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O debate em torno da avaliação da educação superior no Brasil inicia-se em meados da década de 70 (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992)121 e pode-se dizer que são dois os fatores principais que o impulsionam. Em primeiro lugar, houve uma grande expansão do ensino superior nas décadas de 60 e 70 e a dominação do sistema pelo setor privado culminou na preocupação com a sua qualidade122. Em segundo lugar, com o processo de desmantelamento do Estado-providência, foi crescendo o debate em torno das funções e atribuições do Estado e, neste sentido, do papel do Estado com relação à educação. No que concerne o ensino superior, esta reavaliação do papel do Estado gerou uma série de questionamentos sobre a função e o uso dos recursos públicos nas instituições de ensino superior mantidas por ele, isto é, nas universidades públicas.

De acordo com o balanço crítico elaborado por Paul, Ribeiro e Pilatti (1992), as primeiras experiências de avaliação no Brasil começaram não na graduação, mas na pós- graduação quando a CAPES (Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), em 1977, começou a avaliar os cursos de mestrado e doutorado. Nesta mesma época surgem as primeiras preocupações com relação à “instituição de ensino superior como unidade de análise, reveladas por experiências de avaliação institucional em algumas universidades como a UNICAMP ou a Universidade Federal do Rio Grande do Norte” (Paul; Ribeiro e Pilatti, 1992, p.141). Porém, o desenvolvimento do debate sobre a avaliação só tomou um pouco mais de fôlego e foi se organizando a partir do início dos anos 80. Em meados da década de 90 a avaliação já seria vista como o pilar principal da política de educação do governo federal. (Almeida Jr., 2002).

No início da década de 80, momento em que a avaliação institucional foi se introduzindo no âmbito científico e acadêmico, os debates eram relativamente esparsos, embora, em alguns momentos, tornavam-se um pouco mais consistentes, sobretudo a partir da constituição de grupos de trabalho, sendo os mais representativos aqueles incentivados pelo

121 Schwartzman (1992) assinala, em um seminário organizado pelo Nupes em 1989, que a introdução da

temática da avaliação era também algo novo no contexto europeu e latino-americano, embora fosse já mais tradicional nos Estados Unidos. Para conhecer a análise do autor do sistema americano, francês e inglês, ver Schwartzman (1992).

122 “Há mais de duas décadas, o tema avaliação está presente nas discussões sobre a educação superior brasileira,

em função, especialmente, da expansão quantitativa que se deu, nos anos 70, de instituições, de cursos de graduação e do alunado, nessa modalidade de ensino. Era premente que medidas fossem implementadas em

próprio Ministério da Educação. Esse período é caracterizado por suas experiências isoladas, por acumular um primeiro conjunto de recomendações, terminando-se a década sem uma proposta mais estruturada ou que tenha tido continuidade a ponto de alcançar os seus objetivos. Por suas características, Almeida Jr. (2002, p.179) denomina todo o período que vai de 1983 a 1992 como de “construção da agenda”, ou seja, de “constituição da lista de problemas que chamaram a atenção do governo”. Veja-se como o autor resume as principais atividades do primeiro momento do debate da avaliação no Brasil:

Discussões nas universidades, associações científicas e sindicais123 da comunidade científica e MEC; primeiras experiências com a avaliação; criação em 1983-85 do PARU (Programa de Avaliação da Reforma Universitária), proposto pelo Conselho Federal de Educação (CFE) juntamente com o apoio da CAPES e BNDES124); amplo diagnóstico da educação superior brasileira; 1986 criação do GERES (Grupo Executivo da reforma do ensino superior, Governo Sarney) estabelecendo nova política para a educação superior brasileira; surgimento da avaliação como mecanismo estruturado para fins de controle e hierarquização, não chegando a ser implementado por resistência da comunidade universitária; 1986 – 1992, experiências com a avaliação no país: 1986 (UnB), início de processo global de avaliação, 1988 (UFMG), avaliação das atividades de produção da investigação, 1988 (USP), lista dos improdutivos, 1991-1993 (UNICAMP), avaliação institucional completa e sistemática (2002, p.179-180).

Numa síntese de algumas das iniciativas do governo na avaliação do ensino superior, tem-se um primeiro movimento mais representativo no ano de 1983. De acordo com Paul, Ribeiro e Pilatti (1992, p.142), o Conselho Federal de Educação organizou um seminário sobre avaliação que, na seqüência, motivou a CAPES a iniciar o PARU (Programa de Avaliação da Reforma Universitária), realizado entre 1983-1986. Segundo os autores, esse programa buscava identificar “subsídios concretos e pertinentes tendo em vista a formulação de diferentes alternativas para a melhoria do ensino superior brasileiro” (PARU - relação à qualidade, diante da situação que se colocava, acentuada pela demanda social por maior oferta de ensino superior” (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002).

123 Ristoff (1996, p.47) comenta que o movimento docente tem discutido a problemática da avaliação

institucional nas universidades brasileiras pelo menos “desde 1982, quando a bandeira da avaliação foi desfraldada pela Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior (ANDES) [nota da autora]”.

124 O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é uma empresa pública federal

vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior que tem como objetivo financiar a longo prazo os empreendimentos relacionados ao desenvolvimento do país (Disponível em http://www.bndes.org.br, acesso em 25/02/2004) [nota da autora].

Detalhamento do Programa apud Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992, p.142). Dentro da concepção do programa, o objetivo era que isso fosse feito a partir do conhecimento das reais condições nas quais se realizavam as atividades de produção e disseminação do conhecimento no sistema de educação superior (Exame Nacional de Cursos de 2002 - Relatório Síntese, 2002). Apesar de o PARU ter sido a primeira tentativa do governo de avaliar o sistema de instituições de ensino superior de uma maneira mais ampla e sistemática, ao seu final, mesmo conseguindo desenvolver uma metodologia para avaliação, o programa acabou não tendo continuidade e nem alcançando os seus objetivos125. A sua contribuição se deu mais no sentido de alimentar o início das discussões sobre a avaliação no Brasil e por ter dado origem a vários estudos acadêmicos sobre o tema. (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002).

A iniciativa seguinte, por parte do Ministério da Educação, teve um valor simbólico maior no campo da educação e deu-se em 1985 com a criação da Comissão Nacional de Reformulação da Educação Superior126. Esta Comissão divulgou as suas recomendações em um relatório denominado “Uma Nova Política para a Educação Superior Brasileira” no qual apontou para a necessidade de desenvolvimento de sistemas de avaliação do ensino superior no país, necessidade esta que seria, na sua argumentação, 1) da administração federal para a distribuição racional de seus recursos; 2) das universidades públicas, que necessitam conhecer a si próprias e confrontar com dados objetivos as críticas que freqüentemente recebem; 3) das instituições privadas de ensino superior, que necessitam evidenciar a qualidade de seu desempenho e a sua eficiência no uso de recursos; 4) dos estudantes e suas famílias, que não podem mais contar com resultados positivos de seus

125 O PARU trabalhou com uma amostra de instituições e pretendeu uma avaliação que envolvia o sis tema de

educação superior como um todo, incluindo as universidades e instituições isoladas, públicas e privadas. Considerava um conjunto de fatores incluindo eficiência externa do sistema (necessidades e aspirações da sociedade) e a eficiência interna (objetivos relativos à produção e transmissão do conhecimento e à organização e ao desempenho do sistema envolvendo gestão, administração acadêmica, administração financeira e de pessoal). O PARU desenvolveu estudos sobre a realidade de diferentes IES (contou com a participação de 33 instituições) levando em conta a implementação das propostas da Reforma Universitária de 68, assim como peculiaridades regionais e institucionais (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002).

126 Segundo Durham e Schwartzman (1992, p.9) este foi um dos marcos da criação da avaliação visto que foi

tema do discurso de posse de Tancredo Neves, em 1985, com a proposição da “instituição da autonomia plena das universidades brasileiras, acompanhada de um sistema permanente de avaliação e acompanhamento de seu desempenho”. Sampaio analisa este momento como um marco do resgate do papel modelador do Estado (papel exercido quando este disciplina modelos e formatos para dar organicidade ao setor educacional) como resultado da confluência de diversos fatores: “pressão dos diferentes grupos de interesse do sistema, o próprio esgotamento do modelo que o normatiza e as próprias razões do Estado em redefinir suas atribuições em relação à Educação em todos os níveis”(2000, p.123). Para a autora, o resgate da ênfase no papel modelador do Estado está ligado a questões mais amplas que envolvem a redução dos gastos do Estado, a redefinição das áreas prioritárias (e a prioridade à educação fundamental), inadequação do modelo de universidade de pesquisa como direcionador do sistema superior no país, a necessidade de reavaliar questões como financiamento, eqüidade e qualidade do sistema, papéis do Estado e do mercado no desenvolvimento do ensino superior no país, e outros temas afins (Sampaio, 2000, p. 123).

investimentos em educação superior, se mal direcionados (MEC apud ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002).

O relatório acima diagnosticava, ainda, a ausência de parâmetros de avaliação como um dos problemas no sistema brasileiro (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992) e mencionava que o sistema de avaliação deveria não somente atender aos requisitos técnicos mas, também, ser legitimado por parte significativa do sistema de ensino superior e da sociedade, devendo para tanto ser composto de uma auto-avaliação, avaliação governamental, avaliação das entidades científicas e profissionais e avaliações independentes (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002). Apesar do investimento, no entanto, a concepção de avaliação da Comissão Nacional de Reformulação da Educação Superior foi profundamente questionada e criticada por grande parte da comunidade acadêmica tanto em termos políticos quanto teóricos (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002), além de ter sido considerada pelo Ministério da Educação como um “projeto inacabado”, restrito a “um conjunto de proposições”, para as quais seria preciso adicionar as recomendações de um novo grupo criado para a “convocação da comunidade ao debate” (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992, p.142). Afirmam Durham e Schwartzman (1992, p.9) que, apesar de as propostas dessa Comissão não terem sido incorporadas pelo governo como suas, foi a partir dela que “o tema avaliação entrou para a ordem do dia e passou a ser objeto de um grande número de conferências, seminários e reuniões, algumas organizadas pelo Ministério da Educação, outras pelo Conselho de Reitores [CRUB], e muitas mais pelas universidades em toda a parte”.

Com o objetivo de dar continuidade aos trabalhos daquela Comissão, foi criado, em fevereiro de 1986, no interior do MEC, o Grupo Executivo da Reforma da Educação Superior (GERES)127. A idéia desse Grupo era a de que se criasse um sistema de avaliação da graduação que supostamente deveria ser elaborado com a participação da comunidade acadêmica e ter credibilidade e transparência quanto à metodologia e aos resultados obtidos, estimulando a melhoria da graduação, sem qualquer tipo de punição ou premiação (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002). O GERES também publicou um relatório que surgiu em uma reunião do CRUB (Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras)128, com um capítulo sobre “Autonomia e Avaliação” (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992, p.142). A proposta do GERES também foi questionada no meio acadêmico - pelas associações representativas dos segmentos das universidades e pela comunidade científica - por causa do significado que a avaliação

127 Com o falecimento de Tancredo Neves, assumiu a presidência o seu vice, José Sarney (governou de 15 de

teria em termos políticos relacionados, sobretudo, à autonomia da universidade e aos interesses do mercado. (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992; ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002). Conforme explicam Paul, Ribeiro e Pilatti (1992, p.143) a polêmica em torno da proposta foi tamanha que “parece ter funcionado como um freio à discussão mais específica da problemátic a da avaliação”.

Percebe-se, pois, que, desde os seus primórdios, a avaliação da educação superior no Brasil foi vítima de resistências justamente pela complexidade das questões que acabou suscitando. Trocando em miúdos, foi ficando cada vez mais explícito o fato de que a avaliação era um instrumento político, portanto não neutro, e que a definição da sua forma, de seus princípios e critérios toca diretamente o cotidiano e o futuro das instituições e do desenvolvimento da educação superior no Brasil. Ainda, a definição de “como” e “o que” se avaliar trazia e traz implícitas outras questões: “que valores são importantes para a educação no Brasil?” “Quem faz a avaliação?” “Quais os seus parâmetros?” “Como identificar (ou “medir”) tais parâmetros?” “Quais as conseqüências da avaliação (para o que ela é usada)?” “Qual o papel da instituição de ensino superior perante a sociedade?” “Qual o papel do Estado com a educação superior?” “Quem deve avaliar a qualidade das instituições?”

O que se observa é que, com o desenvolvimento do debate e a conseqüente explicitação de posições de agentes do campo da educação superior a respeito dessas e de outras questões relacionadas tanto à avaliação quanto à educação superior como um todo, as diferenças ideológicas foram se tornando cada vez mais nítidas. Ou seja, o aspecto político foi se sobressaindo e foi ficando cada vez mais visível que as definições sobre a avaliação da educação superior envolviam concepções de mundo e de educação normalmente conflitantes. Da mesma forma, na medida em que ela, a avaliação, começou a ser mais diretamente associada ao processo de reestruturação do Estado, a questões de distribuição de recursos, enxugamento da máquina pública, entre outros, a desconfiança, a resistência e os embates foram ainda maiores no meio acadêmico.

Entre o GERES e a iniciativa seguinte do Ministério da Educação houve um intervalo de um ano, interrompido com a realização, em Brasília, do Encontro Internacional sobre Avaliação do Ensino Superior, quando a SESu (Secretaria de Educação Superior) assume para si a responsabilidade de “coordenar uma programação de estudos sobre a temática da avaliação” (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992, p.143). Assim, a partir de 1987, a SESu atuou na mobilização dos setores vinculados ao ensino superior para discutir a necessidade da

128 Houve uma reunião anual do CRUB em 1986 sobre “a questão da avaliação de desempenho como um

avaliação institucional e sua legitimidade. Suas iniciativas foram no sentido de criar espaços políticos e institucionais, por meio de apoio e promoção de reuniões técnicas, encontros, seminários, simpósios, mesas-redondas e debates, que se estenderam aproximadamente até 1989. (Paul, Ribeiro e Pilatti, 1992; ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002). Previa-se, graças ao apoio técnico e financeiro no desenvolvimento de metodologias e na validação de parâmetros de qualidade e de desempenho em projetos e atividades de avaliação (ENC 2002 – Relatório Síntese, 2002), o desenvolvimento do conhecimento técnico no campo da avaliação, à época ainda restrito. De um modo geral, as iniciativas da SESu foram bastante eficientes na disseminação do debate sobre a avaliação mas, assim como o PARU, de pouca eficácia na proposição de políticas e diretrizes que resultassem na consolidação de processos de avaliação consistentes, seja em nível do Ministério, seja em nível das IES.

Como se vê, o debate em torno da Avaliação no Brasil atravessou os primeiros anos da década de 80 em passos lentos, avanços e retrocessos, com algumas experiências individuais que marcam o início de um processo mas ainda tímido e com um grande caminho a percorrer (Durha m e Schwartzman, 1992), acompanhado de uma resistência com relação ao tema devido à associação das mudanças que um processo de avaliação da educação superior poderia trazer para o campo educacional.

Neste período, começam a ganhar força, paralelamente, algumas experiências isoladas de avaliação, como as da Universidade de Brasília em 1986, da Universidade Federal de Minas Gerais e a da Universidade de São Paulo (USP) em 1988. (Almeida Jr., 2002).

A experiência da USP foi certamente a que ficou mais conhecida e teve um impacto efetivo no atraso do desenvolvimento da avaliação na educação superior no país. Aconteceu o seguinte: os resultados de um processo de avaliação da USP foram amplamente divulgados na mídia sob o título “Lista de improdutivos da USP”. Tratava-se de uma lista de professores que não tinham tido nenhuma publicação durante o período avaliado (aproximadamente dois anos). O fato é que a publicação da lista no jornal Folha de São Paulo (em 21 de fevereiro de 1988) contendo informações sobre a produção docente dessa instituição – a partir de dados supostamente disponibilizados pelo então reitor José Goldemberg, gerou polêmica durante muito tempo nos meios acadêmicos129. A partir desse episódio “a avaliação passou a ser associada à execração pública e tornou-se por algum tempo um tabu, um assunto politicamente, pelo menos, proibido” (Ristoff, 1996, p.47). Assim, o caso que ficou conhecido como a “lista de improdutivos do Goldemberg”, lembrada por

129 José Golbemberg foi posteriormente Ministro da Educação (de 2 de agosto de 1991 a 4 de agosto de 1992)

alguns até hoje130, teve como uma das suas conseqüências “a de retardar a aceitação da avaliação institucional nas universidades brasileiras” (Ristoff, 1996, p.50).

Entre parênteses, lembre-se que o início do debate sobre a avaliação acontece em meio à transição e a reconstrução da democracia no país, após a queda do regime autoritário, em 1985 e, também, em meio ao debate sobre a nova constituição brasileira. Assim, no final de 1988, as novidades trazidas com a promulgação da nova Constituição (em 5 de outubro de 1988)131, influenciaram em muito o debate sobre avaliação na educação superior. Como se analisou no Capítulo 1, a partir da década de 70, começou-se a ter um forte questionamento e um progressivo desmonte do Estado-providência. Neste período, conforme mencionado, as elites empresariais brasileiras começaram a fazer uma conversão na busca de apoio de outros parceiros que não mais o Estado nacional mas, entretanto, no jogo de forças na Assembléia Constituinte no fim da década de 80, não conseguiram sair totalmente vitoriosos. Ao contrário, conforme comentou Sallum Jr. (1999), com as resistências dos assalariados organizados e do pessoal do Estado, com o movimento em defesa do “nacional” e do “estatal”, obteve-se em 1988 a aprovação de uma Constituição que não legitimou fortemente os interesses dessa elite e que deu sobrevida à Era Vargas e ao modelo nacional- desenvolvimentista, ou seja, do Estado-providência.

As mudanças nas normas relativas à Educação, de certo modo, seguiram essa mesma tendência. A Constituição de 1988 tocava em pontos como a autonomia das universidades, o regime contratual de funcionários, o financiamento, a garantia do padrão de qualidade no ensino ministrado no país, trazendo a novidade de que a avaliação da qualidade

do setor privado torna-se responsabilidade do Poder Público. Além disso, ela também,

complementada pelo debate em torno dos projetos da nova LDB, incorporava o princípio da avaliação “como instrumento básico de soerguimento do sistema de ensino superior do país” (Durham e Schwartzman, 1992), de modo que a sua influencia foi direta no debate sobre a avaliação. Vejam-se em seguida, sucintamente, algumas das normas da nova Constituição.

No que se refere à educação superior, as novas regras se encontram no “Capítulo III – Da Educação, da Cultura e do Desporto; Seção I - Da Educação”– Constituição 1988. A Seção começa com o Art 205 que promulga, dando a diretriz geral, que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da

130 O episódio foi mencionado em várias das nossas entrevistas com os agentes que à época estavam envolvidos

sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”132. O Art.206 traz algumas novidades: primeiro, a confirmação do direito, no inciso IV, à “gratuidade do ensino público e em estabelecimentos oficiais”133, em seguida, assegura-se, no inciso V, a “valorização dos profissionais do ensino, garantido, na forma da lei, plano de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, assegurado regime jurídico único para todas as instituições mantidas pela União”134. Este inciso foi visto como uma vitória pelos professores e servidores técnico-administrativos das instituições federais que passaram a ser contratados pelo Regime Jurídico Único e a terem os mesmos direitos dos demais funcionários da União.

Outra mudança para o sistema de educação superior veio com o Art. 207: “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”135. Foi mantido para o setor privado, acompanhando as Constituições anteriores, no Art. 209 o direito de atuar como estabelecimentos de ensino136. No mesmo artigo, entretanto, uma novidade: a responsabilização do Estado pela avaliação da qualidade do setor privado, como se pode observar no Art. 209 : “O ensino é livre à iniciativa privada atendidas as seguintes condições: I – cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público”. Ou seja, a partir da Constituição de

131 Momento em que também já tramitavam no Congresso Nacional os diferentes projetos de Lei de Diretrizes e

Bases.

132 Carvalho (2001) analisa as implicações deste artigo na ênfase dada, na educação superior, à qualificação para

o trabalho. Sua argumentação é calcada na análise das provas aplicadas no Exame Nacional de Cursos, o