pra baixo, se um pé tiver maior que o outro é quebranto.

Memória 2 - O rapaz foi escondido da mãe dele no baile e acabou encontrando com um bicho no caminho de volta. Era o coisa ruim.

Memória 4 - Quase todo mundo aqui nasceu nas mãos dela, era uma parteira muito boa. (a mulher leva uma rasteira da memória 2)

Mulher - Rala o queijo com a mão. Memória 4 - ...à cavalo.

Memória 2 - Eu nasci no quilombo dom silvério.

(pausa)

Mulher – Quilombo…

(O texto vai sendo falado cada vez mais rápido e as ações acompanham esse ritmo frenético.)

Memória 1 – Benzo com a brasa.

Memória 5 - ...buscava água numa mina longe toda vida e carregava ela com umas lata na cabeça.

Memória 2 – Conhece finco?

Memória 3 - A minha mãe pegou o resto da farinha que tava na lata e fez um mingau pra nós. Não tinha nem gordura.

Mulher - Eu vi que ela tava chorando.

Memória 1 - Não pode colocar tudo de uma vez não, viu?

Memória 3 - Ô mãe, o mais importante é a senhora aqui com a gente. Memória 1 -(grita com braveza) ...perto do tanque.

Memória 4 - … tinha uma árvore de boneca. Dava umas boneca branquinha, branquinha.(luta corporal rápida)

Memória 2 - Morei em São Paulo 27 anos, 6 meses e 5 dias, aí eu voltei. Memória 3 - Você devia benzê suas filha, menina. Aí elas fica boa rapidinho. Memória 1 - Obrigada de você achar as nossas coisa bonitas.(a mulher cai

mas se levanta rapidamente)

Mulher - Mistura o repolho, tomate, cebola e põe um bucadinho de pimenta. Memória 5 – Põe a criança de cabeça pra baixo, se um pé tiver maior que o outro é quebranto.

Memória 2 - O rapaz foi escondido da mãe dele no baile e acabou encontrando com um bicho no caminho de volta. Era o coisa ruim.

Memória 4 - Quase todo mundo aqui nasceu nas mãos dela, era uma parteira muito boa. (a mulher leva uma rasteira da memória 2)

Mulher - Rala o queijo com a mão. Memória 4 - ...à cavalo.

Memória 2 - Eu nasci no quilombo dom silvério.

(pausa)

Mulher – Quilombo…

(O texto vai sendo falado cada vez mais rápido e as ações acompanham esse ritmo frenético.)

Memória 1 – Benzo com a brasa.

Memória 3 - Ajudava as mulher que tinha tido bebê.

Memória 5 - … panha umas folha de erva cidreira na horta e põe na água com açúcar.

Memória 4 - Mudei. Mudei porque eu queria que as criança estudasse.

Memória 2 - Ah, eu faço docinho, boba. Se não o pessoal pode achar que falta açúcar na casa da gente.

Memória 1 - … eu só assino o nome.

Memória 3 - E não é que meu pai encontrou com o homem que tava trazendo o caixão do meu irmãozinho na rodoviária?

Memória 2 - Meu pão de queijo é diferente, leva batata! (memória 2 começa

a seguir a mulher)

Memória 3 - O caixão tava embrulhado. Meu pai chegou e falou assim: que que é isso, compadre? E era pro filho dele.

Memória 4 - Desejo de comer melado de cana com angu. Todas as memórias – Hã?

Memória 2 - 30 anos fazendo merenda pros menino da escola. Eles fala até hoje que comida boa mesmo é a minha. E tá tudo certo.(ri)

Memória 1 - Amassa o ovo com o açúcar.

Memória 5 - Perdi dois menino de vez e um no parto. (memória 5 começa a

seguir a mulher)

Memória 3 - A vida era muito difícil, mas a gente não achava difícil não, a gente achava boa. Hoje que a gente vê que era difícil.

Mulher - Dois quilos de torradinha e um tacho de doce de leite. (luta

corporal)

Memória 4 - Viuvei nova mas não tô jogada fora, não. Se aparecer alguém me querendo eu vou escolher.

Memória 1 – Manteiga ou margarina?

Memória 3 - 14 anos cozinhando pros preso. Memória 2 - Assava biscoito no forno de cupim.

Memória 5 - Alecrim se você colocar no cabelo ajuda a crescer. E deixa a gente mais alegrinha! (Todas as memórias seguindo a mulher

apressadamente. Em alguns momentos elas tocam tanto nela que a tiram do chão)

p. 58 Memória 4 - Comecei a trabalhar de babá com 11 anos em Belo Horizonte. Memória 2- São Paulo.

Memória 1 – Rio de Janeiro.

Memória 3 - A mãe amarrava um pano na cabeça. Memória 2 - Casei com 16.

Memória 5 – Conhece, não? Broa assada na brasa do fogão de lenha?

Memória 4 - As boneca nossa era de pau de bananeira.(A mulher cai

novamente e levanta com mais dificuldade. O ritmo da cena começa a diminuir.)

Memória 1 - O menino que eu olhava era tão pesado, boba! Eu era franzina, quase não aguentava ele. Eu tinha 8 anos.

Mulher - Uma pitadinha de sal.

Memória 3 – Eram onze, agora tem duas.

Memória 2 – Aí eu costurava pra fora escondido do meu marido mas conseguia dinheiro pras minhas coisa.

Memória 2 - 76 anos Memória 1 – 93 anos Memória 3 – 62 anos

(A partir de agora o texto vai sendo falado cada vez mais baixo. Todas as memórias vão se posicionando atrás da mulher que está visivelmente cansada e ofegante. Ela está no centro do palco.)

Memória 5 – 84 anos Memória 2 - 57 Memória 1 – 86 Memória 3 – 78 Memória 5 – 90 Memória 2 - 71 Memória 1 – 89

(Entram em cena uma senhora de 90 anos, um homem vestido socialmente e uma criança de 6 anos. Eles se posicionam em volta da mulher, na extremidade do palco.)

Memória 4 - Comecei a trabalhar de babá com 11 anos em Belo Horizonte. Memória 2- São Paulo.

Memória 1 – Rio de Janeiro.

Memória 3 - A mãe amarrava um pano na cabeça. Memória 2 - Casei com 16.

Memória 5 – Conhece, não? Broa assada na brasa do fogão de lenha?

Memória 4 - As boneca nossa era de pau de bananeira.(A mulher cai

novamente e levanta com mais dificuldade. O ritmo da cena começa a diminuir.)

Memória 1 - O menino que eu olhava era tão pesado, boba! Eu era franzina, quase não aguentava ele. Eu tinha 8 anos.

Mulher - Uma pitadinha de sal.

Memória 3 – Eram onze, agora tem duas.

Memória 2 – Aí eu costurava pra fora escondido do meu marido mas conseguia dinheiro pras minhas coisa.

Memória 2 - 76 anos Memória 1 – 93 anos Memória 3 – 62 anos

(A partir de agora o texto vai sendo falado cada vez mais baixo. Todas as memórias vão se posicionando atrás da mulher que está visivelmente cansada e ofegante. Ela está no centro do palco.)

Memória 5 – 84 anos Memória 2 - 57 Memória 1 – 86 Memória 3 – 78 Memória 5 – 90 Memória 2 - 71 Memória 1 – 89

(Entram em cena uma senhora de 90 anos, um homem vestido socialmente e uma criança de 6 anos. Eles se posicionam em volta da mulher, na extremidade do palco.)

Mulher de 90 anos – Você pode me arrumar um copo de água? Homem – Vamos?

Criança – Essas que estão atrás de você vão também?

(um carrinho de supermercado corre para dentro do palco. Alguém fora de cena o empurrou. Todos que estão em cena olham para ele.)

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No documento EXERCÍCIOS DE DRAMATURGIA (páginas 55-62)