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A versão oficial e os três principais efeitos: crescimento, melhoria e competitividade

EXAME NACIONAL DE CURSOS – ENC

5. EFEITOS DA AVALIAÇÃO SOBRE O SISTEMA AO FIM DO GOVERNO FHC.

5.1. A versão oficial e os três principais efeitos: crescimento, melhoria e competitividade

Conforme abordado no Capítulo 2, a expansão do sistema de ensino superior brasileiro era uma das metas principais do governo FHC para o setor. Era tida como premente e justificada diante do valor estratégico que se dava à educação no governo – visto que somente o avanço na educação possibilitaria a inclusão do país na economia globalizada em condições mais competitivas e adaptadas aos valores da chamada sociedade de conhecimento

– diante também da necessidade de democratização do acesso à educação superior – os indicadores de inclusão do país eram muito modestos mesmo quando comparados à maior parte dos países da América Latina (Souza, 2003 b). Assim, a prioridade era expandir e defendia-se que isto seria possível sem detrimento da qualidade, que seria controlada pelo sistema de avaliação. Como se pode observar nas palavras do ex-Coordenador da Implantação do Provão, Jocimar Archangelo:

O programa já dizia que para o ensino superior nós tínhamos duas metas: aumentar a quantidade e a qualidade. A quantidade por quê? Porque, como você sabe, o percentual de alunos no ensino superior brasileiro é vergonhosamente inferior a todos os outros países da América Latina para não falar do resto. Então, por que é importante ter um ensino superior que ampliado? Porque para qualquer projeto de desenvolvimento de um país principalmente quando se fala agora na sociedade do conhecimento, é preciso ter uma mão-de-obra qualificada (...). É preciso qualificar a população para poder enfrentar os desafios que aí estão. Então, primeiro nós precisaríamos aumentar a quantidade e garantir a qualidade. Como garantir a qualidade? (...). Nós entendemos que o caminho era a avaliação. Ela deveria ser um instrumento de melhoria de qualidade208.

A meta, ao menos na avaliação dos representantes do governo FHC no Ministério da Educação, foi alcançada. Apesar de admitir que o sistema de ensino superior brasileiro ainda apresente diferenças de qualidade, não há dúvidas de que, conforme o ex-ministro Paulo Renato Souza, “hoje o sistema de ensino superior é maior, melhor e mais competitivo do que era! Muito maior, muito melhor e muito mais competitivo!”: 209

Estamos no caminho certo: as informações produzidas pelas avaliações realizadas desde 1996 mostram um cenário cada vez mais positivo. A cada ano os resultados da avaliação demonstram melhoria

na média geral do sistema e a confirmam como importante indutora da melhoria da qualidade do ensino superior brasileiro. Após seis

anos o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior está consolidado como instrumento fundamental de aferição de qualidade de ensino (Avaliação e Informação como instrumento de política publica, 2002, p.18, grifo nosso).

208 Entrevista em 01 de outubro de 2003.

209 Conforme avaliou o ex-Ministro Paulo Renato Souza em entrevista em 06 de janeiro de 2004, “o sistema

melhorou, todas [as instituições] melhoraram. Hoje o sistema de ensino superior é maior, melhor e mais competitivo do que era! Muito maior, muito melhor e muito mais competitivo!”. Ver também Souza (2003 b) e Ensino Superior: maior e melhor (2002).

ou ainda,

No ensino superior temos um sistema maior e melhor por qualquer

indicador que se utilize, desde a qualificação do seu corpo docente até

as bibliotecas e laboratórios, o que é constatado pelas avaliações do Ministério e pela opinião dos alunos. (...) Em suma, nosso sistema

educacional não só deu conta de ampliar as oportunidades educacionais, como também melhorou muito em relação à qualidade da educação em todos os níveis. É completamente infundada, portanto, a crítica dos que afirmam que este avanço na expansão dos sistemas de ensino teria ocorrido em detrimento da qualidade. Isto

não quer dizer que a qualidade do sistema educacional não apresente ainda sérios problemas. Significa, apenas, que esses problemas são

hoje menores do que eram, apesar da enorme expansão quantitativa que ocorreu, o que não é pouco. (No caminho da qualidade na

Educação, 2002, p.3, grifo nosso)

A partir da sua perspectiva, como visto, e apesar das críticas externas, o governo demonstra estar confiante de que a expansão não se deu em detrimento da qualidade, esta foi garantida pelo sistema de avaliação que, por sua vez, induziu a melhoria na qualidade dos cursos de graduação no Brasil. Aliás, não só propiciou a melhoria da qualidade, mas o teria feito em um sistema de ensino superior que se expandiu e se tornou mais competitivo. Estas características – crescimento com qualidade e competitividade – estão na base da argumentação do governo a respeito das conquistas que defende ter alcançado na educação superior brasileira a partir da implementação do sistema de avaliação. Observem-se, detalhadamente, esses argumentos.

5.1.1. Indicadores de crescimento físico do ensino superior

Logo no início do segundo mandato, Paulo Renato Souza (1999 c) fazia um balanço das conquistas em relação à expansão do sistema de ensino superior após implementadas as medidas no primeiro mandato do governo FHC defendendo o “acerto da nossa política de avaliação e expansão do sistema”. Como escreveu em artigo na Folha de

o Brasil está superando a época de abrir curso só para dar diploma. A sociedade exige qualidade. Quem se acomodou vem sendo ultrapassado por quem levou a sério a avaliação/expansão. Os resultados respondem àqueles que combatem a expansão de cursos, alegando que por causa dela a qualidade da graduação estaria caindo. Como se vê, não é verdade. As explicações são evidentes. O que aconteceria se novas faculdades deixassem de ser autorizadas? Ora, justamente aquilo que se quer evitar, ou seja, a qualidade da graduação tenderia no mínimo a estagnar, como em qualquer reserva de mercado. Inequivocamente, expandir a oferta e avaliá-la ajuda a melhorar a qualidade do ensino.

Para Souza, além de a expansão ser necessária pelos motivos citados anteriormente, a quebra dos cartéis, das reservas territoriais de mercado e dos cartórios “com poder de emitir diplomas de ensino superior, por prazo ilimitado e sem avaliação de qualidade” (Souza 2001a), legados do período anterior, inequivocamente ajudariam a melhorar a qualidade. Assim, observa-se a defesa da relação direta de que a “quantidade propicia melhor qualidade”210 pelo aumento da competitividade, como disse Souza (1999 c): “a expansão impulsiona a qualidade para cima”. Assim, o sistema de avaliação garantiria a qualidade de modo que a expansão do ensino superior durante o governo FHC teria características diferentes dos anteriores períodos de expansão. Segundo Souza, já contabilizando a efetividade das suas medidas em 2001:

A expansão do ensino superior, de 1980 a 94, tinha sido limitada e de qualidade questionável: crescimento de 20% das matrículas; redução de 3,5% no número de instituições de ensino superior; e 26% de crescimento no número de cursos - 70% em universidades que não dependiam de autorização prévia. O desafio [no início do governo FHC] era garantir a expansão e a diversificação do sistema com qualidade. O conjunto de medidas que está sendo implantado agora é uma continuidade das mudanças iniciadas em 1995. (...) O sistema de ensino superior, apesar dos avanços, ainda apresenta importantes diferenças de qualidade. Sabemos, contudo, que estamos no caminho certo: as informações produzidas pelas avaliações realizadas desde 1996 mostram um cenário mais positivo. Subordinadas ao atendimento a padrões de qualidade, verificou-se, de 1994 a 1999, um crescimento de 23% no número dessas instituições de ensino superior, uma expansão de 43% nas matrículas e de 130% do número de doutores formados, qualificando o corpo docente com 63% a mais de doutores nas salas. E 44% dos cursos criados a partir de 1996 receberam conceitos A e B no Provão, com registros de um

movimento de interiorização e de correção dos desequilíbrios regionais. (Souza, 2001 a)

Tendo em vista a defesa da estratégia da “quantidade com qualidade”, se olharmos os dados ao longo dos dois governo FHC, de 1995 a 2002, o sistema de fato cresceu expressivamente em todos os indicadores, principalmente após 1998: número de instituições, cursos, matrículas e docentes. No último censo, feito no ano de 2002, participaram 1.637 instituições211 (Censo da Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003). Esse número demonstra a forte tendência de crescimento pela qual o setor vem passando depois da estagnação de alguns anos: passou-se, entre 1995 e 2002, respectivamente, de 894 instituições de ensino superior para 1.637 (crescimento de 28%); de 6.252 para 14.399 cursos (crescimento de 130,31%) e, ainda, de 1.759.703 para 3.479.913 matrículas (crescimento de 97,76%), como se pode observar nas tabelas abaixo.

Tabela 7: Número de Instituições de Educação Superior, Número de Cursos de Graduação e Matrícula (em 30/06) por Organização Acadêmica e Categoria Administrativa, segundo a Unidade da Federação - 1995-2002

Total Federal Estadual Municipal Particular Total Federal Estadual Municipal Particular Total Federal Estadual Municipal Particular

1995 894 57 76 77 684 6.252 1.536 876 370 3.470 1.759.703 367.531 239.215 93.794 1.059.163 1996 922 57 74 80 711 6.644 1.581 964 433 3.666 1.868.529 388.987 243.101 103.339 1.133.102 1997 900 56 74 81 689 6.132 1.316 939 443 3.434 1.945.615 395.833 253.678 109.671 1.186.433 1998 973 57 74 78 764 6.950 1.338 1.125 507 3.980 2.125.958 408.640 274.934 121.155 1.321.229 1999 1.097 60 72 60 905 8.878 1.721 1.447 326 5.384 2.369.945 442.562 302.380 87.080 1.537.923 2000 1.180 61 61 54 1.004 10.585 1.996 1.755 270 6.564 2.694.245 482.750 332.104 72.172 1.807.219 2001 1.391 67 63 53 1.208 12.155 2.115 1.987 299 7.754 3.030.754 502.960 357.015 79.250 2.091.529 2002 1.637 73 65 57 1.442 14.399 2.316 2.556 380 9.147 3.479.913 531.634 415.569 104.452 2.428.258

Número de Instituições Número de Cursos Matrículas em 30/04

Ano

Fonte: Elaborado a partir de dados do MEC/INEP/DAES

Tabela 8: Taxa de crescimento do número de Instituições de Educação Superior, Número de Cursos de Graduação e Matrícula (em 30/06) por Organização Acadêmica e Categoria Administrativa, segundo a Unidade da Federação - 1995-2002

Total Federal Estadual Municipal Particular Total Federal Estadual Municipal Particular Total Federal Estadual Municipal Particular

83,11% 28,07% -14,47% -25,97% 110,82% 130,31% 50,78% 191,78% 2,70% 163,60% 97,76% 44,65% 73,72% 11,36% 129,26%

Número de Instituições Número de Cursos Matrículas em 30/04

Fonte: Elaborado a partir de dados da tabela acima (MEC/INEP/DAES).

211 Ao publicarem os dados no Censo da Educação Superior – Resumo Técnico 2002 (2003), em setembro de

2003, na própria apresentação do relatório já se atualiza o número nesta data: aproximadamente 2000 instituições.

Analisando-se o período em questão, observa-se que o crescimento generalizado tem, contudo, características especiais. Por exemplo, com relação ao número de instituições de ensino superior, apesar do crescimento geral de 83,11% – ou seja, em 2002 tinha-se quase o dobro de instituições no sistema do que se tinha em 1995, passando de 894 para 1.637 – o que se pode perceber é um grande viés de crescimento através do setor privado. Enquanto o número de instituições federais cresceu 28% no período, acompanhado de uma redução no número de instituições estaduais (-14,47%) e municipais (-25,97%), o setor privado mais do que duplicou em número de instituições (crescimento de 110,82%), sendo responsável, já em 2002, por 88,1% dos estabelecimentos de ensino superior no país contra 11,9% de instituições no setor público. Tal número demonstra claramente a forte tendência da expansão do ensino superior no período pelo setor privado. Uma outra forma de olhar esse dado e que talvez dê ainda maior realce à realidade do 3º grau no país é que: praticamente 9 em cada 10 instituições superiores brasileiras são privadas (Abdala, 2004).

O expressivo crescimento no número de cursos, também mais forte no setor privado, demonstra a diversificação do sistema e a oferta de um maior número de opções de carreiras. Com relação ao número total de cursos, que cresceu 2,3 vezes, novamente sobressai o crescimento do setor privado: 163,6%. Chama a atenção, com relação ao crescimento do número total de cursos, o aumento ocorrido principalmente de 1998 em diante: de 6.950 para 14.399 cursos, ou seja, 7.449 novos cursos em 5 anos, o que dá uma média de 1.490 cursos ao ano, 124 cursos ao mês, 4 cursos por dia (Censo de Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003). Em 2002, terminou-se o governo com 14.399 cursos, com 2.244 a mais que o ano anterior, o que dá uma média ainda maior que os anos anteriores: 187 novos cursos ao mês e 6 cursos ao dia. Com isso, nota-se que, além do crescimento do número de IES, cresce paralelamente o número de cursos dentro delas (a relação cursos por IES variou de 7,1 em 1998 para 8,8 em 2002 de acordo com Censo da Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003). O aumento de cursos, como dito, foi maior no setor privado (dos 7.499 novos cursos, 5.167 - 68,9% - foram no setor privado), o que demonstra a busca deste setor por um maior leque de oferta de cursos como um diferencial de competitividade.

Ainda entre 1995 e 2002, com relação ao número de matrículas, o crescimento foi geral. Os números totais também dobraram em todo o período (crescimento de 97,8%). Nas instituições federais, mesmo apesar de toda a crise durante todo o governo FHC – que pode ser ilustrado pelas greves e pelo constante insucesso nas negociações entre universidades

federais e Ministério da Educação212, houve um crescimento de 44,65% no número de matrículas, que foi acompanhado pelo crescimento das matrículas nas instituições estaduais de 73,72%. Entretanto, o crescimento de matrículas no setor privado foi o que dominou, ao passar de 1.059.163 para 2.428.258 matrículas, um crescimento de 129,26%, atendendo em 2002 quase 70% do alunado. Ou seja, em torno de 7 ou cada 10 alunos do ensino superior estão no setor privado. Do mesmo modo que aconteceu com o número de cursos, o período de maior crescimento total das matrículas se deu nos últimos 5 anos (crescimento de 63,7% - média de 13% ano), sendo o crescimento no setor privado o maior com 83,8% (média anual 16,7%). Apesar do destaque de todo o período, certamente o último ano foi o período em que o crescimento do setor privado chamou mais a atenção: de 2001 a 2002, as IES privadas ganharam mais 450.000 matrículas. Em 2002, dos 466.260 alunos que se formaram em IES no Brasil, 67,6% destes, ou seja, 315.159, concluíram o seu curso em IES privadas (compatível com o 69,7% participação do setor em número de matrículas)213.

Veja-se o resumo na tabela abaixo:

Tabela 9: Número e percentual de instituições, cursos e matrículas em 1995, 1998 (1º governo FHC), 1999 e 2002 (2º governo FHC).

Número de Instituições Números de Cursos Matrículas

Ano Total Públicas Privadas Total Públicas Privadas Total Públicas Privadas 1995 894 (100%) 210 (23,5%) 684 (76,5%) 6.252 (100%) 2.782 (44,5%) 3.470 (55,5%) 1.759.703 (100%) 700.540 (39,8%) 1.059.163 (60,2%) 1998 973 (100%) 209 (21,5%) 764 (78,5%) 6.950 (100%) 2.970 (42,7%) 3.980 (57,3%) 2.125.958 (100%) 804.729 (37,9%) 1.321.229 (62,1%) 1999 1.097 (100%) 192 (17,5%) 905 (82,5%) 8.878 (100%) 3.494 (39,4%) 5.384 (60,6%) 2.369.945 (100%) 832.022 (35,1%) 1.537.923 (64,9%) 2002 1.637 (100%) 195 (11,9%) 1.442 (88,1%) 14.399 (100%) 5.252 (36,5%) 9.147 (63,5%) 3.479.913 (100%) 1.051.655 (30,3%) 2.428.258 (69,7%) Fonte: Elaboração nossa a partir de dados do MEC/INEP/DAES (Censo da Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003).

212 Conforme mencionou Archangelo “(...) as escolas públicas (...) estavam e continuam em uma crise muito

séria. (...).O Paulo Renato não conseguiu entrar em acordo com as instituições federais , não conseguiu que as federais aceitassem ser autônomas”.(entrevista em 09 de outubro de 2003).

213 Calcula -se que, caso se mantivesse esta tendência, em 2007 haveria cerca de 6,4 milhões de alunos em IES no

país. De fato, cumprindo-se o PNE que estabeleceu como meta atender 30% da população de 18 a 24 anos na educação superior até 2010, se deveria ter, neste ano, cerca de 9 milhões de estudantes nessa faixa etária. Hoje são 9% (2.100.000) (ENC 2003 – Resumo Técnico, 2003). Além dessas informações, esse relatório chama a atenção para a população de estudantes que freqüenta as IES atualmente. Apenas cerca de 60% dos universitários correspondem a faixa etária de 18 a 24 anos hoje, sendo significativo o número de alunos com mais de 24 anos (hoje 21,9% com mais de 30 anos e 6,4% mais de 40 anos), resultado do atraso da

Outra variável que demonstra o crescimento do setor é o crescimento do número de docentes: de 145.290 docentes nas IES brasileiras (52,5 % nas públicas e 47,5 % nas privadas) em 1995 para 227.844 docentes (36,9% nas públicas e 63,1 % nas privadas) em 2002.

A expansão no período, como se pode observar nos dados demonstrados, deu–se predominantemente pelo setor privado. E nesse sentido, também apresentou uma série de desvantagens, que serão analisadas mais a frente. Entretanto do ponto de vista do ex-ministro isso não deveria ser um motivo para se frear a expansão o setor privado:

Ao promover a expansão do ensino superior, tentamos não aprofundar duas distorções do sistema: a localização maciça de instituições e cursos no Sul e no Sudeste e, ali, a concentração da matrícula em seis cursos, direito, medicina e administração entre eles. Não tem sido tarefa fácil, em decorrência das limitações orçamentárias à expansão na esfera pública, onde tentaremos ampliar e diversificar a oferta por meio do projeto de autonomia universitária que em breve seguirá ao Congresso214. No geral, porém, o quadro faz com que dependamos da iniciativa privada, o que impõe outra dificuldade: ela só se fixa onde o

poder de compra é maior, orientando-se por essa lógica também na hora de oferecer a formação, o que explica sua concentração nas regiões metropolitanas e a oferta de poucos cursos com maior procura. A análise isenta do tema torna claro [entretanto] que não

seria benéfica ao sistema a proibição à abertura de novos cursos, desde que mantenham qualidade.(Souza, 1999 c).

E essa qualidade, como se analisa na seqüência, era justificada pelo governo através do Provão e do sistema de avaliação implementado.

5.1.2. Versões sobre o incremento da competitividade e melhorias alcançadas: a qualidade

Segundo a equipe do governo FHC, o sistema criado com base na trilogia avaliação, informação e comunicação, do qual o Provão seria o “abre-alas” (conforme demonstrado no capítulo quatro) foi bem sucedido na realização do seu objetivo de propiciar que a expansão do sistema de ensino superior se desse de modo a torná-lo mais competitivo democratização do ensino superior no Brasil. (Censo da Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003, p.4).

pela qualidade. Como diz Souza, “mais importante: tornamos todas as informações atualizadas e transparentes para a sociedade. Permitimos a expansão do sistema a fim de promover a competição sadia entre as instituições de ensino. Busca de qualidade e eficiência são, hoje, as forças que movem esse processo”. (Souza 2003, b).

A defesa que a equipe do governo FHC faz com relação à melhoria da qualidade tem alguns pontos centrais que são defendidos principalmente com base nos conceitos do Provão, nas opiniões de alunos que fizeram o Exame e, ainda, com base em dados da avaliação das condições de ensino (ACE).

quando há indicadores de qualidade, percebe-se uma evolução positiva. No caso do Provão, ela é clara, especialmente no caso das faculdades privadas, nas quais se concentravam os baixos índices. Há uma tendência à diminuição da dispersão da qualidade, o que era um dos propósitos da avaliação. Por outro lado, claramente, as faculdades em geral melhoraram a qualificação do corpo docente em três anos. (Souza, 1998 a)

Um primeiro ponto é a questão da melhoria da qualidade dos professores. Como disse Souza (2003 b) “em face da grande expansão do ensino privado, o número de professores que atuam nesse segmento duplicou nos últimos oito anos. Em 1995, só 25% deles tinham título de mestrado ou doutorado; em 2002, praticamente a metade já tinha essa titulação”. Esse é um dado importante. De fato, como dito anteriormente, houve um grande aumento do número de docentes no país, especialmente no setor privado. Se havia, em 1995, o total de 145.290 docentes em IES brasileiras, sendo destes 76.268 (52,5%) em IES públicas e 69.022 (47,5%) em privadas, chegou-se em 2002 com o total de 227.844 docentes, sendo 84.006 (36,9%) em IES públicas e 143.838 (63,1%) em IES privadas.

Ainda, houve um incremento na titulação dos professores do sistema. Caso se observem os dados de 1994 a 2002, houve um crescimento total de 131,11% (de 21.326 para 49.287) no número de docentes com doutorado e de 130,84% (de 33.531 para 77.404) com relação aos docentes com mestrado em todo o sistema. No mesmo período, 1994 a 2002, esse incremento se deu de forma diferente nos setores público e privado. No setor público, o aumento de docentes com mestrado foi de 8,21% (de 21.268 para 23.014) e com doutorado foi de 90,5% (de 16.850 para 32.098), enquanto que o aumento maior se deu no setor privado, com o crescimento do número de mestres na ordem de 343,53% (de 12.263 para 54.390) e de

doutores na de aproximadamente 284% (de 4.476 para 17.189), como se pode observar no quadro abaixo.

Tabela 10: Distribuição Percentual do Número de Funções Docentes em Exercício por Grau de Formação, segundo a Categoria Administrativa - Brasil - 1994,1998 e 2002

Nº % Nº % Nº % 1994 Total 141.482 100,0 75.285 100,0 66.197 100,0 Até Especialização 86.625 61,2 37.167 49,4 49.458 74,7 Mestrado 33.531 23,7 21.268 28,2 12.263 18,5 Doutorado 21.326 15,1 16.850 22,4 4.476 6,8 1998 Total 165.122 100,0 83.738 100,0 81.384 100,0 Até Especialização 88.567 53,6 35.121 41,9 53.446 65,7 Mestrado 45.482 27,5 25.073 29,9 20.409 25,1 Doutorado 31.073 18,8 23.544 28,1 7.529 9,3 2002 Total 227.844 100,0 84.006 100,0 143.838 100,0 Até Especialização 101.153 44,4 28.894 34,4 72.259 50,2 Mestrado 77.404 34,0 23.014 27,4 54.390 37,8 Doutorado 49.287 21,6 32.098 38,2 17.189 12,0 Fonte: MEC/INEP/DAES

Ano Grau de Formação Total Pública Privada

Fonte: Reproduzido de Censo da Educação Superior 2002 – Resumo Técnico, 2003, p.13.

Contudo, para melhor se compreender esse quadro, importa observar dois pontos. 1) o número total de docentes total no setor público cresceu, entre 1994 e 2002, apenas 11,58% (de 75.285 para 84.006), sendo que este crescimento se deu praticamente só até 1998, quando se estagnou, ao passo que no setor privado cresceu, no mesmo período, 117,29% (66.197 para 143.838) 215. Outro dado essencial para se entender esse quadro refere-se ao percentual total de doutores no setor. Apesar do grande crescimento do número de doutores no setor privado, que tinha em seu quadro de 1994 6,8% dos docentes com doutorado, passando em 1998 para 9,3% e em 2002 para 12% do total, ainda é no setor público que se concentra a maior parte dos doutores. Se em 1994 o setor público tinha 22,8% dos seus professores com doutorado, passou em 1998 para 28,1 % e em 2002 para 38,2%. Ainda, no número total do sistema, que tem 49.287 docentes com doutorado, 65,12 % deles estão nas IES públicas e 34,88 % nas IES privadas. No caso de docentes com mestrado, que são no total de 77.404 no país, o quadro se inverte: 29,73% estão nas IES públicas e 70,27% nas IES privadas. Assim, as IES públicas, mesmo concentrando 11,9% do total de IES no país, tem

215 Em 1998 o número de professores no setor público era de 83.738. Ou seja, de 1998 a 2002, houve um

crescimento de apenas 0,3%. O crescimento do número de docentes no setor privado no mesmo período (1998 a 2002) foi de 76,74%.

65,12% dos docentes com doutorado, enquanto que as particulares, que tem 88,1% das IES no país, têm 34,88% dos docentes com doutorado216. Como se pode ilustrar com o gráfico abaixo abaixo:

Gráfico 1: Distribuição percentual do número de funções docentes em exercício por grau de formação