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4.2 Opiniões dos aprendizes em relação à experiência com o aplicativo

4.2.2 Análise e discussão dos dados da entrevista semi-estruturada

Conforme explicado na metodologia, após a coleta e a análise preliminar dos dados, sentimos necessidade de explorar de forma mais aprofundada qual tarefa foi considerada a mais difícil de ser executada e quais foram as estratégias usadas pelos participantes ao planejarem suas falas. Nosso objetivo principal foi trazer mais subsídios para discutir nossos dados. Para isso, optamos pela realização de uma entrevista semi-estruturada com alguns participantes do grupo experimental.

A análise dos dados da escala Likert do questionário (ponto 4.2.1) nos permite afirmar que, embora os participantes tenham reportado uma opinião positiva em relação à experiência híbrida com o WhatsApp, em sua maioria também admitiram que tiveram dificuldade para falar pelo tempo mínimo estabelecido e que não estavam acostumados à realização de tarefas que unissem a aprendizagem de uma língua à tecnologia digital móvel. Esses dados despertaram nosso interesse em saber qual tarefa os participantes consideraram a mais difícil e o porquê dessa dificuldade.

As respostas à primeira pergunta da entrevista - Qual tarefa você achou mais difícil de fazer? - mostram que sete, dos treze entrevistados, afirmaram que a primeira tarefa havia sido a mais complicada. Ao perguntarmos o motivo, embora dificuldades gramaticais, lexicais e de tempo também tenham sido citadas, a grande maioria reportou que o maior empecilho à realização da atividade foi o medo, conforme mostra o gráfico 10.

GRÁFICO 10 – Respostas à questão “Qual tarefa você achou mais difícil de fazer?” da entrevista semi-estruturada

Embora a vontade em aprender a falar uma segunda língua com segurança seja, muitas vezes, o principal fator que leva o aprendiz a estudá-la (UR, 1996; NUNAN, 1999), sabemos que transformar este sonho em realidade não é uma tarefa fácil. Isso porque: (1) a produção oral se caracteriza por processos complexos, nos quais o falante precisa, simultaneamente, realizar diferentes ações (LEVELT, 1989); (2) línguas diversas estão alocadas em uma única rede, podendo ser ativadas ao mesmo tempo (POULISSE; BONGAERTS, 1994); (3) o conhecimento lexical e gramatical de uma língua (seja ela materna ou não) nunca será estável, pois está sempre evoluindo e se adaptando; (4) é impossível para o falante priorizar, ao mesmo tempo, todos os aspectos relacionados à fala (SKEHAN, 1996; ELLIS, 2009). O efeito trade-off, embora seja parte indissociável da aprendizagem de uma segunda língua, pode desencorajar os aprendizes a seguir adiante nos estudos da L2, já que pode frustrá-los, em especial porque a memória implícita, importante para que processos controlados sejam automatizados, leva tempo para se desenvolver (BRANDÃO, 2014).

As dificuldades elencadas no parágrafo anterior, somadas ao fato dos participantes nunca terem feito esse tipo de atividade antes e de, via de regra, não serem estimulados à produção oral fora do ambiente da sala de aula (PORVIR, 2013) podem ter contribuído para aumentar o medo em realizar a

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primeira tarefa. Somado a isso, imaginamos que o sentimento de insegurança tenha sido ampliado devido ao fato dos participantes, até esse momento, não terem como saber se estavam desenvolvendo a produção oral dentro do esperado, já que não haviam, ainda, recebido nenhum feedback. Os trechos das falas dos participantes, destacados em vermelho, deixam essa dificuldade bem clara:

E9: A primeira, sem nenhuma dúvida! Eu quase desisti de enviar um monte de vezes. Só não desisti porque falei com você e você me incentivou tanto que eu fiquei com vergonha de não tentar. Mas foi horrível. Gravei um monte de vezes e nunca ficava bom. O problema maior foi o medo, porque eu achava que estava tudo errado e que você não ia entender nada.

E19: Eu achei a primeira, porque eu nunca tinha feito nenhuma atividade parecida com estas e fiquei morrendo de medo de estar fazendo errado. Você explicou como era, mas, quando comecei a tentar em casa, me enrolei. É diferente quando a gente tá ouvindo de quando tá tentando falar. As palavras meio que somem!

E21: A primeira, porque era novidade e a gente ainda estava começando a estudar inglês. Deu muito trabalho, mas foi bem legal quando eu consegui. Nem acreditei! Mesmo com os erros, eu falei e você entendeu! Tava morrendo de medo de você dizer que não tinha entendido nada.

Além do medo, dentre as respostas dos participantes duas chamaram nossa atenção e achamos interessante reportá-las aqui, com grifo nosso, em vermelho:

E29: Eu achei a última, a de dar conselho, porque eu não sabia o que dizer para dar o tempo. Sempre dava bem pouquinho e eu tinha que fazer de novo. Tinha pouca coisa para falar.

E10: A primeira tarefa, de falar sobre mim mesmo. Não era difícil, porque a gente fez muito isso em sala. Tinha muita coisa pra dizer. Acho que problema foi esse. Era tanta coisa pra dizer que, toda vida que eu gravava, me perdia e tinha que gravar de novo. A coisa que eu tive mais dificuldade foi a gramática, porque às vezes é diferente do português e eu queria falar igual. Tipo a idade e o “do” e “does”.

Selecionamos esses excertos pois eles exemplificam bem duas dificuldades contrárias. No primeiro trecho, o participante afirma que teve problemas para cumprir o tempo mínimo estipulado porque não sabia o que dizer. Em outras palavras, provavelmente devido à necessidade de um leque maior de palavras e/ou expressões. Já no segundo trecho, a reclamação é

oposta: segundo o participante, havia muito a dizer e, por isso mesmo, era trabalhoso manter a linha de raciocínio. Ou seja, o efeito trade-off - ter que prestar atenção em diferentes aspectos ao mesmo tempo (gramática, vocabulário, tempo) – contribuiu para determinar o nível de dificuldade das tarefas.

Ao longo dos últimos anos, diversos pesquisadores têm voltado seus olhos para o uso do aplicativo WhatsApp como uma ferramenta a mais à aprendizagem da L2 (PORVIR, 2013; RAMPLE; CHIPUNZA, 2013; OLIVEIRA, 2014). No entanto, o uso do aplicativo especificamente para o desenvolvimento da produção oral em uma segunda língua ainda não é recorrente nas instituições educacionais. Este fato nos permite dizer que, de maneira geral, as respostas dos participantes em relação à primeira pergunta da entrevista semi- estruturada sinalizam que intervenções pedagógicas como as do nosso estudo podem ajudar aprendizes de L2 a desenvolverem confiança nas suas produções orais.

Para se tornar fluente em uma língua, tempo e prática sistemática são essenciais. Sabendo disso, e considerando as diferenças individuais dos aprendizes, a capacidade da memória de trabalho e a complexidade envolvida no desenvolvimento da produção oral, consideramos relevante analisarmos de forma mais aprofundada de que forma os participantes planejaram seus áudios em nosso estudo. Embora não tenhamos como confirmar como o planejamento realmente se deu, já que foi feito em horário extra aula, nossa segunda pergunta da entrevista – Como você planejou? – nos permite dizer que parece ter havido uma mistura de estratégias de planejamento, conforme mostra o gráfico 11.

GRÁFICO 11– Respostas à questão “Como você planejou?” da entrevista semi-estruturada

Entre os participantes entrevistados (APÊNDICE H), apenas quatro reportaram terem usado papel para planejar suas falas, elencando tópicos ou criando esquemas. Cinco disseram ter realizado o planejamento de forma oral, falando em voz alta, sozinho ou para alguém. A grande maioria afirmou ter planejado de cabeça, simulando ou respondendo às perguntas da tarefa, ou com a internet, procurando vocabulários ou recorrendo à tradução.

Segundo Izumi (2003), ao produzir os aprendizes monitoram seu output, para terem certeza que a intenção comunicativa foi realmente atingida. Com isso, conseguem traçar um paralelo entre o que sabem e não sabem expressar na L2, o que, em última instância, pode ajudar a desenvolver a consciência linguística. Diversos pesquisadores sugerem que a incorporação do planejamento de tarefas à prática pedagógica pode ajudar a chamar a atenção dos aprendizes para aspectos formais da língua (MEHNERT, 1998; ELLIS, 2009; GUARÁ-TAVARES, 2011). Em outras palavras, o planejamento pode contribuir para que o falante veja as lacunas em suas produções. Ademais, o planejamento pode auxiliar o falante a executar a tarefa, pois, através dele, recursos atencionais e cognitivos são liberados, tornando o processamento durante a tarefa mais fácil. Além disso, o planejamento também pode ajudar o

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No papel Com a internet De forma oral De cabeça

registro cognitivo a ocorrer já que, de acordo com Swain (1985), é somente quando o aprendiz tenta produzir a língua ele consegue ver onde precisa melhorar. Nesse sentido, o planejamento, em especial quando realizado de forma oral, pode ajudar o aprendiz a desenvolver o speaking, já que, ao escutar seu próprio output, o falante pode ter uma oportunidade a mais para voltar sua atenção para aspectos da língua.

Assim, em relação à segunda pergunta da entrevista, de maneira geral os dados nos permitem inferir que, mesmo ainda tendo certa dificuldade em fazer o planejamento de forma oral, o fato dos participantes terem declarado o uso de diferentes estratégias sinaliza, conforme acreditamos, que o planejamento, somado ao feedback, é o melhor caminho para o desenvolvimento da produção oral. Além disso, ao recorrerem à tecnologia (internet) para auxiliá-los nesse processo, os participantes reforçam o argumento que vem sido discutido ao longo deste estudo, de que a tecnologia pode auxiliar a aprendizagem da L2.