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4.1 LEITURA E A ESCRITA NO CICLO DA ALFABETIZAÇÃO: DO ENSINO DAS

4.1.3 Práticas pedagógicas de produção de textos

4.1.3.3 Após a produção de textos

A produção de um texto não envolve apenas a escrita, mas também, as etapas que se sucedem a ela. Assim, tão importante quanto o processo da escrita é a revisão do texto e, se necessário, a reescrita. Essa reescrita não tem como finalidade apenas a correção de erros ortográficos e gramaticais, mas também a finalidade de verificar que o texto cumpra a finalidade do gênero textual a que se propôs. Nesse sentido, Rana e Augusto (2011, p. 72) apontam que, quando a criança aprende a escrever, pode se deparar com vários problemas ao escrever um texto:

 Um deles é tornar o texto bem escrito no que se refere às normas

gramaticais, ortográficas, de pontuação, entre outros elementos que servem para deixar o texto mais claro conforme as regras da língua portuguesa.

 Outro ponto é elaborar um texto bem escrito em relação ao modo como

as ideias são expressadas, organizando-as e encadeando-as de acordo com o gênero em que se está trabalhando.

Esses problemas citados pelas autoras foram identificados nas turmas investigadas e trabalhados através das práticas desenvolvidas pelas professoras, tendo como propósito

identificar os principais problemas relacionados à escrita e promover ações relacionadas à escrita de textos com qualidade. Para identificar os principais erros de escrita na turma, as professoras utilizaram estratégias como ditados de palavras e frases; produção de escritas espontâneas, curtas ou extensas, como por exemplo, a atividade desenvolvida na turma do terceiro ano, em que os alunos tiveram que desenvolver a escrita sobre a utilização da água no cotidiano. Tal atividade foi recolhida pela professora com o propósito de verificar os erros relacionados à escrita, para, posteriormente, promover atividades para trabalhar com os alunos.

Figura 45 - Atividade para verificar problemas relacionados à escrita

Fonte: atividade entregue pela professora em aula (2015).

Após identificados os principais problemas relacionados à produção escrita, eles eram trabalhados através de atividades como revisão, reescrita, leitura, uso do dicionário e utilização de jogos. Durante uma atividade de produção textual, na turma de terceiro ano, por exemplo, a professora chamou os alunos individualmente para fazer a leitura do texto produzido. Na leitura dos textos produzidos, que tiveram como referência uma narrativa

intitulada “O passeio das letrinhas”, foi possível perceber coesão, coerência e bom

vocabulário. A leitura já era fluente, porém, alguns alunos leram sem fazer pausas durante a leitura.

P3: Percebi, durante a leitura, que muitos de vocês leram sem fazer pausas. Vocês lembram que trabalhamos as formas de parar um pouco na leitura, de pausar?

P3: Isso. Usamos as vírgulas e os sinais de pontuação nas frases para dar uma pausa. Lembra que trabalhamos uma forma de parar um pouco na leitura?

C1: Já vimos isso, profe.

P3: Sim, mas tem gente que não está fazendo essas pausas. Agora quero que revisem seus textos. Leiam com bastante atenção focando nos sinais de pontuação, vírgula, ponto-final, ponto de interrogação. Revisem!

(Observação registrada no diário de aula, no dia 08/06/2015)

Neste dia, a professora solicitou aos alunos a revisão do texto escrito, mais especificamente, que observassem as questões da pontuação. Com efeito, o exercício da revisão é de grande relevância para a produção de um texto bem escrito, ortograficamente e gramaticalmente, afinal, as crianças precisam aprender, desde o início do processo de aprendizagem da escrita, que é preciso revisar suas produções, ler e analisá-las, perceber se há equívocos e realizar os acertos necessários, de forma a deixar a escrita clara e correta. Embora era possível identificar, através das leituras das produções das crianças, as diferenças na escrita (estilo, extensão, vocabulário), era nítido que as crianças do terceiro ano, escreviam textos coesos, coerentes, com um vocabulário variado e que desenvolviam a leitura de forma fluente, com exceção das duas crianças que frequentavam a sala de recursos. Estas duas crianças necessitavam do auxílio constante da professora no desenvolvimento das atividades relacionadas com a produção textual.

Durante a conversa com a professora da turma, questionei-a sobre os conhecimentos dos alunos da turma no que se refere à produção de texto e à leitura: “Eles estão super bem.

Já desenvolvem bem a leitura e escrevem com um bom vocabulário. Já chegaram com uma

boa bagagem do primeiro ano” (P3). Percebe-se que a professora do terceiro ano atribui os

bons resultados relacionados provenientes da leitura e da escrita de textos às práticas pedagógicas vivenciadas pelas crianças desde o primeiro ano. Curiosamente, no mês de abril de 2016, na sala dos professores da instituição de ensino superior na qual eu trabalho, uma colega me relatou que esteve na escola em que foi desenvolvida a pesquisa, supervisionando um estágio na turma dessa mesma professora (P3) e que esta relatou que seus alunos desse ano estão bem na leitura e na escrita, o que ocorre porque concluem o primeiro ano lendo e escrevendo alfabeticamente. Imediatamente, reportei-me àquela afirmação anterior, fornecida pela mesma professora em 2015. Os alunos não eram os mesmos, mas o sucesso para a escrita de bons textos, segundo a professora do terceiro ano, continuava sendo uma alfabetização bem desenvolvida, no tempo certo, na classe de alfabetização. Nesse sentido, não é que o segundo ano tenha sido um ano “invisível” ou pouco produtivo no que tange à leitura, à

escrita e à produção de textos, mas sim, que o primeiro ano é o ponto de partida para um

trabalho de qualidade nos anos posteriores. É lá que “nascem” alunos leitores e produtores de

textos, para depois se desenvolverem, a partir desse ano, nos anos seguintes.

Durante as práticas de produção textual, em diversas ocasiões, os alunos eram orientados para desenvolver a revisão e a reescrita dos textos, duas atividades que se complementam na produção de textos coesos e coerentes:

P3: Percebi que vocês estão repetindo palavras demais nos textos, então, então, então, então. Também tem alguns textos com probleminhas de pontuação. Esqueceram dos pontos? Cadê o ponto final?

P3: Por isso, quero que revisem os textos e que reescrevam. C1: No caderno ou na folha?

P3: No caderno. Revisem o texto e passem a limpo, reescrevendo de forma a arrumar as palavras repetidas e a pontuação.

C2: E quem não precisa?

P3: A ‘tá’! Não precisa revisar? Revisa e olha se não dá para deixar o texto mais bonito, melhorar a escrita.

(Observação registrada no diário de aula, no dia 22/06/15)

Para trabalhar o problema das palavras repetidas e o vocabulário restrito, algumas vezes sinalizado em sala de aula, as professoras promoveram o incentivo à leitura e o uso do dicionário. A professora do primeiro ano, que lia com frequência para seus alunos, dizia constantemente para as crianças “a leitura ensina palavras novas” (P1). As professoras do segundo e a do terceiro tinham o hábito de usar o dicionário em sala de aula, mas também promoviam a leitura, de forma a contribuir para o desenvolvimento dos textos. Adscrevendo- se, Morais (2011) afirma que o dicionário, alvo de preconceito no país, é pouco usado,

chamado, inclusive de “pai dos burros”, o que para o autor não é apenas preconceito, mas

também ignorância.

Dessa forma, é muito importante ensinar para as crianças que o dicionário é uma fonte de informação e de consulta de palavras, como também se deve ensinar a usá-lo, seja ele disponível de forma impressa ou digital. No terceiro ano, conforme afirmou a professora, o dicionário fez parte da lista de material escolar: “E esse ano foi uma coisa bem legal porque

no ano passado não tinha dicionário na lista de material, e esse ano, eu e a professora do outro terceiro ano decidimos pedir na lista de material escolar e foi bem legal porque eles começaram a ler e aumentar o vocabulário, começaram a perceber que poderiam usar para

fazer a produção textual” (P3). Ainda, sobre o uso do dicionário, no dia 01/04/2015, na turma do segundo ano, surgiu uma dúvida quanto ao significado da palavra “gafe”, presente

em uma frase. A professora perguntou se alguém sabia o significado. Mediante a resposta negativa, pediu para um aluno buscar o dicionário no armário. Na sequência, a professora procurou a palavra e entregou o dicionário para um aluno, que fez a leitura dos significados da palavra. Logo em seguida, a professora perguntou o que entenderam. As crianças explicaram o entendimento do que foi lido e a professora complementou a resposta. Momentos como esse, de uso do dicionário, eram frequentes na turma do segundo ano.

Outra forma de se trabalhar com os problemas apresentados nas produções textuais estava relacionada também à utilização de atividades lúdicas e jogos para trabalhar as dificuldades ortográficas, o que ficou bastante evidente principalmente na turma de terceiro ano. Durante a entrevista, quando questionada sobre o que levava em consideração quando planejava as aulas, a professora do terceiro ano relatou o foco no trabalho com a ortografia:

“Eu levo em consideração como está o andamento da turma, como eles estão na parte de gramática. No terceiro ano, a gente trabalha muito ortografia, muito com a produção de textos, vou vendo as dificuldades deles e, com base nisso, vou fazendo os planejamentos, de acordo também com o que está nos objetivos da escola (P3)”. Para tanto, nessa turma, para

trabalhar a ortografia, foram promovidas atividades relacionadas aos erros regulares e irregulares da língua35, através da utilização de exercícios e de jogos pedagógicos.

Figura 46 - Jogo para trabalhar ortografia – X e CH

Fonte: registro da pesquisadora (2015).

35

Na perspectiva de Morais (2010), os erros regulares são solucionados através da compreensão de determinadas regras, como por exemplo, o uso da letra M antes das letras P e B. Os erros irregulares são solucionados somente por meio da memorização, como exemplo, cite-se o uso do H inicial.

Deveras, os jogos, o uso do dicionário, a revisão, a reescrita e a leitura contribuem para que os alunos produzam textos coerentes no desenvolvimento das ideias e bem escritos do ponto de vista ortográfico. Outro fator que contribui para isso é oportunizar atividades permanentes de escrita no planejamento semanal, de forma a criar o hábito da escrita espontânea. Mas, para tanto, é preciso oportunizar práticas que sejam interessantes, significativas, para que os alunos tenham interesse em escrever. Afinal, qual seria o nível de interesse de uma turma em produzir um texto cuja professora fizesse apenas atividades de produção escrita, do tipo redação?

Atividade dia 1 - no quadro: “escreva um texto sobre ‘alimentação saudável’. Atividade dia 2 - em folha: “escreva um texto sobre ‘a amizade’.

É possível perceber que, com exceção do recurso utilizado – quadro e folha – a atividade cujo foco é a produção textual é a mesma, ou seja, produção de um texto dissertativo, do estilo redação, que por muito tempo foi o mais utilizado nas escolas. Porém, trata-se de um tipo textual pouco atrativo para as crianças, pois escrever sobre algo, apenas com um tema ou assunto, nem sempre é algo prazeroso, com exceção de ser um tema relacionado a vivências ou interesses. Em contrapartida, esses mesmos assuntos poderiam se transformar em produções de textos, através de outras estratégias, um pouco mais significativas e contextualizadas com situações reais, como se pode verificar na sequência abaixo:

Atividade dia 1 - no quadro: “produza uma receita bem criativa. Use produtos saudáveis”.

Atividade dia 2 - em folha: “o que você diria para o seu melhor amigo? Escreva isso

numa cartinha bem bonita”.

Como se percebe, apesar de os dois conjuntos de atividade tratarem dos mesmos temas (Atividade dia 1: alimentação saudável; Atividade dia 2: amizade), essas opções de produção textual apresentam uma diferença significativa para o aluno: a aproximação da escrita com as necessidades enfrentadas por ele no dia a dia, ou seja, a relação do texto com as práticas sociais de escrita. Isso se remete ao conceito de texto como aquele que promove uma intenção comunicativa, seja ele uma carta, uma receita, uma lista, um bilhete ou até mesmo uma palavra registrada em uma placa. Neste sentido, é preciso oportunizar práticas de produção de escrita (ou de texto) que vão além de escrever sobre algo, mas que despertem no aluno a vontade de escrever, que sejam lúdicas, que integrem diferentes áreas do conhecimento, ou

diferentes temas, que possam contemplar diferentes atividades, enfim, que ultrapassem o enunciado protocolar “escreva sobre...”. Na escola da pesquisa, foi possível identificar que essas práticas ocorreram, visto que as atividades de produção textual estiveram contextualizadas com imagens, jogos, bilhetes, poesias, história em quadrinhos ou outros elementos que despertassem nos alunos o interesse pela escrita. Poderiam ter sido mais relacionadas com gêneros textuais do cotidiano, porém, talvez isso tenha ocorrido durante o restante do ano letivo, visto que as professoras trabalhavam na perspectiva da apresentação de diferentes gêneros textuais.