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Para que possamos compreender o uso das tecnologias digitais no aprendizado de uma língua, faz-se necessário, primeiro, entendermos como este processo teve início. Segundo Warschauer e Healey (1998) os computados têm sido usados para o ensino de línguas desde 1960, tendo passado por diferentes abordagens pedagógicas e por vários níveis diferentes de tecnologia. A CALL, ou Aprendizagem de Línguas Assistida pelo Computador (termo advindo do inglês Computer Assisted Language Learning) traz com ela a ideia de que a tecnologia deve representar uma ferramenta a mais à aprendizagem, e não o foco principal da sala de aula (BROWN, 2007). Essa tecnologia se refere ao modo como os aprendizes usam o computador para desenvolverem suas habilidades de compreensão e produção oral e escrita em L2.

Entre as décadas de 1960 e 1970, impulsionada pelo método audiolingual e pelas teorias behavioristas, que entendiam a aprendizagem da língua como a formação de um conjunto de hábitos, a CALL behaviorista foi bastante utilizada. De acordo com Brown (2007), o computador tinha, nessa época, o papel de tutor mecânico, já que os alunos, através de atividades de imitação e repetição, escutavam falantes nativos da língua e procuravam atingir o mesmo nível de fala.

A partir do início dos anos 80, com o questionamento pedagógico ao modelo behaviorista e, ao mesmo tempo, com a chegada do microcomputador, tivemos o início da CALL comunicativa (WARSCHAUER; HEALEY, 1998). O computador pessoal permitiu a criação de novas atividades e focou no uso da língua, ao invés de na sua forma gramatical. Assim, os alunos passaram da repetição à produção autêntica da língua, sem a pressão de ter que falar corretamente.

Nos anos 90 os educadores passaram a buscar uma forma de integrar os vários aspectos do processo de ensino e aprendizagem de línguas, já que as habilidades, até então, eram geralmente tratadas de maneira isolada. De acordo com Warschauer e Healey (1998) foi assim que a CALL integrativa surgiu, tendo o computador multimídia e a internet como bases principais.

Segundo Warschauer (2004), o século XXI trouxe novos desenvolvimentos na Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC), tais como a substituição dos computadores de mesa pelos computadores portáteis e por dispositivos online, a alteração da banda larga para a conexão ultra- rápida, a modificação da internet como uma forma de comunicação e informação exclusiva para uma forma de comunicação em massa e a substituição dos imigrantes digitais pelos nativos digitais9. Além disso, os avanços tecnológicos foram responsáveis, também, por popularizar a comunicação assíncrona.

Ao contrário da comunicação síncrona, na qual a comunicação de realiza de maneira direta, na comunicação assíncrona há um intervalo de tempo entre o envio da mensagem e o seu recebimento. Em outras palavras,

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Prensky (2001) diferencia os imigrantes digitais, pessoas que não nasceram inseridas no contexto das tecnologias digitais, dos nativos digitais, geração caracterizada pela conectividade e facilidade em lidar com a tecnologia. Segundo o autor, mais do que uma diferença nos hábitos, há uma diferença na forma de pensar e aprender desses dois grupos.

nesse segundo tipo de comunicação não existe, necessariamente, a obrigatoriedade de uma reação imediata. Considerando as tecnologias digitais, chats e webinars são exemplos clássicos de comunicação síncrona. Já no que se refere à comunicação assíncrona, temos, a título de ilustração, os e-mails, os fóruns e o WhatsApp (que pode ser usado síncrona e assincronamente). A comunicação assíncrona tem como principal vantagem a possibilidade de estabelecer um diálogo entre os participantes sem a necessidade de todos estarem conectados ao mesmo tempo, o que permite que os usuários tenham maior flexibilidade na comunicação. Ademais, ela também dá margem para o planejamento, ainda que não guiado.

Warschauer (1996) argumenta que, devido ao fato do estudante ter mais tempo para planejar do que na discussão presencial, a linguagem usada nas comunicações orais e escritas assíncronas apresentam um nível lexical e sintático mais complexo, o que tem levado muitos professores de línguas a considerar esse tipo de comunicação como uma ferramenta a mais ao ensino tradicional10, em sala de aula. Duarte (2011) advoga que a comunicação assíncrona dá ao aluno uma maior possibilidade de reflexão, o que o ajuda a construir um comentário mais consistente tanto em relação ao foco de raciocínio, quanto no que se refere à linguagem utilizada.

Suler (2004), dentre os fatores que contribuem para a desinibição online, elenca a assincronicidade como um deles. De acordo com o autor, o fato de não precisar lidar com a reação imediata da pessoa e de ter tempo para prever respostas contribui para a desenvoltura na comunicação. Ainda de acordo com o autor, a comunicação assíncrona contribui para a desinibição também pelo fato de não haver contato visual, o que faz com que a preocupação da pessoa em relação a sua fala diminua. Assim, a comunicação assíncrona proporciona um sentimento de igualdade que não só encoraja o falante a dizer o que pensa livremente, como minimiza as relações de poder que porventura existam entre as pessoas. Em outras palavras, esse tipo de comunicação, por permitir uma variedade não instantânea de troca de informações, elimina a preocupação em ter que conquistar um espaço para se expressar (permite que todos falem ao

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Educação tradicional aqui pode ser caracterizada como “educação bancária”, definida por Paulo Freire (1998) como aquela em que o professor é detentor do conhecimento e irá narrar o seu saber para os alunos, que nada sabem.

mesmo tempo), já que não precisa da presença simultânea dos interlocutores (WARSCHAUER, 1996, WARSCHAUER; HEALEY, 1998).

Como vimos, o desenvolvimento das tecnologias digitais tem aberto caminho para novas formas de comunicação e, com isso, para novos paradigmas de ensino e aprendizagem. A seguir passamos a discutir como as tecnologias digitais podem contribuir à aprendizagem, em especial no que diz respeito ao desenvolvimento das habilidades de L2.