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Análise do jogo a partir da respectiva organização táctica: a busca de padrões

Capítulo 2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1.3. Análise do jogo a partir da respectiva organização táctica: a busca de padrões

Uma das tendências actuais prende-se com o estudo do jogo a partir da dinâmica da sua organização, através da análise das acções e, sobretudo, das interacções, tácticas que se processam no decurso das relações de cooperação e oposição dos jogadores e das equipas (Garganta, 2005). Neste sentido, a atenção volta-se para as competências comportamentais de carácter individual e/ou colectivo do jogo (Caldeira, 2001).

De facto, cada vez mais se procura investigar o comportamento e o desempenho de jogadores e equipas através da respectiva dinâmica de confronto, projectando-as numa perspectiva interaccional. Pretende-se, assim, indagar sobre a detecção de padrões de jogo a partir das acções de jogo mais representativas ou críticas, com o intuito de perceber os factores que induzem perturbação ou desequilíbrio no balanço ataque/defesa. Neste sentido, procura- se detectar e interpretar a permanência e/ou ausência de traços comportamentais na variabilidade de acções de jogo (McGarry & Franks,

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1996), denominados por Castellano Paulis & Hérnandez Mendo (2002a) e Silva (2004) como padrão de conduta.

Silva (2004) refere que este conceito assenta no carácter de regularidade e de probabilidade de ocorrência de certas condutas3 relativamente a outras, pelo que deve ser assumido quando ocorre um ordenado e lógico contíguo de comportamentos que configuram padrões ou “cenários”. Por sua vez, Castellano Paulis & Hérnandez Mendo (2002a) sustentam que por padrão de

conduta se entende o conjunto de condutas que se repetem com elevada

frequência, portanto não devidas ao acaso.

A construção de modelos de explicação causal da acção motriz que provêm do fluxo do jogo vem sendo realizada através da utilização da Metodologia

observacional, através das técnicas de análise sequencial e de coordenadas

polares (Castellano Paulis, 2000). Esta metodologia é actualmente considerada como reforço dos sistemas de análise conhecidos no Futebol, proporcionando aos treinadores, jogadores e investigadores, um acréscimo de informação sobre condutas de jogo, tendo presente princípios específicos que explicam as acções táctico-técnicas e/ou táctico-estratégicas (Silva, 2004). Reúne características que permitem o estudo científico do comportamento humano em contexto natural (Anguera et al., 2000), que são válidas para os JDC, e em concreto para o Futebol (Anguera, 2004). Assim, esta opção metodológica permite o registo de condutas lúdicas em contexto natural, respeita a espontaneidade do comportamento do desportista em competição/treino, e possibilita o seguimento diacrónico ao longo de um período de tempo prolongado (Lago & Anguera, 2002).

Assim, parece ser premente a procura da compreensão do “enredo do jogo, isto é, do respectivo fluxo histórico, mais do que do comportamento pontual e avulso dos seus actores” (Garganta, 2005: 181). O mesmo autor (2005) refere

3 Neste estudo, Conduta significa todo o comportamento que um jogador realiza no seu contexto natural (jogo de Futebol), que seja perceptível e que esteja incluído no catálogo de condutas inerente ao instrumento Formato de Campo – Sistema de Categorias (Barreira, 2006).

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que a descoberta dos processos que emanam das interacções dos comportamentos, condensadas na dinâmica auto – organizacional das equipas, evidencia maior relevância para o conhecimento do fluxo conductural do jogo do que o produto per se.

Em suma, torna-se fundamental promover a detecção de padrões de conduta com maiores probabilidades de ocorrência do que as dependentes do acaso, considerando as diferentes categorias desenhadas para representar o fluxo do jogo (Castellano Paulis & Hernández Mendo, 2002a), bem como da emergência de certas condutas em função da ocorrência de outras (Hérnandez Mendo et al., 2000).

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2.2.L

ÓGICA

(

S

)

PARA UM ENTENDIMENTO DO JOGO DE

F

UTEBOL

O jogo de Futebol, visto como macrosistema (Gréhaigne, 2001), envolve subsistemas ou níveis de organização (de equipa; de confronto colectivo e de confronto individual), que originam comportamentos tácticos observáveis na dinâmica acontecimental do jogo. Trata-se de um sistema dinâmico em que as equipas operam segundo distintos padrões de acção que evidenciam uma variabilidade interindividual.

Para o entendimento deste macrosistema - jogo de Futebol -, deve procurar-se uma operacionalização com base na sua modelação4, no sentido de permitir uma análise do fenómeno que se pretende investigar sem que lhe seja retirada a ligação ao todo. Ou seja, devem utilizar-se modelos parciais que “procurem reproduzir as estruturas funcionais representativas dos factores, do nível e da dinâmica dos processos complexos passíveis de influenciar o rendimento” (Queiroz, 1983: 66), sem que lhe sejam retiradas as interacções que lhe conferem a essência, ou seja, o “sentido e sentimento” (Guilherme Oliveira, 2004: 122). É assim inevitável o surgimento de distintas concepções e modelações do jogo, que reúnem diferentes terminologias, tentando efectuar, de um modo coerente e fundamentado, a simplificação da complexidade que o jogo de Futebol comporta.

A maioria dos autores privilegia um modelo de organização dualista (Castelo, 2004). De uma forma irreversível um jogador num jogo apresenta dois comportamentos opostos consoante os elementos com que se relaciona: é solidário para com os seus colegas, e rival para com todos os elementos da equipa adversária (Lopes, 2007). Nesta relação adversa o jogo desenvolve-se segundo um quadro de luta permanente pela posse de bola, que consubstancia duas fases fundamentais do jogo: o ataque (fase ofensiva), que é determinado pela posse de bola, e a defesa (fase defensiva), que corresponde à procura da sua posse.

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Por Modelação entende-se “o processo através do qual se procura correlacionar o treino com as exigências e especificidades sugeridas pelo jogo e competição: o grau de significação de tal correlação fundamenta o processo de optimização do treino, isto é, no treino quanto maior for o grau de correspondência entre os modelos utilizados e o jogo melhores e mais eficazes serão os seus efeitos” (Queiroz, 1986: 65).

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Bayer (1994), diferencia claramente que ter posse de bola por parte de uma equipa implica atacar, e não ter a posse implica defender. A partir desta diferenciação o autor formula os princípios gerais de ataque e os princípios gerais de defesa, como mostra a Figura 2.1..

Figura 2.1. - Comportamento estratégico dos jogadores (Adaptado Bayer, 1994)

Neste sentido, da posse ou não da bola, Castellano Paulis (2000) propõe o conceito de segmentação do fluxo conductural da acção de jogo de Futebol que contempla diferentes partes (conforme figura 2.2.): (1) início da posse de bola; (2) desenvolvimento da posse de bola; (3) final da posse de bola; (4) desenvolvimento da não posse de bola; (5) final da não posse de bola.

Figura 2.2. – Diagrama da segmentação do fluxo conductural do jogo de Futebol (Adaptado

Castellano Paulis, 2000)

A minha Equipa tem a bola

A minha Equipa não tem a bola

ATAQUE DEFESA

Princípios do Ataque (1) Conservar a bola

(2) Progressão dos jogadores e da bola até à baliza

(3) Marcar golo na baliza adversária

Princípios da Defesa (1) Recuperar a bola

(2) Impedir a progressão da bola e dos jogadores até à baliza (3) Proteger baliza e campo próprio

Início da Posse de Bola

Início da Não Posse de Bola

Desenvolvimento da Posse de Bola

Desenvolvimento da Não Posse de Bola

Final da Posse de Bola

Início da Não Posse de Bola

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Como refere Silva (2004), das seis situações indicadas, quatro sobrepõem-se, já que o início de uma posse de bola implica a finalização de uma não posse de bola para a mesma equipa, assim como o final de uma posse de bola implica necessariamente o início de uma não posse de bola.

Contudo, concordamos com Castelo (1996) e com Ardá Suárez (1998) quando referem que os jogadores que não intervêm directamente na fase defensiva devem preparar mentalmente o ataque, enquanto que os que não se implicam directamente no ataque têm a obrigação de pensar defensivamente, fazendo prevalecer uma harmoniosa convergência de atitudes e comportamentos táctico-estratégicos na prestação colectiva. Assume-se que numa mesma equipa os jogadores deverão conseguir evidenciar, em todas as fases do jogo, uma permanente cumplicidade operacional por meio da produção de um jogo de atitudes e sinergias comuns (Barreira, 2006), o que só será possível através de um saber táctico colectivo, tornando a equipa mais ou menos ofensiva ou mais ou menos defensiva (Silva, 2004).

Assim, este entendimento faz convergir que a totalidade de uma fase se encontra na totalidade da outra (Castelo, 1996; Ardá Suaréz, 1998), fazendo-se o transfere para um Modelo Unitário da organização da dinâmica do jogo de Futebol, como mostra a Figura 2.3.. Este modelo, lato senso, pressupõe que os jogadores devem estar permanentemente predispostos para responder com eficiência à necessidade de defender e de atacar, devendo colaborar ao máximo em ambas as funções de acordo com a situação de jogo (quer a sua equipa possua ou não a bola) (Barreira, 2006).

Manuel Ramos 25 Figura 2.3. – Modelo Unitário da organização do jogo de Futebol (Adaptado Cervera &

Malavés, 2001)

Uma outra perspectiva pretende mapear o jogo de Futebol a partir de momentos, em detrimento de fases. Pressupõe que os jogadores, tanto individual como colectivamente, procuram atingir o objectivo do jogo através de quatro momentos (Louis Van Gaal, in Kormelink e Seeverens, 1997; Mourinho, 1999; Guilherme Oliveira, 2004; Vélasquez, 2005): (1) o momento de

organização ofensiva, considerado o conjunto de comportamentos que a

equipa assume quando adquire a posse de bola, com o objectivo de preparar e criar situações ofensivas, de forma a marcar golo; (2) o momento de transição