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4.6 Análise Intracaso

4.6.2 Análise das Vulnerabilidades

Para esta análise foram consideradas as categorias propostas por Svensson (2004), dependência funcional, dependência de tempo e dependência relacional. Dependência funcional e de tempo estão relacionadas aos fatores ligados aos processos e ordem cronológica das atividades da cadeia de suprimentos, enquanto dependência relacional refere se a relacionamentos específicos entre as empresas que compõem a cadeia de suprimentos (SVENSSON, 2004).

Desta forma, foram analisadas como vulnerabilidades as evidências ligadas a dependência funcional ou de tempo, ligadas a ausência de recursos ou fatores que atrasaram, dificultaram ou interromperam os processos produtivos durante a crise hídrica, que podem influenciar a capacidade de flexibilidade (dependência funcional) ou capacidade de velocidade (dependência de tempo). E ainda dependência relacional, cujas características remetem aos ativos específicos de relacionamento existente na cadeia, tanto verticalmente (fornecedores, empresa focal e compradores), quanto horizontalmente (ONGs, Governo, Institutos, Associações, entre outros), que podem influenciar as capacidades de visibilidade e colaboração, por estarem envolvidas com compartilhamento de informações e relacionamento entre as organizações participantes da cadeia.

4.6.2.1 Cadeia da Cana

Produtores: Ao analisar a dependência funcional e de tempo entre os pequenos produtores pode-se evidenciar que além dos efeitos da estiagem, as questões regulatórias também entraram no radar como barreiras para gerenciamento eficiente do risco, devido a morosidade que tem provocado nos processos. Por isso, criticam as ações do governo voltadas para taxações de nascentes pelo uso da água e não apenas pela licença para captação em poços subterrâneos. Para outro produtor respondente a principal vulnerabilidade também está ligada a uma dependência funcional, porém referente ao cumprimento do protocolo agroambiental, que determina a proibição do uso do fogo nas lavouras de cana (queimadas). Outro destaque segundo o pequeno produtor de cana é a dificuldade para implantação da mecanização da lavoura e principalmente a dificuldade para encontrar mão-de-obra.

Processadores: Na análise da vulnerabilidade dos processadores notou-se evidências ligadas à dependência funcional, especialmente das usinas respondentes, cujas dificuldades para lidar com a crise hídrica estão principalmente na falta de recursos financeiros e impactos gerados pela crise econômica enfrentada pelo setor. Um dos diretores respondentes apontou que devido a empresa possuir 11 unidades agroindustriais em cinco estados diferentes, tenta reduzir esta dependência geográfica, pois dificilmente seria impactada por uma única

catástrofe natural. Ressaltou que no Brasil, diferente dos outros países, não há seguro que cubra o risco de grandes catástrofes, como por exemplo, risco de geadas ou secas.

Processadores Destilarias: Entre as destilarias de bebidas processadoras, semelhante a situação dos produtores, o gerente agroindustrial expôs que as mudanças provocadas pela implantação do protocolo ambiental estão trazendo impactos nos processos produtivos da indústria, principalmente devido as mudanças causadas pela mecanização da lavoura e alteração na qualidade da cana-de-açúcar colhida. Isto evidencia uma dependência funcional, que apesar de não estar ligada diretamente a crise hídrica, tem influência nos fatores ambientais que são relevantes para cadeia produtiva no longo prazo.

Compradores: Na análise da vulnerabilidade dos compradores, a Cooperativa 1 destaca que as estratégias do governo para o setor não ajudaram a investir em programas voltados para sustentabilidade e gestão de recursos hídricos, aumentando a dependência funcional dentro da cadeia produtiva, especialmente de recursos financeiros. Exemplificaram que alguns fornecedores de peças, fecharam por falta de capacidade para planejamento econômico. O assessor de relações institucionais respondente da Cooperativa 1 apontou que esta empresa fornecedora havia desenvolvido processo para geração de água e açúcar no processo produtivo, mas mesmo com esta inovação e 96 anos de história, acabou em dificuldades em 2016 em meio a um processo de recuperação judicial para evitar falência e dívidas trabalhistas.

Além da dependência funcional, o respondente da Cooperativa 1 destacou em relação à dependência relacional, que as organizações que compõem o setor precisam dialogar continuamente a respeito da crise hídrica. O respondente ressaltou a necessidade de o governo colaborar com maior direcionamento de informações sobre recursos hídricos. Afirmou que a Agência Nacional de Águas (ANA) produz diversos relatórios, contudo não há público que utilize as informações disponíveis em tomadas de decisões. Falta informação de qualidade, acesso, entendimento e apesar da crise ter afetado o setor de forma grave, recentemente não está ocorrendo compartilhamento de informações a respeito da crise hídrica, segundo o mesmo.

Sobre a qualidade da mão de obra no setor, na opinião deste respondente evoluiu muito e houve mudança de foco sobre de quem é a responsabilidade de capacitação, completando que não pode ficar apenas ao encargo dos usineiros. Para o respondente da Cooperativa 1 o setor sucroalcooleiro, em comparação aos demais produtores de alimentos, é o mais adaptável, menos vulnerável e mais resiliente.

4.6.2.2 Cadeia da Laranja

Produtores: Entre os produtores foi destacado que o momento que aconteceu a crise hídrica, trouxe impactos mais graves, pois afetou a fase da colheita da safra da laranja, prejudicando a produtividade e qualidade do pomar. A crise hídrica gerada pela falta de chuvas neste período, foi agravada pela elevação da temperatura e favoreceu o surgimento de pragas nas plantações. Tornou necessário o fortalecimento do relacionamento entre produtores e fornecedores de insumos para desenvolvimento de novos fertilizantes e melhoria nas práticas de pulverização que dependem da utilização de água em sua composição.

Processadores: Entre os processadores também houve necessidade de maior aproximação com os fornecedores, no intuito de buscar fortalecimento para suprimento de laranja, haja vista que a indústria concorreu mais fortemente devido escassez do produto. Desta forma, por meio de encontros e reuniões de negócios, enfatizavam as vantagens de contratos estabelecidos durante o ano inteiro, ao invés de seguir o calendário da indústria que interrompe a compra de matéria-prima na entressafra (janeiro a março). Por outro lado, um dos respondentes processadores revelou que o relacionamento com os clientes foi afetado porque os preços tiveram que ser repassados. Os preços chegaram a aumentar em mais de 50% em meados de outubro de 2015 para 2016 (R$ 14 para R$ 30, caixa 40 Kg).

Compradores: Entre os compradores, a rede de restaurantes destacou a dependência funcional para suprimento de água para as operações, por meio da companhia de abastecimento do Estado (SABESP): “[...] identificamos que a grande maioria dos restaurantes conseguiria operar com as caixas d’água e o volume de água depois de um corte. Então a gente tinha capacidades de operação que variavam de 1 a 3 dias com a água estocada nas caixas d’ água via Sabesp”.

A rede de restaurantes 2 também trouxe esta preocupação e acrescentou que em casos de contingência tem recorrido as empresas que fornecem água por meio de caminhões-pipa. Esta alternativa tem sido utilizada com frequência, mas a regulamentação do serviço, normas de controle e vigilância sanitária ainda não estão definidas de forma clara, na opinião do respondente da rede de restaurantes 2.